“A sociedade brasileira de forma consciente ou inconsciente tem sido vítima ao longo da história de três grandes males: o furor arrecadatório, o delírio regulatório e a impunidade.” (Thomas Tosta de Sá – O Globo/Opinião – 18 de junho de 2011)
Embora a violência seja um fenômeno mundial, multivariado e dependente de causas diversas, não se há de negar seu acirramento no ambiente social do Grande Rio, podendo-se incluir alguns conglomerados urbanos do interior do RJ igualmente assolados por essa inegável calamidade social.
É tão grave a violência, não apenas a decorrente da criminalidade, mas também dos conflitos absurdamente banalizados, como a guerra entre torcidas organizadas, que a população a mais e mais se tranca a sete chaves em residências gradeadas e condomínios fechados, evitando sair à noite e até mesmo durante o dia.
O medo impera no espírito dos cidadãos e as reações contra a crescente violência urbana são tímidas ou eivadas de discursos ideológicos favoráveis aos criminosos, dentre os quais os adolescentes privilegiados por leis frouxas e estimuladoras de delitos, que vão dos mais leves aos gravíssimos (tráfico de drogas, roubos, homicídios, latrocínios etc.).
Infelizmente, a violência segue impune diante de uma maquinaria estatal viciada em crimes de fraude e sangue. Ora, a impunidade é a principal causa da violência, é estímulo à prática de crimes e não parece haver disposição de ninguém, nem da sociedade nem do Estado, para alterar esta calamitosa situação. Com efeito, a passividade impera e o banditismo se fortalece apoiado ideologicamente por midiáticos políticos defensores dos “direitos humanos”, aqui entre aspas porque é tão distorcido na nossa sociedade que não merece respeito.
Os meios de comunicação respondem por boa parte desse falso glamour, com destaque para as telenovelas a ensinarem vícios abomináveis, tornando-os banais e repetitivos a ponto de serem aceitos como normais e imitados por adolescentes e adultos. Os valores morais, nessas telenovelas, são confundidos a pretexto da defesa de minorias, indo às raias do exagero as viciadas interpretações em horário nobre.
Vivenciamos na nossa sociedade o absurdo! Não há mais parâmetros éticos na convivência social, e seria cansativo enumerar os fatos do cotidiano que ceifam vidas humanas gratuitamente. Exemplo clássico foi o do filho da atriz Cissa Guimarães, atropelado e morto por um jovem dirigindo em alta velocidade dentro dum túnel interditado, o mesmo escolhido pelo filho dela para praticar skate de madrugada. Complementaram esses comportamentos absurdos o desvio de conduta dos PMs que acorreram ao local e a ação criminosa do pai do motorista atropelador a tentar subornar os PMs. Enfim, uma sucessão de erros morais e éticos, um cesto de ilegalidades tratadas em separado pelos meios de comunicação social com o foco no desvio de conduta dos PMs, de tal modo que o jornalista Zuenir Ventura, em artigo publicado no Jornal O Globo (Opinião) na ocasião, acabou insinuando que até parecia que os PMs praticaram o crime mais grave no contexto do somatório de crimes vários.
Toda essa doentia permissividade, porém, não é alcançada nem coibida pela midiaticamente aclamada “Lei Seca”, artifício de vigilância e punição que só tem servido para ilustrar a imprensa quando autoridades ou famosos são surpreendidos por agentes públicos dotados dum exagerado poder que deveria ser exercitado pelo Judiciário. Esse mau uso do Poder de Polícia pelo executivo municipal é descaradamente legitimado pela mídia, e o povo adora ler a notícia de mais um figurão em apuros. Ora, isto é pura trapaça num país em que a ética se tornou piada. Penso assim, mas, para que não concluam que me vingo, esclareço que jamais fui surpreendido por essa e outras blitze geradoras de incômodos nos cidadãos contribuintes, incluindo-se aquelas perpetradas por assaltantes imitando policiais. Haja violência contra o cidadão no RJ!
Cá pra nós, cumpri trinta anos de serviço na PMERJ e poucas vezes participei de blitze e muito menos a determinei enquanto comandante de unidade operacional. Parar carros nas vias públicas atravancando o trânsito, revistar pessoas por mera suspeição, fundando essas desnecessárias ações policiais no Poder de Polícia é para mim absurdo. Isto é falta de conhecimento profissional ou do que fazer no labor de polícia. É abuso de poder, não é prevenção de coisa alguma.
No fim de contas, não é para incomodar que a polícia existe, mas para proteger a população e apoiar o cidadão. Essa prática das blitze geralmente acarreta mais violência, pois não são poucos os casos de pessoas assustadas morrerem a tiros apenas porque furaram as barreiras policiais pensando ser de bandidos, como ocorreu com um Juiz de Direito e seus familiares no Alto da Boa Vista. Mais hilariantes são as desculpas oficiais ante a morte de crianças dentro de carros, colégios e favelas. Ora, quanto vale a vida de uma criança? Como pode um policial atirar apenas por suspeitar? Como pode errar tanto tiro? Que diabo de polícia é essa?
A verdade é que o Estado, ineficiente e ineficaz no combate ao crime, apela para incômodos do tipo “Lei Seca” ou para blitze aleatórias a fingir competência. E a mídia exalta, e os leitores aplaudem, e o povo ordeiro que se dane, pois não pode se distrair nas emboscadas dos “pardais” nem beber coisa alguma, é “crime grave”. Enquanto isso, a verdadeira criminalidade de fraude e sangue aumenta deveras, e o cidadão não mais sabe se deve enfiar-se debaixo da cama a medo do bandido e evitar as ruas adrede apavorado ante a possibilidade do encontro com o agente público em acintoso abuso de poder. Pior que acobertado pela Justiça, pois está “cumprindo com seu dever”, algo tão subjetivo quanto o próprio Poder de Polícia, difícil de ser mensurado para se concluir ou não pelo abuso.
Nesse vácuo entre o legal e o abusivo (ilegal) é que se vê a polícia agindo em nome do Estado repressor, ou então trocando tiros em favelas matando inocentes, cena que se repete à exaustão e amplia sobremodo a violência física e psíquica contra quem deveria ser protegido e servido, pois paga muito caro em impostos e multas para tanto. Será que não basta a violência promovida impunemente pelos criminosos? Já não chega de hipocrisia e de tangenciar a realidade? Não será hora de diminuir a violência do Estado contra o cidadão reagindo-se aqui como reagem na Grécia?...
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