sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Reflexão para o fim de semana


O rebolation dos PMs: uma questão de conceito


Muitas gentes às vezes me indagam por que não me candidato novamente a cargo político para me legitimar em virtude das opiniões que emito. Eu, por minha vez, respondo que para ser político não é necessário candidatura, eleições, vitória e mandato. Creio que o mandato parlamentar não legitima nada, o que se legitima é a opinião bem aceita, e é por aí que tento me firmar junto ao público leitor e não em vista de agradar a algum eleitor... Ora, do jeito como a política está desmoralizada, isto afeta os políticos generalizando a ideia de que basta ser um deles para não prestar. Claro que se trata de preconceito de difícil reversão, pois parece que os sistemas de poder, em especial os burocráticos, – formados por pessoas permanentes, concursadas, – tendem a execrar o sistema político, pois lhes interessa abraçar o poder sem concorrência. Mas isto não é novidade, desde que as sociedades instituíram o Estado subdividido em três poderes, os demais se impuseram sobre o Poder Legislativo, este que, em tese, mas não na prática, representa a vontade popular multifacetada. Já o Poder Executivo, embora de natureza majoritária, concentra em apenas um a capacidade de intervir na sociedade por meio de estruturas permanentes, limitada a sua intervenção às nomeações de burocratas não eleitos pelo povo, porém com um desmedido poder de intervir diretamente na vida dos cidadãos. Por sinal, interfere bem mais que o Poder Legislativo, este que depende de fazer leis para alcançar algum objetivo de interesse popular mais amplo, algo bastante improvável. Já o Poder Judiciário, formado por burocratas concursados, concentra a capacidade de discernir sobre os conflitos entre os outros poderes do Estado por meio da interpretação de leis malfeitas e obscuras, o que torna a sentença judicial soberana em cotejo com as decisões políticas e burocráticas, com a vantagem de somente ser contestada por instâncias superiores do mesmo Poder Judiciário, até se chegar ao topo da pirâmide judicial, o que, aliás, nem sempre ocorre: muitas decisões transitam em julgado ainda na base desta pirâmide vencedora das outras paradoxalmente representativas da vontade do povo.

A vontade do povo é manifestada pelo voto livre. Antigamente, a Ágora de Péricles predominava, o povo ia às praças públicas se entender diretamente com os administradores de suas cidades. Era o que conhecemos como democracia direta, sendo a nossa, atual, meramente representativa ou nem isto. Cá entre nós, as sociedades incharam e se dispersaram em ambientes sociais distantes entre si, demais de outros fatores culturais incompatíveis e até antagônicos. No enorme Brasil nem é preciso aprofundar para que todos concordem com esta realidade das diferenças sociais e culturais. Ocorre que o nosso sistema político centralizado não distribui bem-estar com equidade, entendendo-se aqui o bem-estar como um valor abrangente. Também não é preciso muito refletir para aceitarmos como dura realidade que o nosso sistema de escolha dos representantes políticos não acontece com a transparência devida, assim como os demais poderes muito pouco contribuem para que esta representatividade seja realística. Enfim, o Estado é despótico, embora aparente o contrário, assim como os interesses capitalistas superam em gênero, número e grau os interesses individuais e coletivos e todo o resto. Sim, sem defender os demais sistemas político-ideológicos, entendo que o sistema capitalista pátrio é deveras injusto e corrupto. E é neste ambiente que as instituições atuam, sofrendo pressões de cima e de baixo e desenvolvendo seus papéis sociais em meio a essas contradições, autêntica balbúrdia que faz rebentar a corda sempre no lado mais fraco: o dos despossuídos, que pouco ou nada mandam e muito são mandados.

