Aqueçamos a turbina da polêmica!...
O inusitado episódio alcunhado de “Batalhão DA LIESA” (segurança particular feita por alguns oficiais da PMERJ no Sambódromo durante o Carnaval) gerou polêmica de muitos matizes: uns contra, outros a favor; uns em críticas ideológicas; outros mais ponderados. Sob a minha ótica, e deixando a hipocrisia de lado, não vi nada demais no episódio, assim como entendi ter sido natural a notícia veiculada pelo Jornal O GLOBO. Afinal, um fato aparentemente insólito constatado pela imprensa não se pode perder como notícia.
Eu mesmo, durante três anos consecutivos, atuei no Sambódromo como Relações Públicas da PMERJ, fardado de major, na parte interna e atendendo exclusivamente à imprensa. Estaria eu ali, sem receber hora extra, a serviço do Poder Público ou da LIESA (Liga Independente das Escolas de Samba)? Afinal, de quem é aquela festa?... Ora, nem do Poder Público nem da LIESA, mas do povão. Sem a vibração dele nas arquibancadas e na pista, não haveria festa alguma. Considerar que a LIESA pertence a supostos banqueiros do jogo do bicho (“suposto” é clichê midiático para evitar danos morais, e que aqui faço uso em cautela), é afirmar serem eles os donos das Escolas de Samba; e, segundo essa ótica reducionista, e sobremodo estúpida, o Poder Público não deveria se envolver no maior espetáculo da Terra.
O inusitado episódio alcunhado de “Batalhão DA LIESA” (segurança particular feita por alguns oficiais da PMERJ no Sambódromo durante o Carnaval) gerou polêmica de muitos matizes: uns contra, outros a favor; uns em críticas ideológicas; outros mais ponderados. Sob a minha ótica, e deixando a hipocrisia de lado, não vi nada demais no episódio, assim como entendi ter sido natural a notícia veiculada pelo Jornal O GLOBO. Afinal, um fato aparentemente insólito constatado pela imprensa não se pode perder como notícia.
Eu mesmo, durante três anos consecutivos, atuei no Sambódromo como Relações Públicas da PMERJ, fardado de major, na parte interna e atendendo exclusivamente à imprensa. Estaria eu ali, sem receber hora extra, a serviço do Poder Público ou da LIESA (Liga Independente das Escolas de Samba)? Afinal, de quem é aquela festa?... Ora, nem do Poder Público nem da LIESA, mas do povão. Sem a vibração dele nas arquibancadas e na pista, não haveria festa alguma. Considerar que a LIESA pertence a supostos banqueiros do jogo do bicho (“suposto” é clichê midiático para evitar danos morais, e que aqui faço uso em cautela), é afirmar serem eles os donos das Escolas de Samba; e, segundo essa ótica reducionista, e sobremodo estúpida, o Poder Público não deveria se envolver no maior espetáculo da Terra.
O Carnaval leva-nos aos tempos primevos e à certeza de que o ser humano, em sua versão mais rude de vida comunitária, já festejava coletivamente em razão de alguma coisa ou de nada. Apenas festejava. E essas festas, fossem quais fossem seus motivos, sempre representaram uma espécie de ruptura da vida cotidiana. Curioso é que muitos povos que jamais se encontraram apresentavam características semelhantes quanto ao desejo de festejar, variando a forma de fazê-lo conforme a cultura de cada qual. Assim chegamos aos festejos hodiernos, tendo como singularidade a ambivalência de comportamento das pessoas, tornando-as sujeito e objeto do seu próprio divertimento, permitindo a indagação: a máscara carnavalesca oculta a individualidade e pressupõe uma multiplicidade de identidade?... Segundo a filosofia contemporânea, em resumo a resposta seria sim.
O Carnaval propicia, na verdade, a oportunidade momentânea de rejeição das normas de conduta vinculadas a dogmas e tabus aos quais se sujeitam as sociedades em seu dia a dia. Em linguagem grosseira, o Carnaval é ideal para todo mundo “soltar a franga” sem qualquer pejo. Há uma cumplicidade, uma espécie de consenso de que os festejos carnavalescos justificam a ruptura de regras, em muitos casos e lugares levada ao extremo do “ninguém é de ninguém”. É diferente, por exemplo, do “pão e circo” separando classes sociais. Na verdade, hoje a máscara dos festejos é somente um símbolo, pois ninguém mais se oculta para se revelar...
