segunda-feira, 27 de julho de 2015

RIO EM GUERRA CXVI

Absurdo!

“O mundo está perigoso para se viver! Não por causa daqueles que fazem o mal, mas por causa dos que o veem e fazem de conta de que não viram.” (Albert Einstein)

"27/07/2015 07h38 - Atualizado em 27/07/2015 12h00

Tahiane Stochero - Do G1, em São Paulo



Brasil teve mais de 2,5 mil pessoas mortas por PMs em serviço em 2014

São 7 mortes por dia, em média; RO, GO, DF e MS não passam nº.

MP e especialistas criticam falta de transparência sobre letalidade policial.

Levantamento exclusivo feito pelo G1 com base nos dados das secretarias da Segurança Pública mostra que ao menos 2.526 pessoas morreram em 2014 somente em ações de policiais militares em serviço em 23 estados do país. Isso significa sete mortos por dia, em média.

Cinco estados concentram os maiores números: 
São Paulo (695 mortes), Rio de Janeiro (582), Bahia (256), Paraná (178) e Pará (159). 

“É preciso maior transparência. Também há outro aspecto: pode haver corporativismo." (Marcelo Godoy, procurador)

Rondônia afirmou não possuir o número de pessoas mortas nas ações policiais em 2014. Minas Gerais informou o dado após a publicação da reportagem. Já as PMs do Distrito Federal e de Mato Grosso do Sul não responderam aos questionamentos da reportagem.

Em Goiás, o tenente-coronel Ricardo Mendes, porta-voz da assessoria de imprensa da PM, disse que não achava necessário repassar o número à reportagem. "Não vemos necessidade de divulgar os dados. Por qual motivo você precisa disso? As estatísticas que você precisa sobre segurança pública estão no site”, respondeu o oficial, referindo-se a dados gerais sobre crimes, como homicídios e roubos.




Estado
mortos em confronto
média/100 mil habitantes  
total de PMs mortos
SP
695
1,58
14
RJ
582
3,54
16
BA
256
1,69
31
PR
178
1,61
9
PA
159
1,97
2
MG
115
0,55
7
SC
76
1,13
0
RN
69
2,02
5
MA
57
0,83
16
RS
55
0,5
1
CE
53
0,6
1
AL
50
1,5
1
SE
43
1,94
0
AP
25
3,33
0
PE
25
0,27
4
AM
23
0,6
3
ES
21
0,54
1
PB
21
0,53
0
TO
11
0,73
0
MT
8
0,25
18
AC
2
0,25
0
PI
2*
0,06
0
RR
0
0
0
DF
não respondeu

4
GO
não divulgou

não divulgou
MS
não respondeu

6
RO
não tem

0
Total
2.526

139
* números de novembro e dezembro não incluídos
Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, 1.231 pessoas foram mortas em confronto por PMs em serviço no país em 2013, enquanto que, em 2012, foram 1.457.

Considerando a média por 100 mil habitantes, o Rio de Janeiro lidera em 2014 o ranking de mortes provocadas por PMs em relação à população do estado (3,54 mortes).

Questionada, a PM disse que a Secretaria da Segurança do Rio deveria comentar o assunto.

A Secretaria de Estado de Segurança diz que "estabeleceu desde 2009, com a implantação do Sistema Integrado de Metas e Acompanhamento de Resultados, a redução das mortes decorrentes de ações policiais como um dos índices da chamada letalidade violenta – que inclui ainda homicídio doloso, latrocínio e lesão corporal seguida de morte. Nas áreas pacificadas, a redução destas mortes foi de 85% na comparação entre 2008 e o ano passado. Apesar do aumento registrado nos últimos dois anos, a redução das mortes decorrentes de ações policiais foi de 56,1%, na comparação entre 2014 e 2007, ano anterior à atual gestão quando as mortes em ações policiais chegaram a 1.330."

Também no ano de 2014, conforme os dados obtidos pelo G1, 139 PMs foram mortos no país durante o trabalho. Bahia e Mato Grosso lideram o ranking de policiais mortos, com 31 e 18 casos, respectivamente.

Falta de informações

O procurador Marcelo Godoy, secretário-executivo da câmara do Ministério Público Federal responsável pelo controle da atividade policial, diz que um dos obstáculos para que a sociedade possa monitorar o que acontece nas ruas é a falta de transparência.

“De um modo geral, temos dificuldade e imprecisão em relação aos dados de segurança pública. Em relação às mortes provocadas por policiais, enfrentamos resistência, em alguns casos, ao acesso do MP aos dados. É preciso maior transparência. Também há outro aspecto: pode haver corporativismo", afirma.

O ex-secretário nacional de Segurança Pública e coronel da reserva da PM de São Paulo José Vicente também critica a falta de informações. "A maioria dos estados não divulga praticamente nada. Algumas situações são legítimas e necessárias para a defesa do policial. Outras merecem ser investigadas e analisadas com cuidado", diz ele.

