sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Violência em São Paulo


A matéria jornalística, de página inteira, estampada no O GLOBO de hoje, 02 de novembro de 2012, tendo como foco São Paulo, traz alguns dados nada inovadores, todos já conhecidos e sofridos pelo Rio de Janeiro (dizem que em outras épocas, mas creio que ainda presentes no cotidiano fluminense). Com roupagem de “polícia comparada”, – como se houvesse muita diferença entre os ambientes desses dois estados-membros e as coirmãs não vivenciassem a mesma conjuntura nacional agrilhoada à Carta Magna, com suas estruturas estáticas e moldadas à semelhança do Exército Brasileiro, do qual todas as Polícias Militares pátrias são forças auxiliares, – com roupagem de “polícia comparada”, acumulam-se as desinformações sobre tema tão corriqueiro quanto cansativo. 

A matéria em si, porém, ilumina a realidade de que em São Paulo há também milícias com as mesmas características das daqui do RJ, com a mínima diferença de que as daqui são mais badaladas pela imprensa. De resto, tudo igual: as milícias são geralmente formadas por agentes públicos descartados do sistema estatal em virtude de faltas disciplinares mínimas e máximas e por alguns crimes cometidos no exercício da função. Considerando-se o rigor disciplinar principalmente nas Polícias Militares, todas inchadas de tropa e com seus regulamentos moldados à imagem e semelhança dos do Exército Brasileiro e alguns até exatamente idênticos da primeira letra ao ponto final; considerando-se que o efetivo na ativa das Polícias Militares no Brasil é da ordem aproximada de 500.000 almas, é fácil concluir que cada estado-membro possui a sua cota de ex-PMs a ser somada a outros expurgos como os de bombeiros militares, agentes penitenciários, guardas municipais, policiais civis etc. 

Também o tráfico, no caso dos estados-membros focados, possuem facções criminosas organizadas dentro e fora dos presídios, sendo inegável que o PCC (Primeiro Comando da Capital) de São Paulo inspirou-se no CV (Comando Vermelho) do Rio de Janeiro. Apesar desta aberrante situação, real e complexa em todos os sentidos, as autoridades e muitos estudiosos de áreas afins (sociologia, antropologia, psicologia social etc.) opinam de modo a fortalecer o mito do avestruz: escondem a cabeça e deixam o resto ao dispor do inimigo. Ora, que novidade há na notícia em subtítulo da matéria assinada pela ilustre jornalista Luiza Damé e pelo não menos ilustre jornalista Sérgio Roxo (“Milícia disputa com traficantes controle de caça-níqueis”)? Referem-se ambos ao Estado de São Paulo, como se no Rio de Janeiro o fato não acontecesse? Também comentam sobre ”grupos de extermínio” em SP formados por policiais e ex-policiais e mais aquelas turma de expurgados já referida. E, por fim, – e como jamais poderia faltar em argumentações congêneres, – os articulistas desviam o foco para a “corrupção policial”, como se o restante da sociedade fosse isenta desse mal universal que vem dos tempos remotíssimos, defeito humano até hoje insanável e tendente a sê-lo até o Apocalipse... Enfim, o que se deve afirmar aqui é que o sistema policial brasileiro e seus métodos de expurgo (para haver tanto expurgo a seleção e o recrutamento devem ter falhado) são fomentadores da violência, incluindo uma que não costuma merecer a atenção devida: o assassinato em massa de policiais militares. Ora, do modo como dizem os “especialistas”, parece que as vítimas policiais militares estão a cometer suicídio...

 Outro fato que me aguça a atenção refere-se às UPPs postas como solução generalizada para a paz (falsa) aqui no RJ, em contraposição a São Paulo. Esquecem esses especialistas de que as UPPs atendem a um mínimo de comunidades carentes e jamais poderão atender a todas as favelas dominadas por facções multivariadas (CV, TC, CVJ, ADA etc.) que disputam com milícias os meios ilegais de ganho fácil em vista do vácuo do Estado no atendimento geral e igualitário da população. Esses grupos criminosos, aqui e acolá, atuam dentro da mesma lógica da impunidade e do desleixo estatal com os pobres, indigentes e miseráveis em número a mais e mais acrescido pela fertilidade humana existente e crescente desde que o mundo é mundo. 

