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“A
não ser que nos salvemos, dando-nos as mãos agora, eles nos submeterão à
República. Para que as coisas permaneçam iguais, é preciso que tudo mude.” ("O Leopardo"
- Giuseppe Tomasi di Lampedusa - Palermo, 23 de dezembro 1896 — Roma, 23 de Julho 1957)
Começo com citações retóricas
para abordar um tema real e delicado, e ao mesmo tempo indicar que tudo decorre
de manifestação cultural e não de pessoas do presente no âmbito da PMERJ, nem
das diversas Polícias Militares que lhe deram origem (PMDF, PMRJ e PMEG). Deve
a reflexão, porém, desde logo se reportar ao assassinato covarde de uma Juíza
de Direito em São Gonçalo, município do Grande Rio (clareando que perpetrado
por marginais que vestiram farda e não por fardados que se tornaram marginais
por ingressarem na PMERJ), de dois Coronéis PM e de um Delegado de Polícia.
Destaco de caminho essas mortes estúpidas, dentre muitas, para indicar que elas
quebraram a regra histórica no sentido de que primeiro devem morrer os soldados
para que os generais se rendam, ainda vivos, para serem fuzilados, ou punidos
de outra forma, ou até perdoados pelos vencedores (“Aos vencedores as
batatas”).
Vejo hoje nas redes sociais (não
na grande mídia) muita ênfase na morte de policiais, principalmente de PMs, com
ressalva de que antes desse surto de internet não era comum tanto clamor, e o
somatório passava ao largo do conhecimento público porque interessava e ainda
interessa ao sistema situacional escravocrata estatal a ilusão de vitória aos
ouvidos e olhos do povo. Daí é que ninguém se importa com o fato de que em
1994, por exemplo, foram assassinados 227 PMs, segundo o anúncio do Jornal
EXTRA depois de seus editores admitirem frontalmente que há uma “Guerra” no Rio
de Janeiro. E é verdade! Há sim, uma guerra no Rio! Mas vem de longe, desde os
idos de 1983, “costeando o alambrado”... Ademais, o que ocorre hoje (morte
coletiva de soldados) é fruto de cultura a vencer os tempos e há de perpetuar,
sem reação maior, em direção ao futuro. “Nada de novo sob o sol”...
“Que as alegres canções dos trovadores eram sufocadas pelo barulhento
tilintar das armas, que as festivas passeatas com tochas eram substituídas por
marchas guerreiras para os campos de batalha, e que os exuberantes jovens, no
verdor da mocidade, eram chamados às armas pelo sino de guerra, para dar suas
vidas pela Igreja ou pela coroa, pela honra do senhor feudal ou pelo orgulho
dos burgueses.” (René Fülöp-Miller – Os Santos Que Abalaram O Mundo).
Era assim! É assim!
Será assim!... E é bom que eu confesse antes de me enfiar no foco do tema, que
se centra na ideia de que a PMERJ, se fosse descrita, embora ela seja feita de
gentes de carne e osso, deveria sê-lo como um “alicate”, com uma descrição do
seu formato (estrutura) e de suas funções (objetivos), em vez de descrevê-la
como um processo que se desenvolve no tempo. Mas, infelizmente, este processo é
entrópico, numa proporção maior do que a homeostase, que se deveria impor e
renovar tudo, mas que a carcomida cultura que norteia a sua existência não lhe
permite. E isto não é culpa de comandos, insisto, é algo de natureza subjetiva
e inalcançável por mentes e corpos que se movem aleatoriamente. E esse
movimento dá a impressão de renovação, mas a única que há é a de corpos vivos a
substituírem os corpos mortos, já que os vivos existem em imensas proporções nesta
sociedade de massas governada por poucos. E não importa se o regime é
capitalista ou socialista/comunista, o sistema situacional estatal é o mesmo:
mandam os de cima e os de baixo obedecem cegamente, embora todos finjam existir
liberdade e igualdade perante as leis. Ledo engano!...
“Manda quem pode,
obedece quem tem juízo!”. O imperativo aforístico pode ser exemplificado por
mais um fato recente: uma viatura da PMERJ transitando em rua favelada sob a
mira de fuzis dos traficantes, tudo como se fosse “normal”. Cá entre nós,
infelizmente é normal, sim, só que a sociedade escravocrata, a que manda, por
enquanto não está sujeita a tal humilhação imposta pelo sistema de forças
marginal (duvido que uma viatura da PMERJ passe indiferente por um “bonde”
armado de fuzil na Vieira Souto!). Na verdade, o que denominamos “elite”
prefere a defesa da tese de que os pobres-diabos armados com fuzis de guerra de
última geração não passam de “marginalizados” e “oprimidos” pelo sistema
situacional estatal escravocrata que a essa elite se subordina tal como se subordinaram
os “Trezentos de Esparta” ao seu rei, com a ressalva de que o monarca se imolou
a si junto com eles. Mas teria sido decapitado se não fosse ele mesmo a tentar,
pelo menos, retardar o avanço inimigo. Não agiu como o contemporâneo monarca da
segurança pública, que instituiu seus “Trezentos das UPPs”, com direito a capa
de revista, mas se escafedeu, deixando seus “bodes” à mercê dos mandatários
reais: os narcotraficantes das favelas e do asfalto, do Brasil e do Mundo, é
bom lembrar.
