quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

Merda antiga



A propósito do mar de lama (ou de merda) que assola o Rio, e conforme vem noticiando a imprensa, veio-me a ideia de que pouco ou nada mudou do império para cá. Nos tempos de El-rei, a merda dos afortunados da corte era jogada nas ruas ou lançadas por escravos na lâmina d’água da baía de Guanabara. Naquela época, já a cidade exalava miasmas insuportáveis, e as hordas de salteadores circulavam em ruas escuras e perigosas; e já havia a mesma fuxicaria de hoje.

Bem, talvez haja alguma diferença entre o miasma de ontem e o de agora. Talvez... Mas os sofismas de outrora também estavam com os poucos “honestos”, — donos do poder e da verdade, — que os divulgavam segundo suas conveniências, enquanto o povoléu sentia o cheiro da merda sem lhe saber a origem, ou ficava nela se chafurdando diariamente, porque é certo que somente iam para as águas da baía os dejetos da corte e dos abastados comerciantes. De resto, tudo era jogado pela janela mesmo, ou diretamente depositado chão. Mas, às vezes, a brisa marinha trazia o mau cheiro de volta, sem respeitar os empinados narizes daqueles que jogavam longe seus resultados intestinais. Assim, a fetidez retornava às origens, invadindo ambientes requintados através das janelas, até que se os escravos as fechassem e fossem abanar de volta os ares malcheirosos e saídos de seus aristocráticos donos.

Contudo, tanto quanto ontem, hoje são tão poucos os tais “honestos” que arrotam aos quatro ventos a desonestidade da polícia, que dá para contá-los nos dedos. E, para ser “honesto”, basta ter barba ou integrar-se à corte governamental e societária contemporânea vermelho-comunista por fora e verde-dólar por dentro; e por ambos os motivos ter acesso ao barulhento bumbo da mídia. E quem paga sempre o pato é a polícia, que nem um desafinado tamborim tem, como se ela fosse a única a feder. Falam por aí, alguns poucos “honestíssimos”, que existe uma “banda podre” na polícia. Sim, existe, porém esta deposita sua merda nas calçadas e caminhos visíveis, porque a ela nunca foi dado o direito de depositá-la de madrugada, e em tonéis levados por escravos, nas águas da baía.

A pouca merda produzida pela pouca polícia é vista e sentida. Já a muita merda, especialmente a expelida à surda por aristocratas e poderosos de hoje, e que eram os afortunados da corte de ontem, esta não mais se joga na lâmina d’água; Atualmente, toda essa merda de luxo brota dos esgotos e línguas negras que avançam subterrânea e sub-repticiamente ao mar. E ninguém sabe quem a produziu, sendo certo que todos defecam... Esta é a muita merda que fica debaixo do tapete daqueles que criticam veementemente a polícia, porque a estes interessa que a barata corrupção policial oculte a outra, bem mais onerosa aos cofres públicos e ao povoléu...

Mais engraçado ainda é que falam na corrupção policial como se esta, real e indiscutível, fosse única neste Estado que vem de há muito exalando miasmas sem origem. Só na polícia parece haver corrupção; então, chicote nela! Nos tempos de El-rei — hein, ó que saudade! — pelo menos havia um major que fazia e desfazia e ninguém falava nada contra ele. Era o major Vidigal, senhor da verdade e da vida, o protegido de El-rei. E lá já havia a merda visível a todos. Não a dele, é lógico.

Bem, querem saber o que realmente me preocupa? É que o povoléu, que a tudo assiste a longa distância, ou pela telinha da tevê em portas de lojas, ou roubando leituras furtivas de jornais dependurados nas bancas, ou ouvindo o som de rádios alheios, acabe acreditando que todos os desonestos da sociedade estão na polícia e em mais lugar nenhum. Pois isto tem sido muito bom para os barbudos e intelijumentos da moda, estes que a fortuna partidária lhes deu emprego, poder, ou ambos. São eles os “donos da verdade” e da doutinice a criticar a polícia, até que esta um dia se una e resolva dar-lhes o troco. Como? Ora, partindo a investigar o passado, o presente e o patrimônio desses sacripantas que costumam acusar com estardalhaço as pseudo-flatulências alheias enquanto soltam as suas, bem reais, porém sem alarde, como se fossem assim ventinhos sem importância. Mas são esses ventinhos os que mais fedem e poluem o ar vadio do Rio... Ah, desgraçados que manipulam como propriedade sua o tributo do povo, a Lava-Jato chegará aqui!... Já se sente seu agradável perfume no ar a vencer o miasma da corrupção cujo prejuízo que lhes pertence, mas eles pretendem saldar em caradura pisoteando com pés grandes e mãos sem dedo os nossos salários. Mas, para eles, e elas, com certeza, e para alegria do povo, desta vez a merda lhes tornará à origem entrando pela boca...






2 comentários:

TOM TELLES disse...

No último parágrafo temos a explicação, para onde caminha sem azimute nossas ''autoridades'', de maneira sutil e implícita. Usando a lógica acerca de seu texto, nos resta esperar desdobramentos nos cep's 22430 e/ou 22080.
Mas o 'cara suja', como é chamado o carnaval por 'entidades' que visitam corpos em busca de evolução espiritual, anestesia todo e qualquer profano endividado com o massacre tributário dos primeiros dias de janeiro.
O pão e circo com argumentos que variam de, 'vamos que vamos', até, 'depois a gente vê como fica'...
Enquanto isso na Briosa... Tratamento de reses para com os seus, se piar... O látego opressor art. 11 canta no lombo do vassalo.

Anônimo disse...

O senhor está de parabéns. Conseguiu falar de merda o tempo todo, desde o título inclusive, e não transformou o texto numa merda; ao contrário, deixou límpido que a Lava-jato poderia ser a precursora de um emissário para os dejetos desta cidade.