domingo, 29 de abril de 2012

A Trapaça dos "Onze de Acari" (TOMO I)

“Existem objetos como as rochas e os abridores de latas, que simplesmente existem e podem ser completamente explicados por uma lista de suas propriedades. E existem coisas que somente podem ser explicadas contando uma história. Para as coisas do segundo tipo, uma simples descrição nunca é suficiente. Uma história é a única descrição adequada para elas, porque entidades como as pessoas e as culturas não são de fato coisas, mas sim processos que se desenvolvem no tempo.” (Smolin, Lee – Três Caminhos para a Gravidade Quântica)






Vou contar uma história... Do estranho compadrio de arapongas com sistemas formais e informais que explode como bomba atômica em Brasília destaca-se o “intercâmbio” do personagem de codinome “Dadá” com membros do MP, fedentina sabe-se lá de que extensão no panorama geral da podridão que jorra na mídia em espantoso torvelinho. E o miasma exala de um senador até então tido como vestal, quiçá por ser membro do MP brasiliense e elevado ao elevadíssimo cargo de Procurador-Geral de Justiça antes de enveredar-se pela vida parlamentar. O problema é gravíssimo, não se há de negar, a relação do senador com o bicheiro é antiga e os milhões são muitos... Mas a explosão brasiliense não é a primeira nem a única a fazer aflorar esse método escuso de intelligentia a unir em malignidade organismos ministeriais e arapongas. Já vi e protagonizei esse filme antes e ainda agora o protagonizo.
Não sei de outros Estados Federados. Posso, entretanto, falar do RJ e da intrincada rede engolfando no poder político diversos membros do MP a partir da gestão do Sr. Leonel Brizola – inclusive ocupando cargos no DETRAN, DESIPE, PALÁCIO GUANABARA etc. Lembrando o cancioneiro a dizer que o que é bom, “é ilegal, imoral ou engorda”, pior ainda foi no segundo período brizolista: a promiscuidade do MP com arapongas, que antes era imperceptível ou até nenhuma, como se fosse a “coisa” explicada pelo físico quântico, tornou-se escancarada – um “processo” a merecer se tornar “história”: muitos arapongas, até ex-chefes da PM.2 (Comunidade de Informações) atuaram e ainda atuam na estrutura de intelligentia do MP, e vice-versa (não sei hoje, mas no passado era corriqueira a presença de promotores de justiça fazendo não sei quê nos obscuros corredores e salas da PM.2), não se sabendo até que ponto essas maquinações foram e são inconfessáveis nem quem são atualmente seus alvos preferenciais. Exceto eu, sempre um alvo predileto dessa facção formada por alguns promotores de justiça plantados e proliferados no feraz terreno político-ideológico-pedetista-petista. E foram e são sobremodo ferozes contra mim desde a era Biscaia (Antonio Carlos Silva Biscaia), procurador de justiça, inegável militante pedetista e depois petista, primeiro a usar a arapongagem a serviço de sua causa político-ideológica desde quando exercia o cargo de Procurador-Geral de Justiça, claro que ostentando o mesmo ar de seriedade que caracterizava o seu desmoralizado colega de Brasília.
Não exagero e sei até que me arrisco ao me enfiar nesse vespeiro... Por isso não devo ao delicado tema acrescer uma linha, ou qualquer palavra, se não houver prova documental sobre o que infiro. Porém, uso a técnica de inferência como um direito, desde que ela traduza alguma verdade substancial. É como aqui tentarei reconstituir um fato que a mim se refere direta ou indiretamente, e que me vem produzindo imerecido mal. Sim, buscarei retratar a insídia que me atingiu e ainda me atinge, visando a desmascará-la pela junção de partes aparentemente soltas ao vento, mas que, na realidade, formam um todo sinérgico. Sim, sim, é como me interessa resgatar uma nesga de história do infelicitado RJ a partir do livro Comando Vermelho – A História Secreta do Crime Organizado, de autoria do jornalista Carlos Amorim, publicado em 1993 pela Editora Record. Porque o texto registra um incredível conluio do PDT com o CV em virtude duma doentia ânsia de vencer as eleições de 1982, conjunção imoral que tornou Brizola governador do RJ após seu retorno do exílio. E, dentre tantas situações comprometedoras, destaco o episódio ocorrido no Presídio da ilha Grande, ipsis litteris do supracitado livro:

