segunda-feira, 17 de junho de 2013

Nas entrelinhas do protesto...



Desde os primórdios do absolutismo reinante entre os povos, quando os sinos tocavam o povo seguia à igreja para orar ou receber alguma ordem de emergência; ainda hoje, nos campos, quando o peão toca o berrante o gado se encaminha aos piquetes para a engorda antes do abate; e nos quartéis e teatros de operações, ao toque marcial da corneta os soldados entram em formação e partem à guerra para morrer pela pátria sem discussão. Enfim, rebanhos de gado e gentes acostumadas a reações dóceis, enquanto aqueles que verdadeiramente mandam riem do alto de suas varandas amplas, nas cidades e nos roçados, a cena não muda, povoléu é povoléu, e boiama é boiama, e povoléu é boiama, e vice-versa, outrora e agora...

Nas calmarias dos contemporâneos ambientes urbanos, porém, os traçados ortogonais são estudados pelas forças de segurança em mapas detalhados. Bonecos imitam gentes em passeata por uma das ruas, geralmente a mais larga. Bonecos fardados são dispostos no traçado ortogonal e movimentados a separar a multidão, nela penetrando em “cunha” (^), até que, num cruzamento, a “cunha” (^) se reparta em dois “escalões à direita (/) ou à esquerda” (\) ou em “linha” (|) a fracionar o povo, e assim sucessivamente, até que a massa humana se veja fatiada, e que, ao fim e ao cabo, ressurjam os indivíduos isolados e amedrontados, sem mais palavras de ordem a impulsioná-los ao efêmero heroísmo. Todos então tomam o caminho de casa...

A Revolução Francesa foi exceção; a Revolução Bolchevique foi exceção; a Revolução Cubana foi exceção, e outras poucas revoluções aqui e mundo fora foram exceções, a regra é a do conformismo, da apatia ante as fracas ideologias, que, a bem da verdade, são combustíveis incapazes de dar força e velocidade à massa humana em protesto. Diferente é o gado, que à simples faísca dispara enlouquecido até o abismo. E morre... Mas gado não raciocina, é diferente do ser humano, que, por mais animado ou exaltado, cogita sobre as consequências do que está a fazer e não quer perder seus bens mais preciosos: a liberdade e a vida.

Daí é que desde os velhos tempos as manifestações populares são perdedoras, embora se sintam ganhadoras por um efêmero momento do eterno tempo. Porque a fraqueza das massas é conhecida das forças de segurança, estas que, em contrário, podem se dedicar integralmente à vigilância e à ação repressiva dos movimentos populares, pois ganham para fazer exatamente isso. Já os manifestantes sabem que um dia a mais no anonimato em meio às turbas poderá pôr fim ao seu emprego já instável ou ao improdutivo ano escolar. E em não havendo como arriscar, retornam ao cotidiano abraçando o conformismo. E o fazem ao primeiro apito da fábrica ou ao tilintar da campainha escolar, até que os sinos repiquem conclamando-os ao arrependimento como garantia de salvação da alma, já que ao corpo só resta o trabalho árduo ou o desemprego. E tudo isso as forças de segurança, – feitas pelas elites dominantes para a “defesa do estado e das instituições democráticas”, nos termos da “constituição cidadã”, – e tudo isso as forças de segurança sabem. E por tudo isso o Estado sempre será mais forte que o povoléu.

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