domingo, 11 de setembro de 2011

Sobre os Autos de Resistência e seus problemas



Fonte: Internet





Embora a crônica policial forneça vasta prova de que o crime organizado do tráfico é mais poderoso do que supomos; embora os exemplos do poder do tráfico ao redor do mundo, destacando-se o México, são mais que convincentes; embora os países desenvolvidos estejam perdendo a batalha contra o tráfico, que continua pujante na ponta da linha e na sua origem (plantio e produção e distribuição da coca e seus derivados, demais de outras drogas ilícitas), sublinhando-se aqui a Colômbia e a Bolívia; embora as evidências do crescimento e da sofisticação do tráfico sejam aberrantes, o comportamento daqueles que o deveriam levar a sério e instituir contrapartidas capazes de vencê-lo resume-se à desídia.
Pior que desídia, muitas das instituições que se deveriam pôr na vanguarda do enfrentamento ao narcotráfico ocultam-se atrás da estaca para destruir em ciladas judiciais o único braço governamental a enfrentar o tráfico na ponta da linha: a polícia. E o tráfico, aparentemente acuado em algumas comunidades onde UPPs são instaladas, parece que resolveu sair da forma cística exatamente em antevéspera e véspera de 11 de setembro, data que jamais será esquecida por muitas gerações. Será coincidência ou se trata de orquestração inspirada na data fatídica?...
Mais grave, porém, é saber que o ânimo da polícia tende a arrefecer ante as retaliações de outros sistemas que estão questionando Autos de Resistências e enquadrando PMs em homicídios, inclusive qualificado, como se nas favelas os traficantes os recebessem com arco e flecha e estilingues. Ora, os bandidos de hoje portam fuzis poderosos e não têm pejo de usar contra PMs, estes que não podem deixar de combater o tráfico sob pena de prevaricação, crime menor que poderá ser preferido pela tropa da PMERJ, para gáudio dos traficantes, podendo-se supor que a inação é a maior geradora de propinas (arregos e areglos) e chacinas.
É o que a sociedade almeja? Será que voltaremos aos tempos da omissão e das chacinas? Será que as autoridades, por conta de fatos pontuais gravíssimos, optarão pela retaliação coletiva em “castigos-espetáculos” de PMs para “dar resposta à sociedade”?... Será que essas autoridades não dispõem de poder suficiente para “dar resposta” com apuração séria e isenta, singularizando individualmente os verdadeiros criminosos? Será mesmo que precisam apelar para a “punição política”, alardeando-a em prejuízo da imensa maioria de PMs, que, a medo de represálias, poderão evitar futuros confrontos com traficantes? Será que essas autoridades sabem como se dá o entrechoque entre PMs e traficantes em favelas? Será que vão questionar igualmente os Autos de Resistência lavrados por policiais civis, ou vão se fixar apenas nos de PMs porque alguns deles, desviados de conduta, supostamente assassinaram uma juíza?
Preocupam-me as últimas notícias de ataques a PMs de UPPs. Num momento em que a tropa já se vê acuada por “tiro amigo”, exigir que ela reaja aos agressores significa adentrar o campo movediço dos Autos de Resistências agora “politicamente” questionáveis. Então, não seria melhor o PM não matar para não ser preso? Porque é certo que a “solução” de São Gonçalo, levada ao extremo da cobrança política, estenderá seus efeitos negativos à tropa de toda a PMERJ. E não será surpresa se amanhã algum PM se recusar a receber no setor de material bélico do batalhão o fuzil destruidor que o Estado lhe determina usar contra bandidos, embora seja exatamente fuzil a arma preferencial do bandido.
A que ponto esse imbróglio chegará? Qual será a capacidade psicológica da tropa da PMERJ para suportar tanta pressão vinda de fora por uma imprensa que parece satisfeita com as medidas alardeadas como “resposta à sociedade”, mas que necessitam antes ser apuradas com isenção, mesmo que a vítima seja uma arraia-miúda e não uma personalidade do mundo judicial?... Qual a relação do assassinato da juíza com o poderoso narcotráfico? Será que seus matadores não estariam mancomunados com traficantes, e seu assassinato tenha decorrido de mando altamente remunerado? Ou será que a juíza foi assassinada por PMs que mataram bandidos e orquestraram Autos de Resistências, que, por sinal, não costumam ser bem conduzidos em delegacias, estas que também lavram seus próprios Autos de Resistência?
Independentemente da apuração e da punição justa aos assassinos da juíza, indaga-se em acréscimo: onde estará a falha do sistema? Não estará a verdadeira culpa no andar de cima?... Ou será que tudo simploriamente se explica pela malícia de alguns PMs que enfrentam e matam bandidos achando que sairão ilesos das escaramuças e culminarão beneficiados pela Justiça? Seria esta a lógica dos confrontos diários contra traficantes armados até os dentes?... Talvez... Talvez... Ora! Falta apuração rigorosa, cada caso é um caso, e parece que a antiga prática de fabricar culpados por via de falsas opiniões está a renascer com todo vigor. E, diante desse quadro de desestabilização da PMERJ, e em vista da violenta criminalidade que precisa ser combatida, mas não se sabe como, resta-nos rezar para que as autoridades públicas opinantes repensem atitudes e pautem seus atos pela isenção. Não me parece, porém, que a grave questão se encaminhará para uma solução justa...
Por outro lado, a banalização dos Autos de Resistência é uma cruel realidade a ser revista. A começar pelo “socorro” às vítimas, com muitos bandidos “morrendo ao dar entrada em nosocômio” (coloco entre aspas por ser assim mesmo, “entre aspas”). Ocorre que, se o PM não socorrer a vítima ainda respirando e/ou a demora do socorro solicitado no local produzir a sua morte, é também crime a ser-lhe posteriormente cobrado. Também preservar local de morte em favelas, debaixo de tiroteio, não é tarefa simples, demanda pedido de reforço e permanência de aparato durante a perícia e até a retirada dos corpos.
Tudo isto implica uma decisão importante por parte da PMERJ para preservar o ânimo da tropa: só permitir incursão em favelas após planejamento e expedição de Ordem de Operações listando os efetivos empenhados e seus respectivos comandantes, sendo certo que o velho “M-4” desde muito tempo ensina que não se deve operar em favelas com efetivos menores que DUAS PATAMOS comandadas por OFICIAL SUBALTERNO. Cumprir esta regra mínima* seria prudente, pois as ações aleatórias e destoadas da regra são as geradoras de Autos de Resistência que culminam em trancafiamento judicial de PMs por sua inaceitabilidade posterior.
* Para quem não se lembra da regra mínima, a PMERJ preocupou-se em instituir o MANUAL BÁSICO DO POLICIAL-MILITAR, o “M-4”, aprovado por ato do Comandante-Geral em 05 de dezembro de l983. O manual abrange orientações direcionadas inclusive ao homem isolado, mas interessa a sublinha de parte do Capítulo VI − PATRULHAMENTO TÁTICO MOTORIZADO − SEÇÃO I (...):