O Carnaval propicia, na verdade, a oportunidade momentânea de rejeição das normas de conduta vinculadas a dogmas e tabus aos quais se sujeitam as sociedades em seu dia a dia. Em linguagem grosseira, o Carnaval é ideal para todo mundo “soltar a franga” sem qualquer pejo. Há uma cumplicidade, uma espécie de consenso de que os festejos carnavalescos justificam a ruptura de regras, em muitos casos e lugares levada ao extremo do “ninguém é de ninguém”. É diferente, por exemplo, do “pão e circo” separando classes sociais. Na verdade, hoje a máscara dos festejos é somente um símbolo, pois ninguém mais se oculta para se revelar...
O Carnaval democratiza as interações ou apontam incontornáveis contradições? Afinal, a folia põe lado a lado, num bloco de rua ou numa bateria de Escola de Samba, o empregado e o patrão, o policial e o bandido, enfim, santos e demônios, e por aí vão os contrastes multifacetados rendendo-se à explosão de alegria. Sob esse prisma dos festejos carnavalescos, a máscara nada mais é que marca de uma liberdade consentida. Cada um faz o que quer nos seus limites naturais, muito além dos sociais, e todos os carnavalescos reconhecem em si e no outro o direito de romper com as amarras da formalidade. Não se ocultam ou dissimulam a não ser minimamente; antes, mostram-se em ilusão tornada real de cara limpa.
Não importa em que circunstância o Carnaval é festejado, ele tem o sentido genérico da festa que liberta o corpo e a alma, o que permite incluir nesse entendimento os festejos juninos e demais folias mundo afora. Tudo é Carnaval, tudo é ambivalência, tudo é na base do seja ator e espectador nem que por somente um dia. O Carnaval é, portanto, uma festa do povo que não se comporta livremente enquanto existe como ente social agrilhoado a regras. O Carnaval não exclui. Esta é a sua natureza individual, social e histórica. Não é diferente no Sambódromo...
O Sambódromo pertence ao Poder Público e foi construído com o dinheiro do povo. O Sambódromo é do povo, e o Carnaval que ali se realiza só tem um dono: o povo. E não somente ali, como em qualquer parte do planeta, a concentração de pessoas em eventos, sejam eles festivos ou não, conta sempre com a proteção do Poder Público, e também do particular contratado para tal objetivo em festas pagas. Os responsáveis pelo evento, – no caso, o Poder Público e a LIESA, – não podem conceber um sistema preventivo-repressivo-policial numa festa cuja característica é a quebra de normas, em especial a do falso moralismo a lembrar um tempo em que Estado e Igreja se uniam para vigiar e punir os festejos pagãos. Aliás, como intentam fazê-lo ainda hoje... A “vista grossa”, todavia, é o imperativo; a alegria é o fim colimado; e todo o resto é hipocrisia.
No Sambódromo, trabalhando ou se divertindo, todos estão alegoricamente de máscara (curioso é que o papel social representado por trabalhador ou folião não deixa de ser uma espécie de máscara). Mas os foliões não se importam com regras a não ser as do maravilhoso desfile, que, de certo modo, limitam a liberdade, mas não discriminam os foliões. Cada folião fantasia-se e samba porque quer. Cada pessoa que se propõe a se divertir naqueles moldes é livre para fazê-lo. E a proteção desses milhares de carnavalescos assume contornos incomuns. Um, bastante significativo, é a ausência de policiais fardados no ambiente interno destinado ao desfile. Sua presença acarretaria uma falsa ideia de controle estatal sobre a manifestação de alegria, algo inadmissível e geralmente apupado pela galera das arquibancadas. Ridículo seria se as autoridades públicas se postassem nos camarotes, ou eventualmente na pista de desfile, vestidas de terno e gravata. Ora, a descontração é inevitável e generalizada; a alegria impera dentro dos corações por ordem do Rei Momo, a autoridade-mor do Carnaval.
Advém daí a necessidade de a segurança se postar veladamente, sendo óbvio que não deve ser feita por leigos, do mesmo modo que não se justifica montar uma empresa de vigilância para atuar por somente uma semana durante todo o ano. A saída é organizar a segurança com quem sabe, e até desejaria se divertir, mas precisa do “bico” para complementar seu ganho parco, isto quando não é obrigado ali estar em labor que não pode deixar de cumprir. Ora, trabalhar no “bico” é melhor que se corromper em surdina no exercício da profissão policial.
