O preço de uma ilusão
“Tá dominado!” – a frase é do megatraficante Fernandinho Beira-mar após promover massacre em Bangu I, presídio até então considerado de segurança máxima. Ele, o traficante, com a sua barbárie perpetrada dentro da cadeia, desmoralizou o sistema estatal que se ufanava por possuir uma fortaleza inexpugnável. Enfim, o exemplo do poder do bandido ficou provado mesmo com ele trancafiado a sete chaves, e, portanto, deveria constar da preocupação das autoridades públicas como prioridade absoluta. Afinal, o facínora não se preocupou com qualquer punição vinda do mundo oficial, mas antes quis e conseguiu provar seu poder de liderança e de retaliação ao submundo do crime. Daí, subestimar o poderio do tráfico do lado de fora depois deste emblemático episódio do lado de dentro, – ao qual poderíamos acrescentar o do PM amarrado a um bujão de gás, inerme e inerte ante a arrogância de presidiários sublevados, – é abraçar a ilusão e ignorar a realidade. Ademais, nenhum outro presídio foi construído para suprir a segurança máxima reduzida a pó.
A realidade é que do lado de fora, nas favelas, e desde muitas décadas, os traficantes lideram o violento e lucrativo comércio de drogas, não sendo possível contabilizar os assassinatos de policiais para os quais nenhuma ameaça de punição societária surtiu efeito. Pior é que nem mesmo a possibilidade extrema da morte desses assassinos de policiais é capaz de inibir seus espíritos cruéis. Nem é caso de falar das vítimas fatais que o tráfico produz no submundo do crime (entre eles) e no mundo societário, este que responde por uma demanda a aumentar a mais e mais a oferta de drogas, comércio ilícito que rende milhões num contexto multinacional. Aqui no Brasil, – e em razão do descaso societário com os favelados, – as favelas se tornaram covis seguros de traficantes formados paramilitarmente. E por conta da permeabilidade das favelas, que, por sinal, não têm muros como nos presídios, os usuários se misturam aos trabalhadores e bandidos e todos se igualam num forçado mimetismo, com a lei do silêncio reinando soberana. Quem manda ali, sem embargo, é o bandido! Ou será que alguém ainda duvida?...
Na favela apinhada de barracos, valas fétidas, lixo e outras desgraças, misturam-se usuários de droga do asfalto, trabalhadores favelados, bandidos e policiais, sendo certo que os últimos respondem pela heterogeneidade da mistura social. O dinheiro dos primeiros (usuários) sustenta o comércio de drogas, multiplicando-se em milhões a dinheirama neste eterno vaivém do uso-tráfico garantidor de assistencialismos e propinas. Eis o caldo de cultura que embola o crime a ser combatido com a cidadania a ser respeitada, não se sabendo como equacionar problema tão complexo. O resultado, portanto, é o desastre, sempre o desastre, posto ele se repetir ano após ano nas barbas de todos: estado e sociedade. Imaginar solução simples para tão grave problema é irresponsabilidade ou insanidade. Transformar em ficção esta dura realidade que aflora como um tumor maligno em metástase é navegar à deriva e na mais absurda alienação.
A ilusão vai ao ponto de “ex-traficantes” confessos declararem abertamente que se afastaram de seus crimes para servirem ao mundo oficial em bandas musicais aplaudidas por todos, ignorando as autoridades e a sociedade que esses “ex-traficantes” primeiro deveriam responder por seus crimes passados, não prescritos, não lhes bastando sair da lama como se ela não se mantivesse sujando suas almas podres. Ora! Como pode um traficante confesso decidir que não é mais criminoso e fim de conversa? Que diabo de país é esse?...
Ah, é tudo ilusão, o tráfico é ilusão, a vida de crimes dessas gentes não passou de ficção. Nada é real a não ser a “regeneração” deles e delas sob os aplausos societários e estatais. Enfim, não há mais cidadãos ordeiros, não há mais bandidos, todos são personagens de uma ópera bufa que sempre se encerrará no cemitério: o palco último da desgraça olvidada. Portanto, a jovem Fabiana Aparecida de Souza “não morreu”, apenas “encenou a sua morte”, assim como o Complexo do Alemão, embora “conquistado” por uma ocupação militar em força máxima, com direito a “ultimato de rendição”, e depois festivamente ocupado por UPPs, na verdade “tá dominado!”. Sim, “tá dominado” por traficantes que permanecem nos seus covis, ali mesmo, com o beneplácito dos favelados, a medo ou por gostarem de conviver mais com seus parentes e amigos bandidos do que com policiais militares simpáticos e educados, porém meros personagens naquele palco de ilusões. Porque o policial é e sempre será o “patinho feio” e assim há de morrer: abatido por tiro de fuzil.
