Como sabem os profissionais do ramo,
existe todo um aparato conceitual e prático para a polícia lidar com multidões reunidas
a extravasar alegrias em grandes eventos artísticos e desportivos. E a partir
desses conceitos simples de ação policial chega-se ao outro, das multidões que
se organizam com fins de protesto, situação bastante para o povo reunido
descambar à turbamulta, o que, em regra, costuma ocorrer no seu todo. Este é um
detalhe importante porque as pontuais badernas deixaram a nítida impressão, ou a
quase certeza, de que faziam parte do contexto geral de manifestações que
primaram pela organização prévia e pela fixação de objetivos vários, alguns
ainda não detectados, escamoteados no mote principal: redução das tarifas de
transportes públicos.
Há muito ainda que se apurar dos
movimentos que eclodiram simultaneamente em todo o país. Independentemente
disso, porém, a surpresa serviu para confirmar que, mesmo desavisadas e
esvaziadas em meios específicos, as Polícias Militares não culminaram
perdedoras. Claro que a carência de meios e o esquecimento dos métodos de
controle de distúrbios, – que começam bem antes deles, ou seja, na sua detecção
pelos serviços de inteligência, que se puseram adormecidos nas últimas décadas,
– a carência de meios e o esquecimento contribuíram para o avanço entusiasmado
de grupos humanos complementados por estímulos externos, muitos dos quais não
guardavam qualquer relação com o mote inicial, tal como a ira das multidões contra
a PEC 37, sem que os manifestantes dela soubessem minimamente ou absolutamente
nada. Desta forma, a mudança de foco deu azo a que os parlamentares, que de
bobos nada têm, providenciassem pronta resposta rejeitando algo que estava no
Congresso Nacional como favas contadas, eis que o assunto fora exaustivamente
analisado pelas comissões e era certa a sua aprovação. Enfim, jogou-se aos cães
que raivosamente ladravam uma ração com cheiro de osso fresco, eles se deliciaram
dela e se acalmaram...
Tornando às manifestações
(surpreendentes por terem emergido de aparente silêncio por conta de desaviso
do adormecido sistema situacional), urge sublinhar as reações aleatórias de
Polícias Militares nacionais, despidas de mínimos treinamentos de controle de
distúrbio, exceção que se faz aos Batalhões de Choque, embora não se possa
negar que também estes foram ineficientes e ineficazes. O correto seria, a uma,
que as PPMM agissem proativamente, por meio dos seus serviços de inteligência;
a duas, era imprescindível a movimentação da tropa em prévia demonstração de
força a inibir de pronto os manifestantes. Mas houve o contrário: a fraca
reação das forças de segurança estimulou ainda mais os manifestantes; a três,
não havia viaturas apropriadas ao controle de distúrbios por meio do uso de
jatos de água, o que obrigou às forças de segurança o uso do próprio corpo (desprotegido)
e de alguns recursos concomitantes (bombas de efeito moral, gás de pimenta, gás
lacrimogêneo e balas de borracha), direcionados bem mais como reação às
agressões imediatas.
E por ai seguem os absurdos, aos quais
se acrescentam as pressões da mídia contra os excessos policiais e as ameaças
dos organismos ministeriais com o foco nos únicos meios disponíveis aos
policiais, não apenas para conter os manifestantes, mas também para eles se
protegerem de iminentes agressões físicas. Sim, pois além de incitarem os
manifestantes no sentido de bombardearem a PEC 37, e em gratidão, membros
destes organismos ministeriais não tiveram pejo em inibir a ação policial com ameaçadoras
proibições endereçadas às forças de segurança. Pode-se, pois, concluir que
houve e há o desinteresse dos membros ministeriais em punir exemplarmente os baderneiros, saqueadores
e criminosos do gênero: bandidos comuns que também se aproveitaram das
manifestações para infortunar cidadãos produtivos e ordeiros, estes que tiveram
suas lojas depredadas até se esgotar o último bem do estoque e da decoração do
imóvel.
Agora a tendência governamental, por
óbvio, será a de reestruturar rapidamente as forças de segurança, demais de
outras medidas de desoneração cobradas nas manifestações e anunciadas como
atendidas pela própria presidenta. Mas, paradoxalmente, foram postas em dúvida,
ou mesmo desmentidas, por seu poderoso Ministro da Fazenda, Guido Mantega, que alardeou
na grande imprensa o aumento de impostos para atender aos imediatos anseios
sociais. Ora, um dos motivos da revolta se refere à insuportável tributação
nacional! Mas isto não assustou o tecnocrata. Afinal, ele precisava avisar ao
mundo que nada mudará, mas antes continuará como está, e com uma diferença: as
forças de segurança não mais dormem e seguramente recebem logística compatível
com as reações populares vindouras, pois o discurso da presidenta, mesmo
esbanjando simpatia à causa das ruas, foi marcado pelo fortalecimento do
binômio “lei e ordem”, em repetição que não deixa dúvida...
2 comentários:
Amigo e irmão Larangeira,
Comungo inteiramente com a tua análise. Pudesse eu, assinaria embaixo.
Parabéns.
Luiz Monnerat
Cel Larangeira.
Essas recentes manifestações de rua foram atípicas, sui generis, diferentes de todas que já vi.
Não foi como as "Diretas Já" ou "Fora Collor" por exemplo, onde havia uma causa específica.
Nelas eu vi o povo pedindo pra baixar o preço das passagens dos ônibus, pedindo mais saúde, melhor educação, para os políticos corruptos pararem de roubar, para não privatizarem o Maracanã, para baixarem o preço dos combustíveis e pedágios, não à PEC 37, fim do voto secreto do legislativo, fim do voto obrigatório, enfim, vi até um torcedor do Bahia pedindo a demissão do presidente do seu clube de coração.
Vi com orgulho uma grande maioria pedindo ordem e progresso e do lado dessa maioria estava a PM, afinal eles, povo em manifestação e PM em serviço tinham o mesmo ideal, a justiça social tão negada ao nosso povo.
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