“O mundo está perigoso para se viver! Não por
causa daqueles que fazem o mal, mas por causa dos que o veem e fazem de conta
de que não viram.” (Albert Einstein)
Cel PM RR Paulo Cesar Lopes (JORNAL EXTRA)
02/05/15 12:49 Atualizado em 02/05/15 12:49
Artigo: da falácia da
pacificação à mixórdia organizacional - caos na segurança pública (Parte 4)
Paulo Cesar Lopes*
Uma organização militar, como é a PMERJ (Art. 42 CR/88), para o seu
regular funcionamento e eficiência necessita de rigorosa observância de duas
características basilares: HIERARQUIA e DISCIPLINA. Sem disciplina, uma
organização torna-se disfuncional. Aqui reitero a minha advertência para os
anarquistas que defendem a desmilitarização. Comandem! Bondade em excesso é
condescendência.
Comandar é ter aptidão para conduzir homens. É ter iniciativa, coragem,
decisão para contrariar interesses individuais na busca incessante do alcance
do interesse supremo — o interesse público. Quer incongruência maior do que uma
Polícia Militar civil? Leiam a Constituição, antes de se manifestarem de forma
irrazoável. As Polícias Militares são forças militares estaduais (artigo 42 da
Constituição da República de 1988) e constituem reserva do Exército Brasileiro.
Portanto, comportem-se como militares, não como simulacros.
Por oportuno, registro a seguir uma série de descalabros, sucedidos no
último quinquênio, que conduziram a segurança pública ao colapso atual:
1. Fragilização do sistema
disciplinar, com a adoção de uma permissividade com violações jamais
observadas. Como se explicar um policial militar ser investigado pela Polícia
Federal em 2011, por envolvimento com traficantes da Rocinha e, em 2015, ainda
ostentar a condição de policial militar e ser acusado do latrocínio de um
oficial do exército português? Algo está errado.
2. Reintegração, mascarada de revogação, de policiais militares
demitidos por faltas graves. Ignorando-se que o ato punitivo, não obstante seja
discricionário, ele se exaure como vinculado. Sendo incabível a sua revogação.
3. Extinção de vários batalhões, sem qualquer razoabilidade (1ºBPM, 13º
BPM, BPFer, BPTran). O Centro da cidade hoje é um paraíso para a atuação dos
assaltantes. Nas manifestações de 2013 percebeu-se nitidamente a falta que o 1º
e 13º BPM fazem na realização de operações tipo polícia.
4. Venda do terreno da Escola Superior de Polícia Militar (EsPM), com a
promessa que se construiria outra nos Afonsos, juntamente com uma policlínica —
o que não se concretizou. Na atualidade, a EsPM funciona precariamente em duas
sala cedidas pelo Moinho Fluminense.
5. Extinção do Laboratório Industrial Farmacêutico para atender a
interesses corporativos de multinacionais de medicamentos, deixando sem
qualquer emprego mais efetivo o quadro de farmácia.
6. Aeronave abatida em operação aérea, por falta de ação de inteligência
e planejamento na ocupação, por forças terrestres, das localidades objeto de
pretensa invasão por narcotraficantes.
7. Eliminação de dez turmas de oficiais, obrigadas pelas circunstâncias
a passar para a reserva, sem terem oportunidade de demonstrar os conhecimentos adquiridos
ao longo da carreira, ensejando um hiato na regular transmissão de
experiências, e propiciando que oficiais inexperientes assumissem o comando.
Isto, sem considerar-se o prejuízo causado ao erário estadual com tais medidas.
8. Greve de policiais militares numa verdadeira afronta ao artigo 142, §
3º, IV CR/88 e ao Código Penal Militar. E o que é mais temerário, por
frouxidão, os grevistas obtiveram várias conquistas.
9. Desempenho pífio por falta de adestramento e emprego tático
equivocado do BPChoque nos distúrbios de 2013. Policiais militares das unidades
regulares agredidos e humilhados por manifestantes, por falta de instrução e
comando.
10. Viaturas depredadas e queimadas nos distúrbios de 2013, por falta de
observância do protocolo de controle de distúrbios civis.