“(...). Na Ilha Grande, diante de toda a imprensa, um acontecimento insólito: a autoridade pública é recebida por um dos 'vermelhos', um dos novos xerifes da prisão, Rogério Lengruber, o Bagulhão. O representante do Comando Vermelho veste bermudas, camisetas e sandálias havaianas. Mete o dedo na cara do secretário de Justiça e comunica a ele que os presos estão cansados de ouvir o blablablá do governo (...). No dia 30 de setembro, uma quinta-feira, os homens de confiança do governador Brizola se reúnem secretamente num anexo do Palácio Guanabara. O motivo do encontro é a incontrolável violência nas cadeias. A conversa a portas fechadas dura toda a noite e parte da madrugada. Estão presentes o secretário Vivaldo Barbosa e seu subsecretário Antônio Biscaia, o secretário de Polícia Arnaldo Campana, o comandante da PM, coronel Carlos Magno Nazareth Cerqueira, o Diretor do DESIPE, Avelino Gomes...” (AMORIM, Carlos. COMANDO VERMELHO – A história secreta do crime organizado – Ed. Record, 1993, págs. 149-157). (Grifos meus nos membros do MP e no prócer do CV)

Porém, foi no retorno de Brizola ao poder (1991-1994) que Biscaia, com sua trupe de iguais em função, assumiu a PGJ com poderes ilimitados. E incorporou a Comunidade de Informações da PMERJ como seu braço de força logo no início desse período, por conta do episódio conhecido como “Onze de Acari”, em alusão ao desaparecimento de onze jovens (rapazes e namoradas) da Favela de Acari, no mês de julho de 1990. O entrosamento secreto da turma de Biscaia com Brum e equipes da CI (Corregedoria Interna), da DPJM (Delegacia de Polícia Judiciária Militar) e da PM.2 (Comunidade de Informações) pode ser constatado pela leitura do livreto do jornalista Carlos Nobre, intitulado Mães de Acari – Uma história de luta contra a impunidade, publicado pela Editora Relume Dumará. Neste livro, publicado sob os auspícios do CEAP (Centro de Articulação de Populações Marginalizadas), presidido pelo notório petista Ivanir dos Santos, há significativas referências a membros do MP e da arapongagem da PMERJ e a alguns políticos de esquerda, em especial do PT:

“Em perfeita sintonia com esse tempo intolerante, o jornalista Carlos Nobre talvez tenha escrito um dos retratos mais contundentes sobre a morte institucionalizada no Rio de Janeiro.” (Benedita da Silva – Deputada Federal)

“Em nome de quê, em nome de quem? Onde estará a razão de que a humanidade é dotada? Eis o que este livro exprime. É para mim, é para a France-Libertés uma honra associar-se a este canto de dor.” (Danielle Mitterrand – Presidente da Fundação France-Libertés)

“Estamos ameaçados de morte, e uma das Mães de Acari, dona Edméia da Silva Eusébio, foi assassinada. Não temos como recuar. Este livro é uma das expressões da nossa luta, da nossa crença.” (Centro de Articulação de Populações Marginalizadas – CEAP)

