domingo, 3 de junho de 2012

SOBRE AS UPPS E O RELACIONAMENTO PMERJ-COMUNIDADE

De fato, vi também as brincadeiras infantis em 1980: de revólver de pau na mão, dividiam áreas, defendiam território contra os inimigos, trocavam tiros, cobravam pedágio dos passantes. Quando um fazia o papel da polícia não vinha impor a lei: matava os bandidos, pedia dinheiro, morria. (Zaluar, Alba – A MÁQUINA E A REVOLTA – Editora Brasiliense, São Paulo, 1985, pág. 155)

Reitero que defendo as UPPs como um modelo ideal de intervenção policial em favelas dominadas pelo tráfico, não sem reconhecer seus óbices. Igualmente me rendo à realidade de que jamais a PMERJ logrará atender a todas as comunidades fluminenses com igual intervenção. Eis minha razão de olhar para trás, tal como o maratonista que não pode perder a visão da linha de partida – espécie de feedback da corrida. Insisto, porém, em assegurar que não sou partidário de nenhum governo. Prendo-me à instituição PMERJ e lhe almejo sucesso para que, em última análise, ela seja útil à sociedade. E mais afirmo: faço o reparo para minimizar as críticas figadais que me virão por insistir no meu otimismo (Que me desculpem o “Belzeba” e os “300 de Esparta”!), sentimento que é restrito à PMERJ e não se reporta a nenhuma defesa do atual governo.


Agora sim, torno ao início de tudo, ao Morro Dona Marta, e registro o que assisti, no escorrer desta semana, no canal global de tevê: esgoto a céu aberto e muitas reclamações sobre a sujeira e suas consequências danosas. E sublinho as reclamações dos favelados, que contaram com a solidariedade dos repórteres, mas, por outro lado, mereceram deles críticas severas por não cuidarem devidamente do lixo: jogam-no nas valas fétidas que descem morro abaixo, servindo os entulhos como represadores das águas pluviais. A crítica do “politicamente correto” aflora na matéria como se houvesse na favela o recolhimento regular do lixo, como se a chuva fosse problema dos favelados e a existência da favela fosse também culpa deles.

O essencial, todavia, é que os repórteres defenderam unanimemente as UPPs, porém poupando de críticas a tão propalada “invasão social”, que não houve. A realidade é que tem sido a própria PMERJ, por meio de seus efetivos lotados nas UPPs, a que mais se empenha em levar cidadania às crianças faveladas e até aos adultos, e não apenas em simplório lazer, mas mediante cursos de língua inglesa, de música etc., funcionando os dedicados militares estaduais como mestres. Inegável, portanto, que a PMERJ se esforça para minimizar a enraizada cultura denunciada por Alba Zaluar (ibidem, pág. 153):

Esta tentativa que o trabalhador faz de compreender seu outro – o bandido – relativiza a oposição entre eles e acaba por aproximá-los enquanto pobres submetidos às mesmas condições de vida. (...) Mesmo assim, os “bandidos” vizinhos e conhecidos são “gente como nós”.

Eis como se apresenta a inferência da eminente estudiosa, cabendo-nos a sublinha de que, em princípio, não deveria ser parte do labor policial instituir contraculturas em ambientes historicamente forjados por interações reprodutoras de violência (“Ninguém é bandido porque quer” – ibidem, pág. 153). Talvez seja este (o íntimo elo trabalhador-bandido) o pior dos obstáculos. Cá entre nós, se inexistisse a vontade latente do favelado de gozar da liberdade sem riscos, a PMERJ não lograria êxito na integração comunitária que hoje se vê nas favelas com UPP. Há, sem embargo, o êxito da corporação, mesmo com ela enfrentando desvios de conduta inclusive gravíssimos de alguns componentes de UPP. Apesar disso, hoje é possível arriscar a afirmação de que há uma saudável interação trabalhador-policial nas comunidades beneficiadas, quebrando-se, para nosso alento, o binômio histórico “trabalhador-bandido” focado por Alba Zaluar.

Quanto ao futuro, creio que cabe a cada um de nós, oficiais e praças, incentivar os companheiros empenhados na nova modalidade de policiamento preventivo (antes e ainda hoje a repressão predomina na maioria das favelas), de modo que eles (e elas) saibam que não estão sozinhos na sua luta. Sim, esses efetivos de UPPs requerem (e merecem) a atenção da tropa de serviço no asfalto, que deve estar sempre pronta a apoiá-los em momentos críticos, de modo que a força da instituição prevaleça ante os obstáculos a que me referi e que não devem ser ignorados, mas enfrentados com transparência e firmeza. Assim, creio eu, a PMERJ sagrar-se-á vencedora no seu labor cotidiano de protetora de fato do cidadão favelado.

Um comentário:

Anônimo disse...

É tudo uma farsa. O que mais recebo são pedidos para transferência para qualquer outra unidade que não seja UPP. As reclamações e decepções dos nossos recrutas são tão grandes que não cabem num rascunho da Bíblia...