11. Anômala criação de um batalhão para grandes eventos. Que absurdo!
Grandes eventos se inserem no espectro do policiamento ostensivo
extraordinário, que sempre foi executado com serviço extra, mediante
planejamento da terceira seção do Estado-Maior Geral e mobilização de pessoal
feita pela primeira seção. E o que é pior: um batalhão com deficiente
disciplina individual e tática. Basta dizer, que usam o capacete, um (EPI),
pendurado no pescoço. Sugiro a extinção desse batalhão e sua consequente
transformação em uma unidade de policiamento a pé, sediado nas instalações do
extinto 13ºBPM, com atuação no Centro da cidade — nos dias atuais, tão carente
de policiamento ostensivo.
12. Aquisição de cabinas blindadas com ar-condicionado e persianas — só
faltou uma cama para um bom sono. A atividade de polícia envolve risco, sendo
contraproducente quem tem o dever de prover a segurança pública ficar
hermeticamente confinado. Que segurança se oferece para o cidadão se utilizando
tal tipo de abrigo para proteção policial? Fácil concluir-se que tal aparato
promove a insegurança subjetiva, pois a sensação da população é de absoluta
falta de proteção. No mesmo diapasão foram adquiridas torres de seguranças para
policiamento nas vias especiais. Pasmem: a velocidade média nessas vias é de
90km/h, o que torna absolutamente inviável a observação. Com o passar do tempo,
verificou-se a impropriedade de tais instalações que foram na sua grande
maioria abandonadas. Em consequência o erário estadual, mais uma vez, a exemplo
do que aconteceu com a aquisição imprópria de contêineres de lata para as UPPs,
suportou os prejuízos de tal bizarrice; sendo certo que o custo de aquisição
variou entre R$ 120 mil a 140 mil por unidade. Sabem de nada, inocentes!
Frise-se para reflexão daqueles que proferem sentenças ao arrepio da
razão, com o escopo de elidir sua incompetência: nos últimos trinta anos,
jamais ocorreram tais fatos. O militar é uma espécie do gênero agente público e
sua atuação deve se restringir ao espaço autorizatório da lei, por força do
princípio da legalidade estrita. Qualquer atuação fora desses limites constitui
excesso ou desvio de poder. Revogar punições privativas de liberdade, autorizar
o não uso da cobertura (gorro, boina etc.) são exemplos de violações que
configuram o mau uso do poder; além de tipificarem, em tese, crime militar —
inobservância de lei, regulamento ou instrução (artigo 324 CPM).
Policiais militares não são engenheiros. Portanto, absolutamente
descabido desconstruir para construir. Isto é próprio de quem está perdido. De
quem não conhece e não respeita a doutrina consolidada da corporação. Até
porque, muitos passaram a maior parte do tempo de serviço em órgãos estranhos à
corporação.
Saiam da contramão. Hodiernamente, qualquer organização prioriza o
mérito como referência na ascensão profissional. Se inspirem nos exemplos
positivos das Polícias Federal e Civil. Como se pode defender uma entrada
única. Entrada única é própria de estábulo. Restrinjam tal sistema apenas aos quadrúpedes
solípedes do RPMont. A Constituição só autoriza a ascensão nos moldes do Art
37, II, CR/88 (concurso público), não concurso interno, conforme proposto.
Não basta a desqualificação das praças com a malsinada promoção por
tempo de serviço? A continuar tal absurdo, se desmotiva os preparados
intelectualmente e sobrecarrega-se o erário estadual com uma folha de pagamento
inchada por promoções por tempo de serviço.
Este conjunto de desatinos tem conduzido a PMERJ a um estágio de
indisciplina e ineficiência operacional significativos, gerando na população
fluminense o medo difuso, em função do estado caótico que se encontra a
segurança pública no Rio de Janeiro, dito pacificado.
*Paulo Cesar Lopes é coronel da PM do
Rio na reserva
MEU
COMENTÁRIO
Sobre o texto do Cel RR Paulo Cesar Lopes, publicado no Jornal EXTRA, de grande circulação, devo dizer o seguinte:
1) Trata-se
de pesada crítica ao último lustro de vida da PMERJ. Portanto se excluem os períodos
anteriores, o que me deixa em dúvida, pois alguns fatos podem se reportar a
mais de cinco anos.