Numa sociedade como a nossa, em transformação turbulenta, defender padrões ortodoxos chega a ser hilariante, em especial quando essa defesa se traduz em crítica ao comportamento de terceiros sob o manto de um falso moralismo. Enfim, defender posições reducionistas e disparar críticas contra comportamentos individuais ou coletivos cheira a hipocrisia. Porque superabundam falácias como fundamentos de um espírito crítico apenas conveniente ao momento e ao contexto que interessa a quem critica. Claro que a eloquência do crítico, aliada ao apuro do estilo ao grafar seu silogismo erístico, costuma afetar a massa distraída e culmina produzindo o efeito almejado pelo sujeito da ação destinada a influenciar pessoas a favor ou contra algum específico comportamento. Nada demais, a sociedade é assim, e quanto mais se estuda os efeitos da manipulação em suas multivariadas formas, mais se conclui que é realmente fácil influenciar, bastando para tanto uma retumbante falácia posta em lugar e tempo certos. E hoje o lugar certo é a internet desdobrada em muitas oportunidades de comunicação de massa. O perigo, todavia, está na facilidade de disparar ideias e controlar seus efeitos de modo a difundir concordâncias e eliminar discordâncias, o que conhecemos por “moderação”. Também a exposição de posicionamentos contrários tem um preço que muitos não se arriscam a pagar; deste modo, fica o assunto no ar como a garrafa pela metade, sem que ninguém se atreva a preenchê-la ou esvaziá-la, ou buscar uma garrafa proporcional ao seu indefinido líquido. E, desta forma, a garrafa permanece meio cheia sem que os que a acham meio vazia se pronunciem. É assim que funciona a dubiedade de alguns escritos, – meio cheios ou meio vazios, – cujo objetivo é a propagação da ideia do autor, este que não escreve gratuitamente, todos que escrevem visam a influenciar pessoas. Aliás, é o que faço agora objetivando alertar meus leitores contra as tocaias ocultas numa escrita qualquer, em especial quando o texto é veemente em demasia.

Nada demais, eu também defendo ideias, certas ou erradas, mas sempre com a cautela de não ofender pessoas. Posso apenas concordar com elas ou então contradizê-las, mas respeitosamente. Creio que esse tipo de comportamento, que entendo como ético, deva ser a tônica de quem tem responsabilidade e sabe que suas palavras podem influenciar negativamente pessoas distraídas. Sim, porque infelizmente vivenciamos uma sociedade modista, que acha interessante assistir a baixarias como as do Big Brother. Bem, há quem goste, mas eu não consigo ficar um minuto sequer sintonizado nessa espertíssima “máquina caça-níquel” que vai ao ar sob o manto da “liberdade de expressão”, sem que se leve em conta valores mais importantes como a moral e a ética na vida em sociedade. Mas o meu raciocínio não tem por alvo o Big Brother e seus despudorados exemplos. Estou aqui, na verdade, ainda a matutar sobre o rebolation dos PMs no programa da Regina Casé (ESQUENTA), que focou positivamente as UPPs e culminou expondo uns poucos companheiros à execração por parte de alguns indignados de ocasião (PMs ou não), que reagiram tais como eu o fiz agiora em relação ao Big Brother, – que comparo à teletela orwelliana piorada, eis que consciente e voluntária, – programa veiculado ao vivo pela mesma emissora com fins inegavelmente lucrativos, como se não mais houvesse compromisso social da concessão com a moralidade pública. Por favor, entendam a crítica ao Big Brother apenas como exemplo comparativo, embora eu pense exatamente como escrevi.

A exploração negativa do episódio do ESQUENTA, focada no comportamento dos PMs, deve ser avaliada com maior profundidade, tendo como paradigma a legitimidade em contraposição à legalidade. Eis por que iniciei falando de política... Como sabemos, e segundo a Ciência Política, a legitimidade e a legalildade são duas situações que deveriam estar superpostas – ideal –, mas dificilmente ocorre a superposição, mesmo nas mais apuradas democracias. No caso do rebolation dos PMs, uma forte corrente reagiu em pesadas críticas arguindo a ausência de legitimidade do comportamento e mais ainda de legalidade. Apelaram para os regulamentos militares, segundo eles rompidos em sua essência e na prática, culpando ainda o secretário de segurança pública por abonar com sua presença a inusitada reação dos PMs, que, entrando no clima musical reinante, dançaram fardados. É óbvio que, sob a ótica simplista dos regulamentos militares, o fato em si geraria punição. Ocorre, todavia, que esse mesmo regulamento prescreve que a autoridade supracitada decide sobre a hierarquia e a disciplina acima do comandante-geral da PMERJ, o que de pronto anula qualquer opinião ou providência por parte deste e reduz a nada a opinião de subordinados, sem que isto signifique a impossibilidade de opinar. Afinal, a livre manifestação é um direito do cidadão, desde que respeitadas a honra e a imagem das pessoas. O inusitado rebolation, a meu ver, se legitimou na medida em que o secretário de segurança pública foi causa e efeito dele. Portanto, não cabe discutir erros ou acertos em vista da legalidade e da legitimidade, especialmente porque as vozes contrárias talvez não reúnam, também, legitimidade para atacar o problema com as armas da legalidade, a não ser que recorram ao Poder Judiciário. E, quanto à legitimidade, pelo menos até onde eu sei, não houve reações políticas importantes e tudo se resumiu a interesses políticos inconfessos.

