terça-feira, 5 de outubro de 2010

Artigo do Coronel Jorge da Silva




A REBELIÃO DA POLÍCIA NO EQUADOR
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ELEIÇÕES E A CRISE DA DEMOCRACIA REPRESENTATIVA

Policiais se rebelaram contra o presidente do Equador, supostamente por causa de cortes em seus benefícios, no que foram apoiados por militares do Exército e por setores da sociedade equatoriana descontentes com o governo Rafael Correa.

Cabe chamar a atenção para um aspecto desconsiderado nas análises. Refiro-me ao papel da polícia (e das Forças Armadas em geral) no seio de configurações políticas surgidas ultimamente nas Américas, fruto da evolução (ou involução?…) dos princípios da democracia representativa. Como se sabe, esta foi a fórmula política adotada no Ocidente para o exercício do poder na Região depois da dominação colonial, sem a necessidade do recurso à violência e à força das armas. Fórmula que legitima o poder dos eleitos e que leva os cidadãos em geral a eles se submeterem espontaneamente como delegados seus. Nas emergentes nações, o poder haveria de ser exercido por senhores ilustrados e altruístas, os quais, imbuídos da alta responsabilidade cívica, promoveriam o bem comum e conduziriam o povo à fruição dos bens materiais e simbólicos existentes nas novas sociedades. Era preciso, no entanto, a fim de evitar desequilíbrios da ordem social, definir quem estaria habilitado a votar e ser votado. Inabilitados seriam os analfabetos, as mulheres, os que não fossem proprietários, os que não tivessem renda suficiente etc.; em suma, a maioria. E assim foi. Com o tempo, o sufrágio universal vingou em quase todos os países. E então, aos olhos dos próceres tradicionais, a fórmula começa a deixar de cumprir o papel para o qual foi concebida.

Problema. Eleito presidente do Equador um mestiço instruído de esquerda, falante da língua indígena Quíchua, é como se as coisas estivessem fora do lugar. Da mesma forma que fora do lugar estariam os presidentes da Bolívia (um índio); da Venezuela (um ameríndio que se diz índio); dos Estados Unidos (um “African American”); do Brasil (um ex-operário migrante nordestino, “incolor” e de instrução primária). Aí, acende-se a luz vermelha. Muita coincidência!…

A crise do Equador, dentre outros problemas crônicos locais, é também fruto desse fenômeno, ou seja, da ascensão ao poder de uma maioria substantiva da população, o que jamais esteve nas cogitações dos elaboradores da fórmula. Aliás, como nos países mencionados. Este fato, em certa medida, explica a rebelião dos policiais e de militares daquele país, pontas de lança da reação. Na verdade, é da alma castrense o desconforto com políticas ditas “de esquerda”, máxime quando destinadas às camadas populares. “Populismo”, dirão.

Nas Américas, as elites políticas tradicionais estão aturdidas. Imaginam que a fórmula da democracia representativa precisa de reparos, mais ainda porque esses novos mandatários têm apelado para princípios da democracia participativa, direta, com plebiscitos, referendos, leis de iniciativa popular etc. Caso da lei da “ficha limpa” no Brasil, que os está atormentando. Não vêem a hora de derrubá-la. Como se não bastasse, um palhaço resolve candidatar-se a deputado federal, com fortes chances de ser campeão de votos; um pagodeiro negro atreve-se a almejar o Senado da República. E por aí vai. “Um absurdo”, diria alguém que prefere ver os votos destinados aos políticos tradicionais, ainda que entre eles proliferem sanguessugas, mensaleiros, grileiros, fraudadores, embusteiros e que tais. No caso de Tiririca, estamos diante de uma metáfora: um palhaço resolve deixar de ser palhaço…

Sinal de alerta. Toque de reunir. – O que vamos fazer? – Ora, vamos copiar o exemplo do futebol quando um time grande não ganha em campo e corre o risco de cair: apelar para o tapetão. É só fazer o mesmo. Vamos banir esses populistas. E nada de palhaço deputado. Vamos dizer que ele é analfabeto, que escondeu bens do TRE. Nada de pagodeiro. Vamos dizer que ele escondeu um imóvel na sua declaração e mandar a polícia invadir a casa dele. – Ué, mas nós também fazemos isso; vai dar na pinta. Ora, deixa de bobagem; o “sistema” está conosco. O problema é essa história de sufrágio universal, sem limites. E essa baboseira de polícia cidadã. Polícia é para manter a ordem, e nós estamos com a ordem.

2 de outubro de 2010 às 22:25

3 comentários:

Jorge disse...

tudo que eu enso está escrito neste artigo muito esclarecedor,pena que nós policiais,além de parte da população somos um bando de palhaços, que não acordamos ainda para deixarmos de ser palhaços.

Paulo Xavier disse...

Tenho acompanhado pela mídia esse levante dos policiais equatorianos, e quando um segmento da sociedade toma uma medida extrema é porque algo de grave está acontecendo.
Talvez um dos fatos mais marcantes na História Universal tenha sido a Tomada da Bastilha, quando o povo francês insatisfeito com as injustiças sociais resolveu reagir de forma violenta e o restante da história todos sabemos.
O brasileiro, povo tido como ordeiro e pacífico em sua grande maioria, tem demonstrado sua revolta com a classe política nas urnas, na hora do voto, senão, qual a esperança ou qual o anseio ao se confiar um voto em um candidato que nada vai poder fazer depois de eleito. Eis o fenômeno, o palhaço "Tiririca" campeão de votos para um cargo que antes de mais nada, terá que legislar. Complicado até de entender, mas é assim que o povo vai reagindo ante a insatisfação gerada após décadas de desmandos da nossa classe governante.
O povo brasileiro não tomará o poder como fez o francês no séc. XVIII, mas vai reagindo à sua maneira.
Aos Coronéis Jorge da Silva e Larangeiras, se me permitem, minhas continências. Paulo Xavier.

Paulo Xavier disse...

Tenho acompanhado pela mídia esse levante dos policiais equatorianos, e quando um fato desses acontece é porque algo de grave está contecendo.
Um dos fatos mais marcantes na História Universal foi a Tomada da Bastilha, quando o povo francês, insatisfeito com as injustiças sociais resolveu reagir e tomar o Poder. O restante da história todos conhecem.
O brasileiro, tido como um povo ordeiro e pacífico, vem demonstrando sua insatisfação à sua maneira, senão, como explicar o fenômeno "Tiririca" e outros tantos eleitos sem a mínima condição de legislar. Difícil até de entender, mas é assim que o povo vai reagindo após décadas de desmandos e descasos dos nossos políticos.
O povo brasileiro certamente não tomará o poder da forma violenta como foi na França no séc. XVIII, mas sua insatisfação vem sendo demonstrada nas urnas, de forma democrática e pacífica.
Aos coronéis Jorge da SIlva e Larangeiras, se me permitem minhas continências. Aos senhores eu presto com muito prazer. Paulo Xavier