sábado, 18 de abril de 2015

RIO EM GUERRA XLVIII - CRIANÇAS NO TRÁFICO


“O mundo está perigoso para se viver! Não por causa daqueles que fazem o mal, mas por causa dos que o veem e fazem de conta de que não viram.” (Albert Einstein)



A História da Humanidade registra muitas guerras e revoluções nas quais poderosos líderes políticos e chefes militares puseram crianças em armas. Atualmente, é o que mais se vê no mundo islâmico e em seus exércitos xiitas. Sim, crianças, pré-adolescentes e adolescentes sempre foram e ainda são treinados ao uso de armas de guerra, tais como os adultos, e muitos desses menores são encaminhados ao terrorismo suicida. E também no mundo do tráfico o uso de crianças é comum faz tempo, mas a grande imprensa e os pesquisadores sociais parecem ignorar de propósito a grave questão.

No meu caso, e enquanto no serviço ativo da PM, vi muitos exemplos de crianças a serviço do tráfico, e ainda hoje denuncio esta prática em contos e romances. Num deles (CIDADELA CONTEMPORÂNEA), traço o principal personagem inspirado num fato ocorrido na Favela de Acari na década de 90: depois de violento tiroteio entre facções rivais, a polícia interferiu e prendeu boa parte dos envolvidos, pondo-os sentados lado a lado. No meio deles observei, pela foto de um jornal, o rosto de uma criança destacando-se como se pedisse socorro. No dia seguinte, o mesmo jornal anunciava a morte daquele menino, inclusive nominando-o pelo apodo “Pimentinha”. Ele estava baleado no abdômen, e por isso pedia socorro com seu olhar assustado. Foi ignorado e morreu. O irmão mais novo de Pimentinha declarou na ocasião que ele “trabalhava” no tráfico para ajudar a família. Chocou-me tanto o episódio que Pimentinha se tornou inspiração e personagem do meu romance, com edição já esgotada, mas disponível no meu site para reprodução e/ou leitura (www.emirlarangeira.com.br).




Não me lembro da idade dos irmãos, mas era de 12 anos para menos. E tão tamanhona é a participação de crianças no tráfico que os traficantes até instituíram uma forma inusitada de punir suas peraltices: tiro na palma da mão em faltas mais leves e morte nas mais graves, geralmente em assustadores “castigos-espetáculos”, mas pouco ou nada denunciados pela mídia, talvez para não legitimar a onda da mudança de regras da maioridade penal. Mas me indago: não seria mais seguro, justo e humano o Estado retirar essas crianças do jugo do tráfico e cuidá-las em sistemas educacionais e prisionais saudáveis e realmente capazes de lhes garantir um futuro melhor?...

Ora, o tráfico responde pela maior parte do envolvimento de menores na delinquência infanto-juvenil. Porque, já viciado, ou o menor atua na quadrilha para sustentar seu vício ou comete outros delitos com o mesmo fim. E muitas vezes a criança vai ao extremo até do latrocínio, que poderia ser evitado na origem. Mas as esquerdas pátrias, na contramão da vontade da maioria da população brasileira (segundo pesquisas, 87% a favor da diminuição da maioridade penal), insinuam que isto é “retrocesso”. Esta opinião foi outro dia externada até pela própria presidenta Dilma, que hoje contabiliza ridículos 13% de popularidade, curiosamente a diferença que complementa os 87% a favor da mudança de regras em relação a menores criminosos, especialmente os vinculados ao tráfico em favelas, onde está o maior contingente.

Claro que não basta diminuir a maioridade penal em maniqueísmo simplório. Trata-se de instituir um novo sistema penal para lidar com o problema, vendo-se o menor primeiramente como detentor de direitos humanos fundamentais. Falo de um sistema multidisciplinar que compense o afastamento do menor de sua família e do ambiente em que aprendeu a praticar crimes como se fora comportamento normal. Falo de um sistema rígido, porém confortável e animador em todos os sentidos, de modo que crianças, pré-adolescentes e adolescentes sejam efetivamente ressocializados.

Não me refiro aos latrocidas e homicidas contumazes, estes que, infelizmente, engrossam a criminalidade adulta nesse gênero mais grave. Para estes, a punição há de ser como a do adulto, mas em estabelecimento padrão, destinado somente a eles, separando-os por sexo e instituindo atividades de educação física, de música e demais artes, de modo que a cabeça desses menores seja preenchida com motivações saudáveis. Mas para estes há de haver também o isolamento em celas confortáveis, para que tenham seus momentos de reflexão. Tudo isto permanentemente apoiado por psicólogos, psicanalistas, assistentes sociais etc.

Mas não adianta querer cobrir todo o Brasil com um programa deste porte. A União poderia construir as edificações planejadas para atender aos propósitos do programa de recuperação dos menores de idade e prover os meios necessários ao seu pleno funcionamento. A lei da terceirização, em discussão no Congresso Nacional, poderia acrescentar artigos específicos para facilitar a participação da iniciativa privada na instalação e na manutenção do programa, como ocorre em muitos países desenvolvidos, em especial porque aqui nas plagas tupiniquins o Estado já faliu faz tempo. E um dos motivos é o engessamento do serviço público pela obrigatoriedade do concurso, deste modo eliminando a possibilidade de montar e desmontar estruturas para atingir objetivos flexíveis. Sim, a inflexibilidade estrutural tem relação direta com a obrigatoriedade do concurso público, que impede o Estado de evoluir como desenvolta empresa pública.

A verdade é que se não houver uma mudança radical no sistema estatal para lidar com a delinquência infanto-juvenil, pouco tempo escorrerá para que o ânimo das crianças em praticar delitos chegue perto do nascimento, quando então veremos bebês furtando a chupeta do seu coleguinha ainda no berçário...





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