quarta-feira, 10 de junho de 2009

Amarga ilusão

Stalin e Hitler

“Nada é tão ruim que não possa piorar!”
(Alvaro Rogerio Rodrigues – frases absurdas)



Uma das características dos regimes totalitários, – sejam de direita, de esquerda, ou forjados em fanatismos religiosos, – é a presença da arrogância e da subserviência convivendo harmoniosamente no espírito dos burocratas estatais. E não se trata de aludir a contrastes, mas de atentar para a conveniente circunflexão de subordinados a superiores, associada a maus-tratos destes contra subordinados, e estes, na condição de superiores de outros burocratas, agindo da mesma maneira até o último patamar da hierarquia estatal, militarizada ou civil, tanto faz. E nem ainda chegamos ao povo...
Esse comportamento viabiliza-se pela força bruta (legal e ilegal) de opressores que se bajulam ou se ferram entre si; e a força bruta do mandatário todo-poderoso torna-se cultura de opressão direcionada, por último, ao povo destinatário dos mandos e desmandos dessa turma viciada em poder totalitário. Curioso é que a tirania muitas vezes emerge sob a forma de “direitos”. E a liberdade individual e coletiva vai diminuindo homeopaticamente, e, sem ser percebida, transforma-se numa sucessão de “deveres” que, contraditoriamente, se consagram como “defesa” da própria liberdade. E assim, em espantoso fade, a liberdade (natural e social) desaparece, e o povoléu ingressa em invencível conformismo.
O Brasil sempre oscilou entre o totalitarismo (algumas vezes dissimulado em Estado Novo do "pai dos pobres") e uns poucos períodos de aparente liberdade. Mas o sistema não mudou, a não ser pela oportunidade de o povo votar em seus representantes e mandatários políticos, por sinal, as mesmas galdérias dos sistemas totalitários a incorporarem o binômio (arrogância-subserviência) em seus espíritos. Sim, binômio, e não dicotomia, eu aqui repito para ninguém pensar que me engano.
Com efeito, as aberrações continuam vivas, e não apenas latentes; elas se integram ao atual sistema político como se fossem oriundas da luta pelas liberdades democráticas contra o despotismo. Claro que a culpa não é desses burocratas escudeiros da cultura totalitária, agora a serviço dos “amantes da liberdade” com a mesma desenvoltura de outrora. Esse mimetismo ocorre em virtude da falta de pejo dos mandatários políticos afinados com a máxima maquiavélica de que “os fins justificam os meios”; e, desse modo sem-vergonha, usam e abusam das estruturas totalitárias como se democráticas um dia foram, e desdenham os verdadeiros democratas.
É tão tamanhão esse descaramento que muitos dos que hoje mandam e desmandam como déspotas, – e se utilizam das anacrônicas estruturas de informações (nossas antigas “SS”) incentivando suas abomináveis práticas, – muitos deles não fizeram história na luta contra os regimes totalitários. Sim, porque hoje, em nome de uma liberdade que não existe, esses políticos e burocratas roubam às escâncaras e nada lhes acontece. Somaram-se, na verdade, à cultura do despotismo conquistado pelo voto dos currais eleitorais; engrossaram a corrente da roubalheira ignorada pelo sistema que eventualmente comandam. Mas, como num passe de mágica, o sistema torna-se ativo e repressor quando se trata de atalhar seus contrários.
Desde o advento da “Constituição Cidadã”, em 1988, não houve nenhuma contracultura ou ruptura visível do status quo. Tudo continua como dantes; as mudanças seguem a máxima de Lampedusa: “Tudo deve mudar para que tudo fique como está.” Tal sistema atinge o extremo de os burocratas, – amantes daquele binômio “arrogância-subserviência”, – serem alçados a cargos elevados em vez de jogados ao limbo ou diretamente ao inferno. Não! Nada disso! Esses dissimulados desfrutam das delícias do paradisíaco poder estatal como prêmio pela futricagem de ontem, e mais ainda hoje aprimorada e atuante no uso do muque contra as liberdades democráticas. Absurdo!
O ideal é que esses “arrogantes-subservientes” fossem destruídos pela cultura da verdadeira liberdade. Mas, ao que tudo indica, liberdade e democracia no Brasil são e sempre serão utópicas. Pois o que aqui por perto assistimos não passa de cruel anomia do tudo-pelo-poder-e-pelo-dinheiro a lembrar o “Rei Sol” Luiz XIV de Bourbon: "L'État c'est moi". Só faltam as perucas e os trajes carnavalescos paramentando o cinismo dos larápios travestidos de “autênticos democratas”. Enquanto isso, o povo segue conformado, e a pagar mais impostos e taxas, e a ser flagrado por pardais, e a ser impedido de externar sua individualidade por seu “Estado-Protetor”, enfim, impedido de ser livre de dentro para fora, enquanto é oprimido de fora para dentro por um Estado Totalitário fingindo ser “Democrático de Direito”. Que amarga ilusão!



