domingo, 13 de junho de 2010

Sobre as UPPs: eis, finalmente, a origem de tudo!



Venho desde o início da implantação das UPPs tentando entender a verdadeira motivação delas. Na realidade especulando sobre a escolha dos locais cuja decisão estava em mistério, embora na superfície do meu raciocínio aflorasse a certeza de que não poderia ser nada além da preparação de um cenário favorável aos grandiosos espetáculos internacionais (Copa do Mundo de 2014 e Olimpíadas de 2016). Sem embargo, dois eventos desportivos maravilhosos e mais importantes do planeta. Mas a ocultação desses motivos permitiu deduções várias, do mesmo modo que a improvisação dos alojamentos dos PMs alocados em UPPs (contêineres) sugere ainda algo temporário e restrito à falsa ideia de que a PMERJ erradicou o tráfico de drogas nesses lugares, o que não é verdade, as ações repressivas nas favelas ocupadas por UPPs reforçam esta conclusão: o tráfico continua insistindo em funcionar, claro que sem a ostentação das armas, que não foram apreendidas na sua totalidade, e sem a audácia dos traficantes, que não foram presos: entraram em “forma cística” ou migraram para outros lugares.
Quanto à migração, nada demais, a arte da guerra, desde Sun Tzu, ensina que não se deve acuar o inimigo sem lhe deixar rotas de fuga. Inimigo acuado costuma redobrar suas forças e reagir violentamente contra o oponente, havendo até o risco de vencer uma batalha já perdida. Portanto, a ação operacional da PMERJ na conquista dos espaços predeterminados e a sua ocupação estão em conformidade com a estratégia, a tática e a operacionalidade da tropa em combate similar aos encetados contra guerrilheiros em zona conflagrada. A diferença é que agora é contra “narcoguerrilheiros”. Enfim, a PMERJ demonstra sua máxima competência como tropa de combate, ou seja, como “força de segurança”, sua principal vocação carimbada com o gesto máximo da Bandeira Nacional cravada no topo da colina conquistada, e logo abaixo e ao lado a flâmula da tropa vencedora. Mas a ocupação social por outros organismos governamentais até agora não passou de falácia, o que vem obrigando à PMERJ improvisar algumas aproximações comunitárias incipientes enquanto aguarda as demais intervenções estatais, se é que ocorrerão.

A lógica das ocupações finalmente veio à tona, assumida pelo mesmo jornal (O Globo) que vem defendendo e propagando positivamente as UPPs, claro que com mais interesse econômico-financeiro que social. Fosse este último, seria o caso de indagar como será resolvido o problema (idêntico) em milhares de favelas, em todo o RJ, ostensivamente dominadas por tráfico armado ou por milícias. Como elas serão atendidas pela PMERJ concomitantemente com o policiamento do asfalto?... Afinal, a Constituição do Estado do Rio de Janeiro condena todo tipo de privilégio ou de discriminação, como se lê (sic):

“Art. 9º – O Estado do Rio de Janeiro garantirá, através da lei e dos demais atos dos seus órgãos e agentes, a imediata e plena efetividade dos direitos e garantias individuais e coletivos, mencionados na Constituição da República, bem como de quaisquer outros decorrentes do regime e dos princípios que ela adota e daqueles constantes dos tratados internacionais firmados pela República Federativa do Brasil.
§ 1º – Ninguém será discriminado, prejudicado ou privilegiado em razão de nascimento, idade, etnia, raça, cor, sexo, estado civil, trabalho rural ou urbano, religião, convicções políticas ou filosóficas, deficiência física ou mental, por ter cumprido pena nem por qualquer particularidade ou condição.
§ 2º – O Estado e os Municípios estabelecerão sanções de natureza administrativa, econômica e financeira a quem incorrer em qualquer tipo de discriminação, independentemente das sanções criminais previstas em lei.
§ 3º – Serão proibidas as diferenças salariais para trabalho igual, assim como critérios de admissão e estabilidade profissional discriminatórios por quaisquer dos motivos previstos no § 1º e atendidas as qualificações das profissões estabelecidas em lei.
Art. 10 – As omissões do Poder Público na esfera administrativa, que tornem inviável o exercício dos direitos constitucionais, serão supridas, no prazo fixado em lei, sob pena de responsabilidade da autoridade competente, após requerimento do interessado, sem prejuízo da utilização do mandado de injunção, da ação de inconstitucionalidade e demais medidas judiciais.”

Agora eu afirmo: a PMERJ, com seus membros sob juramento individual, em tropa formada perante a Bandeira Nacional, e com o risco da própria vida, deve resguardar os direitos fundamentais dos cidadãos e jamais discriminá-los ou privilegiá-los quanto ao exercício dos direitos constitucionais. A segurança pública é um desses direitos textualmente citados na Carta Magna, cabendo ao Ministério Público fiscalizar o cumprimento das normas constitucionais (sic):

“Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: (...)

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. (...)
Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. (...)
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: (...)”


