“O mundo está
perigoso para se viver! Não por causa daqueles que fazem o mal, mas por causa
dos que o veem e fazem de conta de que não viram.” (Albert Einstein)
30 ago 2016 O Globo GISELLE
OUCHANA giselle.ouchana@oglobo.com.br VERA ARAÚJO varaujo@oglobo.com.br
Roubos de rua no Rio sobem
66,9% em julho
Dados de julho do ISP indicam crescimento de 66,9%
nos roubos de rua e de 20,3% nos assassinatos
“Os
índices criminais expressam a necessidade de uma mudança nas estratégias do
setor. Podemos dizer que temos uma crise na segurança” Sílvia Ramos. Socióloga.
A presença das Forças Armadas nas ruas —
mobilizados para ajudar na segurança da Olimpíada, militares começaram a
patrulhar o Rio no dia 9 de julho — não impediu um forte aumento da violência
no estado durante o mês passado. De acordo com estatísticas do Instituto de
Segurança Pública (ISP) divulgadas ontem, houve, em comparação com o mesmo mês
em 2015, um salto de 66,9% na estatística de roubos de rua, que abrange
assaltos a pedestres e dentro de ônibus, além de registros de celulares levados
por bandidos. A quantidade de casos passou de 6.410 para 10.701. Já o número de
homicídios dolosos (que foram praticados intencionalmente) subiu de 306 para
368, o que corresponde a um acréscimo de 20,3%. Considerando apenas as
ocorrências da capital, a estatística de homicídios dolosos aumentou 7%, de 711
para 761 casos. A de roubos de rua subiu 20,2%, passando de 29.194 para 35.094
registros
Entre janeiro e julho deste ano, o estado
contabilizou o maior número de casos de roubos de rua desde 2001, quando teve
início a série histórica. Foram, ao todo, 69.700 casos, 38,3% a mais que o
total registrado no mesmo período de 2015. Para piorar, os índices de
produtividade policial caíram no mês passado
UM ASSALTO A CADA DOIS MINUTOS Os dados do ISP se
tornam ainda mais preocupantes numa análise da quantidade de todos os tipos de
roubos praticados no estado. O número, em julho, chegou a 16.843 casos, 48,1% a
mais que os 11.369 do mesmo mês do ano passado. Isso significa que, em média,
houve um assalto a cada dois minutos e 39 segundo.
Os municípios que tiveram maior quantidade de
roubos de rua foram Nova Iguaçu, Mesquita, Nilópolis, São Gonçalo e Duque de
Caxias. Dentro da estatística desse tipo de crime impressiona o aumento na
quantidade de registros de celulares levados por bandidos em todo o estado. Na
comparação com julho do ano passado, houve um salto de 75,8%, de 964 para 1.695
casos. Também incluídos na estatística de roubo de rua, os assaltos dentro de
ônibus apresentaram um salto ainda maior: 90,7%, de 602 para 1.148 casos.
QUEDA DA PRODUÇÃO POLICIAL O estado registrou um
aumento de 23,3% (de 378 para 466 registros) de letalidade violenta — soma de
casos de homicídio doloso, latrocínio, lesão corporal seguida de morte e
homicídio decorrente de oposição à intervenção policial. O índice de roubos de
veículos saltou de 2.425 para 3.105 (28%).
A escalada da criminalidade aconteceu no mesmo mês
em que a produtividade policial caiu, de acordo com os indicadores do ISP. Em
julho, houve uma redução de 32% nas apreensões de adolescentes infratores:
foram 271 casos a menos na comparação com o mesmo mês de 2015 (queda de 846 a
639). Os cumprimentos de mandados de prisão diminuíram 13,9%, caindo de 1.802
para 1.551.
As apreensões de drogas e armas também tiveram
queda, de 12,7% e 4,2%, respectivamente. Por outro lado, o número de carros
roubados que foram recuperados cresceu de 1.905 para 2.399, ou 25,9%.
Para a socióloga Sílvia Ramos, coordenadora do
Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Candido Mendes, os
índices da violência são alarmantes:
— Esses sistemas de cobertor curto no policiamento,
que repetem políticas que não deram certo, estão nos levando ao fundo do poço.
O levantamento é preocupante, os índices criminais expressam a necessidade de
uma mudança nas estratégias no setor. Podemos dizer que temos uma crise na
segurança.
BELTRAME NÃO COMENTA NÚMEROS O secretário de
Segurança, José Mariano Beltrame, não comentou ontem o levantamento do ISP. Em
maio, durante uma entrevista sobre o planejamento da segurança para a
Olimpíada, ele havia manifestado preocupação com a violência antes e depois do
evento.
