terça-feira, 28 de janeiro de 2014

Eleições e segurança pública II



O RJ vivenciará uma eleição atípica em 2014: todos os candidatos com chance de vencê-la são de partidos da base do Governo Federal. E os que são oposição ao PT e costumam lançar candidatos não representam muito no contexto eleitoral, pelo menos até agora e segundo recentes pesquisas. Claro que esses candidatos ligados à situação no nível político maior não estão muito legitimados a sugerir ao eleitor local mudanças radicais em absolutamente nada. Se o fizerem, isto soará como mentira deslavada. Por exemplo: falar mal da segurança pública com o foco apenas no Estado-membro sugere uma autêntica parcialidade. Com efeito, não terão roupagem de verdade os discursos desta natureza... Daí talvez a saída seja “melhorar o que existe” sem acirrar a discussão para desmerecer os demais candidatos aliados ao PT no contexto nacional. Afinal, todos os palanques serão exclusivos da presidente Dilma Rousseff, candidata à reeleição com a vantagem do favoritismo até o momento. E também será no mínimo engraçado ela corroborar candidaturas diversas no RJ em palanques ocupados por naturais desafetos pessoais e políticos.

Ora bem, tão circunstância já demonstra que tudo não passará de brincadeira, as propostas de mudança decerto relembrarão a histórica frase lusitana: “Tudo como dantes no quartel de Abrantes”. Sim, tudo ficará como dantes... Pois a impressão desde agora é a de que qualquer mudança conjuntural no RJ limitar-se-á à certeza de que trocarão meia dúzia por seis... E quanto à segurança pública em si o foco da polêmica invariavelmente será a Unidade de Polícia Pacificadora (UPP). Nem tanto polêmica, bem mais uma convergência de opinião, pois nenhum candidato terá coragem de afirmar ao eleitor que desfará o programa de UPP... Tecnicamente, porém, e como mero eleitor, posso questionar as UPPs por ser modelo centralizador de efetivos numa instituição que deveria atuar precipuamente como polícia preventiva e secundariamente como polícia repressiva no seu âmbito de mantenedora da ordem pública. Entendo que a PMERJ deveria distribuir seus efetivos tendo como base diagnósticos que beneficiem a população no seu todo. É óbvio que não se trata de distribuir efetivos no ambiente como se todos os problemas estaduais fossem iguais em quaisquer regiões e localidades. Há vários fatores que determinam a localização de batalhões, companhias, pelotões, destacamentos e demais frações de tropa, todos fixados no terreno com fins amplos ou restritos em vista de estratégias, táticas e ações operacionais de natureza geral e específica. Mas as UPPs, que são específicas, não se encaixam neste largo conceito de emprego da tropa da PMERJ na prevenção e na repressão à violência e ao crime com o foco na máxima frequência do patrulhamento (ostensividade máxima), sem perder de vista as situações de exceção que exijam seletividade do uso da força até mesmo operativa em lugar do rotineiro serviço de segurança com vistas à proteção do cidadão individual e coletivamente considerado.

O uso da força, sem embargo, é medida de exceção que poderá alcançar o Estado de Defesa ou de Sítio. Portanto o serviço policial preventivo em ambiente de normalidade é a regra, ficando a repressão ao crime como intervenção meramente policial – não operativa (ação militar). Mas, sem dúvida, o propósito das UPPs é o de prestar serviço policial, ou seja, o de proteger a comunidade no seu dia a dia. Eis, porém, a raiz do problema, pois as UPPs, se bem atendem aos seus fins, alcançam um mínimo de favelas situadas na Zona Sul da capital, acrescidos os locais considerados “sede” de facções criminosas, em especial o Complexo do Alemão e a Rocinha. Já a realidade do RJ amplia-se a milhares de favelas dominadas pelo tráfico, e o pior é que todas elas estão imbuídas da falsa idéia de que a UPP é a única forma de lhes garantir proteção, o que as torna discriminadas em comparação às favelas privilegiadas com UPP. Todavia, as UPPs estão ainda em teste, porém não se há de negar que as comunidades faveladas não aquinhoadas com UPPs sofrem dupla violência: conflitos armados entre facções de traficantes disputando pontos de comércio de drogas e entrechoques armados com guarnições de PMs necessitadas de lograr êxito no “combate ao tráfico”, o que somente ocorre quando essas guarnições recolhem, muitas vezes a preço do sangue de bandidos e de PMs, o famigerado “Kit Imprensa”.

Como mudar isto?... Como arranjar um discurso diferente e convincente para a campanha eleitoral?... Ah, se antes não havia nenhum gosto pela ação policial, hoje a mídia aplaude e induz a sociedade a aplaudir as UPPs, e pelo menos o farão até as Olimpíadas. Depois, seja o que Deus quiser!... Mas o aplauso da sociedade esbarra a toda hora com os insucessos de algumas UPPs, pondo em dúvida seu valor, porquanto muitas comunidades beneficiadas têm vindo às ruas em manifestações violentas contra ações desastradas de guarnições lotadas em UPP para protegê-las, mas que, em contrário, dão vazão à velha a cultura da repressão, tais como fazem as guarnições de batalhões em favelas sem UPP.

Como se vê, a questão da segurança pública, que longe está de se restringir a alguma ação isolada ou coletiva de Polícia Militar, está, porém, reduzida ao discurso sobre a validade ou não das UPPs. Enquanto isso, os demais organismos de segurança pública não são cobrados e não dizem a que vieram além do “feijão com arroz” de sempre. Eis, portanto, a síntese do que se postará ante os candidatos “chapa branca”: não poderão cobrar eficiência, recursos etc. do Governo Federal ao qual seus partidos servem fielmente. Terão de criticar a segurança pública, cuja responsabilidade maior é da União, fingindo, porém, que o problema é tão-somente local e decorre de má gestão de seus adversários nas eleições. Enfim, haja cintura!...

2 comentários:

tom telles disse...

Concordo com a sua visão técnica operacional da ocupação do terreno. Mas coronel Emir o que falta aos oficiais que após especialização no último posto da carreira, não por em prática as suas percepções? Deixando-se render-se por politicagens escandalosas, será que suas vaidades são maiores que seus objetivos profissionais? No meu micro pensamento, observo que seria muito prazeroso ao um oficial ter liberdade de gestão para aplicação de conhecimento sem interferência externa/política... Caminhando para 14 anos de experiência policial militar exclusivo na atividade fim, vejo modestamente omissões, obscuridades e ainda há alguns desmotivados e cansados desta lama densa no qual estamos inseridos, contando seu tempo para com sua aposentadoria procurar outra ocupação mais prazerosa ou menos desgastante. Mestre esta é a minha impressão da atual policia da qual tenho orgulho de fazer parte. TELLES

Anônimo disse...


Emir disse:

Seu comentário resume a questão. Realmente não deveria caber ao político não mais que prover os meios materiais e humanos para que a PMERJ cumprisse sua missão constitucional nos limites da lei. Nada mais. É assim em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul. EM MG o comandante-geral é escolhido entre os pares e tem seu nome encaminhado ao governador. Se ele não aceitar, ninguém assume. Mesmo na ditadura a PMMG jamais deixou alguém de fora sentar-se na cadeira de comandante. Mas aqui...