segunda-feira, 2 de abril de 2012

Absurdo! Absurdo! Absurdo!... Nada mais que absurdo!




O que mais me espanta nessa discussão sobre a crescente criminalidade é a tendência de trocar o geral pelo particular. Abandona-se a complexidade e tudo ao final se reduz ao simples e até ao simplório nas diversas avaliações que culminam publicadas. Forma-se assim uma aluvião de engodos, uma enxurrada de desencontros e o afastamento de verdades gerais que precisam ser postas num primeiro plano. Uma delas, de natureza geral, como nos ensina Manuel López-Rey desde muitas décadas, foca o “Crescimento Demográfico”:
“A relação entre o crime e a população é direta, no sentido de que quanto maior é a população tanto maior é o número total de crimes. No entanto, essa relação é afetada pela ação de uma série de fatores intermediários, alguns deles inerentes à própria população, sendo que o resultado disso é que muitas vezes o crime cresce mais depressa do que a população. As projeções demográficas são decisivas na formulação de muitas ações políticas, mas até agora seu papel tem sido modesto em relação à política criminal.”
Sei que é chato apelar para teorias quando a maioria almeja a reclamação imediata e a crítica irada ao ineficiente e ineficaz sistema de segurança pública, como é o caso em comento. De tal modo é o vício do cachimbo que a PMERJ vem a público se justificar pela morte do médico, lamentável em todos os sentidos, como se ela, a PMERJ, respondesse sozinha pelo fracasso do todo que é mais que ela. Tanto que não se vê na matéria uma linha de entrevista dos representantes da Polícia Civil, responsável direta pela investigação criminal não apenas após a ocorrência de algum crime, mas na repressão de ações criminosas sequenciais e repetitivas, singularizando e prendendo como autores e culpados os mesmos meliantes que se sabem impunes se burlarem o policiamento ostensivo da PMERJ. Como diz o ditado cujo autor não me vem agora à memória: “Quando alguém percebe ser possível cometer um crime impunemente, comete-o!”
Ora, a coirmã não pode se reduzir à anotação de ocorrências criminosas em seus balcões. Nem a mídia deve se reduzir à comodidade de ouvir parentes e amigos das vítimas, geralmente leigos, ou políticos desinteressados em criticar com veemência os governos dos quais fazem parte direta ou indiretamente. São críticas vazias, ou emocionais, que culminam sepultadas com as vítimas até o próximo ato deste teatro de horrores que vem de longe no tempo. Na verdade, há uma impressionante preocupação com o “como” as coisas aconteceram e não com o “por que” as coisas podem acontecer. Não há visão prospectiva na avaliação do problema do crime no RJ. O imediatismo prospera e a deturpação daqueles “fatores intermediários” (ou seu mero esquecimento) responde pelo caos atual que põe Niterói no centro da atenção enquanto no seu entorno ocorre o mesmo sem tanta difusão, o fato maior (assassinato de um médico) obscurece os menores, que são muitos e variadíssimos.
Enfim, há o destaque da exceção caracterizada por um inaceitável crime de sangue, eis que tendente a superar em gravidade os demais, olvidando-se os fatores intermediários que devem ter contribuído para o desfecho trágico e deste modo continuarão a gerar outros crimes de sangue e notícias iguais aqui e algures, ontem e hoje. Tanto tem sido assim que aproveito para dedicar à família do médico assassinado o mesmo texto que dediquei a uma menina linda, filha de médico e estudante de medicina, que partiu deste mundo com um tiro no coração desferido por um casal adolescente que talvez nem esteja mais trancafiado. O texto prova que nada mudou debaixo do céu niteroiense...