“Art. 136 − O Patrulhamento Tático Motorizado (PATAMO) difere da Radiopatrulha (RP) essencialmente no que diz respeito à maior mobilidade, dinamismo, flexibilidade e emprego maior de recursos, armamento e pessoal, exercendo ação preventivo-repressiva no combate à criminalidade.
Art. 137 (...)
Parágrafo 4º (...)
4) atua normalmente próximo a subidas de morros, ou onde houver favelas (...)
7) deve, sempre que possível, atuar sobre roteiros preestabelecidos pelo comando da UOp, objetivos e cronológicos, de acordo com as necessidades da área.
Art. l38 − Como a PATAMO atua sempre na ofensiva direta contra o crime, indo de encontro à ocorrência, deve-se ter sempre em mente que: (...)
Parágrafo 2º − É necessário que todos estejam familiarizados com a conduta de combate do grupo, e cada um tem de saber a sua função e também o procedimento de seus companheiros.
Na Seção VI, sob o título Ação em Favelas, há a seguinte orientação:
Art. l46 − A ação em favelas deve ser executada com 2 (duas) viaturas do PATAMO, no mínimo. E finalmente recomenda, no Art. l50, que se "for utilizada mais de uma viatura PATAMO para o patrulhamento em conjunto, o comandante será um Oficial Subalterno."

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