quinta-feira, 17 de junho de 2010

Sobre a crítica

Não raramente sou questionado por evitar críticas a outras corporações atuantes na segurança pública. A resposta é simples: creio, em princípio, que cada qual deve cuidar do seu próprio quintal antes de avaliar o do vizinho. E, mesmo que este se apresente feiíssimo, devemos observar primeiramente o nosso, pois nele sempre haverá o que destruir para reconstruir, isto no mínimo. Daí é que me prendo à PMERJ (o meu quintal), não sem me ufanar por saber que minha tão malfalada corporação, se cruzar os braços em resposta às duras críticas que recebe, o ambiente social se tornará vulcânico. É como na relação intrínseca entre a saúde e a doença. Só damos valor à saúde quando adoentamos. É assim também com a ordem e a desordem: só valorizamos a primeira quando a segunda nos atinge, e o primeiro remédio que nos surge é a PMERJ. Se ela não funcionar, aí sim, virão os tratamentos seguintes: a PCERJ, o Ministério Público, o Poder Judiciário, o Sistema Carcerário etc. Com efeito, no corpo humano, a saúde se digladia com a doença; no corpo social, a ordem se confronta com a desordem. São as eternas tendências à entropia dependentes de ajustamentos em direção à homeostase.
Manter a saúde é se prevenir contra a doença; manter a ordem é se prevenir para não ocorrer a desordem. Se não houver prevenção, a doença ou a desordem poderão imperar até fazer morrer o corpo físico ou o corpo social. Não são poucos os exemplos de ambos (doença e desordem). A morte cessa a doença individualmente, mas a epidemia é capaz de produzir mortes físicas e sociais concomitantemente (doença acrescida de desordem). Enfim, doença e desordem é que devem ser o foco precípuo do indivíduo e da sociedade. Como nos ensina o estudioso Cel PM e Professor Jorge da Silva, devemos administrar a insegurança, para evitá-la ou minimizá-la, num processo dinâmico e infinito. Sim, a PMERJ administra a desordem para que a ordem predomine. Trata-se de uma guerra sem fim, desdobrada em batalhas em que a ordem vence aqui e perde ali, e sempre por um triz porque a desordem é teimosa...
Creio até que ficaria mais bem posto se a PMERJ fosse denominada “polícia de administração da desordem pública”. Porque o nosso labor cotidiano incide sobre a desordem. Onde há ordem não há a necessidade de polícia alguma, e muitíssimas vezes a ordem predomina sobre a desordem ou a esta se adapta, legitimando-a e tornando-a ordem sem intervenção policial. Afinal, como diz com sabedoria a Carta Magna, a segurança pública (garantia da ordem pública) é dever do Estado e responsabilidade de todos. Nesta última prescrição constitucional se incluem o cidadão, lar, a escola, a igreja e demais segmentos sociais cumprindo seus papéis. Enfim, seria a sociedade convivendo saudavelmente, sem o Estado intervindo nas liberdades individuais e coletivas ou fazendo-o no seu mínimo. Seria a sociedade se administrando a si, definindo o que é ordem e o que é desordem, antes de o Estado exercer o seu papel coercitivo em vista de uma “ordem” não legitimada pela sociedade a que serve ou deveria servir, por sinal, sempre exagerando na vigilância, na punição e na espoliação dos cidadãos... O Estado deveria, sim, ser o fomentador do desenvolvimento, invertendo o sentido contínuo da frase “Ordem e Progresso”, contida no Pavilhão Nacional, para “Progresso e Ordem”...
Mas, não! Antes de ser estimulada, a sociedade é vigiada e punida por diversos organismos estatais policiais e não policiais. Os cidadãos vivem cercados de impedimentos e afagados por autorizações que soam como proibições. Porque, quanto se autoriza alguma coisa, presume-se certa vontade anterior de proibi-la, o que por si só encerra a ideia da vigilância e da punição como um sistema de tocaia... Sim, porque a sociedade, para viver em paz e harmonia, trabalha e entrega grande parte do seu suor ao Estado. Portanto, nada que o Estado faça em benefício do cidadão é favor; pelo contrário, é obrigação, para a qual é mui bem remunerado. E entre os organismos estatais que mais cumprem a sua parte devolvendo serviços à sociedade, a PMERJ se destaca, o que não significa dizer que esse nosso quintal está bem-cuidado. Na verdade, não está funcionando tão a contento, assim como nenhum outro serviço público pode afirmar excelência no Brasil. No caso da PMERJ, aceitar e corrigir falhas significa avanço no sentido de prestar o melhor serviço público. E corrigir falhas é um processo contínuo...
Se o serviço público, de um modo geral, é ruim, o que há de excelente é publicidade tornando-o “bom” aos olhos e ouvidos ingênuos do povo. E é assim porque a publicidade penetra a mente do indivíduo isoladamente e produz o efeito pretendido. A publicidade trabalha o “rebanho” por meio da influência de cada “ovelha”. Portanto, a publicidade, nesse sentido, é um mal social. E, em se tratando de publicidade paga pelo Estado, via contribuinte, é um mal social maior, pois o que se propaga é a falsa verdade. Ou a mentira! Jamais a verdade!... No mundo particular, igualmente, a publicidade vende porcaria, e o povo, afetado por mensagens que atingem o emocional individual, compra-a, joga-a fora e torna a comprá-la. A má publicidade é uma desgraça!
A PMERJ faz pouca publicidade do seu bom serviço. Ela substitui ou complementa muitos serviços assistenciais como regra operacional inevitável e não difunde esta suada contribuição para o bem-estar da sociedade. Daí é que as falhas são maliciosamente noticiadas pela mídia. Afinal, não se trata de publicidade paga pelo Estado, mas de acontecimentos individuais desmoralizantes, que se generalizam midiaticamente, tornando o todo, que é bom e até excelente, algo ruim. O perigo disso é o círculo vicioso, pois o policial cumpridor dos seus deveres não recebe a aprovação da mídia e acaba entendendo que “ser ruim é a regra”. E muitas vezes, revoltado, não insiste no bom serviço, que, por sinal, é pessimamente remunerado. E o círculo gira no sentido inverso do desejado pela PMERJ e pela sociedade. E tudo termina mal, mesmo que comece bem aos olhos e ouvidos do povo afetado pela má notícia. Mas é assim o mundo: ele pertence à versão e não ao fato; ele pertence à aparência e não à realidade. A PMERJ trabalha com a realidade, e faz grande esforço para bem cuidar do seu quintal, embora aparente não fazê-lo por culpa da má publicidade propagada pela mídia sensacionalista e amante do “Cidadão Kane”...

