quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Sobre as UPPs nos dias de hoje




A Teoria Geral da Administração nos informa que são tantas as incertezas e turbulências ambientais, e tão tamanhona é a velocidade da tecnologia nos dias atuais, que qualquer organização, para vencer suas competições ou mesmo sobreviver aos impactos ambientais e tecnológicos, não pode se escorar em estruturas imutáveis e na manutenção do staus quo. Tanto que a TGA sugere ser o desenho organizacional o meio mais eficiente e eficaz de se antecipar às incertezas e turbulências, evitando a departamentalização tradicional e usando a tecnologia como arma para o sucesso. Mais ainda: a organização, para ser bem-sucedida em vista dos seus multivariados objetivos sociais, deve estar preparada para avançar e recuar. E jamais estagnar. Deste modo, se a organização não conseguir reverter posições antes assumidas como excelentes, mas que na prática não atingiram os resultados esperados, ela tenderá à entropia e ao desaparecimento.

Estamos nos referindo à PMERJ como organização social, o que nos remete ao pressuposto de que sua estruturação piramidal e o apego às tradições e ao processualismo interno costumam causar mais estagnação que movimento de avanço ou recuo. Daí é que não se é de estranhar o que hoje se constata em relação às UPPs: estagnação. Porque as pressões políticas e midiáticas obrigam à PMERJ defender o indefensável, eis que a ela não é dado nem o direito de repensar as UPPs como possibilidade de avanço e muito menos de recuo, o que as situam na condição péssima de paralisação no tempo e no espaço, enquanto o proselitismo segue em função da campanha política.

Sem dúvida, em se falando de segurança pública no RJ, o candidato da situação defende que avançará com as UPPs, ignorando solenemente o seu fracasso, em especial o traduzido pelo excessivo número de PMs mortos em locais supostamente pacificados, mas que permanecem com seus traficantes comercializando drogas nas barbas dos inferiorizados PMs enlatados como sardinhas, todos fingindo que tudo está bem. Do lado da oposição ao atual governo, o discurso não pode ser o de recuo do programa de UPP, mas de sua complementação com medidas sociais já prometidas e não concretizadas pelo atual governo. Enfim, ambos discursam se agarrando ao pseudo-sucesso, o primeiro aumentando o número de UPPs e o segundo prometendo reforçar as que existem, mesmo estagnadas, o que até me parece mais prudente, pois sugere certo movimento no mesmo lugar, dentro da lógica de que como estão não há como defender as UPPs.

O problema, porém, é que nenhum dos discursos leva a algum horizonte otimista. Pois, como programa de pacificação, as UPPs fracassaram; e nem é caso de enumerar as falhas deste antiquado modelo de intervenção policial-militar posto apenas com roupagem nova. No fim de contas, diferenças não há se se comparar a UPP com o DPO (Destacamento de Policiamento Ostensivo), com o PPC (Posto de Policiamento Comunitário) ou com outros modelos mais recentes, mas que, no fundo, significam nada mais que a estrutura de sempre, e desde os tempos da II Guerra Mundial: o DPO. Senão, vejamos o conceito de DPO e de PPC na Diretriz Geral de Operações da PMERJ, datada de 1983:

“4) Destacamento de Policiamento Ostensivo (DPO) e Posto de Policiamento Comunitário (PPC) – Forma de policiamento em que uma fração de tropa, comandada, é empregada em determinado local que, por suas características físicas, ou em face de distância da sede da UOp, ou subunidade, torna difícil a cobertura por qualquer outra forma de policiamento. O DPO e o PPC podem executar todos os tipos de policiamento.”