Michelle, nossa filha


Tudo é contraste no mundo. Que seria da luz se não houvesse trevas? Que seria das trevas se não houvesse luz? E se tudo fosse luz, ou apenas trevas, como seria o mundo?... Mas, enfim, existem luz e escuridão, assim como tudo mais é pura energia que se contém nos mundos microscópico e macroscópico. Nada há fora deles... Ou melhor, pode até ser que haja, sim, quem somos nós para saber? Por acaso temos capacidade de perceber integralmente esses dois estranhos mundos? Claro que não! Sabemos, todavia, que ambos formam um mundo único e em permanente movimento, embora tenhamos a imperfeita noção de que muita coisa é estática, quando, na verdade, tudo se transforma e caminha em direção ao desconhecido. Assim é o nosso universo, ao mesmo tempo atomizado e infinitamente grandioso. E, não fosse a inteligência humana, não admiraríamos o macrocosmo das galáxias e jamais enxergaríamos o microcosmo dos átomos. Tudo, enfim, é energia, e energia é vida e morte...
O mundo de hoje tem telescópio e microscópio, e assim, de certa forma, vemos, mesmo que parcialmente, o maior e o menor existindo num tal determinismo que, independentemente de raciocinarmos, o galo canta ao romper da aurora, o tempo passa, e o pensamento leva-nos aos pontos máximos ou mínimos da certeza ou da incerteza, porque, mesmo com toda tecnologia disponível, ainda não conhecemos nada da vida e da morte. Nascemos e morremos como matéria efêmera, receptáculos de uma energia que decerto existia antes do nascimento e existirá após a morte. Negar esta evidência é admitir o nada, é apagar a vida antes de ser concebida. Só existe a morte porque há a vida antecedendo-a; só existe a vida porque uma energia organizou-se para materializá-la. Vida e morte são, pois, mutações duma energia que subsiste independentemente de ambas. Ou será que vida e morte não passam de mais um contraste neste mundo de Deus?
Eis a indagação sempre presente em nossas mentes, tanto que a sentimos muito mais do que aqueles que não pensam... Pelo menos assim nos determinamos, ou seja, que os animais não pensam, como se nos fosse possível penetrar o mundo invisível do instinto animal, e como se nós, humanos, não o tivéssemos (o instinto), quando, na verdade, temo-lo até de modo desmedido e irracional. Sim, eis o contraste diante de nós, “pensadores”, que, porém, negamos o instinto e o atribuímos muitas vezes, e exclusivamente, aos animais, estes que vivem em perfeita harmonia com as coisas do mundo perceptível e imperceptível, ao passo que nós, “pensadores”, nos colocamos em escaramuça irracional e destruidora dessa harmonia. Enquanto isso, o galo canta, o tempo passa, e assim, neste mundo de contrastes, de sim e não, neste mundo maniqueísta que dizem ser de Deus e do Diabo, vamos existindo em permanentes dúvidas. Uma, o Criador, é o sim; a outra, o Diabo é a negação. O Primeiro é o Bem e o segundo, o Mal. Assim, pois, estaria o mundo reduzido, não existisse algo que transtorna esta simplicidade: o sentimento.
Eis a pitada do sal no alimento, ou o açúcar que garante o doce; eis, novamente, o contraste à disposição do livre-arbítrio humano, lembrando-se aqui, porém, que há o insosso e o amargo, ou não há nem um nem outro. No animal dito irracional a ação é reduzida ao instinto e naturalmente limitada à luta pela preservação da espécie; em nós, é algo mais, é buscar vencer todos os limites, é sentir concomitantemente as coisas do mundo. É construir, mas é também, e insensatamente, destruir... Por quê?...
Ora, que seria do mundo se todos os humanos, como os bichos, vivessem apenas por viver, sem a percepção do início e do fim, sem emoções? É, dizem que somente os bichos-homens percebem antecipadamente o seu fim terreno, e que os animais são desprovidos de razão e emoção, tudo neles é simplesmente instinto, algo puramente mecânico, reflexos condicionados etc. Enquanto isso, a mãe macaca despeja lágrimas ao perceber a arma do caçador para si fatalmente apontada, e lhe mostra a cria. Por quê?...
