sexta-feira, 31 de agosto de 2012

“Os fins justificam os meios” (Maquiavel – 1469/1527)


“Quando uma teoria científica não permite atingir os objetivos que os agentes têm em mente, eles recorrem à trapaça, à fraude, à mentira, à demagogia, etc. Quando esses meios falham, eles usam a violência para destruir o que não sabem ou não são capazes de controlar.” (Martinez, Paulo – Política, Ciência, Vivência e Trapaça – Ed. moderna, SP, 1992)

A máxima do florentino Niccolò di Bernardo dei Machiavelli permeia o mundo do poder desde antes de ele a gravar. Não no sentido de estimular a esperteza e a maldade, como muitos a concebem, mas para em cautela denunciar as práticas danosas do poder para não perder seu precioso pescoço.
Na verdade, desde que o mundo é mundo o que mais se vê na política é a trapaça a serviço do poder, não havendo limites pensáveis ou impensáveis de comportamento criminoso no sentido da conquista desse poder, que, decerto, não se persegue para servir ao povo com desprendimento. Isto é utopia, o real é a descarada roubalheira em nome do poder!
Por amor à verdade, basta o desvio de uma moeda pertencente ao erário público para que o povo seja traído pelo detentor do poder que este povo, – enquanto sociedade organizada e criadora do estado, – emprestou-lhe para servir ao cidadão e não para se locupletar. Sim, o larápio é traidor do povo, e como tal deve ser eliminado. Segundo Rousseau, a eliminação do malfeitor inclui como possibilidade desde o exílio até a morte.

“(...) De resto, todo malfeitor, ao atacar o direito social, torna-se, por seus delitos, rebelde e traidor da pátria; cessa de ser um de seus membros ao violar suas leis, e chega mesmo a declarar-lhe guerra. A conservação do Estado passa a ser então incompatível com a sua; faz-se preciso que um dos dois pereça, e quando se condena à morte o culpado, se o faz menos na qualidade de cidadão que de inimigo. Os processos e a sentença constituem as provas da declaração de que o criminoso rompeu o tratado social, e, por conseguinte, deixou de ser considerado membro do Estado. Ora, como ele se reconheceu como tal, ao menos pela residência, deve ser segregado pelo exílio, como infrator do pacto, ou pela morte, como inimigo público, pois o inimigo dessa espécie não é uma pessoa moral; é um homem, e manda o direito da guerra matar o vencido. (...).” (Do Contrato Social – Jean-Jacques Rousseau)

O dilapidador do erário público é pior que assaltante. Daí a radicalização de Rousseau, que propõe um “contrato social” referendado por todos os cidadãos, sem contemplações com aqueles que o quebram conscientemente. É “contrato social” nossa Carta Magna e todas as leis pátrias que lhe são submetidas. Portanto, quebrar essas regras é crime punível de acordo com a dosimetria adrede contratada, observados também os direitos e garantias individuais.
A história demonstra que a prática do uso do poder em benefício próprio é tão tamanhona que o próprio povo acha normal um cidadão ingressar pobre na política, – restrito a salário que jamais enrica alguém, – e depois de alguns anos, – sem que se afastasse do seu múnus público, – o cidadão-político ostenta fortunas impressionantes: mansões, fazendas, aviões, carrões etc. E ainda é afagado nas altas rodas como se fosse rico de berço. Participa de leilões de gado PO e adquire suas vacas leiteiras milionárias como se comprasse alfinete de fralda.
Ora, se o Brasil conferisse a origem dessas fortunas, uma a uma, arrebatadas dos cofres públicos por políticos caraduras, e as cotejasse com seus ganhos normais, ano a ano, nada mais precisaria para constatar que são desviadas do erário público. Há apuração mais fácil?... Ora, ora, nada mais que ostentação da riqueza basta para configurar a imoralidade e alcançar as ilegalidades praticadas por ricaços políticos!... Ah, não farão isto! Portanto, creio que somente uma revolução seria capaz de pôr tudo a limpo, mas a questão é que qualquer revolução há de ter uma ideologia, de esquerda ou de direita, e haverá sempre um lado adversário. Por conseguinte, revolução nesses moldes derramará sangue e não haverá de vingar o povo...
Como então fazer uma revolução sem sangue para vingar o povo?... Sem embargo, vemos agora no STF esta revolução. Pena, todavia, que não alcance o todo. Cá entre nós, a roubalheira acumulada nas algibeiras dos políticos daria para enriquecer o Brasil muitas vezes. A saída então é a L'armata Brancaleone formada por alguns membros do Ministério Público, do Poder Judiciário e da Mídia, não sem o perigo da contaminação, pois enquanto uns almejam os holofotes do sucesso, outros visam ao lucro capitalista; ou visam a ambos... E também nesses casos “os fins justificam os meios”...
Porque a essência do problema está no ser humano propenso a falhas de caráter. Ele é vaidoso por natureza, e de quando em quando é abjeto quanto aos meios que escolhe para alcançar seus fins. E o fazem porque se sentem deuses ou semideuses inalcançáveis, ininvestigáveis, imperscrutáveis. São, sim, supinos arautos da moralidade, da lei e da ordem na aparência e maus-caracteres na essência, como aquele senador-procurador-de-justiça... Hum, será ele exceção?... Cá pra nós, quantos são como ele ou piores que ele? Quem seriam eles? Onde atuam?... Ah, isto corresponde ao milagre de o povo ver anjos e santos materializados num exército e demônios sendo por eles finalmente vencidos. Enfim, só assistiremos a derrota do MAL e o triunfo do BEM no Juízo Final sentados numa arena romana ou num grande estádio de futebol. Se é que lá estaremos por direito de boas ações. Oremos, pois!...

2 comentários:

Paulo Fontes disse...

Caro amigo Larangeira,
MisI uma vez vc reaparece em grande estilo e coloca os pingos nos "is"
Seu texto é primoroso e para meio entendedor pingo é letra.
Meu amigo essa democracia brasileira assemelha-se a uma caixa vazia e oca por dentro e para minha decepção nem mesmo o julgamento do STF fará justiça pois quem pegar pena de 10 anos cumprirá 1/6 e com um ano e meio de regime semi aberto estará no olho da rua, quites com a justiça e prontos para mais roubalheira.
Enquanto isso minha esposa que declarou imposto de renda e aproximou para maior o valor de centavos, enfrentou o maior problema com a Receita Federal.
"QUOSQUE TANDEM CATILINA ABUTERE PATIENTIA NOSTRA"-CÍCERO, IN CATILINÁRIAS.

Paulo Xavier disse...

Seria repetitivo demais elogiar mais um texto do escritor Emir Larangeira, todavia em um tempo não muito distante, o autor de um texto magnífico como este que acabo de ler já estaria condenado ao exílio por subversão. Coisas belas que aprendi a apreciar na minha juventude, como a música "Sinal Fechado" de Paulinho da Viola, ou "Alegria Alegria" de Caetano; do Chico Buarque nem se fala, foram suficientes para mandar seus autores ao exílio e permanecem por lá por um bom tempo.
Uma das principais virtudes que aprecio num ser humano é a coragem; coragem de dizer a verdade, coragem de enfrentar os poderosos, coragem de não se omitir perante os fatos e nem se acovardar diante das ameaças; a mesma coragem que teve o mártir Tiradentes que num patíbulo, diante da morte bradou a plenos pulmões "dez vidas eu tivesse, dez eu daria".
Cel Larangeira cada vez mais o admiro e respeito; quanto aos covardes, não liga não porque o bem sempre vencerá o mal, onde e quando eu não sei...