Esse negócio de “festa profana” já era! Não passa de artifício dos detentores do poder e da “verdade”: Igreja/Estado/Igreja/Estado... Irra!... O Todo-Poderoso deveria decretar Carnaval em tudo que é lugar onde os povos se matam em guerras cruentas. E os soldados largariam as armas e cairiam na gandaia, uns abraçados aos outros; e as armas enferrujariam em desuso. Pois uma coisa é certa: se o pudessem, – os repórteres que denunciaram o “bico” sob o pretexto de a LIESA pertencer aos supostos banqueiros do jogo do bicho que presidem algumas Escolas de Samba, – se o pudessem, os repórteres cairiam no samba; e os soldados da PM, – representantes da formalidade artificial, e mais os policiais que estavam no “bico”, e todos os demais que trabalhavam para garantir a alegria do povo – sambariam como o famoso Gari, que, mesmo em plena formalidade de sua profissão simples, sambou trabalhando e trabalhou sambando. Sim, ele deu uma rasteira no Estado e na Igreja e conquistou uma proeza digna da fama que recebeu por fazer o Folião vencer o Gari. Para mim, estão de parabéns todos aqueles que mostraram a cara e suaram a camiseta para garantir a alegria do desfile das Escolas de Samba.
Não importa em que circunstância o Carnaval é festejado, ele tem o sentido genérico da festa que liberta o corpo e a alma, o que permite incluir nesse entendimento os festejos juninos e demais folias mundo afora. Tudo é Carnaval, tudo é ambivalência, tudo é na base do seja ator e espectador nem que por somente um dia. O Carnaval é, portanto, uma festa do povo que não se comporta livremente enquanto existe como ente social agrilhoado a regras. O Carnaval não exclui. Esta é a sua natureza individual, social e histórica. Não é diferente no Sambódromo...
O Sambódromo pertence ao Poder Público e foi construído com o dinheiro do povo. O Sambódromo é do povo, e o Carnaval que ali se realiza só tem um dono: o povo. E não somente ali, como em qualquer parte do planeta, a concentração de pessoas em eventos, sejam eles festivos ou não, conta sempre com a proteção do Poder Público, e também do particular contratado para tal objetivo em festas pagas. Os responsáveis pelo evento, – no caso, o Poder Público e a LIESA, – não podem conceber um sistema preventivo-repressivo-policial numa festa cuja característica é a quebra de normas, em especial a do falso moralismo a lembrar um tempo em que Estado e Igreja se uniam para vigiar e punir os festejos pagãos. Aliás, como intentam fazê-lo ainda hoje... A “vista grossa”, todavia, é o imperativo; a alegria é o fim colimado; e todo o resto é hipocrisia.
No Sambódromo, trabalhando ou se divertindo, todos estão alegoricamente de máscara (curioso é que o papel social representado por trabalhador ou folião não deixa de ser uma espécie de máscara). Mas os foliões não se importam com regras a não ser as do maravilhoso desfile, que, de certo modo, limitam a liberdade, mas não discriminam os foliões. Cada folião fantasia-se e samba porque quer. Cada pessoa que se propõe a se divertir naqueles moldes é livre para fazê-lo. E a proteção desses milhares de carnavalescos assume contornos incomuns. Um, bastante significativo, é a ausência de policiais fardados no ambiente interno destinado ao desfile. Sua presença acarretaria uma falsa ideia de controle estatal sobre a manifestação de alegria, algo inadmissível e geralmente apupado pela galera das arquibancadas. Ridículo seria se as autoridades públicas se postassem nos camarotes, ou eventualmente na pista de desfile, vestidas de terno e gravata. Ora, a descontração é inevitável e generalizada; a alegria impera dentro dos corações por ordem do Rei Momo, a autoridade-mor do Carnaval.
