Vitimização de policiais
“O mundo está
perigoso para se viver! Não por causa daqueles que fazem o mal, mas por causa
dos que o veem e fazem de conta de que não viram.” (Albert Einstein)
Thiago Reis. Do G1, em São
Paulo
Estudo ouviu 10 mil agentes sobre violência,
discriminação e condições de trabalho.
30/07/2015
05h00 - Atualizado em 30/07/2015 05h00
68%
dos policiais do país dizem ter colegas assassinados fora de serviço
Dado faz parte de estudo
do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Maioria dos agentes relata falta de equipamentos e discriminação.
Dois em cada três policiais do país dizem que já tiveram
colegas próximos vítimas de homicídio fora de serviço. É o que mostra uma
pesquisa feita pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e cujos resultados
serão divulgados nesta quinta-feira (30), no Rio.
O percentual de policiais que tiveram
colegas mortos fora do expediente (68,4%) é maior, inclusive, que o de
profissionais que dizem ter perdido um colega assassinado em serviço (60,6%).
Ainda de acordo com o estudo, 74,7% dos
agentes de segurança no Brasil dizem já ter sofrido ameaças durante o combate
ou a investigação de crimes; mais da metade (51,4%) relata ter sofrido ameaças
também fora do serviço.
A pesquisa, intitulada ‘Vitimização e
risco entre profissionais do sistema de segurança pública’, foi feita em
parceria com a Fundação Getúlio Vargas e com a Secretaria Nacional de Segurança
de Segurança Pública e ouviu 10.323 policiais militares, civis, federais,
rodoviários federais, agentes penitenciários e integrantes do Corpo de
Bombeiros e da Guarda Municipal em todos os estados do país. O estudo foi
realizado entre os dias 18 de junho e 8 de julho.
Para a diretora-executiva do Fórum
Brasileiro de Segurança Pública, Samira Bueno, a pesquisa mostra o quanto os
policiais estão expostos durante suas trajetórias profissionais. “Os policiais
são reconhecidos no Brasil pelas violações de direitos. Mas eles também são
vítimas de violações dos seus próprios direitos, que passam despercebidas.”
O estudo mostra que 64,2% dos agentes
dizem ser discriminados em razão da função que exercem. A reclamação de que são
alvos de preconceito da população recai também sobre o círculo de convívio dos
filhos: 22,5% dizem que eles já sofreram discriminação na escola ou na
comunidade.
“É um cenário triste. Mas trata-se de um
dado esperado. A percepção de discriminação que o policial tem está intimamente
ligada à desconfiança da população. Só 30% afirmam confiar na polícia. Isso
porque, desde 1988, com o advento da Constituição, que tecnicamente rompe com o
momento autoritário do país, muito pouco se mudou no modelo de segurança
pública. As pessoas se afastam dos policiais porque eles são tidos como
violentos. As instâncias responsáveis pela área direta ou indiretamente
precisam pensar em mecanismos de modernização”, afirma Samira.
O número de agentes que relatam situações
degradantes no trabalho é grande: 62,8% dizem já ter sofrido assédio moral ou
algum tipo de humilhação. Um terço (32,3%) afirma ter sido vítima de violência
física durante algum treinamento.
Rotina
A pesquisa revela ainda que os agentes costumam adotar hábitos específicos no dia a dia para evitar serem alvos de retaliação ou violência: 36%, por exemplo, escondem o fato de serem policiais ou agentes prisionais de conhecidos. Quase metade (45,5%) jamais deixa à mostra a farda ou o distintivo no trajeto casa-trabalho. E 61,4% evitam usar transporte público. “Esse dado chama bastante a atenção. São pessoas que têm que garantir o direito de ir e vir e não têm o deles assegurado. São pessoas que têm que esconder sua profissão”, afirma Samira.
Os agentes também relatam insegurança
durante a prática profissional e elencam alguns motivos para isso. A
impunidade, com 64,6%, é o principal. Mais da metade (52,7%), no entanto,
também coloca a falta de equipamento pessoal de proteção como fator
preponderante.
“Isso é um alerta para as corporações, para
os comandos, porque mostra como os profissionais se sentem em relação às
condições de trabalho. A gente o tempo todo cobra eficiência, redução de
indicadores de criminalidade. E é um dever cobrar. Mas pouquíssima gente olha
as necessidades dos policiais. Em muitos casos, não há coletes ou eles não são
adaptados, por exemplo, para a mulher que vai atuar”, afirma a
diretora-executiva do fórum.
De acordo com a pesquisa, 39,9% dos
policiais têm receio de serem assassinados em serviço. Essa percepção varia entre
as regiões do país. No Sul, esse índice sobe para 55,3%; no Sudeste, ele fica
em 34,5%.
Distúrbios psicológicos
Para Samira, outro dado que merece destaque é o de policiais diagnosticados com algum distúrbio psicológico: 16,4%. “É um número muito alto. E como as corporações enfrentam isso? Basta ver as estruturas de atendimento. Quando muito, se existem, estão só nas capitais ou regiões metropolitanas. Isso sem contar o preconceito dentro das corporações quando um profissional procura um psicólogo. E esse percentual diz respeito apenas aos diagnosticados. Ou seja, o contingente deve ser muito maior.”
De acordo com a pesquisa, 86,5% dos
ouvidos são homens, 56,4% têm de 25 a 40 anos e 44,1% trabalham em capitais.
Além disso, 43,7% se declaram brancos, 9%, negros, e 44,7%, pardos.
Policiais se despedem de colega assassinado em Aguaí, interior de SP, em outubro de 2014. Segundo pesquisa, quase 40% têm medo de morrer em serviço (Foto: Sagui Florindo/Gazeta de Aguaí)
MEU COMENTÁRIO
Enfim se faz justiça à realidade, mostrando-se o outro
lado da moeda. Ainda na semana passada comentei aqui sobre matéria que
demonizava os PMs, pondo-os em igualdade de condições com os facínoras que
infestam o Brasil de Norte a sul, de Leste a Oeste. Agora pelo menos o o FBSP e
o G1 ofertam ao leitor, cidadão brasileiro, e aos policiais, principalmente,
uma visão isenta do problema. Porque até então as matérias visavam a tão-somente
promover sentimento de pena em relação ao bandido e de raiva em relação ao
policial, o que intitulei como absurdo.
Espero que o Fórum Brasileiro de Segurança Pública busque
demonstrar pelo menos o contraponto das notícias que gera para a mídia, de modo
a não ampliar a agonia dos policiais, e que fique mais claro o seu
posicionamento, que no mínimo deve ser isento. Pois de uns tempos para cá o
FBSP vem claramente se ideologizando, assim afastando do seu foco aqueles que
mais necessitam de apoio na luta contra a criminalidade: os policiais.
Vamos torcer para que pesquisas como esta, publicada em
boa hora, se aprofundem e sugiram à população brasileira a melhoria do sistema
de segurança pública como um todo globalizado, tendo no seu braço de força estatal
um aliado, e o bandido, um mal a ser tratado na forma da lei, e não o
contrário...
Não almejo que o FBSP enverede pelo corporativismo, isto
seria ruim até para os órgãos de segurança pública e seus agentes. Espero, sim,
isenção e avaliação mais contextual, fugindo-se do fragmento sensacionalista, que
é vício da imprensa e não pode ser abraçado por um organismo que pretende ser
reconhecido como capaz de fazer ciência social respeitando suas metodologias.
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