segunda-feira, 6 de junho de 2011

Tristeza e indignação













Pra começo de conversa, sou independente em minhas ideias e não abro mão da minha liberdade de expressão − tesouros intocáveis que levarei ao túmulo. E estou muito triste com o desagradável desfecho da manifestação dos companheiros bombeiros-militares... Dito, reinicio anotando minha perplexidade ante os últimos acontecimentos que culminaram no desigual confronto entre irmãos PMs e BMs.
Ontem, domingo, dia 05 de junho de 2011, às 08:00h, passei de táxi pelo Quartel Central do Corpo de Bombeiros, na Praça da República, e vi a cena mais deprimente que meus olhos jamais poderiam levar ao meu irrequieto espírito: uma viatura de PATAMO postada no portal de entrada a pretexto, honestamente, não sei de quê. Aliás, sei sim: trata-se de mais um absurdo ordenado à PMERJ para humilhar a corporação coirmã e agradar a um governante que, não faz muito tempo, sugeriu que PMs e BMs participassem de uma Parada Gay fardados e embarcados em viaturas caracterizadas. E se os militares estaduais acolhessem a sugestão governamental? Seriam tachados de “vândalos”?... Seriam presos administrativamente?... Responderiam a processo criminal por peculato em companhia daquele que proclamou a ilícita sugestão?... Ah, que capacidade teatral de mimetizar para dar a cada peso variadas medidas!...
A verdade é que a história do relacionamento fraterno entre os militares estaduais da PMERJ e do CBMERJ ficará para sempre maculada. Pois os homens da PMERJ, − que encenaram a incrível reação governamental explodindo com bombas o portão dos fundos do Quartel Central do CBMERJ, arremetendo-se contra homens desarmados, mulheres e crianças, − os homens da PMERJ passarão; e o governante passará; e os eventuais dirigentes dessas instituições passarão... Mas a nódoa do ataque armado ao “santuário” da coirmã (vocábulo que roubo do atual comandante-geral do CBMERJ nomeado às pressas) jamais passará. E não há argumento que justifique a ação extrema do BOPE ao estilo de golpe no seu sentido mais contundente. Entendo também que a primeira invasão apenas representou a entrada dos BMs em sua própria casa cuja porta necessitou de ser arrombada porque de dentro a trancaram a chave. Estivesse aberto o portão frontal, os BMs entrariam calmamente e ocupariam o pátio como muitas vezes ocorreu no QG da PMERJ, especialmente durante o movimento dos “Barbonos” e dos “40 da Evaristo”, dentre outros havidos no passado e liderado por inúmeros oficiais. Mas (que horror!) invadir a sede do CBMERJ pelos fundos, furtiva e abruptamente, lembra um pouco o arrombar da porta de algum barraco favelado pontapeando-a em furor...
Espanta-me, ainda, a veemente reação de um promotor de justiça, afinada com o discurso do governante, anunciando sua opinião aos jornais antes de aprofundada a apuração. Tudo bem, ele pode se restringir aos efeitos... Mas talvez fosse boa hora de a respeitável autoridade ministerial avaliar as causas e atentar para o fato de os integrantes do CBMERJ estarem desde muitos anos reduzidos ao status de “agentes de saúde”, algo que deve ter contribuído para a insólita quebra da hierarquia e disciplina. Sim, quem quebrou primeiro a hierarquia e a disciplina nos intestinos do CBMERJ? Igualmente, deveria ele perscrutar o tratamento remuneratório a mais e mais diferenciado entre PMs e BMs, que são da mesma espécie, algo jamais ocorrido em tempos anteriores. No fim de contas, ambos são militares estaduais, portanto detentores dos mesmos direitos e submetidos aos mesmos deveres.
Ademais, os valorosos bombeiros-militares em muitas situações de serviço culminam até subordinados a civis, inclusive terceirizados (vide o funcionamento da Regulação de Ambulâncias do SAMU). Afirmo-o, todavia, externando meu sincero respeito à valorosa categoria de servidores civis que sofrem suas agruras na Secretaria de Estado de Saúde, lugar para onde o CBMERJ foi deslocado em total desapreço à norma constitucional. Aliás, não é de hoje que o Corpo de Bombeiros do RJ se confunde em sua missão precípua. Por um absurdo erro de avaliação e de decisão, a Assembleia Nacional Constituinte reduziu a Defesa Civil a uma atividade complementar de bombeiros, quando, na verdade, é muito mais que isso. Tal afirmação constitucional, - que somente interessava aos Corpos de Bombeiros não orgânicos das Polícias Militares (se não me engano, em número de apenas três no país, pois os demais Corpos de Bombeiros são estruturas das Polícias Militares), - tal afirmação constitucional vem desviando os bombeiros-militares de suas funções primeiras de socorro imediato a pessoas atingidas por desastres naturais e artificiais, sendo certo que Defesa Civil é bem mais que socorro imediato.
