sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Alvíssaras!





Fonte: Jornal O GLOBO, de 22 de fevereiro de 2013

Finalmente a imprensa despertou a atenção para o foco ausente: falta investigação criminal nas UPPs, incumbência exclusiva da PCERJ. Falta também inteligência policial, que não deve ser confundida com investigação criminal, pois esta visa a singularizar criminosos, e recolher provas contra eles para levá-los às barras dos tribunais. A inteligência policial é mais abrangente e deve diagnosticar os focos de desordem inclusive os não tipificados como crime ou contravenção. Enfim, a inteligência policial vê os detalhes do todo e a investigação criminal cuida dos detalhes da parte. Quanto à inteligência policial, é bom esclarecer que não é privilégio somente da Polícia Civil ou da Polícia Federal. É também ferramenta fundamental à atividade de polícia administrativa de manutenção da ordem pública (PMERJ), cujo conceito jurídico não se esgota no tipo penal, eis que cuida da restauração da ordem no seu mínimo, por meio do ato de polícia fundamentado no poder de polícia, indo, porém, ao seu máximo representado pelo uso da força em ações operativas, como, por exemplo, as realizadas pelo BOPE, pelo Batalhão de Choque e por outros efetivos concentrados, a comando, em estilo militar, para “conquistar” as favelas posteriormente agraciadas com UPPs. No caso do Complexo do Alemão, o aparato até foi ornado com “ultimato de rendição” em duvidoso estilo militar, mais parecendo palanque eleitoral...

Mas o momento de júbilo passou, e já lá naquele lugar amargamos o assassinato da PM Fabiana Aparecida de Souza, esta, que poucos lembram, embora o tempo de sua morte abrupta nem seja tanto. Mas a família e os amigos dela lembram e jamais a esquecerão. Já os colegas dela, que não a conheciam de perto, nem mesmo se lembram da jovem morta em serviço por conta da sua ingenuidade. Sim, ela creu que o território favelado estava efetivamente conquistado depois de ver pela telinha da tevê a correria dos bandidos sem a consideração de que muitos deles, ainda anônimos, permaneceram na favela, e outros daqueles que escaparam ao cerco retornaram. E tal como no Complexo do Alemão, “conquista” mais recente, marginais que escaparam de outras favelas, dentre elas a Mangueira, decerto tornaram também aos homizios e neles atuam criminosamente. É neste ponto que se insere não apenas a inteligência policial, por óbvio demais, mas também a investigação criminal, por mais óbvio ainda. E é neste ponto que se nota a ausência da PCERJ, principalmente (nem digo da Polícia Federal, que tem função mais ampla no território pátrio), no indispensável e insubstituível labor investigativo, que, aliás, não cabe à PMERJ, e ai desta se tentar avançar o sinal!...

Porque a PCERJ, como denuncia o Professor Roberto Kant de Lima, provoca mais queda de braço com poderes afins que a PMERJ, esta, sempre perdedora no tablado político, talvez por ser “militar” e daí gerar preconceitos latentes e explícitos. Mas a verdade é que o problema das UPPs, que desde muito carecem da presença da PCERJ em caráter permanente, não conta com tal apoio desde o primeiro dia da criação de cada uma delas nas favelas “conquistadas” e “pacificadas”. Deduz, portanto, que as UPPs apenas eliminaram os fuzis, dando ao respeitável público a falsa impressão de paz por inteiro, mas que, na realidade, vêm garantindo aos traficantes, também, a “paz”, a “justiça” e a “liberdade” que informam o famigerado slogan do Comando Vermelho: “Paz, Justiça e Liberdade”. Porque o tráfico não para, nem no asfalto nem nas favelas, com a ressalva de que nas agraciadas com UPPs quadrilhas rivais não mais atacam, a PMERJ lá está para garantir o tráfico local, que o PM novato, ainda ingênuo em muitos detalhes, não vê, e o PM antigo, – já infiltrado por necessidade do sistema, a quebrar o discurso inicial do ascetismo dos novatos, – o PM antigo vê, mas não liga, e por diversos motivos que não se resumem apenas à corrupção, como, por exemplo, a preservação de sua integridade física, assim se atendo a pequenos conflitos comunitários, suficientes para lhe justificar a presença ostensiva na favela exercitando policiamento para “inglês ver”: brigas de marido e mulher, desordem de bêbados, brigas de torcidas clubistas e coisa do gênero ou da espécie. Tudo, claro, sem tiroteio entre policiais e traficantes, ou entre traficantes e traficantes, principalmente, e sem balas perdidas, a não ser algumas que acharam aqui e ali algum PM novato e ingênuo que hoje, por conta disso, está sepultado, ou acertaram algum morador distraidamente enfiado entre duelos isolados... Isto, sim, as UPPs resolveram...