Advém daí a necessidade de a segurança se postar veladamente, sendo óbvio que não deve ser feita por leigos, do mesmo modo que não se justifica montar uma empresa de vigilância para atuar por somente uma semana durante todo o ano. A saída é organizar a segurança com quem sabe, e até desejaria se divertir, mas precisa do “bico” para complementar seu ganho parco, isto quando não é obrigado ali estar em labor que não pode deixar de cumprir. Ora, trabalhar no “bico” é melhor que se corromper em surdina no exercício da profissão policial.
Esse negócio de “festa profana” já era! Não passa de artifício dos detentores do poder e da “verdade”: Igreja/Estado/Igreja/Estado... Irra!... O Todo-Poderoso deveria decretar Carnaval em tudo que é lugar onde os povos se matam em guerras cruentas. E os soldados largariam as armas e cairiam na gandaia, uns abraçados aos outros; e as armas enferrujariam em desuso. Pois uma coisa é certa: se o pudessem, – os repórteres que denunciaram o “bico” sob o pretexto de a LIESA pertencer aos supostos banqueiros do jogo do bicho que presidem algumas Escolas de Samba, – se o pudessem, os repórteres cairiam no samba; e os soldados da PM, – representantes da formalidade artificial, e mais os policiais que estavam no “bico”, e todos os demais que trabalhavam para garantir a alegria do povo – sambariam como o famoso Gari, que, mesmo em plena formalidade de sua profissão simples, sambou trabalhando e trabalhou sambando. Sim, ele deu uma rasteira no Estado e na Igreja e conquistou uma proeza digna da fama que recebeu por fazer o Folião vencer o Gari. Para mim, estão de parabéns todos aqueles que mostraram a cara e suaram a camiseta para garantir a alegria do desfile das Escolas de Samba.
Ah, se lograssem sufocar as normas e pontapear as regras, todos que lá estavam, – trabalhando ou assistindo ao maior espetáculo da Terra, – todos sambariam ao som da Imperatriz Leopoldinense, que, em 1989, abriu as Asas da Liberdade e uniu o povo numa só torcida e numa só canção que se tornou oração. E o Todo-Poderoso se alegraria com a sua “obra-prima”, nós, os foliões, pois o Céu só pode ser Carnaval e Alegria. Que fiquem a Tristeza e a Formalidade no Inferno, com o diabo queimando o rabo em solidão! Nem tanta solidão, pois com ele chorarão suas mágoas os sacripantas, enquanto que no Céu estarão os foliões fardados, e uniformizados, e fantasiados, e irmanados, e livres da máscara, cantando alegremente:
Liberdade!, Liberdade!
Abre as asas sobre nós
E que a voz da igualdade
Seja sempre a nossa voz, mas eu digo que vem
Vem, vem reviver comigo amor
O centenário em poesia
Nesta pátria mãe querida
O império decadente, muito rico incoerente
Era fidalguia e por isso que surgem
Surgem os tamborins, vem emoção
A bateria vem, no pique da canção
E a nobreza enfeita o luxo do salão, vem viver
Vem viver o sonho que sonhei
Ao longe faz-se ouvir
Tem verde e branco por aí
Brilhando na Sapucaí e da guerra
Da guerra nunca mais
Esqueceremos do patrono, o duque imortal
A imigração floriu, de cultura o Brasil
A música encanta, e o povo canta assim e da princesa
Pra Isabel a heroína, que assinou a lei divina
Negro dançou, comemorou, o fim da sina
Na noite quinze e reluzente
Com a bravura, finalmente
O Marechal que proclamou foi presidente
Liberdade!, Liberdade!Abre as asas sobre nós
E que a voz da igualdade
Seja sempre a nossa voz,
Liberdade!, Liberdade!
Abre as asas sobre nós
E que a voz da igualdade
Seja sempre a nossa voz...
Seja sempre a nossa voz...
Sim, sim, sou torcedor da Imperatriz Leopoldinense, não importa quem tenha sido ou ainda seja o seu presidente! Sou também flamenguista, não importa quem tenha sido ou ainda seja o seu presidente! E afirmo, sem máscara: tenho bom gosto!... Hum... Que me venham os críticos e os apupos!... Afinal, a vida é feita de escolhas entre contrastes; nem sempre de boas escolhas diante muita vez de turvos contrastes; o Bem e o Mal, como objetos, se confundem ante o sujeito que os tenta distinguir, ou se enfiam juntos dentro dele. Por isso muitas escolhas são falhas para alguns e excelentes para outros. Mas é este o sal da vida...
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