4 comentários:

Paulo Xavier disse...

Ano passado fui a uma festa de aniversário de 60 anos de um amigo Policial Militar Reformado e encontrei-me com alguns ex companheiros de batalha que não via a mais de 27 anos.
Passamos o dia nos divertindo, ora com brincadeiras e zoações, ora com conversas sérias e numa dessas conversas sérias, o assunto se voltou para os filhos, alguns estavam presentes, inclusive o meu e aí pude perceber que nenhum PM ali presente, inclusive Oficiais Superiores, mencionou que seu filho era Policial Militar.
Ora, se eu tenho orgulho da minha profissão, vou desejar que meu filho siga esta mesma profissão, mas infelizmente são muitas mazelas, injustiças, baixos salários, risco da morte rondando 24 horas do dia. É uma profissão muito mal entendida pela população em geral, não sei se a culpa é só da imprensa.
Com sinceridade, costumo defender a classe quando comentam injúrias e difamações perto de mim, porque conheço os problemas enfrentados no dia a dia, cheguei a defender a contratação de um ex-PM e ele trabalhou comigo por alguns anos e era um excelente profissional, hoje ele está reincluído e é 2º Sgt na ativa.
Estamos em festa pela Copa do Mundo, dois goleiros foram afastados e talvez nunca mais disputem um jogo pela Copa, o mesmo aconteceu com alguns jogadores que levaram o segundo cartão amarelo. Na PM é mais ou menos assim, você faz mil ocorrências dignas de elogio, mas se falhar em uma apenas, poderá nunca mais entrar em campo.
Parabéns Cel Larangeira, por mais um belo texto que sempre nos induz à reflexão.

Anônimo disse...

No ultimo concurso do CBMERJ eu e outros companheiros fizemos de tudo para que nossos filhos seguissem nossa carreira, mais parece que esse assunto é doença, as provas cada vez mais difíceis, coloquei meu filho em cursos, mais não deu e tive que ver ele com 23 anos chorando como criança, foi forte agora ele esta lá no nordeste longe de mim e da Corporação, me vi impotente. Vou me dedicar para melhorar essa visão e outros BM não passem o que eu passei mesmo estando na Área de ensino, igual ao companheiro das Forças Armadas dar todo apoio ao filhos da casa.
Creio que se fala muito em tradição mais para nós hoje em dia isso é só falácias. Trabalhei na Escola de Bombeiros e junto a Academia. fico feliz quando um filho de BM passa e se forma.
Isso é amor é tradição.

Reynoso Silva

Anônimo disse...

Caro Padrinho e Amigo Cel Emir Larangeiras

Vejo com tristeza essa síndrome que se apossou de todo, concurso idôneo, e sério é quando passam o mínimo de filhos de Militares Estaduais para as Corporações, foi assim que vi e senti.
E ninguém se preocupa em questionar essa linha de pensamento pelo menos dar publicidade. Li em um trabalho da psicóloga da DGI do CBMERJ, sobre o que seria as qualidades especiais para ser um BM, foi além dos meus conhecimentos prova ali que nem só de Matemática e português se faz um BM e que as autoridades tem esse conhecimento sendo, o assunto alvo de estudos, dentre as qualidades destacava-se o amor à profissão, quase um sacerdócio. Se achá-lo vou colocar na integra no meu blog.
MUITOS ENTRAM JÁ PENSANDO EM SAIR.
Tenho esperança que alguém possa ajudar ou provar que estou errado.

Reynoso Silva

Anônimo disse...

Cel
Mais um a parte, posso dizer que com certeza deveria fazer parte de nossa cultura como Bombeiro,e com orgulho, passar de pai para filho, com um cerimonial,como vi outro dia na internet, o pai batizando o filho com um banho de mangueira, cheguei a inveja-lo ,assim como a dedicação que temos ao servir a população. além do dever, isso deveria ser nossa raiz cultural mais uma de nossas máximas, dentre tantas, raiz sim, nos nossos princípios para a continuação da Familia de BM e PM.

Ten BM QOA/79 Reynoso Silva