quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Reinado Azevedo disse tudo...

"REVISTA VEJA

 BLOG DO REINALDO AZEVEDO

19/08/2013

Às  17:10


Reportagem de Leslie Leitão e Helena Borges na VEJA desta semana informa que o escritório de advocacia de que é sócia Adriana Ancelmo, mulher de Sérgio Cabral, cresceu muito durante o mandato do marido governador. Segundo a reportagem, antes de Cabral governar o Rio, apenas 2% do faturamento do escritório tinha origem em concessionárias e prestadoras de serviço para o Estado; hoje, chega a 60% — os ganhos mensais de Adriana alcançam R$ 184 mil. Cabe, creio, um debate sobre a legalidade dessa clientela. Do ponto de vista ético, não há o que discutir. O escritório deveria recusar esses clientes e pronto! Ninguém quer impedir a pr imeira-dama de trabalhar — aliás, é desejável que continue com a sua profissão; poderia ser um bom exemplo de independência. Parece não ser o caso.

Lembro esse episódio porque é mais um elemento a complicar a situação política de Sérgio Cabral, cujo prestígio, que se mostrava impermeável a situações até mais constrangedoras, se manteve incólume até a onda recente de caça aos políticos — o que, como é sabido, nunca me entusiasmou e jamais contou com o meu endosso. E não contou porque não acredito em movimentos espontâneos. A rigor, a espontaneidade não existe, a não ser na natureza — e olhem lá. A palavra deriva do vocábulo latino “sponte”, aquilo que se dá pela própria vontade, por moto próprio. Daí que o conceito vá bem com a natureza, desde que não s eja tomado como sinônimo da ocorrência imotivada. Algum motivo sempre há — a não ser para os milagres, mas aí estamos em outro domínio.

Um certo “malaise” se espalhou pelo Brasil inteiro, como a gente viu, mas se mostra mais persistente e agudo no Rio — e o esforço para engolfar a Prefeitura é visível. Sempre há motivos para protestar contra governos, e não estou aqui a questionar o que é um direito democrático. Mas é um desserviço à democracia considerar que a livre manifestação, que é constitucional, se sobrepõe à liberdade de ir e vir, que também é assegurada pela Carta. E é o que se tem visto Brasil afora, especialmente no Rio. Não há um empate entre esses direitos porque isso faria supor que se anulam. Eles podem conviver. Digam-me: alguém já v iu por aí o direito de ir e vir cassando a liberdade de manifestação? Quando? Onde? O que se vê cotidianamente é o contrário. As coisas não ficam por aí. Não raro, protestos são tomados por arruaceiros, que se dizem anarquistas, e o que se tem é um rastro de destruição. Mas não vou tomar esse atalho agora. Quero voltar ao Rio.

Vi, neste domingo, os professores promovendo o enterro simbólico de Sérgio Cabral. Oficialmente, a categoria está em greve no Estado e no Município. “Movimento espontâneo”? Não! As mãos que balançam esse berço são principalmente do PSOL e do PSTU. Os abduzidos de Marcelo Freixo comandam ainda a absurda ocupação da Câmara dos Vereadores do Rio, agora com o endosso de uma juíza, que se negou a conceder uma liminar para que os vereadores possam fazer o seu trabalho — e, caso não façam, sempre restam as eleições para apeá-los de lá. Disse a meritíssima que aquela é Casa do povo. Sem dúvida. Justamente por ser do povo, não pode ser privatizada pelo PSOL, não é mesmo, doutora? O que é de todos não pode ser de um grupo em particular. Quer ainda a magistrada que, no caso de alguma transgressão evidente à lei, as forças policiais atuem. Sei… Impedir vereadores eleitos de tocar uma comissão de inquérito, segundo o dispõem o Regimento da Casa e a lei, supõe a atuação da Polícia? Em vez de a digníssima fazer valer esses dois códigos e determinar a desocupação pacífica, prefere o quê? Que ela se dê com o uso, ainda que legítimo, da força? As explicações da juíza atendem ao estado de direito ou ao alarido das ruas?

E a turma que acampa nas imediações da casa de Sérgio Cabral? Também PSOL e PSTU? Pode até haver um outro, mas aí já é outra fauna, composta, curiosamente, de, como posso chamar?, entusiastas do deputado Garotinho (PR-RJ) e da bicho-grilagem que também se nega a crescer. E, atenção!, em qualquer caso, em qualquer manifestação, não faltam os petistas, entusiastas da candidatura do senador Lindbergh Farias (PT-RJ) ao cargo de Cabral. Os petistas evitam exibir suas bandeiras, até porque o partido está no governo. Participam da confusão por intermédio dos ditos movimentos sociais. Como já lembrei aqui, o senador pode ter sua can didatura abalroada por um processo que corre contra ele no Supremo. Se candidato e vitorioso e se condenado (aí, no caso, com o processo migrando para o STJ), poderia ter o mandato cassado.

Desserviço
A imprensa, nessa fase absurda de competição com as redes sociais (como se fossem a mesma coisa!), se nega a dar nome aos bois e presta, assim, um desserviço ao leitor, ao telespectador, ao internauta. Eles têm o direito de saber quem está na rua e para quê. Eles têm o direito de saber quem promove a ocupação nas imediações do apartamento do governador e para quê. Eles têm o direito de sab er quem manda nos sindicatos de professores e para quê. Eles têm o direito de saber quem comanda a invasão da Câmara e para quê. Se vão achar isso bom ou ruim, eis uma questão que não diz respeito ao jornalismo. Informar quem faz o quê não desqualifica reivindicação nenhuma. Omitir do leitor a informação certa, aí sim, desqualifica o próprio trabalho jornalístico.

Cabral passou tanto tempo sendo protegido de si mesmo pela imprensa carioca — e nacional! — que se mostra atrapalhado, aturdido, meio aparvalhado. De resto, eventos de sua vida privada deitaram uma sombra sobre as questões políticas, e parece que ele não consegue reunir forças para reagir. Protestar contra ele, com ou sem motivo, parece ter virado uma onda deste inverno carioca.

Não!!! É inútil tentarem me atribuir o que não escrevi. E eu não escrevi que inexistem motivos para protestar. Até porque, meus caros, a democracia assegura, e eu também o reconheço, o direito de protestar até sem motivo. Só estou lembrando que o estado democrático é caracterizado por uma teia de direitos e que nenhum deles é soberano. E, por óbvio, sobre os arruaceiros, dizer o quê? Não existe a licença para a arruaça e o quebra-quebra. Isso é crime! E, mais uma vez, expresso a minha curiosidade final: essa gente que acampa por dias na rua ou na Câmara vive de quê? Quem paga as contas de água, luz, telefone, supermercado ? Seria uma burguesia rentista, que vive do que lhe propicia um gordo patrimônio privado, ou, se formos verificar, constataremos que, no fim das contas, todos eles vivem mesmo é do dinheiro público?"

Por Reinaldo Azevedo

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