Bem, o mundo é assim, feito de contrastes, e com eles permanece inelutável e eterna a dúvida sobre a finalidade de tudo. Que será essa finalidade tão impalpável?... Qual a resposta?... Por que tudo é assim?... Diriam os ardentes defensores do absurdo que tudo é tão absurdo que o melhor é crer apenas nele, no absurdo; ou melhor, descrer de tudo ou nem mesmo pensar, como o fazem muitos humanos que nascem em isolamento, vivem na ignorância total e, deste modo, vão à morte. Mas, mesmo estupidificados ante o ininteligível fim, não se conseguem alhear do fato de que nascem e morrem, e talvez por isso é que emerge o sobrenatural até entre os mais recônditos grupos humanos e por mais rudimentares que o sejam.
Os humanos, na verdade, instituem meios de compreensão de suas próprias existências e as justificam crendo na vida eterna, no espírito imortal, porque é certo que a outra vida, – materializada ante seus olhos, que veem seus próprios corpos e os de seus semelhantes às vezes apenas nos espelhos d’água, – esta outra vida eles a sabem inexoravelmente finita. Teria alguma lógica a crença num espírito além da matéria que se degenera no decorrer do tempo terreno?... Ou seria tudo apenas lógica conveniente? Eis a questão crucial, traduzida no mais contundente contraste humano: crer ou não crer.
Muitos creem de modo ímpar, afirmando não existir o sobrenatural, e que tudo, enfim, é verdadeiramente natural, seja matéria sólida ou fluídica, ou corpo, ou alma, ou perispírito, ou espírito. Mas, seja qual for a crença ou a descrença, ninguém duvida de que o corpo se degenera, morre e torna-se pó. Isto é indiscutível. Daí as incertezas sobre o além-mundo... Mas, enquanto pairam estas incertezas, o ser humano sente a vida pulsar dentro de si e se emociona; alegra-se e se entristece; ri e chora; aplaude e vaia; acaricia e agride. Eis o sentimento, inusitado e dependente, de inúmeros fatores externos e internos envolvendo pessoas e situações em decorrência das quais essas pessoas reagem. Eis o sabor da vida, os cinco sentidos, o sal ou o açúcar, ou ambos, sabores variados que se nos apresentam em matéria; eis o sabor da vida, que nos toca em pensamentos e emoções enquanto vivemos. Eis a vida inteira e única: do corpo e da alma e do espírito, como nós, cristãos, acolhemos como Verdade, o que não significa dizer que outros caminhos para se chegar à Verdade não sejam também verdadeiros.
Toda esta digressão, feita em confusas cabriolas dos meus cansados neurônios, representa uma tentativa de compreensão de mim mesmo ante o que me ocorreu em apenas um dia. Em 24 de janeiro de 2002, saí de casa para renovar minha carteira de motorista. Pensei em aproveitar o tempo e o lugar para aclarar algumas pendências na Secretaria de Segurança, como sempre lutando contra meus intangíveis “moinhos” contemporâneos, tentando impertinentemente vencer as volumosas injustiças praticadas por superiores contra subordinados no cotidiano da PMERJ, geralmente por conta da irracionalidade e da irascibilidade que infelizmente se situam como prioritárias no trato entre superiores e subordinados milicianos.
Bem, fui ao DETRAN, e logo me frustrei ao ver-me derrotado pela burocracia que me obrigou a tirar retrato, a pagar um tal “DUDA” e a ter de marcar, por telefone, as demais obrigações, apesar de já estar dentro do lugar que receberia o tal telefonema e que providenciaria as marcações, algo no mínimo estranho, para não dizer estúpido. Coisas da modernidade, ou... Ora, não importa, ficou a carteira de motorista para um tempo posterior, logicamente condicionado ao fato de eu continuar existindo no mundo, algo que nunca se sabe...