“Pierre Fatumbi Verger, em Os libertos, relaciona-nos a história de Ajayi, um jovem africano, nascido em Oxogum e trazido para o Brasil como escravo. Foi ele capturado em 1821 por mercadores mulçumanos, juntamente com sua mãe, duas irmãs e um primo. Levado para Iseyin, no dia seguinte foi separado de sua mãe e seus parentes, e vendido como escravo aos 13 anos de idade. (...) A edição do presente livro é de suma importância, perpetua todos os dados nele contidos e leva-os ao conhecimento do grande público. Isso é necessário, no momento político por nós vivido. Após, não será possível dizer ‘eu não sabia’. Saibam: é assim mesmo que as coisas acontecem. (...) Mas, um dia, mudará!” (Tania Maria Salles Moreira – Promotora de Justiça da 4ª vara Criminal de Duque de Caxias – Baixada Fluminense. Texto extraído da quarta capa e da orelha de capa do livro de Carlos Nobre). (Grifo meu)

Não vou aqui reeditar a íntegra do livreto, mas não posso deixar de chegar ao ponto principal do que entendo por conluio-político-institucional-ideológico gravado por Carlos Nobre num misto de ficção e realidade a se confundirem mutuamente em sugestões ilícitas para atingir desafetos e elogiar aliados. E, sobre os aliados, ressalte-se, ipsis litteris:

“Entidades e pessoas foram fundamentais para a produção deste livro. Agradeço o incentivo da Fundação Frances-Libertés, do Comitê de Solidariedade França-Brasil e da primeira dama francesa Danielle Mitterrand. Agradeço também aos militantes e funcionários do Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (...). Sem a clarividência de Tania Maria Salles Moreira muitas passagens deste livro estariam nubladas. Obrigado também aos militantes do Movimento Negro (...). O procurador-geral de justiça Antonio Carlos Biscaia foi simpático em relação ao livro, assim como os promotores da Assessoria de Direitos Humanos; o coronel Brum foi uma luz nas partes obscuras desta história; as Mães de Acari e toda a comunidade nos deram lições de vida. Ivanir dos Santos foi um importante autor intelectual desta obra: agradeço muito pelo convite.” (Agradecimentos extraídos do livreto em comento. Grifos meus)

Chumbo grosso!... Como não creio em coincidência, e lido aqui com realidade, não me será difícil reconstituir a trapaça havida em 1993, mas que se reporta aos idos de 1991 e ao fato mais específico duma tentativa de “reconhecimento”, em sede da PCERJ, tendo de um lado as “mães de Acari”, o então Capitão PM Odilon e um conhecido advogado de traficantes, Dr. Salvador Meneses Couto, e do outro lado PMs selecionado pela PM.2 de Brum como supostos autores e culpados de extorsão e do sequestro dos “Onze de Acari” (o fato teria ocorrido em julho de 1990, sendo certo que eu não mais comandava o nono batalhão; entreguei o comando a outro tenente-coronel em 10 de abril de 1990). Com efeito, até hoje não se sabe de que “critérios investigativos” Brum fez uso para listar os PMs, supondo-se até a possibilidade de o referido “investigador” ter-se escorado em mensagens vindas do além, como ele mesmo admite no livreto e confirma em juízo do II Tribunal do Júri (Processo sobre a chacina de Vigário Geral) ser verossímil tudo o que disse e foi publicado por Carlos Nobre:

“(...) O coronel achou interessante o relato de Marilene. Não descartava nada nas investigações, nem mesmo mensagens vindas do além. Afinal, ele devia a própria carreira militar às ligações de sua família com o espiritismo. – Um tio, sempre que nos visitava, incorporava uma entidade da umbanda chamada Pai Joaquim de nagô. Era um preto-velho africano. Um dia ele disse que eu seria o único ‘canela-preta’ da família – conta o coronel. (...) Sou um investigador que tem um leque muito grande para abrir. Sou intuitivo, um homem ligado ao mundo espiritual. Utilizo a investigação espírita para chegar a fatos concretos. Não vejo nada demais nisso. Nada que me possa ridicularizar como policial.” (NOBRE, Carlos – Mães de Acari - Uma história de luta contra a impunidade – Editora Relume-Dumará, Rio de janeiro, 1994, págs.55-57)