Não perderei tempo explicando o porquê de a Defesa Civil ter sido reduzida a uma atividade subsidiária de bombeiros. Quem quiser aprofundar o assunto deve acessar o site da Secretaria Nacional de Defesa Civil, rico em informações esclarecedoras. Importa aqui constatar que o CBMERJ, se por um lado ganhou poder de manipulação política ao abocanhar a Defesa Civil, por outro paga um alto preço confundindo sua imagem interna e externa ao cuidar de problemas além de suas possibilidades estruturais e culturais. E, se não bastasse tanta confusão decorrente do primeiro desvio de finalidade erroneamente consagrado na Carta Magna, somou-se ao imbróglio o deslocamento de todo esse organismo de segurança pública para uma secretaria de estado que não lhe é afim. Não resiste a medida à análise do texto constitucional e das leis federais ainda em vigor que indicam claramente ser a Secretaria de Estado de Segurança Pública o nicho correto do CBMERJ. Ora, quando a estrutura é assim despedaçada, que esperar das pessoas?...
Quem conhece mesmo superficialmente a Defesa Civil no real contexto da História da Humanidade sabe o que quero dizer. Seu mentor, Sir Winston Churchil, definiu-a com clareza ímpar: “A defesa Civil é uma obrigação para com a humanidade que não pode ser abdicada por nenhuma Nação, Comunidade ou Indivíduo.” Cá pra nós, reduzir tal tarefa humanitária a uma simples “atividade de bombeiros” mais parece piada de mau gosto! Eis como indica o § 5º do Art. 144 da CRFB: “às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.” Ah, que me perdoem os congressistas pátrios!...
Tornando ao centro do furacão, não posso negar minha perplexidade ante as imagens dos revoltosos do CBMERJ dominados a ferro e fogo pela PMERJ. Não sei, por outro lado, se lhes devo referir-me como “revoltosos” ou simplesmente revoltados, eis que humilhados ao extremo por um governo insensível e truculento, que, quando lhe interessa, abalroa as leis vigentes, mas quando é contestado utiliza a força bruta contra seus contestadores. Até quando?... Será que esses apaniguados pensam que o mundo é feito só de covardes e que eles são “os tais” para sempre?... Ora, sei que não posso ultrapassar meus limites, mas nada me impede de traçar estas entristecidas linhas às quais acrescento fotos do abominável episódio e da lágrima sofrida de um bombeiro-militar para inspirar arrependimentos futuros.
Pensei encerrar aqui por já me sentir muito envergonhado com tudo isto. Ocorre, porém, que não posso deixar passar a “opinião” externada pelo Jornal O Globo de hoje, que ataca os manifestantes com o foco no “estado de direito”. Boa hora de solicitar aos defensores do Senhor Cabral sobre esse mesmo “estado de direito” ignorado a partir da transferência do CBMERJ da secretaria de segurança para a de saúde, aviltando a Carta Magna e todas as leis federais que regulam as atividades das forças auxiliares reservas do Exército Brasileiro. Que opine o jornal com a devida isenção sem poder alegar desconhecimento dos fatos passados (causas geradoras de muitos efeitos desagradáveis até chegar ao momento presente)! Ora, claro que não o farão!

Um comentário:

Paulo Xavier disse...

Interessante que esse jornal não citou que a opinião pública está do lado dos Bombeiros, numa aprovação que se aproxima dos 100%. Acho bom esse governador colocar as barbas de molho porque vemos pelo semblante e atitude dos "presos" que nada vai demovê-los da idéia de lutar até o fim nesta causa mais do que justa. Outra coisa. Tem muito mais gente do lado de fora pronta para entrar. Alguém duvida?