Foi assim com Fabiana; foi assim com muitos policiais civis e militares; foi assim com traficantes e usuários que caíram no descrédito de quem efetivamente está em condições de bradar o “tá dominado”: o bandido. Por isso Fabiana morreu, ou seja, porque lá estava para cumprir uma finalidade mui bem resumida na frase do coronel PM coordenador das UPPs veiculada no Jornal O DIA de hoje, 25 de julho de 2012, pág. 4: “(...) As atividades da UPP são de proximidade com a comunidade e não somente de confronto.” Enfim, e em outras palavras, entenda-se: “Morrer se preciso for; matar nunca.” (marechal Rondon). Mas há uma grande diferença: o marechal referia-se a índios inocentes e eventualmente belicosos ante o desconhecido. O coronel PM refere-se não aos favelados, mas aos bandidos, pois não há como excluir os bandidos como supérfluos depois do cruel assassinato de Fabiana, que talvez estivesse na favela pensando ingenuamente que ali estava para exercitar a “proximidade” com os favelados ordeiros. Já a presença de bandidos armados com fuzis, prontos para o confronto, para ela não passava de ficção.
Ora Bem, ela jamais poderá saber que errou e que por isso perdeu a vida. Por conseguinte, – e que me desculpe o respeitável companheiro, – não é hora de continuar a ignorar o perigo do confronto em defesa da indefensável ilusão de “proximidade”. No fim de contas, o preço disso está caro demais e não precisa morrer ninguém além da jovem Fabiana para se constatar a dura realidade de que, se há algum domínio do Complexo do Alemão e quiçá em outros lugares com UPPs, este seguramente pertence ao bandido. E bandido só pensa em confronto, não cogita nenhuma “proximidade”...
“Tá dominado!” – a frase é do megatraficante Fernandinho Beira-mar após promover massacre em Bangu I, presídio até então considerado de segurança máxima. Ele, o traficante, com a sua barbárie perpetrada dentro da cadeia, desmoralizou o sistema estatal que se ufanava por possuir uma fortaleza inexpugnável. Enfim, o exemplo do poder do bandido ficou provado mesmo com ele trancafiado a sete chaves, e, portanto, deveria constar da preocupação das autoridades públicas como prioridade absoluta. Afinal, o facínora não se preocupou com qualquer punição vinda do mundo oficial, mas antes quis e conseguiu provar seu poder de liderança e de retaliação ao submundo do crime. Daí, subestimar o poderio do tráfico do lado de fora depois deste emblemático episódio do lado de dentro, – ao qual poderíamos acrescentar o do PM amarrado a um bujão de gás, inerme e inerte ante a arrogância de presidiários sublevados, – é abraçar a ilusão e ignorar a realidade. Ademais, nenhum outro presídio foi construído para suprir a segurança máxima reduzida a pó.
A realidade é que do lado de fora, nas favelas, e desde muitas décadas, os traficantes lideram o violento e lucrativo comércio de drogas, não sendo possível contabilizar os assassinatos de policiais para os quais nenhuma ameaça de punição societária surtiu efeito. Pior é que nem mesmo a possibilidade extrema da morte desses assassinos de policiais é capaz de inibir seus espíritos cruéis. Nem é caso de falar das vítimas fatais que o tráfico produz no submundo do crime (entre eles) e no mundo societário, este que responde por uma demanda a aumentar a mais e mais a oferta de drogas, comércio ilícito que rende milhões num contexto multinacional. Aqui no Brasil, – e em razão do descaso societário com os favelados, – as favelas se tornaram covis seguros de traficantes formados paramilitarmente. E por conta da permeabilidade das favelas, que, por sinal, não têm muros como nos presídios, os usuários se misturam aos trabalhadores e bandidos e todos se igualam num forçado mimetismo, com a lei do silêncio reinando soberana. Quem manda ali, sem embargo, é o bandido! Ou será que alguém ainda duvida?...
