sexta-feira, 21 de outubro de 2016

VIOLÊNCIA URBANA NO RJ – CRISE NA SEGURANÇA



“O mundo está perigoso para se viver! Não por causa daqueles que fazem o mal, mas por causa dos que o veem e fazem de conta de que não viram.” (Albert Einstein)


30 ago 2016 O Globo GISELLE OUCHANA giselle.ouchana@oglobo.com.br VERA ARAÚJO varaujo@oglobo.com.br

Roubos de rua no Rio sobem 66,9% em julho
Dados de julho do ISP indicam crescimento de 66,9% nos roubos de rua e de 20,3% nos assassinatos

“Os índices criminais expressam a necessidade de uma mudança nas estratégias do setor. Podemos dizer que temos uma crise na segurança” Sílvia Ramos. Socióloga.

A presença das Forças Armadas nas ruas — mobilizados para ajudar na segurança da Olimpíada, militares começaram a patrulhar o Rio no dia 9 de julho — não impediu um forte aumento da violência no estado durante o mês passado. De acordo com estatísticas do Instituto de Segurança Pública (ISP) divulgadas ontem, houve, em comparação com o mesmo mês em 2015, um salto de 66,9% na estatística de roubos de rua, que abrange assaltos a pedestres e dentro de ônibus, além de registros de celulares levados por bandidos. A quantidade de casos passou de 6.410 para 10.701. Já o número de homicídios dolosos (que foram praticados intencionalmente) subiu de 306 para 368, o que corresponde a um acréscimo de 20,3%. Considerando apenas as ocorrências da capital, a estatística de homicídios dolosos aumentou 7%, de 711 para 761 casos. A de roubos de rua subiu 20,2%, passando de 29.194 para 35.094 registros

Entre janeiro e julho deste ano, o estado contabilizou o maior número de casos de roubos de rua desde 2001, quando teve início a série histórica. Foram, ao todo, 69.700 casos, 38,3% a mais que o total registrado no mesmo período de 2015. Para piorar, os índices de produtividade policial caíram no mês passado

UM ASSALTO A CADA DOIS MINUTOS Os dados do ISP se tornam ainda mais preocupantes numa análise da quantidade de todos os tipos de roubos praticados no estado. O número, em julho, chegou a 16.843 casos, 48,1% a mais que os 11.369 do mesmo mês do ano passado. Isso significa que, em média, houve um assalto a cada dois minutos e 39 segundo.

Os municípios que tiveram maior quantidade de roubos de rua foram Nova Iguaçu, Mesquita, Nilópolis, São Gonçalo e Duque de Caxias. Dentro da estatística desse tipo de crime impressiona o aumento na quantidade de registros de celulares levados por bandidos em todo o estado. Na comparação com julho do ano passado, houve um salto de 75,8%, de 964 para 1.695 casos. Também incluídos na estatística de roubo de rua, os assaltos dentro de ônibus apresentaram um salto ainda maior: 90,7%, de 602 para 1.148 casos.

QUEDA DA PRODUÇÃO POLICIAL O estado registrou um aumento de 23,3% (de 378 para 466 registros) de letalidade violenta — soma de casos de homicídio doloso, latrocínio, lesão corporal seguida de morte e homicídio decorrente de oposição à intervenção policial. O índice de roubos de veículos saltou de 2.425 para 3.105 (28%). 

A escalada da criminalidade aconteceu no mesmo mês em que a produtividade policial caiu, de acordo com os indicadores do ISP. Em julho, houve uma redução de 32% nas apreensões de adolescentes infratores: foram 271 casos a menos na comparação com o mesmo mês de 2015 (queda de 846 a 639). Os cumprimentos de mandados de prisão diminuíram 13,9%, caindo de 1.802 para 1.551. 

As apreensões de drogas e armas também tiveram queda, de 12,7% e 4,2%, respectivamente. Por outro lado, o número de carros roubados que foram recuperados cresceu de 1.905 para 2.399, ou 25,9%. 

Para a socióloga Sílvia Ramos, coordenadora do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Candido Mendes, os índices da violência são alarmantes: 

— Esses sistemas de cobertor curto no policiamento, que repetem políticas que não deram certo, estão nos levando ao fundo do poço. O levantamento é preocupante, os índices criminais expressam a necessidade de uma mudança nas estratégias no setor. Podemos dizer que temos uma crise na segurança. 