Claro que, quanto maior a população e sua economia invisível (no Brasil, a economia invisível é talvez igual ou maior que a visível, digo-o aqui também me vendo no direito de “dar o meu chute”), maiores e mais competitivos serão os grupos armados interessados em explorar os serviços não ofertados formalmente às populações ilhadas dentro das cidades brasileiras, tais como cidadelas medievas, só faltando muralhas. Daí proliferarem Gatonet, venda ilegal de gás de cozinha e de água supostamente mineral onde não existe rede de abastecimento, “gatos” de energia elétrica, caça-níqueis e outras modalidades de crime e contravenção. E, claro, o melhor de todos os negócios: o tráfico de substâncias entorpecentes. 

De modo que o resto é especulação a condenar a repressão, esta que, a bem da verdade, jamais solucionou o problema da violência no Brasil nem arranhou o tráfico de drogas e demais crimes conexos. Por derradeiro, cabe sublinhar Diógenes Lucca, comentarista de segurança pública da Rede Globo de São Paulo e ex-comandante do Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) de São Paulo, quando discorre sobre UPPs e garante não haver em São Paulo, como há no Rio de Janeiro, “territórios aos quais a polícia não tem acesso.” Ora, aqui também não existe território inexpugnável para a polícia, que incursiona em qualquer localidade dominada por traficantes. Mas sem essa de afirmar que em São Paulo não há “dono do morro”. Há, sim, desde quando era cantado por “Kid Morengueira”. Ora bolas, São Paulo tem de tudo, inclusive favelas dominadas por traficantes. Agora, decidir conquistar esses territórios e lá permanecer com algum destacamento permanente, isto é outra história. Como tão bem afirmou Claudio Beato Filho, coordenador-geral do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública da UFMG: “... Tem que ter polícia à disposição da população onde ela é necessária. Isso não é coisa da UPP. Polícia é um serviço público.” Traduzindo, ele apenas declara, com a sutileza dum elefante enraivecido, que o serviço policial não pode ser privilégio da alguns em detrimento de muitos com igual direito... 

Com a palavra o leitor...

Um comentário:

Anônimo disse...

O "Bico" e o Policial Militar

Em vez dos órgãos de segurança pública discutirem o projeto de legalização do trabalho paralelo de policiais militares (jornada que deixa o profissional estressado), deveriam discutir o pagamento de salários dignos aos referidos agentes da lei. Ao analisarmos o artigo 7º, inciso IV, da Carta Magna de 1988, percebemos que os Bombeiros e Policiais Militares do Estado do Rio de Janeiro não recebem um salário digno. O Salário Mínimo Necessário, referente ao mês de Outubro de 2012, foi estimado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos, em conformidade com o supracitado dispositivo constitucional, no valor de R$ 2.617,33 (dois mil, seiscentos e dezessete reais e trinta e três centavos). O objetivo do referido piso, divulgado ontem (segunda-feira, 5 de novembro de 2012), é o atendimento das necessidades vitais básicas (moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene e transporte).

http://www.dieese.org.br/rel/rac/salminMenu09-05.xml

Colocar Policiais Militares para fazer "bico" joga na lata do lixo o nome da gloriosa Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro e do próprio Governador Sérgio Cabral Filho, a quem cabe contratar e prover o sustento dos Policiais Militares no exercício da profissão. É PRECISO OFERECER QUALIDADE DE VIDA AOS PROFISSIONAIS DE SEGURANÇA PÚBLICA. É inacreditável o que acontece no Estado do RIO DE JANEIRO, o Estado que possui a segunda MAIOR ARRECADAÇÃO de impostos! O GOVERNO FLUMINENSE ESTÁ PAGANDO O MENOR SALÁRIO DO BRASIL AOS MILITARES ESTADUAIS. Dada a natureza da atividade policial militar, faz-se necessário o investimento nos profissionais que a desempenham, de modo que as necessidades vitais básicas dos mesmos sejam devidamente atendidas. UM ESTADO QUE PRETENDE SEDIAR MEGAEVENTOS ESPORTIVOS COMO COPA DO MUNDO (2014) E OLIMPÍADAS (2016) NÃO PODE PAGAR MENOS DO QUE O SALÁRIO MÍNIMO NECESSÁRIO AOS SERVIDORES PÚBLICOS ESSENCIAIS. PAGAR UM SALÁRIO DIGNO É IMPORTANTÍSSIMO!