Nem é preciso mais registro nem devo grifar nada, este resumo é o que basta para entender a “metodologia investigativa” de Brum ao selecionar seus alvos a serem “reconhecidos” pelo advogado de traficantes, para, em seguida, as “mães de Acari” confirmarem a escolha dele, tudo criteriosamente orquestrado pelo capitão Odilon, subordinado de Brum. Só não contavam com um obstáculo de última hora: pediu-me socorro um dos listados, ex-PM já falecido, Paulo Roberto Borges da Silva, que estranhara a desenvolta presença dum advogado de bandidos de Acari (Dr. Salvador Meneses Couto); levei então um advogado criminalista, ilustre e digno presidente da OAB de São Gonçalo, Dr. Jorge Antônio da Silva, para patrocinar o solicitante caso fosse necessário. E lá na SSP, depois de avistar o capitão PM Odilon (que fingiu não me reconhecer na maior caradura) junto com o Dr. Salvador Menezes Couto, em sugestivo conluio, deixei o Dr. Jorge Antônio da Silva e fui ao gabinete do Dr. Nilo Batista para denunciar a trama que se verificava debaixo de seus pés. Depois de fazê-lo, obtendo dele a garantia de que não aprovaria nada que fosse ilegal, retirei-me sem tornar ao andar da tramoia e sem avistar as “mães de Acari”.
Sobre a trapaça que ocorreria, basta ler a entrevista de Edméia da Silva Eusébio, uma das “mães de Acari”, publicada no livreto de Carlos Nobre. As perguntas são da mente dele, algumas bastante sugestivas, mas as respostas dela deixam evidente a farsa que caiu por terra ante a OAB representada pelo presidente da seccional de São Gonçalo. Ponho antes o relatório produzido na PM.2 pelo capitão PM Odilon (por sinal, só rubricado para lhe ocultar a autoria, típica de araponga) e apenas parte da entrevista da “mãe de Acari”, esta que sugere claramente a trapaça orquestrada por arapongas com o Dr. Salvador Meneses Couto. Enfim, não estou dizendo nada, quem diz é a própria Edméia da Silva Eusébio, frustrada com inesperado desfecho contrário à sua vontade, com ressalva, porém, quando as indagações do jornalista a mim se referem e praticamente sugerem respostas esperadas para ajustá-las ao meu conceito de “vilão” traçado no livreco.
Vale também o relatório do capitão Odilon a deixar evidente não ter eu permanecido no local do reconhecimento como insinua a entrevistada. A discrepância, decerto, resulta da falta de sintonia do jornalista com o capitão Odilon. Se houvesse, o relatório estaria diferente ou a entrevista teria tomado outro rumo para ajustar uma mentira à outra. Mas como o fato é muito anterior ao livro, e à entrevista, e por talvez o jornalista desconhecer a verdade contida no relato do capitão, houve a discrepância de a Edméia afirmar ter eu permanecido no andar do reconhecimento fazendo “cara feia” (“ameaçadora”) para ela, o que efetivamente não aconteceu, não avistei nenhuma “mãe de Acari” no recinto onde rapidamente circulei até me retirar, lá deixando o Dr. Jorge Antônio da Silva e mais ninguém.
Mas o que importa, para encerrar a esta parte, é demonstrar que o entrosamento do Ministério Público com a PM.2 começa no episódio das “mães de Acari” e se acirra definitivamente em três fatos posteriores: as chacinas da Candelária e de Vigário Geral e a apreensão da “lista do bicho”, fato que gerou muita polêmica e cuja verdade nele embutida jamais será descortinada por esses dois organismos estatais que agiram em inconfessável concurso de vontades nos porões do serviço secreto da PMERJ.