2) Também
não conheço muitas informações que baseiam algumas críticas. Já outras não
apenas sei como concordo com a assertividade do articulista ao expô-las, em
especial quanto ao absurdo da alienação da ESPM, em Niterói, patrimônio
histórico da extinta PMRJ que foi vilipendiado em todos os sentidos.
3) Sei
também que por pouco não extinguiram o Colégio da Polícia Militar, sediado no
Fonseca, Niterói, nas antigas instalações não menos históricas da Ala de
Cavalaria da extinta PMRJ.
4) O mais
interessante, todavia, diz respeito ao que observei no campo de comentários do
Jornal EXTRA, que não poupa o articulista em vez de avaliar com isenção suas
denúncias bastante graves. Até parece patrulhamento ideológico... Mas vamos ver
aqui como se comportam meus leitores, sendo certo que a polêmica é válida e a
ofensa, proibida...
5) Por entendê-lo
importante, repiso aqui o texto dele, mesmo discordando em parte, não dos
temas, mas da forma de anunciá-los. Por outro lado, como eu já disse, não lhe posso
negar valor, pois ele aponta para um irreversível processo entrópico que venho
denunciando faz tempo, em especial quanto ao desprezo da disciplina consciente
que deveria primar no modelo hierárquico-militar que caracteriza constitucionalmente
a PMERJ.
6) Que ela,
a PMERJ, anda esquecida desses valores, é de se sentir na pele de quem veste a
farda, mormente os inativos. Porque não há mais respeito entre superiores e
subordinados, como antigamente, embora as regras sejam as mesmas. Sim, é
verdade, o subordinado de hoje não mais respeita o posto ou a graduação, mas
somente o cargo de quem se encontra em atividade e pode efetivamente retaliá-lo
no caso de quebra da hierarquia e da disciplina.
7) Sabem os
subordinados, como regra, – (excluo os casos em que subordinados e superiores
são amigos ou se conhecem, ou quando os primeiros reconhecem que seu superior
hierárquico, inativo, mesmo nesta condição tem algum prestígio com os ativos), –
sabem os subordinados, como regra, que os inativos não serão prestigiados, em
detrimento de si, por seus comandantes, chefes e diretores, com os quais,
muitas vezes, guardam estranhas e inconfessas relações de promiscuidade.
8) Tal
deformidade institucional elimina a possibilidade de os inativos, – que por dever
e mérito se preocupam com a instituição à qual se integram, tais como os
ativos, – elimina a possibilidade de os inativos interferirem como espécie de
“fiscais” de comportamentos desviados que observam em todo o RJ por onde estão
circulando. Sim, faltam canais de comunicação entre inativos e ativos, pois
estes últimos, mesmo sabendo que serão um dia inativos, preferem a distância daqueles
que consideram “institucionalmente mortos”.
9) Esse
desprezo vem custando caro à PMERJ, esta que ainda sofre as consequências de
fracionamentos e fusões abruptas e desagradáveis ao longo de sua existência, o
que faz predominar o nefasto exercício de facções intramuros, talvez o único
ensinamento que permaneceu vivo na mente dos novos, que hoje se autodestroem e
levam a instituição à entropia, e quiçá ao fim, sem qualquer chance de
homeostase.
10) Por
derradeiro, mais concordando que discordando do articulista, creio ter sido
muito útil seu desabafo, que me parece típico de quem se dedicou à carreira com
vigor, embora guardando em si o gosto da polêmica (e não da ofensa), o que, no
meu modo de ver, é ótimo! Sendo certo, porém, que não podemos confundir o
significado dos vocábulos, que agora lembro apelando para o Aurelião: “polêmica[F. subst. do adj. polêmico.] Substantivo feminino. 1. Debate oral;
questão, controvérsia. [Dim. deprec. (irreg.): polemícula. Cf. polemica,
do v. polemicar.]”. Ou: “ofensa [Do lat. offensa.] Substantivo
feminino. 1. Injúria, agravo, ultraje, afronta. 2. Lesão, dano. 3. Desconsideração,
desacato; menosprezo. 4. Postergação de preceitos; violação de regras;
transgressão; pecado, falta. 5. Mágoa ou ressentimento de pessoa ofendida.”
11)
Portanto, polemizar é preciso! Ofender, jamais!...
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