quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Sobre a boiada do RJ vendida ao Bradesco



Ontem passei a parte da tarde no Ginásio Caio Martins, Niterói, a cumprir rotina de abertura de conta no banco Bradesco mediante ordem. Malgrado o esforço dos funcionários do banco para agradar a todos, não pude deixar de enfiar meu olhar crítico para alguns pontos. Um deles se resume ao descarado descumprimento da lei do idoso. Com certeza, a velharia se sentia como condenada ao fuzilamento com o direito de se postar na estaca de fraque e cartola... Tudo muito arrumado em piquetes graciosos, predominando o infernal vermelho, claro, mas não havia nenhum esquema para atender a quem por direito de idade tem precedência. Daí, vi gentes envelhecidas sendo tratadas em igualdade de condições com os jovens. Nem reclamo do meu caso, que se insere no contexto de uma velhice de direito que me recuso a assumir de fato. Falo de pessoas mui antigas na face da Terra, mais para dentro dela que para fora, que no Ginásio Caio Martins subiram escadarias e pacientemente esperaram o anúncio da senha sem qualquer preocupação com cegueira, surdez, cardiopatias, isquemias, artrites, artroses etc.

Mais azar para os cegos e/ou surdos: não podiam acompanhar aquela espécie de “sorteio” em que a sua senha agonizava e não aparecia na telinha da tevê nem para identificação por alguém mais novo e interessado em ajudar os deficientes auditivos e visuais. Confesso que quase me insiro no exemplo do cego/surdo, embora seja também cardiopata devidamente operado, dentre outros defeitos da velhice. Foi por pouco que consegui enxergar o número e a mesa quando anunciado o meu “abate”. (Ó que saudades dos meus tempos de instrutor de tiro! Eu acertava todos na mosca, mas hoje nem sei por onde anda a minha arma...). Aliás, ninguém se propunha a ajudar ninguém. Cada qual cuidava de manter a atenção na telinha onde surgiria a salvação do atendimento do “passageiro” por uma “estação”. A partir desse momento, o passo acelerava e nem dava tempo de raciocinar. No guichê da “estação”, a funcionária treinada emendava um tema ao outro e ia enfiando papelada à assinatura. Atordoado, exausto de tanto esperar, fui rubricando tudo, e creio que assinaria até minha demissão da briosa, tal era a minha vontade de pular fora daquele abatedouro de carnes humanas tornadas “filé mignon” por obra e graça do atual governante e seus assessores, um dos quais, dizem à surda, hoje ocupando alto cargo no Bradesco. Verdade?... Coincidência?... Não sei...

Sei, porém, que não enxerguei em meio aos piquetes lotados de gentes simples nenhuma figura de alto talante. Ninguém de terno e gravata... Não vi nenhum embleminha do lado esquerdo do paletó indicando essas poderosas autoridades, que, ao que parece, foram poupadas do incômodo e conseguiram atendimentos personalizados, embora sejam servidores públicos como quaisquer outros integrantes da arraia-miúda. Bem... Pode ser que eu não os tenha visto porque estou ligeiramente cego de um olho por maculopatia crônica (pode ser redundante dizer que maculopatia é crônica, mas vá, não sou médico e estou perdoado!). Mas que não vi ninguém de alto talante, é a mais pura verdade! Não vi, mesmo, as gentes engravatadas por conta do nobre exercício de suas funções; e omito suas características funcionais por medo deles e delas. Fico cá, em minha humildade de gado velho, tal como fui tratado: gado de corte, talvez com pinta de nelore PO, mas na fila como qualquer exemplar pé-duro. Mas, por amor à verdade, afirmo que o tapete vermelho era privilégio de todos...

... Todos... Ah, que rebanho! Nada mais que rebanho sem vontade, cena que jamais ocorreria na Europa sem turbamulta a protestar quebrando tudo. Mas aqui é o Brasil, aqui é o Estado do Rio de Janeiro: apinhado de políticos larápios (qualquer dia desses cito seus nomes e apelo para a “exceção da verdade”, se processado por algum dos citados). Aqui é piquete que se reporta à Casa-Grande e à Senzala dos idos coloniais, imperiais e republicanos, tudo idêntico, sem tirar nem pôr... E assim, pensando assim, é que abri ou me abriram uma conta associando-me em viés a uma agremiação particular contra a minha vontade e por determinação de quem ignora os mais elementares direitos do cidadão, sendo um deles o insculpido no Art. 5º, caput, Inciso XX: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado;”

Enfim, que venham os sábios do Direito Constitucional e outros dotados da sapiência jurídica para ilustrar minha ignorância e aplacar minha indignação. Pois entendo que fui obrigado a me associar a um banco particular contra a minha vontade, que é diferente da vontade do governante, sem essa de dizer que “venceu o melhor banco na licitação”, resposta mui simplória ante a envergadura da negociação de bilhões e bilhões de reais envolvendo interesses pessoais, profissionais e familiares de milhões de brasileiros servidores públicos estaduais reduzidos a gado de corte sem mais nem menos, sem muita explicação e nenhum respeito à dignidade da pessoa humana.




Ah, não revisei o texto. Estou muito velho e não posso perder tempo com revisão de nada. Vai ao mundo como me veio ao atino ou ao desatino!

4 comentários:

Paulo Fontes disse...

Caro amigo Larangeira,
Como vc, também passei pela mesma situação.
Mas a vingança será "maligrina" como dizia Bento Carneiro, o vampiro brasileiro, imortal personagem do Chico Anísio.
Vou entregar na agência do Bradesco que me foi compulsoriamente designada um documento fornecido pelo banco Itaú o qual determina que o salário deverá ser depositado automaticamente no banco de origem(Itaú).
A isso chama-se portabilidade bancária a qual todos tem direito, sem nenhum custo.
Um abraço
Paulo Fontes

Paulo Xavier disse...

Cel Larangeira.
Para funcionários de empresas da iniciativa privada parece ser pior; cada empresa escolhe o banco que melhor lhe convier e o trabalhador depois que se vire.
Em 22 anos de Bacia de Campos já recebi salário em cinco bancos diferentes, mas sempre gostei do Real, hoje Santander, onde o respeito e o bom atendimento nos aproximaram bastante. Um abraço.

Emir Larangeira disse...

Não tenho nada contra o Bradesco. Tenho tudo, sim, contra todos os bancos, que são iguais no seu grande objetivo, que é o lucro exorbitante. O problema é a incapacidade de o cidadão fazer valer sua vontade, como diz a Carta Magna. Na verdade, ninguém respeita a Lei Maior, e que se dane o povo. Este é o problema, mas dizem que o povo tem os políticos que merecem.

Luiz Peres disse...

Prezado Cel Larangeira
Também já fui abatido!
Suas palavras retratam a realidade do sistema. Parabéns.
Abçs
Luiz Augusto Peres