Eis na mesa os documentos geradores da celeuma (lista dos que deveriam ser reconhecidos na trapaça montada nos bastidores da PCERJ pela PM.2 e o relatório do capitão PM Odilon). Ressalte-se que o tumulto havido no local não foi pela presença do Advogado, Dr. Jorge Antônio da Silva, presidente da OAB/SG e assessor do então deputado Emir Larangeira. Como se pode inferir da leitura do relatório, o clima de tumulto aduzido pelo capitão PM Odilon em seu relatório somente rubricado ficou por conta de policiais civis. Neste ponto é fácil perceber, pela fala da “mãe de Acari” Edméia da Silva Eusébio, como o assunto foi deturpado pelo entrevistador Carlos Nobre, destacando-se do inteiro teor da entrevista dela as seguintes indagações e respostas acompanhadas de alguns comentários em caixa-alta (...)

CARLOS NOBRE – Quem era o doutor Salvador? Era advogado dos PMs?:

EDMÉIA – Não, ela andava por aí (FAVELA DE ACARI, ONDE PROVAVELMENTE OCORREU A ENTREVISTA). Como a menina conhecia ele... ele marcou dar os 150 mil que restavam no outro dia. O doutor Salvador veio buscar o dinheiro que faltava. Na segunda-feira, veio um dos PMs que eu não lembro o nome... e falou que ia matar o Moi e o Edinho, porque eles estavam devendo dinheiro a ele. Houve esse problema todo e começou a caça (...)

CARLOS NOBRE – E a participação do coronel Emir Larangeira nisso tudo? Na época ela comandava o 9º BPM?

EDMÉIA – É, o pessoal dele extorquia para bancar o Larangeira. Era tudo a mando dele. Ele também manda matar.

(OBS.: EU NÃO MAIS COMANDAVA O NONO BATALHÃO EM JULHO DE 1990, COMO JÁ ESCLARECI)

CARLOS NOBRE – Tem um grupo de extermínio?

EDMÉIA – Foi esse grupo que veio aqui em casa. O coronel criou esse grupo para matar. Ele também mandou matar om irmão do dono do tráfico de Acari. O nome do rapaz era Paulinho. Foi o Larangeira e o Peninha.



(DESCARADA INDUÇÃO DO JORNALISTA)

CARLOS NOBRE – O Peninha estava nisso tudo? O Peninha de Magé?

EDMÉIA – O Peninha estava nesse trabalho, sim. Ele servia o Larangeira. Os policiais do Larangeira estavam junto, e ele, na área dele, na? Ele é exterminador. Como é que eu sou exterminador, você vai estar nom seu grupo aqui dentro e eu não vou estar participando?

CARLOS NOBRE – E então?

EDMÉIA – Então o Ivanir (IVANIR DOS SANTOS, do CEAP), da Comissão Especial, mandou investigar. Aí o Bira (PESSOA DA FAVELA) começou a dizer que ia matar eu, a S., a Penha e a Neném. Com medo disso, o Ivanir pediu pra botar segurança pra gente: ‘ Vão acabar matando uma mulher dessas, e vai ficar pior. ‘O Bira vinha pulando pelos muros, lá da frente pra trás, com o revólver. Mas via a barreira, e entrava na casa da mãe dele. De repente, quando o Ivanir já estava no cafofo, como diz na gíria, tiraram ele da Comissão especial. O Larangeira tirou o Ivanir.

CARLOS NOBRE – A senhora acha que o Larangeira interferiu para ele (IVANIR DOS SANTOS) sair?

EDMÉIA – Deve ter interferido, porque no reconhecimento dos PMs me botou em pânico.

(DESCARADA INDUÇÃO DO JORNALISTA)

CARLOS NOBRE – A senhora reconheceu algum dos PMs que fizeram a extorsão?

EDMÉIA – Não. Eu não estava em condições, mas a menina reconheceu. Um ano depois, a Rosângela reconheceu todos eles.

CARLOS NOBRE – Quem mais participou do reconhecimento?