“O uso da força letal pelo estado deveria ser apresentado permanentemente. O Brasil precisa assumir que a letalidade policial é um ponto que precisa ser trabalhado pelas polícias”, defende a coordenadora da área de Segurança Pública da ONG Sou da Paz, Carolina Ricardo.

Para tentar entender a questão, o Conselho Nacional do Ministério Público iniciou neste ano um cadastro nacional de ocorrências em que haja mortes provocadas por agentes do estado, sejam PMs, policiais civis, guardas, agentes penitenciários ou policiais federais.

O objetivo é ter detalhes sobre os casos, como os locais onde ocorrem, nomes dos envolvidos e das vítimas, além de potencializar a presença do MP na apuração dos casos.

Conhecer e analisar o problema

Em um caso emblemático na Bahia, o Ministério Público denunciou 9 PMs pela morte de 12 pessoas durante um tiroteio em fevereiro no bairro Cabula, em Salvador. A Secretaria de Segurança do Estado divulgou áudios tentando provar a ligação dos suspeitos com o crime organizado e, assim, confirmar a tese de resistência. A reportagem questionou a PM da Bahia sobre como é a fiscalização interna em relação a confrontos, mas não obteve retorno.

“A sociedade deveria parar de tratar este tema como tabu. A questão não é apontar o dedo, mas entender o que está acontecendo, e as polícias têm total condição de fazer esta apuração, verificando procedimentos, quantidade de tiros disparados, se houve algum tipo de falsificação de provas, se alguém deve ser responsabilizado”, afirma Carolina Ricardo, da ONG Sou da Paz. “Primeiro, é necessário conhecer o problema, dar transparência e começar a analisar."

O vice-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, defende melhoria na investigação dos inquéritos sobre mortes provocadas por PMs.

“Em geral, as justificativas dos policiais são que atiraram por legítima defesa, e as próprias testemunhas são PMs. Nenhum órgão, nem o MP, pode impedir a polícia de matar, até porque pode ser necessário isso. Mas o que temos que garantir é que os fatos sejam apurados com técnica e perícia para inocentar quem não agiu com excesso e até para quem errar ter receio de ser punido”, diz Renato de Lima.

“Quando o estado mata, alguém, ou o delegado, deve ir ao local, preservar a cena do crime, tomar as medidas necessárias nas primeiras horas, para poder identificar e retratar o que aconteceu de verdade”, afirma.

Ouvidoria externa

Para o ouvidor das polícias de São Paulo, Júlio Cesar Fernandes Neves, o fato de alguns governos se negarem a passar o número sobre mortes em confrontos mostra que é necessária maior autonomia a órgãos independentes, como as ouvidorias externas, para receberem denúncias e atuarem com pressão sobre os governos, quando necessário.

“O primeiro passo para que se possa reduzir os índices é criar coragem de divulgar os números corretos. Quem tem medo de divulgar é porque, com certeza, tem vergonha ou algo a temer." (Júlio Cesar Fernandes Neves, ouvidor das polícias de SP)

Em São Paulo, explica ele, os dados são publicados semestralmente desde 1995 por força de lei e também há resoluções internas que obrigam as polícias Civil e Militar a divulgar os números mensalmente no Diário Oficial.

Em maio, o G1 divulgou com exclusividade que o número de mortos pela PM em São Paulo no primeiro trimestre de 2015 – 185 – foi o maior nos últimos 12 anos.

A Secretaria de Segurança Pública não comentou os dados do trimestre. Mas questionada antes sobre o aumento da letalidade nos dois primeiros meses do ano, a SSP havia dito em comunicado que "a atuação da polícia de São Paulo se dá estritamente dentro dos limites da lei. As exceções são apuradas com rigor e terminam com a punição dos policiais acusados de crimes. Em 2014, 128 policiais militares foram demitidos e 177, expulsos. No caso da Polícia Civil, 55 agentes foram expulsos e 17, demitidos. A SSP tem trabalhado para reduzir os índices de letalidade".

Especialistas apontaram que a cultura da impunidade e as redes sociais servem como motivadores para incitar a violência entre policiais e criminosos.

Maior fiscalização das ocorrências, além da formação de uma polícia única – investigativa e ostensiva – foram fatores apontados como alternativos para reduzir os indicadores de letalidade policial.

“O primeiro passo para que se possa reduzir os índices é criar coragem de divulgar os números corretos. Quem tem medo de divulgar é porque, com certeza, tem vergonha ou algo a temer. Se os dados fossem coerentes, os estados [que não abrem estes dados] divulgariam, com certeza”, critica Neves, que diz pressionar o governo sempre que os indicadores sobem.

