terça-feira, 2 de dezembro de 2014

O livro de Beltrame






Li com atenção o livro do secretário Beltrame. Lembrei Jean-Paul Sartre e sua máxima no sentido de que toda história de vida, se escrita, torna-se uma grande aventura. Assim é a parte do texto que reproduz a vida do autor desde a infância. Descortina a sua origem simples e lutadora, saga italiana que até os dias de hoje pode ser constatada no Rio Grande do Sul, em especial nas Serras Gaúchas. Embora não me tenha despertado grande interesse se cotejada esta parte pessoal com a outra, institucional, que descortina de modo audaz o real cenário das UPPs desde o início, devo dar o valor à guinada pessoal do autor em vista de sua sinceridade e da boa aventura particular com que nos brindou.

Indo, porém, ao que mais me interessa, – as UPPs, – não me vi diante de muita novidade quanto ao formato delas e seus objetivos. Trata-se de modelo estrutural que surgiu ao acaso no Morro Dona Marta, segundo relato do autor, local aonde a UPP vem funcionando a contento, o que se nota também em outras comunidades que se mantêm com suas UPPs fora da mídia negativa e esparsamente noticiadas como iniciativa positiva. Também não se me afigura como novidade a dificuldade que representa ainda hoje a ocupação de locais emblemáticos como Rocinha, Complexo do Alemão e Cidade de Deus. Nos dois primeiros, continuo cético quanto ao sucesso da empreitada estatal, os fuzis dos bandidos não apenas insistem em se manter em cena como também têm causado gravíssimos estragos representados no seu máximo com a inesperada morte de alguns oficiais e praças.

Não vou me ater às falhas, assim como o autor igualmente as evitou para não quebrar o entusiasmo dele mesmo e dos seus leitores. Afinal, sua intenção foi apresentar o registro histórico sobre a evolução do programa, indo ao detalhe de diálogos que em muito enriqueceram o conteúdo do livro. Comparando o texto com a iniciativa do Cel Mário Sérgio, cujo livro igualmente li e não com menor interesse, parece-me que o secretário Beltrame foi mais profundo e demonstrou mais maturidade, o que não desmerece a idêntica intenção do Cel Mário Sérgio, com a ressalva de que talvez a pressa tenha tornado sua obra menos densa que a do seu chefe. Mesmo assim, ambas são importantes hoje e, sobretudo, amanhã. Como eu disse, são registros históricos, e devem ser assim reconhecidos pelos interessados no tema, destacando-se o numeroso grupo pátrio situado no âmbito das ciências sociais.

Como não estou aqui para reescrever nada, tudo está escrito, sugiro aos leitores conhecer a obra do secretário Beltrame e dela extrair ensinamentos, não importando se concordantes ou discordantes. No fim de contas, o autor cuida de informar sobre da área mais importante e sensível do poder do estado: a segurança pública. E a meu ver, embora me ponha quase sempre como crítico (construtivo) das UPPs, e me exalte de quando em quando ao ver morrer algum companheiro que se dedicava com entusiasmo a esta missão, continuo crendo na necessidade de frear a arrogância dos traficantes, no mínimo tomando-lhes os fuzis. E mesmo que em alguns lugares o descontrole desta situação seja inegável, pior é não enfrentar o problema.

Por conseguinte, acredito que as UPPs, – mesmo necessitando de constante correção de rumo, segundo já admitiu o próprio secretário Beltrame em entrevistas recentes, – as UPPs devem resistir e se aprimorar até que se encontre seu modelo definitivo, sendo certo, todavia, que não existe nenhum modelo estrutural definitivo nos tempos de agora. Tudo é função, tudo é processo, e o ideal é que o formato se ajuste e reajuste sempre que o objetivo (função) assim o determinar.

Ademais, como não lidamos com milagres nem com audácias heroicas, mas com missões que competem à PMERJ, o jeito é torcer para que tudo ao fim e ao cabo dê certo e não morram tantos PMs, situação que deve ser posta na mesa dos gestores da segurança pública como prioridade absoluta no contexto de uma pacificação que veio para ficar. Então, que assim seja! Que tudo se ajuste! Que os efetivos cresçam e o restante do RJ também respire os ares da pacificação inegavelmente rarefeitos nos dias de hoje!

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