quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Sobre a ação pacificadora da PMERJ em favelas

Temporária ou definitiva?





“... as coisas não podem ser de outro modo: pois, como tudo foi criado para uma finalidade, tudo está necessariamente destinado à melhor finalidade.” (Cândido ou o otimista – Voltaire).





Rui Gomes Chaves, emérito professor de Ciência Política da Universidade Nuno Lisboa, contratado para lecionar no Curso Superior de Polícia (CSP) do qual fui aluno no ano de 1988, lá do alto de sua admirável sapiência exemplificava muita coisa interessante por meio de alegorias. Uma delas dizia respeito aos feitos da PMERJ com divulgação geralmente inexistente ou reduzida a reações às notícias negativas por meio de defensivas institucionais que não serviam nem servem para melhorar a imagem da corporação. Dizia ele, em gracejo, que comemos ovo de galinha porque ela faz o maior estardalhaço ao terminar sua tarefa. Já a pata, que produz um ovo excelente, sai quietinha e ninguém se interessa por seu produto tão delicioso e maior que o da galinha. Enfim, resumia o mestre que não basta “saber fazer”; o importante é “fazer saber”. A PMERJ é a “pata” da alegoria...
Tenho acompanhado as bem-sucedidas ocupações pacificadoras encetadas pela PMERJ em algumas favelas, destacando-se o Morro Dona Marta e a Cidade de Deus. Anima-me o entusiasmo das autoridades policiais e dos governantes estadual e municipal, o que indica uma louvável disposição deles no sentido de ampliar o número de ocupações, assim desbaratando os traficantes homiziados nesses locais como se fossem fortalezas medievas. Mas o fato de reconquistar territórios excluídos da lei e da ordem institui um dever hercúleo da corporação no sentido de garantir paz permanente nessas localidades. Demais disso, caberá à PMERJ proporcionar igual serviço público aos favelados de todos os municípios do RJ, não apenas aos da capital dos tambores midiáticos a ressoarem mundo afora como aquela galinha da alegoria alardeando o seu único ovo do dia. Isto implica considerar a reconquista de mais de mil comunidades dominadas pelo tráfico, demais de algumas outras mantidas por grupos paramilitares armados, que, infelizmente, recebem o apodo de “milícias”, vocábulo histórico, honroso e designativo de policiais em muitas partes do mundo, mas aqui tornado tipo penal: “crime de milícia”.
Ocupação total... Mas como ficará o asfalto?... Tarefa difícil, senão impossível, se se considerar a falência do efetivo e dos meios materiais, resultado da aversão de antigos governantes ao aparelho policial, por considerá-lo “de direita”. Entretanto, só o fato de provar que o poder público é mais poderoso que o poder paralelo significa muito para a sociedade em geral e, principalmente, para os destinatários dessas ações policiais: o povo favelado. Acabar com a sensação de superioridade dos bandidos, sepultando aquela triste imagem do Fernandinho Beira-Mar gritando “tá tudo dominado!” dentro de Bangu I, depois de encetar a matança de seus rivais, é fundamental para o resgate da credibilidade do poder público. Isto está acontecendo, devemos reconhecer o fato e aplaudir.
Sei, por vivência, o quanto é importante para uma comunidade carente livrar-se do domínio de bandidos. Quando comandei o nono batalhão (abril de 1989 a abril de 1990), expulsei os traficantes da Favela Pára-Pedro (também conhecida como Vila São Jorge), situada no bairro de Colégio, Zona Norte, e lá mantive policiamento ininterrupto. Pude muitas vezes visitar a comunidade e perceber a alegria das crianças e a descontração dos jovens e adultos circulando sem temor pela favela. Isto durante as vinte e quatro horas do dia. Lá a PMERJ não era rejeitada: era querida e tinha a sua presença sempre ansiada pelos cidadãos ordeiros. Mas foi só retornar o segundo tempo do maldito brizolismo para o policiamento sumir de lá e os bandidos dominarem a comunidade ao custo do sangue de muita gente que antes desaprovara a presença deles. Este é o perigo futuro. Se amanhã ou depois essas localidades tornarem ao mando cruel dos bandidos, muita gente ordeira morrerá em represália. E a repercussão será como a da pata pondo seu ovo no silencioso mundo favelado...

Favela Pára- Pedro (Vila São Jorge) - Colégio - Zona Norte do Rio.

TCel PM Larangeira, cmt do 9º BPM e Dr. Wilson Vieira, Del. Pol. titular da 40ª DP

Não há como não temer que o desastre ocorra. Na política, tudo é temporário. Hoje o governante estimula a ação policial. Amanhã poderá haver o contrário, já vi esse filme. Não se trata de pessimismo, mas de realismo. Por isso devo deixar registrada a minha preocupação, e, no caso, trata-se de quem teve experiência nesse campo específico de restauração da ordem pública em localidades carentes dominadas pelo tráfico. Hoje o Morro Dona Marta e a Cidade de Deus comem “ovo de galinha” em barulhenta alegria. Se amanhã não estiverem a comer ovo nenhum, nem de galinha nem de pata, com certeza estarão a comer bala quente da desforra de enraivecidos bandidos, ou chumbo grosso conseqüente dos indefectíveis confrontos a tapar o sol sangrento com o telhado de vidro de sempre. E o retumbar será, no máximo, o de batida fúnebre numa caixa de fósforo...
Calma! Calma!... Não sou pessimista! Afinal, o atual governante já anunciou o aumento do efetivo da PMERJ em vinte mil homens, prometendo ainda melhores salários. Bem... Não me cabem dúvidas de que a corporação é capaz de formar esses homens em tempo recorde. Imaginemos dois anos, tempo que falta ao chefe do Poder Executivo para cumprir o anunciado. Se realmente houver empenho, não digo que a meta será alcançada, mas com dinheiro para acelerar o ânimo do pessoal, isto é possível. Torçamos, pois, para o otimismo! Façamos como o Cândido e o Pangloss de Voltaire! E que o dinheiro jorre das algibeiras federais direto aos cofres estaduais! Que também os dirigentes municipais se empenhem e invistam na segurança pública como um dever constitucional! Que a sociedade se mobilize! Deste modo, com a participação de todos, venceremos o crime organizado e a paz reinará em todas as favelas do RJ. Hum?... Sim, nem eu nem você sabemos aonde irão parar os milhares de traficantes expulsos de seus homizios. Os do Morro Dona Marta foram para a Ladeira Tabajara dividir com seus comparsas aquele apertado espaço. Os da Cidade de Deus, esses eu não sei aonde foram dar com seus costados. Mas isto é mero detalhe, eles que se virem!...

Um comentário:

Anônimo disse...

Cel. Laranjeira, bom dia!

Fui Policial Militar e atualmente sou "GM" do Rio de Janeiro. Trabalhei por um periodo, em um DPO em 99 próximo a sua residência, no municipio fronteriço a região metropolitana do rio. Hoje moro em jacarepagua, vejo e acompanho esta ocupação com louvor e temor! espero que neste campo as coisas se concretizem e libertem não só a comunidade da "Cidade de Deus" como também os moradores de jacarepagua de vez; pois, já foi noticiado que os indices de criminalidade na região caiu depois da intervenção da PMERJ na favela.

kandrade