Enfim, “nada de novo sob o sol”, “tudo como dantes no quartel de Abrantes”, o que nos leva a considerar como expressiva a concentração de efetivo em 40 UPPs (quase 10.000 PMs), ou seja, mais de 10% do efetivo global da PMERJ, que talvez seja hoje em torno de 60.000. Que fosse assim, tudo bem, mal menor... Ocorre que se há a considerar, ainda, as inúmeras baixas motivadas por doenças e demais afastamentos de natureza administrativa, inclusive os decorrentes de escalas e consequentes folgas dos serviços vários executados em todo o RJ, tudo a conspirar contra o efetivo pronto para o serviço fora das UPPs. Conclui-se, por conseguinte, que a PMERJ está hoje com “asas maiores que o ninho”, mais um aforismo que gravo para demonstrar que as UPPs, longe de terem sido solução para a criminalidade no RJ, - não o foram nem onde estão instaladas em vista de critérios discutíveis, - longe disso, elas são bem mais um grave problema a se resolver mais adiante. E aqui está o impasse: ou o problema será técnico ou continuará político.

Nos dois casos, todavia, a solução é dramática. Isto porque, em sã consciência, tudo não passou de invencionice, de remendo de pano novo em retalho velho, pois as UPPs ou são DPOs, ou PPCs, ou outra qualquer denominação. E em sendo assim, o jeito é tornar à velha máxima arquitetural de Louis Sullivam, que anda esquecida: “O formato segue a função”. Ou seja, a estrutura deve seguir os objetivos, o que institui uma espécie de cordão umbilical entre a “pirâmide PMERJ” (estrutura) e a manutenção da ordem pública (objetivo maior e global), num contexto que não se esgota na prevenção e na repressão ao crime, mas abrange desordens multivariadas num ambiente social extenso, incerto e turbulento.

Vê-se que a “pirâmide PMERJ”, se fosse perfeita e não sujeita a crises internas gravíssimas, mesmo assim não lhe seria fácil fugir de sua tradicional estrutura que constitucionalmente existe para cumprir missões de Defesa Territorial, de Defesa Interna e de Defesa Pública, sendo esta última sua missão cotidiana. E a se considerar esses três fatores legais, o primeiro passo da PMERJ deveria ser o reestudo do ambiente do RJ como um todo, este que não se resume à Rocinha ou ao Complexo do Alemão e muito menos à Maré, embora talvez esses locais representem desafios à parte, com o que não concordo, há muitos outros igualmente desafiadores e que estão fora de foco.

Como se pode notar, na medida em que se abre o leque de ações da PMERJ, nas suas diversas formas de policiamento que dispensam enumeração, as UPPs emergem como um tipo estranho de doença e não como sintoma geral de saúde do corpo social chamado RJ. Porque não é possível admitir que uma UPP no morro Dona Marta produza reflexos positivos, diretos ou indiretos, em Itaperuna ou São Gonçalo. Entretanto, não é demais admitir reflexos negativos nesses e em outros municípios fluminenses, já que muitos deles foram desfalcados em seus efetivos para atender à paranoia das UPPs como solução da criminalidade em favelas dominadas pelo tráfico, problema antigo e enraizado. Porque as favelas do RJ são braços de varejo do transnacional narcotráfico, cujas teias cobrem o planeta e movimentam trilhões de dólares/ano.

Portanto, caros leitores, não há como crer no discurso do avanço das UPPs, pois lembram o avanço napoleônico em solo russo, sem logística nem retaguarda, tendo como resultado a derrota do Exército Francês sem confronto a não ser com a fome e o frio. Pois a verdade é que as UPPs estão estagnadas como pântanos, mesmo que em alguns brotem lírios. Só que o estrume é feito do sangue de valiosos PMs, oficiais e praças, que perderam a vida em vão. Aliás, hoje, exatamente hoje, e neste momento em que posto este meu pensamento mínimo e superficial sobre o tema, o Complexo do Alemão está em pé de guerra. E lá há muitas UPPs, bem como há muitas mortes de PM já contabilizadas em vista da insistência delirante do poder público em manter de pé o fracasso...

Um comentário:

Anônimo disse...

Hoje é o dia da vergonha no Brasil. Hoje vamos ter o desprazer de ver Dilma e pezao no segundo turno.