Referência: Lei nº 9099/95
Há ainda de se desdobrar em muitas etapas a polêmica sobre os limites de competência da PMERJ e da PCERJ, discussão acirrada pela segunda instituição ao questionar na CGU/RJ a lavratura, por parte da primeira, de Registro Policial Militar (RPM) em Teresópolis e algures, entendendo os reclamantes se tratar de Termo Circunstanciado (TC) referente à Lei nº 9099/95, que atalha infrações penais de menor potencial ofensivo. Na realidade, a PCERJ intentou ganhar a luta por nocaute no primeiro round, para tanto contando com “treinadores”, “juízes”, “claques” etc. Deste modo, subestima um adversário que há mais de 200 anos não sai do ringue a não ser como vencedor de guerras cruentas contra inimigos da pátria, além de detentor da mais sangrenta de todas as missões: o combate à criminalidade violenta que assola o cidadão carioca e fluminense nos dias de hoje.
O mais espantoso desta polêmica tornada oficial por “sentença” da CGU/RJ e imediatamente acolhida pela SSP é o aberrante compadrio entre delegados federais, gestores da referida secretaria, e seus colegas delegados estaduais. Impressionante a celeridade da tramitação dos documentos e dos pareceres, tudo ajustado a uma versão unívoca do problema, focando um só lado da moeda que longe está de se enfiar no cofre de vitórias da PCERJ. A PMERJ não tombará tão facilmente nesta luta de bastidores políticos e de tribunais em fase apenas de aquecimento... Porque abundam argumentos contrários (doutrinários e jurídico-judiciais) à tese fechada dos delegados federais e estaduais unidos por circunstâncias meramente políticas, nem se precisando ir além do Google para enumerá-los.
Não se trata de incentivar rusgas entre policiais civis e militares, mas o acirramento da polêmica poderá acarretar rivalidades envolvendo, no ringue montado pela PCERJ, boxeadores apenas transitórios, com enorme prejuízo à segurança pública. Porque tudo nesta vida passa, todos nós passaremos, e só o Mário Quintana “passarinho”... Trocadilhos à parte, a questão é grave, na medida em que o delegado federal que dirige a SSP posicionou-se de pronto contra a PMERJ, entendendo que a lavratura de RPM não se enquadra na competência da corporação militar estadual. Não considerou, para decidir, nada além da superficial decisão da CGU/RJ reforçada por parecer de um delegado estadual assessor jurídico dele, tudo num concerto de partitura adrede ensaiada.
Com efeito, o assunto foi decidido na superfície e pela força do muque, sem se considerar, por exemplo, que a PMERJ, como polícia administrativa de manutenção da ordem pública, exercita multivariadas tarefas que não cabem em pouco papel. A PMERJ não deve se prender ao reducionismo que eles (delegados de polícia) insistem em impor à corporação, ou seja, que ela se torne inerme e inerte no exercício da segurança individual e comunitária indispensável à garantia global da ordem pública. Mas, afinal, que ordem pública é essa? Será que os que tentam nocautear a PMERJ sabem? Sabem que o que estão, mesmo, é nocauteando a população?... Para quem não se lembra, vai gratuitamente um dos vários conceitos de ordem pública da lavra de um dos mais renomados administrativistas pátrios, Diogo de Figueiredo Moreira Neto: “Ordem pública, objeto da segurança pública, é a situação de convivência pacífica e harmoniosa da população, fundada nos princípios éticos vigentes na sociedade”.
Muito bem, reduzindo esta complexa ordem pública a não sei quê, os detratores da PMERJ alegam que a corporação ultrapassa os limites de sua competência constitucional e insinuam prática de crime supostamente perpetrado por militares estaduais. Curioso é que acusam a corporação de fazer o que mais a PCERJ faz: atropelar a competência da PMERJ por meio de blitze aparatosas levadas constantemente a efeito por organismos como a CORE e outros que atuam com roupagem típica de “polícia administrativa”, como se o fato de ser a PCERJ competente para o exercício de polícia judiciária abrangesse também a atividade de polícia administrativa. Ora, está faltando respeito à Doutrina do Direito Administrativo da Ordem Pública e à própria CRFB que usam como arma para atacar. Afinal, os amantes das blitze aparatosas, ao que tudo indica, não leram a frase contida no § 5º do Art. 144: “Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública.” Ora, as blitze ostensivas da PCERJ são o quê?...