A propósito, nunca é demais lembrar que os ilustres membros do Ministério Público não se confundem com burocratas do Poder Executivo, embora o organismo ministerial dele faça parte, mas não como um ente servil ao dirigente político. No caso da União, é crime de responsabilidade do Presidente da República atentar contra o livre exercício do Ministério Público, nos termos do Inciso II do Art. 85 da CRFB. Já na Constituição do Estado do Rio de Janeiro, o Ministério Público consta como uma das funções essenciais à Justiça, indicando o Art. 170 e seus parágrafos e incisos a mesma independência funcional, sendo o seu único compromisso constitucional a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Isto significa que o Ministério Público não é um organismo burocrata que se inclui no binômio “arrogância e subserviência” em relação ao efêmero e eloquente poder político. Muito pelo contrário, é permanente e caracterizado por sua capacidade de acusar quaisquer cidadãos, políticos ou burocratas, que infrinjam as leis vigentes, e não orienta suas decisões por sugestões midiáticas, mas pelas provas dos autos de inquéritos e processos judiciais. Claro que falamos de democracia, palavra difícil de ser digerida por alguns mandatários que pensam ser ela restrita ao voto, que, absurdamente, é obrigatório. Quem sabe não será este o principal motivo da anomia que corrompe o nosso ilusório Estado Democrtático de Direito?...

4 comentários:

paulo fontes disse...

Caro amigo Larangeira,
Mais uma vez tenho que deixar no seu blog a minha mensagem de elogio à tão contundentes artigos que do alto da sua experiência e clarividência você tem postado no site.
Alguns anos atrás,assistindo uma palestra dos juízes italianos que conduziram a "Operação Mãos Limpas" na Itália, fiquei muito impressionado com o modo ao qual se referiram sobre à democracia naquele país, antes entregue ao crime organizado e a corrupção deslavada dos políticos: Era uma caixa vazia sem nada dentro.

É exatamente o que ocorre atualmente no Brasil: uma democracia ôca, canhestra, sem nada dentro,uma anomia total, dominada pelo crime das ruas e dos gabinetes, ou o contrário, se é que me entende.

Entretanto quero ressaltar que também incluo nesse caldo o Ministério Público, que produz muito pouco para tantas prerrogativas, imunidades, salários, etc.

Com admiração e respeito, mando-lhe um grande abraço.
Paulo Roberto S. Fontes- Ten Cel PM

Anônimo disse...

http://gustavodealmeida.blogspot.com/2009/06/nada-menos-que-39-deputados-assinam.html

Nada menos que 39 deputados assinam documento que questiona o governador
Como era mais do que previsível, a discussão sobre os 44 policiais militares soltos pela Justiça polarizou: o governador considera-os culpados, mesmo depois que o Judiciário tomou uma decisão soberana. E mais: deu ordens para tratá-los como culpados, todos os praças.
Espero que o governador tenha tomado a mesma decisão em relação a um tenente-coronel condenado a 54 anos de prisão por envolvimento com roubo de caixas eletrônicos. Afinal, este oficial estava condenado em primeira instância e respondia em liberdade, diferentemente dos 44 PMs, que nem condenados estavam.
E o oficial esteve na função de oficial-de-dia do QG da PM. Não é pouca coisa.
Mas o comentário mais interessante partiu de um advogado, assessor jurídico de um gabinete na Assembléia Legislativa. Este, como dizem dentro da PM, acertou no 5X:


"Houve um soldado que foi inocentado e mesmo assim excluído porque, segundo entendeu o comando da PM, ele feriu o pundonor policial. Bom, oficiais da Lista do Bicho foram inocentados e alguns até já chegaram ao posto máximo da corporação. Quando são questionados por isso, o comando responde: "Eles foram inocentados pela Justiça". "Ora", pergunta o advogado, "Essa resposta só serve quando é um oficial?"

Pelo sim, pelo não, o deputado Flavio Bolsonaro (PP) resolveu sair na defesa dos PMs e bater no governo. Conseguiu que, na próxima semana, seja instalada uma comissão especial da Alerj para rever exclusões de praças da PM que estejaM em desacordo com as normas constitucionais. A proposta teve apoio de 39 deputados, ou seja será automaticamente aprovada por ter o apoio da maioria absoluta.
Postado por Gustavo de Almeida às 19:38

Emir Larangeira disse...

Caro Gustavo

Espero que a CPI seja aprovada e se estenda aos PMs feridos em serviço, alguns com perda de membros, mas não são reformados. A PMERJ vivencia um dos períodos mais absurdos de sua história. Os direitos humanos não se aplicam ao PM nem os princípios fundamentais da cidadania gravados na Carta Magna são considerados. Mas um dia isto mudará. Pois a hierarquia e a disciplina não foram feitas feita para funcionar somente de cima para baixo. Mas, infelizmente, é assim que funcionam: para cada caso, um critério dependente do humor de quem julga.

Abraços

Emir

Anônimo disse...

GENIAL.

Oclocracia é isso aí.

Abraços,
Maria Angelica
LAGOA