quinta-feira, 26 de maio de 2011

Uma teoria conspirativa



Por que a PMERJ está na berlinda?

No torvelinho das notícias impactantes e despidas de justa causa, característica marcante deste atual governo, eis que surge a declaração do Dr. José Mariano Beltrame, − mui digno Secretário de Segurança Pública do RJ, − sugerindo acabar com os grandes quartéis da PMERJ para dar lugar a aquartelamentos menores e descentralizados. Tal anúncio não seria tão significativo se não fosse o ilustre secretário um lídimo policial civil, inegavelmente competente e merecidamente aplaudido pela sociedade, em especial pelo sucesso operacional da PMERJ com as UPPs. Ressalto o “policial civil” para especular sobre a extensão e a profundidade da referida declaração, que não se pode resumir à singeleza da causa alegada, ou seja, diminuir o efetivo da atividade-meio para aumentar o policiamento nas ruas.
Sob o crivo de minha modestíssima opinião, a justificativa da autoridade pública é insuficiente. Fosse mais aprofundada e convincente, vá. Mas apontar uma alteração estrutural de vulto como único meio de aumentar o efetivo de policiais-militares nas ruas, ignorando as consequências da medida na cultura corporativa, é roçar as raias da temeridade. Não que a ideia seja de todo ruim e não deva ser discutida, mas antes se há de atentar que a PMERJ, como organização mantenedora da ordem pública, e, em respeito à sua importância social, deve ser diagnosticada como um sistema composto, no mínimo, por seis subsistemas ou variáveis básicas: estrutura, pessoas, ambiente, tarefa, tecnologia e competitividade. Esta última variável, recentemente consagrada pela Teoria Geral da Administração, ressalta-se como relevante também no contexto sociopolítico, posto não haver dúvida da existência de uma conspiração no sentido de extinguir as Polícias Militares brasileiras.
Melhor lugar para constatar a veracidade da conspiração é o Congresso Nacional, por onde tramitam diversos Projetos de Emenda Constitucional (PEC) com fins conspirativos. Tais PECs, longe de serem inócuas, percorrem célere e perigosamente os corredores daquela casa política. Elas são consequentes de forte lobby capitaneado por entidades representativas de policiais civis nos últimos anos, e as Polícias Militares (PPMM) são o alvo preferencial, eis que tratadas como excrescências a serem jorradas no primeiro esgoto; e, como ocorreu durante a Assembleia Nacional Constituinte de 1988, essas desgastadas instituições militares estaduais imitam o elefante tentando inutilmente pisotear a formiga que lhe ferra o tornozelo, alegoria que mui bem representa a via unívoca do interesse pecuniário calcado na PEC 300. Na realidade, enquanto as bandas militares estaduais tocam sinfonias esdrúxulas em vista desse inconstitucional objetivo pecuniário, as silenciosas caravanas policiais civis passam-lhes à frente no sentido de extinguir suas corporações.
Não sou contra a PEC 300, acho bom afirmar. Afinal, sou amante de ficções... Aliás, a PEC 300 me faz lembrar outra PEC, de famoso e televisivo deputado estadual, garantindo o retorno aos quadros da PMERJ de policiais-militares absolvidos em processos criminais, pura ilusão dos sentidos com efeito restrito ao pleito eleitoral havido em passado recente e vencido à custa de muitos votos fardados. Tão logo as eleições findaram, porém, a badalada PEC lançou-se ao abismo das inutilidades suicidas... Ora, não se há de negar que o ambiente político atual não é favorável aos militares (estaduais e federais), que perdem espaços de poder a olhos vistos. Todos nós carregamos em resignação o fardo alheio do golpe militar como asnos enfileirados numa trilha íngreme à esquerda e abissal à direita...