Na ocasião, Beltrame falou sobre a dificuldade de
montar um esquema eficiente de segurança em meio à crise financeira do estado,
e, entre os problemas de sua pasta, citou os atrasos nos pagamentos dos
salários e do Regime Adicional de Serviço (RAS) dos policiais.
Há quase dez anos no governo estadual, Beltrame
pretende apresentar um plano de reestruturação das Unidades de Polícia
Pacificadora (UPPs). Para dar início à execução, Beltrame espera doações da
iniciativa privada e da Assembleia Legislativa do Estado do Rio: o presidente
da Casa, deputado Jorge Picciani, é considerado seu principal aliado político.
Em uma reportagem publicada no GLOBO em 11 de
junho, o secretário chegou a dizer: “A Olimpíada vai passar e eu vou ficar.
Ainda tenho projetos para tocar. Quando eu cumprir isso, aí posso pensar em
sair.”
COMENTÁRIO
O detalhamento da matéria
jornalística e os comentários da Socióloga Silvia Ramos quase que esgotam o
assunto. Mas, na realidade, apontam para o recrudescimento do problema da
criminalidade, malgrado o esforço da SSP nesses dez anos de gestão do
secretário Beltrame e de sua equipe (ele não atua isoladamente, há todo um
contexto de profissionais escudando suas posições institucionais). Mas é
inegável que o esforço de Beltrame e de sua equipe falhou, os números não
permitem outra conclusão. Também não pode o secretário nem seus auxiliares
negar que não tenha havido avisos de todas as formas, exceto da imprensa, que
sempre aposta no imediatismo das notícias e nas cobranças, tudo na superfície
do problema e na base do alarde negativista ante as estatísticas. Esquece-se
esses profissionais que não foram poucas as reportagens aplaudindo a política
de segurança dos sucessivos governos a partir de Sérgio Cabral e do seu brado
veemente após a PCERJ abater em combate direto 19 traficantes no Complexo do
Alemão: “É enfrentamento mesmo!” Brado valentão, sem dúvida, que ainda contou
com o infeliz comentário de Beltrame concordando com seu chefe: “Não se pode
fazer omelete sem quebrar ovos!”, cuja origem enviesada leva a Joseph Stálin e
ao assassinato de um famoso escritor a seu mando, tendo a esposa do escritor proferido
a frase em alusão aos métodos sanguinários do segundo maior genocida da
História da Humanidade.
Mas eis que, de repente, o
cenário deu uma guinada histórica: da repressão máxima (“enfrentamento”) passou-se
para a “pacificação”. A partir de uma casual operação policial militar no Morro
Dona Marta, para atalhar um confronto entre bandos rivais de traficantes, um
grupamento do 2º BPM rechaçou os bandidos e ocupou a comunidade por uns dias,
até garantir a mais absoluta paz naquele específico e reduzido ambiente favelado.
Assim nasceu a “teoria da pacificação”, com direito a nome novo em modelo
velho: “Unidade de Polícia Pacificadora” (UPP), que logo também se adotou em
outra ocupação temporária na Cidade de Deus, mas que se tornaria igualmente
definitiva. Pronto, o “ovo de Colombo” foi posto novamente de pé, a mídia se
empolgou e apoiou, Beltrame se tornou “herói nacional” e quiçá “internacional”.
Estava redescoberta a pólvora, embora ferisse todas as lógicas de atuação da
polícia administrativa (Polícia Militar) num ambiente social qualquer, pondo-se
a polícia judiciária (Polícia Civil) num plano inegavelmente secundário, embora
seja esta a principal responsável pela elucidação de delitos e garantia de
punição dos delinquentes pelo Poder Judiciário, na verdade o mais eficiente e
eficaz método de contenção do crime pela garantia de punição ao criminoso.
Afinal, a maioria dos crimes não é alcançada pela polícia administrativa
ostensiva, papel preponderante da Polícia Militar, mas pela investigação
criminal, que pode e deve acontecer antes, durante e depois de algum fato
criminoso individual e/ou coletivo. Como tudo isto falhou, vale encerrar o
comentário com a emblemática frase da Socióloga Silvia Ramos: “Os índices
criminais expressam a necessidade de uma mudança nas estratégias do setor.
Podemos dizer que temos uma crise na segurança.”
Sim, temos uma crise na
segurança! Então, que fazer?...
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