MEU COMENTÁRIO

“É preciso maior transparência. Também há outro aspecto: pode haver corporativismo." (Marcelo Godoy, procurador) “O procurador Marcelo Godoy, secretário-executivo da câmara do Ministério Público Federal, responsável pelo controle da atividade policial, diz que um dos obstáculos para que a sociedade possa monitorar o que acontece nas ruas é a falta de transparência.”

Extraí do texto estas duas intervenções do procurador Marcelo Godoy para estender o raciocínio dele, no caso, reduzido à atividade policial, e garantir por minha conta que o mal da obscuridade afeta toda a maquinaria estatal nos seus três patamares de poder, não se livrando desta centenária cultura nem mesmo o organismo ao qual ele se integra como ilustre membro. Trata-se de organismo muito afeito ao mistério, quase que sacrossanto, deixando-nos a impressão de que lá todos são deuses sem chance de prova em contrário...

Mas, independentemente disso, ele está coberto de razão, as PPMM postas no foco não gostam de divulgar nada, nem ações positivas nem negativas, cultura antiga, cacoete militar. Porque o militar não gosta de contar vantagem para não alertar o inimigo, e muito menos lhe agrada expor suas vísceras em benefício deste mesmo inimigo, que pode ser o bandido, mas pode ser a imprensa ou outros órgãos, sendo certo, porém, que todos gostam, mesmo, é de pagar mistério, o que exime as PPMM desta exclusividade.

Convenhamos que a matéria obedece ao padrão moral que norteia as sociedades de um modo geral, ficando de lado a razão, esta, que não interessa ao leitor. Lembra-me Wilhelm Nietzsche e sua “Aurora”, onde ele inutilmente gasta tinta e papel para defender uma impossível soberania da razão em detrimento da moral enraizada na cultura humana. Porque, visto o assunto pela ótica da razão, deveria ser ele bem mais aprofundado e valorado conforme a ideia de que uma vida humana que defenda o bem de todos deveria valer mais que uma vida desumana de quem pratica o mal. Ora, comparar friamente o número de mortos de um lado e do outro (bandidos versus PMs), sem considerar as consequências sociais dessas mortes que afetam a família dos PMs, é no mínimo absurdo.

Sim, absurdo, porque o malfeitor, sempre tido pela indiferente ou maliciosa mídia como “suposto”, ingressa na atividade criminosa conhecendo os riscos de prisão, ferimento e morte. Já o PM, que nunca é “suposto”, e que por isso não pode desfrutar da dúvida, não escolhe sua profissão para ser criminoso, mas para agir em defesa da sociedade formada por pessoas de bem e da qual os malfeitores não são mais que segmento adverso à paz. Ora, ora, o malfeitor deveria, sim, ser situado nos termos de Jean-Jacques Rousseau no seu “Do Contrato Social”:

“(...). De resto, todo malfeitor, ao atacar o direito social, torna-se, por seus delitos, rebelde e traidor da pátria; cessa de ser um de seus membros ao violar suas leis, e chega mesmo a declarar-lhe guerra. A conservação do Estado passa a ser então incompatível com a sua; faz-se preciso que um dos dois pereça, e quando se condena à morte o culpado, se o faz menos na qualidade de cidadão que de inimigo. Os processos e a sentença constituem as provas da declaração de que o criminoso rompeu o tratado social, e, por conseguinte, deixou de ser considerado membro do Estado. Ora, como ele se reconheceu como tal, ao menos pela residência, deve ser segregado pelo exílio, como infrator do pacto, ou pela morte, como inimigo público, pois o inimigo dessa espécie não é uma pessoa moral; é um homem, e manda o direito da guerra matar o vencido. (...)”

Que me desculpem os contrários, mas é muito perigoso cuidar de fragmentos em vez de contextualizar o tema! O reducionisnmo é um mal moral contrário à razão. Enfim, não serve para nada a não ser para desmerecer o todo, e o todo significa que há talvez 500.000 (quinhentos mil) PMs Brasil afora cuidando da segurança de talvez 200.000.000 (duzentos milhões) de brasileiros dentre os quais gravitam milhões de malfeitores assumidos, portando armas de guerra, praticando seus crimes e dizimando PMs como se nenhuma lei houvesse além da lei do mais forte. É neste universo cruel que o PM atua dia e noite, na chuva e na canícula, recebendo como troca um péssimo salário e a aversão social por culpa de matérias ideológicas como a que está posta neste foco crítico.


Bem, vou parando por aqui para não me perder na emoção e cair na vala comum das paixões. No fim de contas, não almejo sucumbir aos silogismos erísticos, dentre os quais se insere esta especulação jornalística reforçada com depoimentos de personalidades para lhe emprestar uma utilidade que não tem. Isto, decerto, não é útil à sociedade nem aos PMs, seus defensores, sempre igualados ao que há de pior até na morte. Haja paciência!...

Nenhum comentário: