quinta-feira, 30 de abril de 2009

Sobre o ambiente social hodierno



Um ambiente de consumo propício ao crime


Uma das características marcantes da era industrial, – reforçada atualmente pela indústria da informática e das comunicações, – é a disseminação do consumo material e o acirramento do egoísmo humano. Daí a indiferença permear a convivência individual e coletiva, afastando-a da mãe-natureza, tornada matéria-prima para a produção de muitas inutilidades.
Este secular comportamento destrutivo instituiu uma irreversível entropia no planeta, como se dele os viciados em consumo não mais dependessem nem tivessem nenhuma responsabilidade com as gerações vindouras.
A gravidade da situação reflete-se em qualquer segmento que se sublinhe para observação. Não importa o seu fim social, nele estará presente o consumismo como mola propulsora (“o consumidor é a eterna criança de peito berrando pela mamadeira” – Erich Fromm*).
Sim, tudo capitalizado e dependente de máquinas: saúde, educação, moradia, transportes etc. Nada é deixado de lado quando se trata de exploração dos recursos naturais em benefício do lucro desmedido.
Em nome do “progresso”, do “desenvolvimento sustentável” e quejandos, florestas urbanas não mais existem, o desmatamento desertifica regiões antes ferazes, rios e lagoas estão assoreados, e as praias não mais permitem o banho saudável.
Enfim, o mundo está a mais e mais feio e fedorento, as chuvas inundam as planícies, a lama desliza morro abaixo e arrasta a sujeira largada pelos insensíveis destruidores do ecossistema – a nossa casa. E muitos morrem.
Os desastres naturais e artificiais se confundem e produzem vítimas como se a mãe-natureza estivesse raivosa contra seus filhos ingratos. Mas a insensatez, mesmo debaixo da desgraça, funciona tal e qual cegueira coletiva. Só é vencedor quem possui bens materiais – eis a medida de valor das pessoas, que não mais “são”... apenas “têm”. E, por conta do “ter”, devastam tudo.
Ninguém se preocupa com nada. Todos se esquivam de qualquer sacrifício para evitar o caos futuro. A facilidade da comunicação em massa permite a proliferação de falácias em discursos eloquentes. A propaganda e a contrapropaganda garantem em fragmentos bem urdidos a manutenção de um status quo fundado na indiferença generalizada. Por isso, o grande desastre virá, mas não parece constar da preocupação individual nem coletiva.
Não há quem queira doar cota alguma de suor ou responsabilidade para evitar a calamidade maior: a destruição total. E basta um pequeno erro de cálculo para ocorrer uma hecatombe nuclear, ou por conta de guerra ou de algum desastrado experimento. Ah, se a humanidade não se preocupa com essas possibilidades mais gravosas e prementes, imaginem as menores e remotas!...

Fechemos o zum...

Vivenciamos no Brasil, a par das catástrofes naturais, uma calamidade social composta de várias vertentes crônicas. A pauperização da população, a mortalidade infantil, as doenças, a fome, o desemprego, a economia invisível, eis o meio ambiente, por si só calamitoso, em que prospera o multifacetado crime; porque há uma enorme variedade de delitos acobertados pelo que chamam de “injustiça social”. Iguala-se, destarte, o pobre ao criminoso; enfiam-se ambos num mesmo saco e o resultado é que experimentamos em espanto a pujança do banditismo urbano e rural, que se basta como gravíssima calamidade social.
O tráfico de drogas e de armas é a locomotiva que puxa o progresso do crime na tessitura social; este crime também é conduzido por ônibus, avião, carro de luxo, iate, navio... E pela corrupção generalizada.

E assim a violência e o crime vão bem, obrigado, e os malfeitores riem! riem! riem!...

Eis o nosso imperativo ambiental!...

Desfavorável...