Sim, é espantoso o preconceito dos atuais detentores do poder em relação aos fardados, com boa parte da mídia a fazer coro com aqueles poderosos, ambos fingindo abraçar uma democracia que simplesmente inexiste. Com efeito, ser “democrata” no Brasil é ser “de esquerda”, seguindo a lógica do “quem não está comigo está contra mim”, sendo certo que os militares de hoje, que de nenhuma ditadura participaram, se põem circunflexos ante o poder reinante e em subserviência de dar pena. E, conformados, se entregam ao abate, tais e quais carneirinhos dóceis, o que anima deveras os que intentam destruir as bases das instituições militares indo direto ao desmoronamento de suas estruturas físicas conquistadas à custa de muito suor por nossos antepassados. Cá pra nós, cabe-nos no mínimo o dever de preservá-las como nosso patrimônio histórico...
Entendo que desativar e vender quartéis a partir de motivações supérfluas e casuísticas (Que me perdoem seus mentores e atores!) resume mais uma tentativa de esvaziamento do prestígio da PMERJ. Sim, os discriminadores de militares agem na contramão da legalidade intentando “dividir para enfraquecer”, antiga tática de combate da qual somos vítimas desgraçadamente passivas. No fim de contas, há leis e decretos federais determinando regras para a instalação de batalhões operacionais pelas PPMM (na condição de forças auxiliares reserva do Exército Brasileiro). Pelo que sei, as prescrições legais continuam em vigor e devem ser respeitadas; se são boas ou não, é problema a ser sanado pelo Congresso Nacional. Ou será que não vivenciamos uma democracia?...
Insisto, porém, na ideia de que não nos devemos acirrar contra nenhuma mudança, desde que atenda aos objetivos institucionais, pessoais e sociais e não abalroe a legalidade. Afinal, a cultura da caserna não pode ser destruída de golpe como se fôssemos nós um bando de cordeiros. Porque é certo que uma mudança estrutural abrupta afetará as demais variáveis organizacionais supracitadas e culminará baralhando os legítimos anseios e valores dos militares estaduais. Ademais, os jovens que ingressam na PMERJ são adrede motivados para uma carreira militar continuada, o que presume o direito de todos às promoções, aos cursos e demais compromissos institucionais que os permitam ascender aos postos e graduações seguintes até alcançarem a inatividade. Em contrapartida, a eles é destinada uma vida de sacrifícios extremos, caracterizada bem mais por deveres assumidos em juramento diante da Bandeira Nacional do que por direitos tão limitados que não é demais assegurar que o PM não é cidadão pleno.
Por conseguinte, é inaceitável a transformação de grandes espaços ocupados por batalhões em pequenos aquartelamentos sem uma ampla discussão, com a participação da tropa, sobre as consequências desse ato político-administrativo. Até então, a justificativa do ilustre e digno secretário Beltrame é de tal modo superficial que mais parece acinte endereçado ao imenso contingente de policiais-militares, que, aliás, nem se refizeram do outro acinte disparado pelo próprio governante, talvez em momento de delírio: a sugestão de participação dos militares estaduais, fardados e embarcados em viaturas caracterizadas, na “Parada Gay”...

2 comentários:

Isabel Aquino disse...

É, indubitavelmente, INACEITÁVEL esse tipo de "transformação", visto que nosso Secretário está esquecendo, principalmente, do mais importante dos seis componentes do sistema: as pessoas, no subjetivo, e não apenas numericamente. Sem citar a (falta) estrutura e a (falta) tecnologia...

Tiago Alexandre disse...

Caro Coronel larangeira,
enfim observo uma análise compatível com o que também venho observando na conjuntura militar brasileira. Gostaria de destacar a inércia do Exército Brasileiro diante de tamanhas atrocidades disparadas pelas autoridades estaduais. Mas é como dissestes, os militares estão se acostumando a viverem como cordeiros, mansos e passivos. O parco salário que recebemos (estaduais e federais) é apenas a ponta de um iceberg, é apenas mais uma das facetas da subserviência a que foi imposta o militarismo pelos outros e por nós mesmos, como aqueles que se açoitam voluntariamente a fim de aplacar alguma culpa(?). Por fim gostaria de parabenizar-te por mais um excelente texto, claro e de uma lucidez que premia pouquissimos na nossa sociedade.
Grande abraço,
Tiago