Alvíssaras!... Agora não mais há de se fugir das explicações, não há mais espaço para comodidades, a cobrança finalmente começou, postura, aliás, que assumi aqui faz tempo. Não sei se minhas reclamações e apreensões reverberaram em algum escaninho inteligente que se mantinha com suas luzes apagadas. Mas que me dá satisfação, muita, isso é verdade! Valeu a assinatura do jornal O GLOBO, que pago em dia! Porque havia momentos em que eu me sentia burro, sonhador etc., quando insistia sem eco na ideia da polícia completa atuando nas favelas “conquistadas”, mesmo que separadas e litigiosas, como denuncia com propriedade o Professor Roberto Kant de Lima, indiscutível autoridade no assunto, em especial porque pesquisou exatamente as atividades rotineiras da Polícia Civil do RJ; por sinal, com muita dificuldade: as portas e janelas geralmente lhe estavam fechadas e trancadas por dentro. Mas, mesmo assim, com todos os obstáculos impostos pela burocracia estatal, ele concluiu sua pesquisa e a publicou em livro (A Polícia da Cidade do Rio de Janeiro), sem também poupar a PMERJ, tal como destaco em sua homenagem: “A Polícia Militar, comandada por um oficial do Exército, tornou-se cada vez mais militarizada e foi encorajada a considerar sua função de vigilância como uma verdadeira guerra contra o crime e os criminosos”. Daí o “ultimato” no Complexo do Alemão, cena inesquecível de suprema vaidade... Ora bem, vou parando por aqui também em suprema satisfação com a matéria de hoje, assinada pelo jornalista Antônio Werneck, que direciona o foco do seu telescópio para a estrela mais distante e oculta da “galáxia policial”, ou aproxima o seu foco em microscópio com que perscruta tão importante tema da segurança pública. Sim, em suprema satisfação porque, finalmente, vejo desbarrancada a insinuação do mestre João Ubaldo Ribeiro no seu clássico “Viva o Povo Brasileiro: “O segredo da Verdade é o seguinte: não existem fatos, só existem histórias”. Até então as UPPs estavam assim: muitas histórias a encobrirem o risco entrópico: única verdade a acender luzes vermelhas ante um horizonte sombrio. Mas há tempo de apagá-las...

4 comentários:

tomtelles disse...

Coronel Emir boa tarde,
estas considerações expostas no blog, por incrível que pareça, são visíveis a olho nu. Me foi questionado por pessoas do meu convívio por qual motivo diante da presença de policiais ainda existe presença de marginais da lei nestes territórios? respondi de pronto, e sem saber desta pesquisa, que a responsabilidade pelo sucesso ou não é simplesmente político, pasme, não acreditaram quando expliquei que os órgãos responsáveis por "municiar" de informações os policiais da atividade fim não o faz a contendo, pediram para ser mais direto, então falei: a PM2 DETÉM INFORMAÇÕES SOBRE O TERRITÓRIO, FOTOS E NÃO AS DISPÕE PARA OS "NOVATOS", A PCERJ TEM INÚMEROS INQUÉRITOS NESTES LOCAIS E NÃO HÁ UMA DILIGENCIA PARA COLHER ELEMENTOS DE INFORMAÇÕES AFIM DE FINDÁ-LOS, SÃO IGNORADOS AO SEU BEL PRAZER... Quando terminei de concluir meu raciocínio diante de um oficial médico cbmerj, outro servidor da fio cruz, enfermeira e um taxista,todos meus amigos ficaram

tomtelles disse...

todos ficaram reticentes com meus comentários, haja visto a simpatia que esta ocupação nos traz...

Emir Larangeira disse...

Caro tomtelles

Não podemos desanimar e devemos cobrar em tudo que é canto o nosso direito à informação para melhor servirmos à sociedade. Insista, pois, no seu argumento, e sempre o reforce indagando dos preconceituosos que seria da ordem pública se a PMERJ decidisse permanecer um só dia no quartel sem ir às ruas. Obrigado pelo comentário.

Anônimo disse...

Eh,eh,eh,eh,eh,e,.........

Belzeba