Perdida a contenda contra o meu primeiro “moinho”, parti ao segundo: fui ao 15º andar do mesmo prédio, à sede da Secretaria de Segurança, por esta hora bufando em indignação, achando-me o mais prejudicado dos homens, reclamando das injustiças desferidas contra alguns policiais-militares as quais tentaria solucionar através da minha “veia política” (diabo de veia, que me inquieta o tempo todo e não a consigo evitar!). Em chegando, – e enquanto buscava pelos intrincados corredores as pessoas certas (ou erradas), “dando carteirada” aqui e ali, – culminei frente a um velho amigo: Dr. Wagner de Moraes. Ao vê-lo, percebi nos seus olhos um brilho incomum, uma singular alegria, um ar sereno e superior. Deslumbrei, na verdade, em seu rosto, um semblante de Anjo. E pensei em Michelle, sua filha, e – por que não dizer? – também minha filha e de todos aqueles que souberam do modo trágico que a levou deste mundo.
Enfim, Michelle, nossa filha... E assim, de súbito, senti-me diminuto ante aquele pai, um amigo curiosamente distante e próximo de mim por laços indiretos de amizade e parentesco com pessoas sempre presentes na vida de nós ambos. E, vendo-o, lembrei da Michelle desde que a vi, ainda pequenina e muito linda, nas festinhas de aniversário na casa do Glerson, lá em São Gonçalo, até a última vez em que nossos olhos se cruzaram, no Clube Canto do Rio, em festa de Bodas de Prata de Roberto e Marlene. Coincidentemente, minha mesa ficava bem em frente da que Michelle ocupara com seus familiares. Pude, por isso, apreciar a beleza da moça e sua leveza de espírito traduzida num olhar meigo que ela me lançou em saudação. Sem dúvida, Michelle era uma menina especial, educada e discreta, linda, e elegante no ponto certo.
Sim, naquele dia de festa, pude notar que Michelle transformara-se numa bela mulher, e lhe desejei em pensamento um primoroso futuro. É o que sempre almejamos para as pessoas que aprendemos a amar do melhor modo, um amor paternal que, no caso dela, e mesmo sem muito notar, me vinha no coração desde os seus tempos de anjo-criança. Sim, porque não há pai, desde que seja normal, que não ame os filhos de pessoas que gosta como se fossem filhos seus. Assim apreciei Michelle, por conta de um destino que me pôs diante da linha permanente dos seus olhos. Acho que já ali vislumbrei um Anjo...
Foi terrível receber o impacto da tragédia. Portador de afecção cardíaca, confesso que não tive coragem de compartir com a família enlutada da dor de ver um ser humano cheio de vida e futuro promissor sucumbir ante a crueldade de criminosos implacáveis e possuídos pelo demônio. Às vezes não entendo por que Deus permite que demônios também destruam nossos corpos, mesmo que não atinjam nossas almas... Ou melhor, concordando com Wagner de Moraes, creio que Deus permite que tal aconteça por excesso de amor a determinadas almas, e que, por isso, logo cedo as transforma em Anjos.
Aceitando ou não a contradição de ver morrer quem não merecia, a verdade é que acompanhei a passagem de Michelle com tristeza e indignação, além de ficar extremamente frustrado comigo mesmo por não ter feito mais, como policial, para evitar que tragédias assim continuem acontecendo. Creio que a morte de Michelle despertou em todos nós, policiais, o sentimento da derrota, um profundo desgosto por perder mais uma batalha contra o crime, pois Michelle teve de morrer para nos provar que pouco ou nada fizemos ou fazemos, que somos covardes diante desses animais ferozes, que se dizem humanos, mas não o são, pois saem por aí matando pessoas indefesas pelo simples prazer de matar. Por isso somos covardes, e aqui não me refiro somente aos policiais, mas também a outros segmentos governamentais ou particulares que deveriam ser menos condescendentes com os criminosos e mais compreensivos com os policiais. Mas esses apologistas do caos, lamentavelmente, vivem na mídia justificando as loucuras dessas bestas-feras em nome de ideologias inconfessáveis. Por isso somos, mesmo, uns covardes, e Michelle é, antes de tudo, vítima da covardia deste malicioso sistema que permite a proliferação de bestas-feras pelas ruas da miséria e da violência gratuita e impune!