Na favela apinhada de barracos, valas fétidas, lixo e outras desgraças, misturam-se usuários de droga do asfalto, trabalhadores favelados, bandidos e policiais, sendo certo que os últimos respondem pela heterogeneidade da mistura social. O dinheiro dos primeiros (usuários) sustenta o comércio de drogas, multiplicando-se em milhões a dinheirama neste eterno vaivém do uso-tráfico garantidor de assistencialismos e propinas. Eis o caldo de cultura que embola o crime a ser combatido com a cidadania a ser respeitada, não se sabendo como equacionar problema tão complexo. O resultado, portanto, é o desastre, sempre o desastre, posto ele se repetir ano após ano nas barbas de todos: estado e sociedade. Imaginar solução simples para tão grave problema é irresponsabilidade ou insanidade. Transformar em ficção esta dura realidade que aflora como um tumor maligno em metástase é navegar à deriva e na mais absurda alienação.
A ilusão vai ao ponto de “ex-traficantes” confessos declararem abertamente que se afastaram de seus crimes para servirem ao mundo oficial em bandas musicais aplaudidas por todos, ignorando as autoridades e a sociedade que esses “ex-traficantes” primeiro deveriam responder por seus crimes passados, não prescritos, não lhes bastando sair da lama como se ela não se mantivesse sujando suas almas podres. Ora! Como pode um traficante confesso decidir que não é mais criminoso e fim de conversa? Que diabo de país é esse?...
Ah, é tudo ilusão, o tráfico é ilusão, a vida de crimes dessas gentes não passou de ficção. Nada é real a não ser a “regeneração” deles e delas sob os aplausos societários e estatais. Enfim, não há mais cidadãos ordeiros, não há mais bandidos, todos são personagens de uma ópera bufa que sempre se encerrará no cemitério: o palco último da desgraça olvidada. Portanto, a jovem Fabiana Aparecida de Souza “não morreu”, apenas “encenou a sua morte”, assim como o Complexo do Alemão, embora “conquistado” por uma ocupação militar em força máxima, com direito a “ultimato de rendição”, e depois festivamente ocupado por UPPs, na verdade “tá dominado!”. Sim, “tá dominado” por traficantes que permanecem nos seus covis, ali mesmo, com o beneplácito dos favelados, a medo ou por gostarem de conviver mais com seus parentes e amigos bandidos do que com policiais militares simpáticos e educados, porém meros personagens naquele palco de ilusões. Porque o policial é e sempre será o “patinho feio” e assim há de morrer: abatido por tiro de fuzil.
Foi assim com Fabiana; foi assim com muitos policiais civis e militares; foi assim com traficantes e usuários que caíram no descrédito de quem efetivamente está em condições de bradar o “tá dominado”: o bandido. Por isso Fabiana morreu, ou seja, porque lá estava para cumprir uma finalidade mui bem resumida na frase do coronel PM coordenador das UPPs veiculada no Jornal O DIA de hoje, 25 de julho de 2012, pág. 4: “(...) As atividades da UPP são de proximidade com a comunidade e não somente de confronto.” Enfim, e em outras palavras, entenda-se: “Morrer se preciso for; matar nunca.” (marechal Rondon). Mas há uma grande diferença: o marechal referia-se a índios inocentes e eventualmente belicosos ante o desconhecido. O coronel PM refere-se não aos favelados, mas aos bandidos, pois não há como excluir os bandidos como supérfluos depois do cruel assassinato de Fabiana, que talvez estivesse na favela pensando ingenuamente que ali estava para exercitar a “proximidade” com os favelados ordeiros. Já a presença de bandidos armados com fuzis, prontos para o confronto, para ela não passava de ficção.
Ora Bem, ela jamais poderá saber que errou e que por isso perdeu a vida. Por conseguinte, – e que me desculpe o respeitável companheiro, – não é hora de continuar a ignorar o perigo do confronto em defesa da indefensável ilusão de “proximidade”. No fim de contas, o preço disso está caro demais e não precisa morrer ninguém além da jovem Fabiana para se constatar a dura realidade de que, se há algum domínio do Complexo do Alemão e quiçá em outros lugares com UPPs, este seguramente pertence ao bandido. E bandido só pensa em confronto, não cogita nenhuma “proximidade”...
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