Insisto que não sou contrário às UPPs. Não gosto, todavia, de vê-las mitificadas; isto é um perigo futuro, pois não me será estranho a imprensa passar do elogio à crítica (sua real inclinação), desde que não mais se interesse por UPPs. Mas agora não me há mais dúvida de que as UPPs e a transferência do BOPE se incluem no tal “cartão postal” citado pelo Jornal O Globo. Haveria na “insinuação global” alguma tocaia em andamento?... Por outro lado, foi bom ter sido assim, porque, pelo menos, acabou-se a especulação do óbvio, ainda que induza a matéria em destaque certa intenção de “tirar o corpo fora”... Seja como for, permanece em mim a certeza de que tudo se resume ao cenário de uma peça teatral cujos ingressos ficarão restritos a somente uma parte dos interessados em assisti-la: estão excluídas as demais comunidades assoladas pelo tráfico e acrescidas de armas e traficantes deslocados das comunidades ocupadas por UPPs, em nítido privilégio destas poucas e discriminação daquelas muitas outras. Ou seja, a maioria da população favelada não conhecerá jamais nenhuma UPP, por uma razão simples: “O formato segue a função.” E o formato da PMERJ é e continuará sendo insuficiente para seguir tão gigantesca função...
Esta máxima estratégica de Louis Sullivan*, que, em outras palavras, significa que a estrutura deve atender aos objetivos traçados, jamais será suprida pela esforçada corporação mantenedora da ordem pública. Porque, nem gastando todo o orçamento estadual é possível transformar o território do RJ num “cartão postal globalizado” (apenas trocadilho). Afinal, aumentar os meios materiais e humanos (estrutura/formato) para atender otimamente a esse objetivo (função) de ocupar todas as favelas do RJ com UPPs, e policiar eficazmente o asfalto, ainda generalizando o privilégio remuneratório destinado a algumas poucas UPPs e a alguns poucos PMs a elas destinados como “especiais”, é impossível.
Aliás, nem se pode falar em “alguns poucos PMs”, pois há municípios com milhões de habitantes que não são privilegiados nem com metade do efetivo já alocado nas “poucas UPPs”. Enfim, o que prevalece é o privilégio de poucos em contraposição à discriminação de muitos, com o poder estatal olvidando a Carta Magna e seus ditames democráticos na base do L'Etat c'est moi... No fim de contas, a Copa do Mundo e as Olimpíadas, hoje, são mais importantes que os “interesses sociais e individuais indisponíveis” (com a palavra o Ministério Público...). Ah, e esse pessoal amante dos maus exemplos ainda critica os abusos do regime militar... Mas estou satisfeito por saber que desde o início não me enganei ao especular exatamente o que agora emerge na nota jornalística: a verdade do “cartão postal”! Resta agora aguardar o futuro e torcer para que a PMERJ saia elegantemente da “sinuca de bico” em que se meteu. Porque os acertos serão do governo e os erros, tão-somente da corporação. Aliás, como sempre...


*
Sullivan. L. H. (1988): The Public Papers (Ed. Robert Twombly). Chicago and London: Chicago University Press.

3 comentários:

Anônimo disse...

Gostaria de lhe postar algumas coisas referentes ao polciamneto na cidade de maricá, pois sei que o senhor reside aqui, no governo municipal anterior foram criadas a sede da 4º cia, na entrada de Maricá, DPO de Inoã, DPO de São José do Imbassaí e Cabine de Itaipuaçu no Françês, neste governo foram instintos o Dpo do Centro de Maricá, e o PATAMO, será que porque o Governo estadual não gosta do Prefeito a população tem de pagar o "pato", literalmente.

Luiz Drummond disse...

Emir o que me questiono todo dia é como um sujeito que não sabe nada a respeito de violência no RJ, pode estar ocupando o cargo de secretário de segurança da cidade.
Quem deveria ocupar esse importante cargo é no mínimo algum ex.oficial da PMERJ ou da PCERJ, gente que vivenciou a situação.
Beltrame com essa história de criancinhas está parecendo o seu conterrâneo Brizola.
O fato é que taí a máscara caiu.UPP é pra Copa e Olimpíada. Nos ja sabiamos, mas tenho certeza que muita gente se desiludiu.
Enquanto isso o dinheiro dos impostos do carioca serve pra elevador no cantagalo, teleférico no alemão,etc...

Paulo Xavier disse...

Para onde estão indo esses bandidos expulsos das favelas? Certamente que estão disseminando o mal em alguma parte do nosso Estado.
Essa semana soubemos aqui em Macaé de dois casos de latrocínios contra trabalhadores, fato que a imprensa pouco ou nada divulgou, aliás a grande imprensa só aparece em Macaé quando tem plataforma de petróleo afundando, helicóptero com trabalhadores no fundo do mar ou grande derramamento de petróleo . Parece estratégico, mascarar ou ocultar os casos de violência, pois isso tira votos, enquanto isso ela permeia por todo Estado.
Lugar de bandido é trancafiado atrás das grades e não circulando livremente por aí.
Ainda não tenho uma opinião formada sobre UPPs, quem está mais próximo tem condições avaliar melhor, porém de uma coisa ainda não sabemos: Para onde estão indo os bandidos expulsos das favelas ocupadas?