Não discuto a questão, todavia, além do fato de que a elite capitalista determina artificial ou artificiosamente a legitimidade interferindo no campo das atitudes e do comportamento consequente, deixando pouco espaço para opiniões contrárias. A influência midiática sobre a atitude e o comportamento das pessoas é algo inegável, como explica a Psicologia Social. Ora, não há comportamento (visível) sem alguma atitude (invisível) impelindo-o, e esta atitude decorre da cultura predominante na sociedade, seja natural ou imposta por meio de propaganda bem direcionada ou até de “lavagem cerebral”. Neste ponto, não se há de negar que as camadas mais simples da sociedade são afetadas diretamente por movimentos musicais do tipo que predominou no programa. E os PMs do rebolation fazem parte dessas camadas mais simples e manifestam gritante preferência por movimentos musicais exatamente como os favelados, isto sem falar que muitos PMs são oriundos de favelas, onde nasceram, foram criados e possuem parentes. No fim de contas, são todos rotos ou esfarrapados, e o resto é pura balela. Portanto, exigir que PMs embolados com seus iguais reajam diferente só em função da farda, inda mais no caso em que havia uma autoridade maior legitimando a reação, por sinal, e segundo a minha ótica, naturalíssima, é, mesmo, pura balela! Imaginar também que o capitalismo não estivesse pagando a conta do ESQUENTA para generalizar em otimismo o sucesso das UPPs, de um lado afagando os PMs, e propagar a satisfação dos favelados, do outro glamourizando a arte predileta de ambos, é ignorar a realidade. Pois é certo que um programa como o ESQUENTA, para atingir o objetivo de seus mentores, jamais poderia inserir música erudita como pano de fundo e de animação daquela plateia. Enfim, e dentro das circunstâncias que aqui grafei em digressão ou em especificidade, não importa, tudo que aconteceu no ESQUENTA foi normalíssimo e tenho dito!

5 comentários:

Anônimo disse...

Irretocável.

Anônimo disse...

Irretocável.

Reynoso Silva Cidadão Bombeiro... disse...

Muito bom, saber que a sanidade e a Clareza de espirito se encontra entre nós! falei de uma forma mais sempre exatamente o que o senhor brilhantemente escreveu! Parabéns!
Reynoso Silva Cidadão Bombeiro!

Anônimo disse...

É muito fácil usar palavras bonitas quando vc mesmo não respinde a drds por ferir o pundonor militar. É muito fácil não se indignar quando vc ñ tomou tiro da quadrilha de fascínoras q atuava no complexo do alemão e da qual faz parte esse marginal q teve o prazer de ter como parceira de dança a capitã . Tive o desprazer de trocar tiros e de perder parceiros lá.
Esse assassino sequer pagou pelo q fez.
Hipocrisia foi o q aconteceu no referido programa.
Q me desculpem os oportunistas da vez , mas eu sou polícia de verdade e não me misturo a bandidos.

Emir Larangeira disse...

É muito fácil dizer o que se quer dizer escudado no anonimato! Como saber se a indignação do anônimo procede, se se esconde por trás do "ninja virtual"? Como saber se fala a verdade quanto à sua valentia e tropeços profissionais? Mas tudo isto não desmerece a opinião sobre a hipocrisia alegada, mas mal explicada. Hipocrisia é quando se finge aquilo que se diz ou faz. Ali não me pareceu que alguém fingisse, todos estavam realmente animados e vivenciando o momento de alegria. Hipocrisia é falsa devoção. O que me está cheirando a hipocrisia são as críticas, mesmo as assumidas, de falsos moralistas. Aceito e posto a observação do anônimo porque nela vejo um rasgo de sinceridade, e não de hipocrisia. Mas se o anônimo estivesse naquele circo, talvez sambasse como os que lá estavam. Ah, só pra você, anônimo: hipocrisia foi o concerto sinfônico no Complexo do Alemão ignorando a morte da PM Fabiana dias antes naquele local. Mas, enfim, são opiniões contrastantes, e o ser humano vive de contrastes, estão neles o sal da vida.
Obrigado pela contribuição e evite responder a DRD, a não ser que a causa seja justa...