Agora, todavia, o
assassinato das autoridades referidas sugere a ampliação desta possibilidade,
sendo certo que também dois oficiais superiores da corporação que dirigiam
presídio estaduais foram assassinados num mesmo clima de “normalidade”. E não é
difícil conceber a hipótese de o delegado, que estava de terno e gravata, - e
considerando de onde saiu do emblemático prédio denominado “Cidade da Polícia”),
- pudesse ser um promotor de justiça, ou outro juiz, o que sugere a
possibilidade de que é fácil aos bandidos matar autoridades na saída de seus
próprios estatais de onde manifestam o seu poder teórico, desferindo-o contra
marginais de carne e osso. Sim eles podem ser as próximas vítimas, já que a
eles, e elas, são reservados o poder de pedir a punição e punir esses criminosos.
Porque todos estão diante da dura realidade de que os assassinatos ocorridos e
aqui rememorados lembram “práticas sicilianas” de ontem e de hoje.
Vejam os leitores que
até agora não critiquei ninguém, prática corriqueira da mídia pátria para
deslocar a realidade para o campo ficcional, preferindo culpar ou elogiar
pessoas e autoridades isoladas em vez de se aprofundar na contextura social
criminosa, que é grave, muito grave, tão grave que o Jornal EXTRA já intitulou
em matérias sucessivas que se trata de “guerra”. Ora, não adianta culpar
pessoas representantes do poder estatal, elas estão morrendo também como patos na
lagoa. Estão morrendo “generais” como se fossem “soldados”, assim provando que
os autênticos mandatários estão com um poderio bélico e numérico que situa a
informalidade do crime acima da formalidade das leis. E as leis, como diriam os
filósofos e historiadores, só se sustentam e se impõem por meio de “boas
armas”. Mas estas, as boas armas, estão em maiores quantidade e qualidade nas
mãos dos narcotraficantes, estes que, embora aparentando desorganização são
organizados em hierarquia militar, e embora aparentando fraqueza em razão de
suas roupas rotas e esfarrapadas são especialistas em armas e na arte da guerra.
Curiosamente treinados por militares no regime de recrutamento obrigatório à
prestação do serviço militar nas três armas: Exército, Marinha e Aeronáutica...
Ainda acrescido do fato de que os treinados depois treinam os que não vestem
farda, pois armas e munição não lhes faltam. São tão abundantes que gastam em
visíveis e barulhentas demonstrações noturnas de tiro, isto em todas as favelas
do Grande Rio e já em algumas situadas em municípios do interior do RJ. E a
polícia, de um modo geral, inferiorizada bélica e numericamente, - ainda sendo
pressionada para atacar e sendo aprisionada quando atende à ordem de ataque e
comete erros, - a polícia não sabe mais para onde correr. Daí a cena da
patrulha a fingir não ver os traficantes armados, porém sabendo que se se
incomodar com eles a guarnição morre na hora. Que fazer?...
Querem saber, prezados
leitores?... Não sei! Só sei que a situação é contextual, é internacional, é
nacional, é regional, é local. E não será com corporações policiais (civis e
militares) inferiorizadas que a questão será vencida. Menos ainda por políticos
sustentados pelo crime organizado, independentemente de serem
“socialistas/comunistas” ou “capitalistas”, todos se igualam nesta sociedade
escravocrata em se tratando de poder gerador de fortunas a serem sugadas do
povo em caradura. Até estão sendo combatidos, mas tão clamorosamente que a
sociedade (formal e informal), satisfeita por ver alguns medalhões presos,
continuam a criticar a polícia “opressora de marginalizados”. Enquanto isso, o
crime organizado, de todos os moldes (subsistemas) e não somente do tráfico,
apresenta-se feraz e indiferente ao oba-oba da Lava a Jato, por exemplo, que
até agora não passa de árvore a ocultar a floresta em “generalização brilhante”
(técnica de propaganda e contrapropaganda), aliás, como insinua o ditado alemão
e para não abandonar a retórica: “A árvore oculta a floresta”.
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