terça-feira, 4 de maio de 2010

Sobre a segurança pública na “democracia” brasileira

Quem milita na segurança pública necessita se policiar para não se contagiar pela desgraça que acompanha cada notícia, mesmo as que exaltam o sucesso policial, porque, ao fim e ao cabo, tudo resulta na constatação da existência de um banditismo perigoso para a sociedade. E tão volumoso e globalizado é o crime que só as pequenas partes dele são esporadicamente afetadas. Os crimes de sangue entre bandidos e a morte constante de policiais em confrontos ou tocaias perpetradas por facínoras alcançam índices alarmantes, em especial se comparados com o que acontece nos países civilizados. Isto significa que estamos longe de ser um povo civilizado, e nem precisaria citar crimes para concluir que não o somos: pecamos antes na distribuição das riquezas pátrias. Somos, sim, incivilizados, por estarmos enfiados na miserabilidade que afeta calamitosamente expressiva parcela da população brasileira.
Somos alegres e felizes, dizem os interessados nesse falso discurso. A generalização brilhante da sorte de algum favelado destacado no futebol deixa-nos a falsa impressão de que todo favelado é ou será jogador de futebol de renome e realizado na vida. Enquanto isso, a maioria dos jovens segue o modelo do traficante bem-sucedido e ingressa no crime na tenra idade. E dificilmente ultrapassa os desafios mortais da atividade criminosa pela qual optou para desfrutar de algum glamour, como costuma assistir na telinha da tevê. A facilidade de aquisição de um aparelho de tevê é primeiramente interesse de quem utiliza esta via de comunicação de massa. Porque, antes de proporcionar o lazer, ele vende produtos e projeta uma falsa esperança entre o povoléu. Daí ser comum a imagem dos barracos favelados ostentando antenas como aquele repolho de festa cravado de palitos depois de comidos os ovos de Codorna. E o repolho vai ao lixo, e é apanhado pelo miserável, e mata a sua fome...
A indústria da comunicação lembra a tática da contravenção penal explorada por particulares e pelo Estado. O jornal custa o preço de uma pequena aposta e ainda serve de “papel higiênico”. A luz da favela geralmente é “gato”. Então o consumo de energia pela tevê é, como se diz na gíria, “0800”, tanto como o “gatonet”, que, se de um lado prejudica os poderosos meios de comunicação, de outro lhe permite vender os produtos anunciados, compensando assim a perda temporária da assinatura. Fosse o custo da “gataria” mais prejuízo que benefício, o sistema já a teria transformado em tamborim, do mesmo modo descarado com que explora jogo de azar enquanto combate os bicheiros. Mas jogo de azar estatal presume “causa nobre”, e, neste caso, a lei não vale. E o policial, por outro lado, há de ser honesto mesmo passando fome, eis a insistente e hipócrita cobrança que a mass media faz para desviar a atenção pública de suas próprias incoerências enquanto influencia a sociedade ao bel-prazer de seus interesses financeiros e políticos.
O mote para tanto desvario é a liberdade de imprensa, que deve ser máxima, sim, mas com responsabilidade civil e penal dos que exageram, o que os profissionais do ramo não aceitam de modo algum. Basta um pequeno beliscão e eles explodem em ira coletiva e ai do alvo escolhido... A Justiça, por sua vez, desde muito tempo se tornou circunflexa ao “Quarto Poder”, tanto que costuma ser perda de tempo recorrer aos tribunais para reivindicar direitos e cobrar deveres em se tratando de ofensas e mentiras publicadas sob o manto da “liberdade de imprensa”. Aliás, o Poder Judiciário é também circunflexo ao Poder Executivo, de tal maneira que é perda de tempo e dinheiro recorrer ao primeiro para corrigir injustiças praticadas pelo segundo.
Num sistema totalitário dissimulado em democracia, como o nosso, o povo é apenas expectador das poderosas tramas governamentais e midiáticas. Pior é que sendo levado como gado à aceitação tácita ou explícita de absurdos inteligentemente difundidos pela mass media regada a ouro governamental decorrente dos altos tributos que passivamente pagamos. E segue o povo no seu papel de bobo ou de palhaço em cabriolas num picadeiro enodoado pela imoralidade, pela ilegalidade e pela total ausência de ética. Não nos discursos oficiais e midiáticos. Para essa turma, esses valores são as “bandeiras” que empunham em desfaçatez absurda. E o difícil é separar os verdadeiros homens públicos e profissionais de imprensa enfiados entre os falsificados e socialmente doentes. Daí o justo pagar pelo pecador, num sistema em que predomina sempre a máxima de Trasímaco: “A justiça é o interesse do mais forte, ou seja, do governante”.


