A turbamulta que vem agitando
São Paulo e Rio de Janeiro, posta sob minha modesta ótica, reflete-se por
duas vias íntimas que se poderiam resumir nas indagações: “Por quê?”; “Como?”.
Quanto aos “porquês”, devemos nos posicionar no contexto que antecede à eclosão
da turbamulta, e concluímos que as motivações devem ser várias e complexas,
todas, porém, traduzidas em acumuladas insatisfações diante de governos que
prometem em campanha e desdenham o eleitor durante o exercício de seus
mandatos. Afirmar, pois, que a turbamulta tem como causa um ponto somente
(aumento de tarifas de transporte coletivo), como no “Big-bang”, é querer se enganar
redondamente. Creio, por conseguinte, que a insatisfação deva começar, por
exemplo, pela constatação da péssima qualidade dos transportes públicos e particulares, passando pela
falência da saúde e pelo descaso dos demais serviços públicos deveras onerosos às
algibeiras da população num país onde os impostos são abusivos se comparados com
o resto do mundo. Isto talvez explique a presença de pessoas cultas, de classe
média, quebrando o pau nas ruas, mais até que os verdadeiramente prejudicados
pelo aumento das tarifas. E aqui podemos enumerar infindáveis causas, diversos
pontos de insatisfação cotidiana a encherem a represa da revolta aqui, ali e
acolá. Já o “como?” se resume à enfadonha cena de vandalismo e de confronto de
manifestantes com as forças de segurança representativas de um Estado que não
cumpre suas funções sociais, e no final cuida com primor da repressão, também
uma função social que deveria ser exceção e por enquanto ainda assim pode ser
vista. Ou seja, manifestantes, de um lado, interessados no confronto para a
manifestação não parecer um show gospel, sem sal ou açúcar, e do outro a polícia
de choque de sempre, com as mesmas formações de antanho (em linha, em cunha, em
escalão à direita ou à esquerda), os escudos de outrora e os antigos gases
jorrados com discutível tecnologia, pois geralmente afetam ambas as partes do
confronto, o feitiço voltando-se contra o feiticeiro, tornando tudo uma espécie
de “samba do crioulo doido”.
Enfim, “tudo como dantes no
quartel de Abrantes”... E que se preparem as Polícias Militares, é hora de elas
cumprirem a pior das funções sociais, que é a de dar e receber pancadas nas desajeitadas escaramuças contra segmentos da população insatisfeitos e revoltados, bem mais a
primeira hipótese e menos a segunda, felizmente, pois se todos os insatisfeitos
pátrios decidissem pela baderna não haveria de haver polícia capaz de contê-los,
nem mesmo a tiros reais. Por falar em tiros, releva como nova tecnologia de
enfrentamento policial às multidões enfurecidas (pelo menos na aparência) as
balas de borracha, cujos efeitos têm sido bem mais o de “tiro pela culatra”.
Pois as marcas individualizadas em alguns atingidos são logo generalizadas pela
mídia como se todos os manifestantes tivessem recebido igual quinhão (não
esqueço a cena do jovem provocando de perto um policial para receber seu
"tirinho básico" e se destacar como “herói” em meio aos anônimos). Ora, é tudo igual se
atentarmos para os métodos de contenção de turbamulta aqui e algures, e todas
terminam pelo cansaço de ambas as partes confrontantes, de modo que os “porquês”
permanecem latentes até o próximo momento em que populares (pouquíssimos em
relação à população pátria) partirão ao vandalismo para pôr graça na
manifestação, não sem o condimento ideológico, no meu modo de ver fajuto, pois
os partidos políticos da extrema esquerda que balançam suas bandeiras não
lideram nada, nem voto em urna. De tal modo que, se somarmos os movimentos
sociais adrede organizados em vista de interesses comuns ou incomuns, com as
agremiações universitárias que não representam a massa estudantil, e mais
outros gatos pingados, o resultado é o de uma turbamulta quantitativamente
menor que a capacidade do Estado de contê-la na base do método de sempre: meia dúzia
de rotos e esfarrapados, que também pagam passagem, enfeitados em fardamento
pomposo, com escudos nas mãos, ombreados em minoria, e alguns poucos com a
função de disparar petardos contra os manifestantes, cena perfeita para entupir
com sensações o noticiário televisivo e jornalístico, nem tanto o radiofônico,
este que só consegue empolgar nas narrativas de eventos desportivos. E, no dia
seguinte, emergem as chiadeiras, seguidas de declarações oficiais garantindo “rigor nas
apurações dos excessos”, os vidros quebrados, as ruas sujas, enfim, o de sempre, ou
seja, permanecerá o aumento das tarifas e todos retornarão às suas realidades
para não perderem o emprego ou o ano escolar, o que me faz lembrar uma frase de
um dos ídolos desses baderneiros românticos, Karl Marx: “Tudo que é sólido e
estável desmancha no ar”...
Um comentário:
Membro destacado de partido de esquerda já havia comentado que em 2013 o "bicho ia pegar" (sic")! Estão cumprindo o que foi antecipado...a PM é o último bastião de defesa da Paz na sociedade brasileira e é a instituição mais achincalhada...coincidência? NÃO!!!
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