Bem, a verdade é que, como muitas outras vítimas indefesas, Michelle, nossa filha, se foi, e seria apenas mais um traço estatístico nos anais da polícia, – e notícia efêmera em jornais sensacionalistas, – se não tivesse o pai que tem, e ela sempre e eternamente o terá, pois ele a mantém viva em nós, assim como sua obra humanitária acenderá uma nova Luz a rebrilhar nos Céus por todos os tempos, pois este pai reencontrou a filha identificando pela fé a Luz de um Anjo, a Luz de Michelle — a nossa filha.
Não sei por que razão, tão especial, eu senti uma emoção diferente ao rever Wagner de Moraes naquele 24 de janeiro de 2002. Talvez o lugar me tenha levado a lembrar o jovem que comigo participara do concurso para a EsFO, em 1966, fora aprovado, mas preferira a medicina porque igualmente lograra êxito naquele outro vestibular. Enfim, ainda novo, Wagner de Moraes dava provas de que viera ao mundo para vencer no campo de estudo que bem quisesse e na profissão que escolhesse. Foi o que fez: tornou-se médico, não apenas mais um entre muitos, mas referência nacional e quiçá internacional por sua excelência. Tornou-se motivo de orgulho para os niteroienses; deixou de ser um anônimo profissional para projetar toda a classe médica no cenário da cidade-sorriso; fez o Rio de Janeiro ter a certeza de que Niterói merecia e merece destaque por sua medicina exemplar.
Em Wagner de Moraes, – e apenas devido à sua reconhecida competência, – o médico superou seus limites profissionais, transformando-se, ele, em importante figura pública. Sim, o médico de repente começou a exercer sua MISSÃO além da medicina; não se pôde travar no anonimato, como muitos outros excelentes médicos o conseguem. Na verdade, não era questão de vontade dele, mas uma incumbência divina que inelutavelmente lhe surgia. O que ninguém esperava é que o preço desta incumbência, – que assim se evidenciava antes mesmo da tragédia, – lhe fosse cobrado tão duramente. Contudo, como conhecer a MISSÃO senão através de um valor de tal modo significativo que o despertasse para a necessidade de realizar uma função terrena de tamanha envergadura? Como Deus o poderia motivar a cumprir tão grandiosa tarefa?...
Deparei com meu amigo e senti sua obstinação naqueles corredores formais; e vi meus “importantes moinhos” se desmoronarem como castelos de areia diante da montanha que ele, Wagner de Moraes, – como um dia Sísifo recebeu em castigo, – ele, Wagner de Moraes, não como castigo, mas voluntariamente, dera para si. Mas o que para Sísifo era e continua sendo castigo, para Wagner de Moraes é MISSÃO, algo que ele, por seu livre-arbítrio, decidiu fazer para mostrar ao mundo que sua filha Michelle não partiu em vão. Assim o faz para provar que sua querida filha está ainda mais viva dentro dele e de nós, através da mensagem de fé que ele, pai extremoso, nos vem transmitindo desde o dia em que Michelle se tornou Anjo do Senhor integrado ao Exército Celestial para combater o Mal.
Vá em frente, amigo, porque, diferentemente de Sísifo, que continua a empurrar sua pedra montanha acima, para vê-la, desalentado, rolar montanha abaixo, você, ao contrário, tem muita gente disposta ajudá-lo a transformar sua pedra em nuvem, e assim vencer a montanha e elevá-la aos Céus. Você tem a vontade de Deus que o impele em direção à vitória da luz sobre a escuridão. Michelle, nossa filha, está viva, sim, através de você e de todos os milhares de seres humanos que, ombro a ombro com você, estarão sempre a multiplicar a idéia de que a melhor vida não está aqui, mas lá, ao lado do Criador de tudo: nos Céus, onde Michelle, nossa filha, é uma Luz tremeluzindo em maravilhosa eternidade. Mas, que me desculpe o querido amigo, – exemplo de pai e de homem, – prefiro que os matadores dela recebam aqui mesmo, na Terra, um castigo semelhante ao imposto a Sísifo pelos deuses do Olimpo!...