EDMÉIA – O advogado, o Salvador. Estava também o advogado do Larangeira e o capitão Odilon, que investigava o caso com o coronel Brum. Em não reconheci nenhum. Quem eu conhecia não apareceu. Então, enquanto a menina reconhecia, o salvador falou: ‘Eu vou reconhecer porque quero ajudar vocês. Isso é muita bagunça, é muita sacanagem. Onde estão os polícia? Isto é o Salvador falando. Mas tava de truta com eles, né? Aí, o filho da puta, esse veado desse advogado, me botou em pânico. Eu tremia tanto que o prédio termia. Parecia que as paredes iam cair em cima de mim. E me deu febre, eu fiquei ruim, não podia andar. Ele, o advogado, falou: ‘Eu vou reconhecer primeiro. Depois você reconhece.’ Quando chegou a hora, os PMs passavam todos na frente... E ele dizendo: ‘Não. Não.’ Aí, eu falei, na hora: ‘Ele tem participação com os polícias. Ele tem de ser cobrado.’ Tanto que ele sumiu daqui também.

CARLOS NOBRE – Qual era o papel do salvador aqui (NA FAVELA)?

EDMÉIA – Eu acho que ele andava assaltando até os marginais. Arrumava dinheiro fácil. Vinha aqui, a polícia tava ali na esquina, ele levava para a polícia: ‘Quero meus honorários.’

CARLOS NOBRE – Então, os policiais pegavam dinheiro do pessoal daqui e o advogado tirava dinheiro dos policiais?

EDMÉIA – Não, acho que o acorde dele era comer junto com os policiais. Acho que quando ele apanhou o nosso, ele comeu. E os policiais alegam que ele não pagou a segunda parte da extorsão. Falaram na minha cara.

CARLOS NOBRE – Esse doutor Salvador, como foi que ele apareceu? Ele tem alguma ligação com a Larangeira?

(DESCARADA INDUÇÃO DO JORNALISTA)

EDMÉIA – Eu não sei de onde ele apareceu, porque nunca tinha visto ele aqui antes. Mas a ligação dele com o Larangeira está na cara. Pra ele não querer fazer o reconhecimento... Ele abandonou a gente. Passava PM e ele, nada. O Larangeira olhava para mim com uma cara de ‘eu vou te matar’ e dizia: ‘Não adianta, que vai melar.’ Até há pouco tempo, ele dizia que ia melar. Eu recebi um recado de gente alta, igual a ele, de lá de dentro, que eles estavam armando. Corri pra botar na reportagem... mas a gente sempre tem medo dele, porque é um safado, ele é exterminador. Do mesmo modo como ele matou o Paulinho, irmão do traficante Cy, ele pode matar a gente. Quando o menino começou a depor para o juiz, ele deu um jeito e matou o garoto. Olha, que ele também vai me matar... mas eu não tenho medo deles, não. Esse é o problema do nosso país. (...)

A longa entrevista, embora maculada por sugestões de respostas a partir de perguntas induzidas, deixa evidente que o tal “reconhecimento” não passava de farsa. Quanto ao Dr. Salvador Meneses Couto, até eu já o conhecia por conta de processo no qual ele próprio me arrolara como testemunha em ação penal deflagrada contra dois traficantes da favela de Acari (clientes dele), cuja reportagem adiante se destaca. A operação policial destinava-se a demonstrar à imprensa que a quantidade de viciados frequentadores da favela de Acari era impressionante, o que garantia um faturamento absurdo, alguns milhões de dólares/mês. Foram presos em flagrante dois bandidos após trocarem tiros com as guarnições. Prestei depoimento no referido processo e os bandidos foram condenados a 16 anos de reclusão, sentença confirmada em segunda instância, prova cabal de que o referido advogado não estava lá na SSP para defender PMs e muito menos para atender a algum interesse meu. Aliás, foi a estranha presença dele a única motivação de o ex-PM Paulo Roberto Borges da Silva ter-me solicitado o patrocínio de advogado, no caso o Dr. Jorge Antônio da Silva, que efetivamente lá permaneceu, mas não foi necessária sua intervenção: o PM não foi reconhecido por ninguém. Eis a matéria, muito expressiva, por sinal; é só conferir o inquérito pela data para se chegar ao processo e confirmar ter sido o Dr. Salvador Meneses Couto defensor dos réus. Resta saber por que ele estava lá, no local do “reconhecimento”, em compadrio com o capitão Odilon... Quanto à afirmação deste capitão de que eu permaneci na SSP, ele mente, pois não sabe por quanto tempo o Dr. Nilo Batista gentilmente me recebeu, retribuindo minha manifestação de respeito pela autoridade dele ao visitar as dependências que ele comandava na condição de vice-governador e secretário de Segurança Pública.


