Há quem defenda essa sem-vergonhice pátria, que advém de uma cultura escravocrata enraizada na mente da elite e impregnada na massa subalterna e sem vontade própria em virtude da pobreza, da indigência e da miséria (“gado de rebanho”), e a ouvir daquela elite: “É pobre, mas é honesto”. Sim, há quem dissemine este absurdo, que encerra, no fundo, o preconceito de que ser pobre é precondição para ser criminoso. Como subsistir condignamente o pobre, o indigente e o miserável nessa sociedade que não põe rico na cadeia? Ora, eu me recuso a engolir a moderníssima e maliciosa classificação dos “abaixo da linha de pobreza”, que camufla as brutais diferenças entre “pobres, indigentes e miseráveis”, cujos conceitos sociológicos nos foram mui bem ensinados pelo eminente sociólogo Pe. Fernando Bastos de Ávila e não devem ser esquecidos.


Contudo, animar é preciso; tanger a boiama a toque de berrante é crucial; ou então pô-la a andar a ponta de lança é a saída: o poder do estado dominador e cobrador de impostos, – tal como faziam os despóticos reis medievos, – o poder do estado garante a opressão dissimulada no que vivenciamos como “democracia”. Ora!... Está aí, a pleno vapor, uma ditadura de esquerda tão ou mais viciada que o Estado Novo. E nós, cidadãos, sofremos o mando cruel de dominadores e ladrões, e não de representantes legítimos, pois o voto é o do rebanho e é em sua maioria manipulado pelo vil metal. Demais, o voto é obrigatório, excrescência tão tamanhona que se bastaria a si para confirmar o óbvio: o Brasil não vivencia a liberdade democrática, mas um totalitarismo de lobos travestidos em cordeiros.

4 comentários:

Paulo Xavier disse...

Esse tema daria para se escrever um livro, caso os "guerreiros" que visitam esse blog não fossem tão avessos à exposição. Existem histórias fantásticas que a mídia não tomou conhecimento ou preferiu não divulgar. Vou tentar resumir uma: Foi no ano de 1980, era véspera da primeira visita do Papa João Paulo II ao Rio, havia um aparato policial enorme, todos de prontidão e eu me encontrava de serviço normal de Patamo. Era entre 22 e 23 horas quando o rádio das viaturas anunciava que quatro bandidos haviam amarrado um motorista de táxi em uma torre de telecomunições na divisa de Niterói e S Gonçalo, no alto de um morro e com seu carro, eles praticavam assaltos em série em vários bairros. Iniciou-se o cerco policial e logo uma RP os avistou no bairro da Covanca em S Gonçalo, seguindo-os à média distância e informando a todas as viaturas o rumo que eles tomavam. Erro dos malandros, entraram na Avenida Edson com destino ao bairro do Rocha e ali eles morreram crivados de bala, depois de intensa troca de tiros quando infelizmente um PM do 7º BPM também veio a falecer.
Lembro-me que várias TVs foram para o local com geradores e holofotes superpotentes, registrar o fato que não saiu uma linha sequer nos jornais no dia seguinte, nem nada foi noticiado na TV.
Nesse episódio a PM e a Policia CIvil fluminense prestaram um excelente serviço à sociedade, dando inclusive uma vida de um chefe de família, mas o povo brasileiro naquele dia não podia ver a visita de Sua Santidade o Papa João Paulo II manchada de sangue.

Celso Luiz Drummond disse...