26/01/2002


Com muito carinho e respeito, do amigo


Emir Larangeira

5 comentários:

Paulo Xavier disse...

Cel Larangeira.
Quando vejo nos noticiários a violência que assola Niterói, fico triste. Sou macaense mas guardo um carinho especial por Niterói, que me acolheu exatamente em 1973, quando entrei para a PM. Niterói é também o berço do meu único filho, hoje com 26 anos.
Fico triste e volto ao passado quando no comando de uma guarnição de Patamo, adentrava em qualquer comunidade, morro ou favela à procura de delinquentes, armas e drogas.
Éramos respeitados e o bandido que ousasse a nos enfrentar geralmente estava decretando seu fim de carreira, definitivo ou temporiamente. Por algumas vezes sentei no banco dos réus por não exitar em responder à altura, qualquer agressão vinda do lado dos criminosos, e fazia com a consciência do dever cumprido. Infelizmente hoje percebo que muita coisa mudou...para pior. A população está acuada e trancafiada dentro de suas casas, enquanto a bandidagem está solta, matando e roubando impunemente.
Entristece-me muito saber que não servi para a PM, quando todos sabiam que jamais transigi com o crime e com os criminosos.
Bom, graças a Deus superei tudo, estou bem, aposentado e quietinho na minha doce Macaé.
Meu obrigado e um abraço a todos que leram até o final esse desabafo. Paulo Xavier

Emir Larangeira disse...

Prezado Paulo Xavier

Não há mais polícia e policiais como antigamente. Lembra-me um juiz de direito, cujo nome omito, dizendo que em Niterói bandido achava nota de um cruzeiro e tinha de sair feito louco procurando o dono. Hoje são outros tempos, tempos de anomia, tempo de pujança do banditismo, em especial porque de um período para cá, que chamam de "abertura", os bons policiais passaram a ser tratados como vilões e descartados em monstruosas injustiças. Sem falar naqueles que preferiram a baixa a se submeter aos novos tempos de bandidos mandando na política.
O resultado aí está, e tende a piorar por conta desse socialismo marrom que destrói o país com a conivência passiva do povo. Vejo, pois, um futuro sombrio, para azar de nossos filhos e netos. A não ser que... Ah, deixa pra lá!

Luiz Monnerat disse...

Prezado Larangeira,
talvez tenham sido os dois dos mais belos textos produzidos por você, o prólogo e a pungente e verdadeira ária em homenagem a um anjo chamado Michelle, onde como que tomado pelo desespero que antevia como natural e esperado naquele pai a ofertou como um bálsamo já oferecido a outro pai em situação idêntica. Além disso, você se excedeu, como que por obrigação, enxergando-se como pai e como policial militar, sem se esquecer do cidadão comum existente na nossa essência, normalmente exasperado por pequenas coisas que infernizam e nos derrotam por pouquíssima coisa. Quando se extrapolou, sem que sentisse, utilizou-se da dialética socrática para conduzir um discurso que considera urgente para todos os que se encontram em matéria,em meio às trevas, pois ai delas se não houvesse a luz! Então, na maiêutica, nos fez deparar com o que asseverava Tomaz de Aquino, que com a razão é dado ao ser humano a possibilidade de encontrar Deus.
Sinceramente, estou certo de que raros foram os que conseguiram conter a emoção diante da beleza com que você desnudou os seus sentimentos. Parabéns e obrigado com um grande abraço de irmão, Monnerat.

Emir Larangeira disse...

Muito obrigado, irmão Monnerat! É bom saber que não apenas o meu coração de "cidadão-policial-pai-e-avô" sofre com esses absurdos.
Abs.

Paulo Xavier disse...

Brilhante a colocação do Cel Monnerat.
No ímpeto de egoisticamente falar de mim, não fiz menção à bela e confortante prosa falando da Michelle. Não há mais o que dizer sobre a passagem dessa moça, o mestre Larangeira o fez com a sabedoria que lhe é peculiar.
Minha continência aos dois Oficiais, duas reservas morais da PM que tenho orgulho de ter sido comandado.