Não se cumpre o Contrato Social** sugerido por Rousseau, e o primeiro a acintosamente descumpri-lo é o Estado, que, reforçado pela Igreja, oprime o povo por via de sua submissão ao poder terreno e divino.
Ainda hoje é assim: duas invencíveis hierarquias a dominar a massa ignara pelo temor da punição material e espiritual: liberdade e céu para os obedientes; prisão e inferno para os recalcitrantes; penas brandas para os malfeitores; nenhuma pena substancial para “menores infratores”.
Vivenciamos o triunfo do Mal, estímulo permanente dos delinquentes. Mas o conformismo da sociedade é recompensado pela dogmática ideia de que os pobres terão o Reino dos Céus. Porque, se todos quiserem a posse dos prazeres materiais a um só tempo, como ficarão os ricos a desfrutarem o “hedonismo radical”?
É esse o Estado que desejamos para as próximas gerações? Um Estado moral e materialmente falido?... Ou seria melhor assumir corajosamente o Contrato Social?...
Eis o que sugere Rousseau, e não me cansarei de repeti-lo aqui, embora eu reconheça que não há, neste país, como confiar no acerto da polícia e da justiça:

(...). De resto, todo malfeitor, ao atacar o direito social, torna-se, por seus delitos, rebelde e traidor da pátria; cessa de ser um de seus membros ao violar suas leis, e chega mesmo a declarar-lhe guerra. A conservação do Estado passa a ser então incompatível com a sua; faz-se preciso que um dos dois pereça, e quando se condena à morte o culpado, se o faz menos na qualidade de cidadão que de inimigo. Os processos e a sentença constituem as provas da declaração de que o criminoso rompeu o tratado social, e, por conseguinte, deixou de ser considerado membro do Estado. Ora, como ele se reconheceu como tal, ao menos pela residência, deve ser segregado pelo exílio, como infrator do pacto, ou pela morte, como inimigo público, pois o inimigo dessa espécie não é uma pessoa moral; é um homem, e manda o direito da guerra matar o vencido. (...)

Mas, na contramão da sugestão rousseauniana, a sociedade se submete ao irresistível comportamento de rebanho, em especial seus segmentos menos favorecidos, dentre eles os burocratas, e dentre estes a polícia. E enquanto o Estado cuida do ferrão a tanger seus burocratas contra si mesmos e contra os pés-de-chinelo, a Igreja cuida de lhes garantir a salvação como prêmio pela irrestrita obediência.
Se os burocratas se desviam de suas finalidades traçadas a ferro e fogo pelo Estado, demais da punição material há ainda o risco de se danarem, pois esses desvios são naturalmente gravados como “pecados”.
E assim caminha a humanidade...
Para o caos, única saída deste labirinto riscado por meia dúzia de poderosos de ontem, hoje e amanhã.
Afinal, a humanidade vivenciou, vivencia e parece que sempre vivenciará a arrogância das elites e a subalternidade das massas.
Nesse contexto, os criminosos quase que se tornam heróis por romperem as regras dogmáticas e legais. E, quem sabe, é por isso que eles são burgomestres em suas comunidades sitiadas? Quem sabe é por isso que eles se tornam tão poderosos, a ponto de submeterem o Estado e a Igreja ao ridículo fracasso?...
Afinal, eles, aparentemente, representam bem mais o “ser” que o “ter”, embora almejem o segundo modo de vida como prêmio pelo risco máximo e pelo acintoso desrespeito às leis.
Eis o que se vê aqui, diariamente, bem pertinho de nós...




* Fromm, Erich – Ter ou Ser – LTC Editora, 1987 – Rio de Janeiro – RJ.



** Rousseau, Jean-Jacques – Do Contrato Social – Ed. Martin Claret, 2004 – São Paulo ­– SP.

2 comentários:

Anônimo disse...

Meu Comandante,

Saudações, espero que tudo venha estar na mais perfeita ordem em sua vida familiar.
Belo artigo vou acompanhar seu blog com atenção que sua experiencia merece.

Um forte abraço deste seu amigo e eterno subordinado,

Jorge Alves

(filho do Luiz)

Emir Larangeira disse...

Oi Jorge Luiz

Como o tempo passa, né? Falei com seu pai recentemente. Precisamos nos ver. Abraços.
Emir