Grande Emir, primeiramente tenho que lhe parabenizar por mais um brilhante texto escrito pelo amigo no qual eu tive o privilégio de ler e absorver novos conhecimentos.
O amigo fez uma analogia parecida com a pauta que eu entreguei para o jornal da faculdade. O fim do regime militar revelou a fragilidade do estado democrático de direito. O que ocorreu é que nessa transição deixamos de ter o regime coercitivo, porém passamos a ter a ditadura do social, carinhosamente apelidada de violência urbana.
Como disse o Paulo Lins (autor do livro Cidade de Deus) no documentário Notícias de uma Guerra Particular, sempre morreu gente na favela só que a mídia não divulgava. A mídia só passou a divulgar a violência, o homicídio o assalto, quando ele começou a alterar a rotina urbana das pessoas.
Outra coisa que você destacou no texto a questão da aparelho da tv, o Hélio Luz ressalta em uma entrevista ao mesmo documentário. Como ele diz o miserável vê na novela da Globo o "Fantastico" mundo da fantasia e quando ele sai fora do barraco dele ele cai na realidade. Como ele quer pertencer a aquela realidade ele vai praticar assalto. Ou entao no caso do menino que entra para o tráfico, ele vê o chefe do morro como um deles que deu certo. O Helio Luz ainda ressalta que os caras são tão sem noção que você pega o Uê num hotel cinco estrelas.
Com relação ao papel da mídia, eu hoje estive em algumas delegacias da capital mineira para levantar dados para uma matéria referente a criminalidade na regiao centro-sul de Belo Horizonte. E uma das coisas que o soldado que nos atendeu reclamou foi o papel nefasto que alguns órgaos de imprensa fazem com o intuito de desmoralizar a corporação Polícia Militar. Ele disse que os policiais honestos (a maioria), pagam pelos atos cometidos por uma minoria (vide pm's de são paulo que espancaram o motoboy até a morte) que prejudicam a imagem de uma coorporação inteira em território nacional.
Outra coisa que achei interessante foi ele dizer que acabar com o crime é utopia, pois existe desde que o mundo é mundo. O que ele disse que há é a prevenção ativa, para que os níveis criminais estejam dentro de uma margem aceitavel. Porém alguns individuos como o secretário Beltrame pregam o discurso populista dizendo que vai acabar com o crime no RJ (coisa que eu duvido, ja que nao existe efetivo pra 1020 favelas fortemente armadas como mostrou o reporter record da ultima segunda feira), aliás o Beltrame está repetindo o slogan de campanha do ex. governador Moreira Franco que nos anos 80 prometeu acabar com a violência em 06 meses.E o pior é que o povo iludido ainda consegue crer nisso.

Celso Luiz Drummond disse...

Paulo Xavier até hoje a mídia faz isso.
Hoje na zona sul de são paulo uma moça foi morta após uma tentativa de assalto e ontem terça-feira aqui em Belo Horizonte uma empresária foi morta após a nova modalidade arquitetada pela vagabundagem conhecida como saidinha de banco. Porém eu não vi uma linha no principal telejornal do país o JN.
O JN até a escolha da Copa 2014 e do Rio 2016 divulgava noticias referentes a violência urbana com grande destaque. Essa semana mesmo mexendo nos meus arquivos de VHS encontrei uma edição de 2008 que começava falando de uma operação da CORE na favela do Cantagalo e também tinha uma matéria de um assalto em São Paulo. Se fosse hoje não teriam divulgado. Afinal como o JN agora é exibido na Globo Internacional,eles querem mascarar a situação pros gringos dando a entender que aqui tá tudo bem por aqui. Aliás vale a pena destacar que jornalistas da propria rede globo em palestras a estudantes de jornalismo são totalmente contrários a realização tanto da copa 2014 como do Rio 2016.

Paulo Xavier disse...

Celso Luiz, disse que daria para escrever um livro, mas com certeza seriam vários livros, se bem que não resolveria esse grave problema social, porém todos saberiam que a ferida é bem maior do que imaginam. Concordo com tudo que foi dito aqui, mas convenhamos, com a proliferação do uso e do comércio das drogas, a coisa está tomando tamanho e peso insustentáveis.
Sabemos que o problema é bastante complexo e de difícil solução, porém sem a união de tods os segmentos da sociedade, sem a interação dos Poderes Constituídos, a tendência é o mal vencer o bem, como bem já disse o Cel Larangeira.
Um abraço.