Por outro lado, em minha santa ignorância não vejo nenhum mecanismo capaz de separar a função policial, que é una, em duas atividades estanques: administrativa e judiciária; ora, ambas se completam como subsistemas de um só sistema, sendo certo que aquela ordem pública do conceito operativo do mestre Diogo de Figueiredo Moreira Neto é mui maior que ambas as corporações policiais juntas, tanto que é fundamento de decisões ministeriais e judiciais superiores à polícia. Aliás, este é o ponto nevrálgico, porque a atividade de polícia judiciária, que deveria primar por apurações penais, resume-se ao questionável rito formal denominado Inquérito Policial Civil, do qual o Ministério Público prescinde para formar suas opiniões. Esta formalidade, aliás, é desaconselhada pela Lei 9099/95, que veio ao mundo também para desatravancar os pesados ritos processuais inscritos no CPP.
Por sinal, e conforme vasta informação jornalística, o Ministério Público não tem contado nem mesmo com essa formalidade policial civil de modo efetivo. Ademais, o Inquérito Policial não é a investigação criminal em si, ele não supre de modo algum a investigação técnico-científica, apenas arruma a papelada para indiciar supostos criminosos, cabendo ao promotor de justiça emanar a opinião acusatória (competência exclusiva e intransferível) ante o juiz. Ora, se a PCERJ não está dando conta de seus inquéritos e de suas apurações penais, como intenta cercear a PMERJ por pretender acelerar o atendimento da população no tocante à segurança pública? Que pretendem os detratores da PMERJ? Mais poder? Para quê?...
Verdade seja dita: o sonho das polícias civis no Brasil é extinguir as polícias militares. Chega a ser hilariante essa vontade manifestada em lobby permanente no Congresso Nacional. São inúmeras as Propostas de Emenda Constitucional com esse fim, como se o Brasil fosse tão tranquilo que pudesse eliminar da vida comunitária e societária as polícias militares, que somam um efetivo, em atividade diuturna, de mais de 500.000 almas. Privar a sociedade brasileira do principal alicerce da segurança pública é simplesmente loucura. Ora, os policiais civis almejam tão-somente o poder pelo poder, porque outra explicação não há...
Trocando a digressão em miúdos, a realidade é que a atividade de polícia judiciária não passa de preparação dos autos do Inquérito Policial para encaminhamento à Justiça (o rito), o que, como sabemos, não tem atendido plenamente à finalidade de singularizar autores e culpados com provas técnicas para garantir denúncias bem instruídas e condenações justas. Muitos criminosos, portanto, escapolem pelo ralo da ineficiência gritante do Inquérito Policial. Daí o interesse das polícias civis pela atividade de manutenção da ordem pública, que reúne um sem-número de funções difíceis até de listar: eles precisam mostrar serviço. Mas, para azar das coirmãs brasileiras, as polícias militares vêm dando conta do recado, acertando e falhando, sem dúvida, por falta de recursos e/ou de preparo, nada demais, que trabalha está fadado a falhar.
O exercício da atividade de polícia judiciária pouco ou nada ultrapassa a solenidade do registro de fatos delituosos ou supostamente delituosos em sedes de delegacias policiais, perdendo-se tempo e aviltando o princípio da economia processual. Porque, como a PCERJ não consegue investigar com precisão, os inquéritos vão se avolumando e são atropelados por outros igualmente sem solução, tornando-se bolas de pingue-pongue a serem batidas por delegados de polícia e rebatidas por promotores de justiça, e vice-versa, até a exaustão. Quanto à autoridade judicial, esta depende do resultado das intermináveis partidas de pingue-pongue para encerrá-las, até que lhe venham as seguintes indefectivelmente burocratizadas em cansativas papeladas que não mais se usam nos países civilizados.
Sorte do Ministério Público, que pode simplesmente ignorar o rito inquisitorial e partir para suas próprias investigações, que não passam de técnicas a serviço da verdade que a eles compete localizar e apontar ao Juiz de Direito em denúncias. Sorte, mesmo, também da sociedade. Não fosse a autonomia do Ministério Público, a lentidão processual seria total e o controle da criminalidade estaria irremediavelmente arruinado. Cá pra nós, não seria mais importante às polícias civis vencer seus próprios obstáculos em vez de perder seu precioso tempo na montagem de ardis que o Poder Judiciário desde muito tempo atalhou em benefício da sociedade brasileira? Ora, ora! Como reduzir um problema nacional a uma questiúncula como a que aqui no RJ se inicia com cores e sabores de “guerrilha política”?... Ah, pior que tentam vencer a luta por meio de golpes baixos, que no ringue são proibidos, e mais ainda detestáveis nos tapetões de um “Dom King”... Ah, que pena, o gongo tocou!... Esperemos o próximo round...
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