Já pelos tempos de Joaquim Manuel
de Macedo (1820-1882) o romancista em questão grafou no seu clássico “A luneta
mágica” que “[...] A opinião pública é a rainha do mundo [...]” Não imaginava
ele que sua “rainha” seria do mal, pois com as ferramentas da psicologia de
massa, e da tecnologia, apelando para a certeza de que se comunicam com um povo
ignaro, os protagonistas da comunicação tornariam essa “opinião pública” uma
“opinião publicada”. E não somente pela palavra escrita, mas pela fala posta
nas ondas do rádio e nas imagens da tevê, além, claro, de palavras e imagens
disseminadas como praga nas redes sociais. E mais ainda, por sua aparente
simplicidade, tornaram-se as fotos e os desenhos (charges) as linhas de frente
da comunicação massificada, eis que são as que mais estimulam a preguiça dos
incultos que não leem nem raciocinam nada. E eles são milhões...
Por isso a charge sempre vem em
destaque na mídia, seja ela animada para a telinha da tevê ou apenas desenhada
e grafada em jornais e revistas. Seu poder de comunicação é impressionante.
Porque parte da premissa de que o povo não gosta de ler e prefere absorver o
que lhe dá menos trabalho, que é o de olhar a imagem e concluir conforme a sua
intelectualidade ou a sua estupidez, mais a segunda hipótese. E é tão forte
esta comunicação por imagens que ela leva à ira extrema as pessoas, a ponto de
praticarem atentados contra seus protagonistas, como se viu recentemente na
França. Mas aqui no Brasil, considerando-se a histórica subalternidade das
massas, as reações não ultrapassam as manifestações de indignação totalmente
inócuas diante da realidade de que a charge e a foto, juntas ou separadas,
alcançam rapidamente o espírito do povo, em boa parte agradando-o, e em exceção
indignando-o.
É nesse meio de cultura que
surgem os talentos voltados para o mal ou para o bem, dependendo de quem desenha
e de quem observa o desenho ou a foto, ou assiste na telinha alguma comunicação
com fins geralmente inconfessáveis. Na verdade, esses meios de comunicação
acompanham a tendência “do contra” adrede introjetada no espírito do povo. É
como juntar a fome com a vontade de comer, ficando os atingidos por esse
insidioso meio de comunicação como seus alvos preferenciais, sendo a PM o mais
atraente, não importando aos mentores e autores as indignações nem os prejuízos
que decorrem do estímulo à ira do PM contra eles e contra o povo. Pois esta ira
se materializa em excesso no uso da força contra esse mesmo povo que ri deles e
aplaude as charges pejorativas, mesmo que, em raras às vezes, a ideia do chargista seja a de retratar a
realidade presente, como no caso em sublinha, que retrata a mais pura verdade,
é fácil, muito fácil, a morte alcançar o PM no seu dia a dia de atuação na
segurança individual e comunitária do cidadão. Ora, por que o povo odeia a PM,
se ela existe para protegê-lo e morre muito por isso? Seria uma contradição?...
Talvez, talvez... Ora bem, um dos
motivos é aberrante, o povo sabe que o mesmo PM que se propõe a combater
criminosos para defendê-lo é o que põe o capacete, o escudo e outros aprestos
para contê-lo na base da violência em manifestações, muitas delas mais que
justas, contra sistemas estatais e particulares que não o respeitam enquanto
povo trabalhador. Esta contradição, dentre muitas outras, reforçam a ideia
popular de que a PM (nem digo a polícia em geral) é “inimiga” do povo e não a
sua protetora. E é neste estado de espírito coletivo, e negativo, que a charge
penetra como punhal afiado bem no coração do PM enquanto instituição e enquanto
pessoa individualizada, situação, aliás, rara, pois geralmente eles pensam e
agem em grupos psicológicos cujas ideias e ações se expandem na velocidade do
raio. Então, se esses grupos psicológicos são o combustível, as palavras de
demérito, as fotos e as charges são o comburente e o calor a provocarem irados
incêndios, num círculo vicioso que aqui no Brasil tão cedo não terá fim. Pois
aqui não ocorre a máxima de Erich Fromm: “A calamidade é ruim para o povo, mas
boa para a sociedade”.
Sim, a tragédia talvez seja o único caminho
para se mudar uma sociedade, como vimos no soerguimento do Japão após as bombas
atômicas, para não nos alongarmos. Portanto, enquanto não houver uma grande
tragédia que una a todos em torno de um objetivo comum e grandioso, a sociedade
brasileira continuará no seu círculo vicioso, que gravita entre a formalidade e
a informalidade do “você sabe com quem está falando?” e “para os amigos tudo,
para os inimigos os rigores da lei”, frases que resumem a imprensa de hoje,
que, unida por compadrio ao Ministério Público, e, por via de consequência ao
poder da justiça, escreve o que bem entende, fala o que bem entende, desenha o
que bem entende, e sempre sai imune (impune) neste país que hoje é comandado por
marginais de terno e gravata e por rotos e esfarrapados armados até os dentes e
dominando as favelas e boa parte do asfalto. Daí a certeza do chargista de que
será aplaudido pelo povão e vaiado por meia dúzia de indignados: os mesmos de
sempre, poucos em relação ao todo, como a formiguinhas mordendo patas do
elefante.
Nenhum comentário:
Postar um comentário