Muitos por esta hora indagarão: “Por que o tema? Assunto morto, mais de 20 anos, por que ressuscitá-lo?” Ora, não estranhem, prezados leitores, o retorno ao tema procede, e em bom momento o escândalo brasiliense me inspira a relembrar as atrocidades que ocorreram a ainda ocorrem aqui no RJ por conta do entrosamento espúrio entre membros do MP e arapongas da PMERJ, embora abundem sentenças judiciais condenando essa prática detetivesca. Mas a verdade é que ela está viva e permanece transtornando a vida de muita gente inocente apenas para aplacar iras refreadas durante algum tempo e em virtude de decisões judiciais reprovadoras dessas condutas cujos personagens, pasmem, são os mesmos! Há, porém, novos xerimbabos que se vendem em vez de representarem condignamente suas nobres funções policiais e ministeriais. Em vez disso, porém, atacam em tocaia nojosa os alvos de sempre, inconformados por não lograrem êxito em suas trapaças e violências passadas. “Nada de novo sob o sol”, diria o filósofo, os fins políticos no Brasil se resumem ao que outro dia disse um ministro do STF: “O Poder Executivo no Brasil é imperial, não é republicano.” Eu diria mais: “Não é imperial nem republicano: é tirano!”.
A esse caldo de vergonhosa trapaça devemos ainda acrescer a malsinada apuração da chacina da Candelária, que, por conta do mesmo “investigador espiritual”, Brum, transformou inocentes em monstros. O procedimento, para variar, foi o mesmo – um “reconhecimento” – que ao final encarcerou um PM negro por existir um suposto “Pelé” como chacinador, um tenente PM e um serralheiro que, paradoxalmente, socorreram uma das vítimas depois instada a apontar os dois últimos como seus carrascos. Não bastasse, a trama repetiu-se no episódio conhecido como chacina de Vigário Geral, outro “reconhecimento” treinado e perpetrado por um bandido do Comando Vermelho cuja folha penal é de arrepiar. Claro que, conforme a história nos demonstra, o bandido teria de ser do CV e possuir liame material com Rogério Lengruber (o “Bagulhão”), aquele mesmo citado lá no início (dois assaltos a banco com parceiros do líder do CV em outros assaltos enquadrados na Lei de Segurança Nacional). Vejam os leitores o perfil-síntese do marginal Ivan Custódio Barbosa de Lima, usado para “reconhecer” inocentes injustamente acusados pelo bárbaro crime, sendo forte a possibilidade de ser ele, sim, um dos reais chacinadores que jamais acusaria seus verdadeiros parceiros no horrendo crime.












Desse emaranhado de trapaças que se ligam de algum modo, emerge o principal araponga, coronel PM Valmir Alves Brum, que no episódio conhecido como “Lista do Bicho” destacou-se pelo vedetismo a ponto de ser afastado do poder pelo comando da PMERJ (sem macular seu prestígio junto ao MP, com o qual atuou intensamente). A Nota Oficial da PMERJ, encerrando este tomo falará por mim:



É o que, por enquanto, basta!




Nenhum comentário: