quarta-feira, 28 de julho de 2010

Sobre a morte de Rafael Mascarenhas








Quae vult rex fieri, sanctae sunt congrua legi


Um fato nem tão surpreendente me vem aguçando a atenção: desde o primeiro instante do acidente os personagens envolvidos na morte de Rafael Mascarenhas só se apresentam à DP, à mídia e comparecem aos locais de investigação (reconstituição) acompanhados de bons advogados. Quanto aos PMs, eles foram presos administrativamente, estão presos preventivamente, e têm sido reiteradamente ameaçados de expulsão, em antecipação de decisão administrativa, sem que qualquer advogado os tenha representado em lugar algum nem recebido espaço midiático para pelo menos tentar contraditar a acusação contra eles jorrada como tempestade pelo pai do atropelador. Nem creio que os PMs tenham constituído advogado ou que a PMERJ lhes tenha proporcionado acesso a algum defensor durante o clamor público (ou publicado). No domingo (que baita demonstração de desapreço pela PMERJ!), o foco do Programa Fantástico prendeu-se tão-somente à execração dos PMs, tendo como base a fala unívoca do pai do motorista atropelador, posta como “verdade absoluta”: a “extorsão”. No entanto, suas primeiras declarações indicavam um concerto de vontades (no âmbito jurídico-penal da corrupção ativa e passiva: crime de mão dupla). Que estranho!... PMs aceitando mil reais com promessa de receber o restante (nove mil reais) noutra oportunidade. Nada mais oportuno para se montar uma operação e flagrar os militares estaduais abocanhando a maior parte do dinheiro... Por que não foi feita?... Eis então que surge o pai do atropelador, agora devidamente conduzido por advogado, com a nova versão da “extorsão”, o que o transforma em “vítima” (parece que a autoridade policial não engoliu o artifício e está indiciando-o por crime de corrupção ativa). Demais disso, confesso está que a “vítima de extorsão” conduziu o carro avariado ao lanterneiro para desfazer a prova contundente do atropelamento em alta velocidade perpetrado por seu filho. Nota-se, talvez, até este ponto da história, um preexistente concerto de vontades envolvendo os PMs (que ainda não se manifestaram publicamente) e o pai do atropelador, supondo-se que tenha sido ele o senhor das ações a tentar resguardar o filho de um homicídio doloso. Mas aí é outro crime contra a administração da boa Justiça. Por sinal, em depoimento à polícia, conforme noticiado, o carona disse não saber de nenhuma negociação entre o pai do seu colega atropelador e os PMs. Depreende-se desta negativa favorável aos PMs um resquício de mentira para livrá-lo de arranhões judiciais futuros. Ele não servirá como testemunha de ilegalidade alguma e quiçá não será exposto em acareação para se contradizer e atrapalhar a tese da “extorsão”. Nos treinamentos militares, denominamos esse comportamento de observador privilegiado como “fora de situação” (neutro: nem amigo, nem inimigo)... Vê-se, portanto, que o trágico episódio inicia-se enodoado por manobras nitidamente jurídico-judiciais arquitetadas por especialistas. Enquanto isso, aos PMs trancafiados só cabe negar que tenham recebido propina ou tentado extorquir o pai do atropelador. Ou poderão afirmar que seguiram gentilmente o pai do atropelador e seu filho até o caixa eletrônico para evitar algum assalto (“saidinha”) e não para ajudá-los a acobertar crime grave impossível de ser acobertado... E também poderiam ter acompanhado o extremoso pai para protegê-lo de algum azar de caminho... Afinal, Reus sacra res est (“O réu é coisa sagrada”)... Deste modo o “forte indício” (GPS) contra os PMs, embora suficiente para uma punição administrativa extrema, não passará disso. Mas, sem dúvida, o GPS é “batom na cueca”... E para a corporação, salvo milagrosa guinada em vista de outros fatos que poderão emergir das trevas lançadas sobre a verdade verdadeira, a culpa administrativa dos PMs parece suficiente para que a ordem prévia do irado governante se materialize: “bandidos ao quadrado”: rua com eles e cadeia neles! Se responderem como “bandidos ao quadrado” pela corrupção passiva, aparentemente de difícil ou impossível prova direta, os desinfelizes, depois de excluídos administrativamente, vão dar com os costados na Água Santa, talvez a conviver lado a lado com alguns bandidos que prenderam. Mas nada disso é problema, o azar é deles (Ó amaldiçoados PMs!), quem os mandou “ajudar um desesperado pai” (coitadinho!), como todos (autoridades, mídia etc.) já concluíram sem que qualquer advogado tenha sequer apresentado um mínimo contraditório a favor dos amaldiçoados. Tudo lhes é desfavorável. Estão ambos os fardados fadados à danação, hereges endemoninhados pelo governante-inquisidor ao modo Tomás de Torquemada...



Neste ponto, eu diria sem temor: já vi este filme! Sim, e muitas vezes: PMs execrados pela mídia ante a opinião publicada, acusados de bárbaras chacinas, e depois inocentados pela Justiça sem uma linha sequer da imprensa desmentindo as execrações anteriores. Eles são às centenas, ou quiçá aos milhares. Mas isto é mero detalhe, pois o que vale é a máxima latina lá do cabeçalho: “Vão as leis onde querem os reis”.

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