BELTRAME NÃO COMENTA NÚMEROS O secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, não comentou ontem o levantamento do ISP. Em maio, durante uma entrevista sobre o planejamento da segurança para a Olimpíada, ele havia manifestado preocupação com a violência antes e depois do evento. 

Na ocasião, Beltrame falou sobre a dificuldade de montar um esquema eficiente de segurança em meio à crise financeira do estado, e, entre os problemas de sua pasta, citou os atrasos nos pagamentos dos salários e do Regime Adicional de Serviço (RAS) dos policiais. 

Há quase dez anos no governo estadual, Beltrame pretende apresentar um plano de reestruturação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs). Para dar início à execução, Beltrame espera doações da iniciativa privada e da Assembleia Legislativa do Estado do Rio: o presidente da Casa, deputado Jorge Picciani, é considerado seu principal aliado político. 

Em uma reportagem publicada no GLOBO em 11 de junho, o secretário chegou a dizer: “A Olimpíada vai passar e eu vou ficar. Ainda tenho projetos para tocar. Quando eu cumprir isso, aí posso pensar em sair.”



COMENTÁRIO


O detalhamento da matéria jornalística e os comentários da Socióloga Silvia Ramos quase que esgotam o assunto. Mas, na realidade, apontam para o recrudescimento do problema da criminalidade, malgrado o esforço da SSP nesses dez anos de gestão do secretário Beltrame e de sua equipe (ele não atua isoladamente, há todo um contexto de profissionais escudando suas posições institucionais). Mas é inegável que o esforço de Beltrame e de sua equipe falhou, os números não permitem outra conclusão. Também não pode o secretário nem seus auxiliares negar que não tenha havido avisos de todas as formas, exceto da imprensa, que sempre aposta no imediatismo das notícias e nas cobranças, tudo na superfície do problema e na base do alarde negativista ante as estatísticas. Esquece-se esses profissionais que não foram poucas as reportagens aplaudindo a política de segurança dos sucessivos governos a partir de Sérgio Cabral e do seu brado veemente após a PCERJ abater em combate direto 19 traficantes no Complexo do Alemão: “É enfrentamento mesmo!” Brado valentão, sem dúvida, que ainda contou com o infeliz comentário de Beltrame concordando com seu chefe: “Não se pode fazer omelete sem quebrar ovos!”, cuja origem enviesada leva a Joseph Stálin e ao assassinato de um famoso escritor a seu mando, tendo a esposa do escritor proferido a frase em alusão aos métodos sanguinários do segundo maior genocida da História da Humanidade.

Mas eis que, de repente, o cenário deu uma guinada histórica: da repressão máxima (“enfrentamento”) passou-se para a “pacificação”. A partir de uma casual operação policial militar no Morro Dona Marta, para atalhar um confronto entre bandos rivais de traficantes, um grupamento do 2º BPM rechaçou os bandidos e ocupou a comunidade por uns dias, até garantir a mais absoluta paz naquele específico e reduzido ambiente favelado. Assim nasceu a “teoria da pacificação”, com direito a nome novo em modelo velho: “Unidade de Polícia Pacificadora” (UPP), que logo também se adotou em outra ocupação temporária na Cidade de Deus, mas que se tornaria igualmente definitiva. Pronto, o “ovo de Colombo” foi posto novamente de pé, a mídia se empolgou e apoiou, Beltrame se tornou “herói nacional” e quiçá “internacional”. Estava redescoberta a pólvora, embora ferisse todas as lógicas de atuação da polícia administrativa (Polícia Militar) num ambiente social qualquer, pondo-se a polícia judiciária (Polícia Civil) num plano inegavelmente secundário, embora seja esta a principal responsável pela elucidação de delitos e garantia de punição dos delinquentes pelo Poder Judiciário, na verdade o mais eficiente e eficaz método de contenção do crime pela garantia de punição ao criminoso. Afinal, a maioria dos crimes não é alcançada pela polícia administrativa ostensiva, papel preponderante da Polícia Militar, mas pela investigação criminal, que pode e deve acontecer antes, durante e depois de algum fato criminoso individual e/ou coletivo. Como tudo isto falhou, vale encerrar o comentário com a emblemática frase da Socióloga Silvia Ramos: “Os índices criminais expressam a necessidade de uma mudança nas estratégias do setor. Podemos dizer que temos uma crise na segurança.”
Sim, temos uma crise na segurança! Então, que fazer?...


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