terça-feira, 10 de abril de 2012

Niterói: bandidos continuam vencendo

Em meio à tristeza, finalmente o assunto criminalidade em Niterói parece tomar o rumo certo, saindo do reducionismo inicial (culpando somente UPPs) e consagrando o contexto (bem mais complexo) em que a discussão deve se situar. Em outras palavras, Niterói, São Gonçalo e Maricá precisam juntas tomar posição como cidades merecedoras dum respeito mínimo por parte do Estado-membro, este que se dedica à Capital ignorando o antigo RJ como se este fosse mero penduricalho, filho bastardo da Fusão. Não é, muito em contrário, representa todo o corpo de um organismo social que não existiria somente com a cabeça, sendo que boa parte dela pertence ao antigo corpo que se tornou acéfalo com a Fusão.
Independentemente das verdadeiras causas da Fusão (de$confio que já $abiam do petróleo e do pré-$al naquele$ tempo$ ido$...), inegável é que o lado de cá foi relegado à última importância, de tal modo que Niterói, por exemplo, vive só de aparência, e a cruel realidade da cidade ainda não se reflete com clareza na grande mídia. Agora, porém, parece que o assunto desperta e encontra o seu norte: é preciso reverter o esvaziamento, isto no mínimo, ou buscar um novo modelo estrutural para a segurança pública na cidade como um todo, talvez uma “Unidade de Polícia Pacificadora Niteroiense” (UPPN), moldando-se o mesmo em São Gonçalo e Maricá. Para tanto, porém, é necessário rever o modelo tradicional de distribuição do policiamento nas ruas e logradouros, que mais parece um relógio de parede usado no pulso. E o máximo que podem fazer com a estranha peça é girar seus ponteiros em torno do dos mesmos números fixos, adiantando-os ou atrasando-os nos seus limites invencíveis.
Enfim, é hora de quebrar o relógio e de lhe dar novo formato para atender a uma nova função exigida pelo ambiente, e não sei, sinceramente, se vale a pena aumentar o efetivo ou se se deve buscar uma ousada inovação em vista do ambiente incerto e turbulento e, principalmente, contando com o avanço tecnológico que hoje permite uma “visão geral” * (panoptismo) de dentro de alguma sala capaz de acionar patrulhas diretamente ao problema visualizado. Assim, por exemplo, é no Japão desde antanho. Vi o modelo em 1989 na cidade de Tokio. Havia apenas alguns policiais isolados nas ruas, desarmados (não sugiro isto aqui) e portando um pequeno rádio na lapela (tal como o Nextel de hoje). E diante de qualquer alteração no ambiente coberto por suas vistas, o policial acionava o radinho e surgiam do nada muitas patrulhas. Tudo isto visualizado em tempo real numa Central de Operações Policiais contendo um mapa virtual de Tokio. Repito que vi isto funcionando em 1989...
Significa dizer que a Prefeitura, em vez de acionar seus malditos pardais para multar indiscriminadamente os niteroienses, poderia reacionar as câmeras desativada e cobrir Niterói com a tecnologia panóptica, bairro por bairro, num sistema pronto para despachar a patrulha mais próxima e concomitantemente acionar a delegacia de polícia judiciária responsável pela região onde ocorrer algum evento criminoso. Dentre as muitas vantagens, as câmeras identificarão de imediato os protagonistas do crime, dando à polícia a condição de antecipação, o que por aí chamam de polícia “pró-ativa”, quando deveria ser “proativa”. Mas neste caso até poderia se ajustar o comportamento operacional ao anseio “pró-ativo” (a favor da ação), pressupondo que a proatividade estaria no contexto dum PLANO DE SEGURANÇA PÚBLICA a ser elaborado em conjunto pela maquinaria estatal (União, Estado-membro, Município) e segmentos sociais direta ou indiretamente interessados na segurança pública, que, como assinalei em artigo anterior, é constitucionalmente “responsabilidade de todos”.
Este é o aspecto otimista da mudança. Mas, infelizmente, a canseira dos políticos niteroienses e a abastança deles não sugerem nada mais que pessimismo. Desde muitos anos não se pode separar o Poder Legislativo Municipal do Poder Executivo: ambos são uma só máquina a garantir a (in) governabilidade. Daí, somente uma reação societária veemente poderá acordar esse Leviatã que ronca de barriga cheia e não parece mais interessado nem em comer para não explodir e sujar ainda mais a “praia de Cocoraí”. Como fazer, então?... Bem, a iniciativa privada, que enriquece em Niterói por conta da maquinaria governamental, poderia ser questionada e cobrada no sentido de investir no panoptismo aqui sugerido, sem essa de invasão de privacidade ou críticas semelhantes, pois a “visão geral” já ocorre em tudo que é shopping e até em pequenas lojas, demais dos malditos pardais que nos vigiam (os cidadãos de bem) só para nos punir sem qualquer pejo com a privacidade. Por que não quebrar a “privacidade” dos meliantes?...
Infelizmente, devo acrescentar mais uma tragédia em Niterói: o assassinato do sargento PM Celso de Jesus, ontem à noite, reagindo a assalto no Fonseca*. Um dos assaltantes, menor de 15 anos, que só pode ser “apreendido”, foi alcançado pela polícia, constatando-se que a quadrilha armada homizia-se no Complexo da Coruja, em São Gonçalo. Outro membro do bando foi identificado, também menor de idade (17 anos), e só poderá ser “apreendido”. Um terceiro meliante identificado conta 18 anos e poderá ser preso. O quarto assaltante ainda não se sabe quem. Com o deslinde do crime, aflorou que a conhecida “gangue da Hilux” praticou diversos assaltos nas ruas e residências. Eis um tipo de ocorrência que demonstra como a sucessão de crimes perpetrados por um só grupo é capaz de generalizar a falsa ideia de crescente aumento da criminalidade, como se os delitos envolvessem muitos bandidos. Desta feita a PCERJ agiu rápido e decerto retirará de circulação os assaltantes; mas logo, logo a justiça libertará os “menores de idade”, embora se trate de latrocínio (roubo seguido de morte). E tão logo estejam em liberdade, outras vítimas farão e assim a impunidade vai animando o crime e o crime animando a impunidade. Só falta o aplauso da sociedade, sempre conformada, circunflexa, genuflectida, resignada, só faltando persignar-se e pedir perdão pela culpa da existência de marginais no mundo...

*Wikipédia: Originalmente criado pelo filósofo e jurista Jeremy Bentham, o panoptismo seria uma forma privilegiada de olhar, uma vigilância que gera controle, ou seja, um olhar vigilante e controlador sobre os corpos no espaço, através desta perspectiva, Bentham criou o panóptico, o conceito de um projeto arquitetônico que tem por fim vigiar e observar todos os prisioneiros dentro de um centro penitenciário; seria uma forma mais econômica de vigilância, pois se utilizaria apenas de um guarda, que observaria os detentos dentro de um lugar estrategicamente localizada (...).

*http://extra.globo.com/casos-de-policia/apreendido-menor-de-15-anos-suspeito-de-envolvimento-na-morte-de-pm-em-niteroi-4607974.html#ixzz1rfNfAQw3

7 comentários:

Monnerat disse...

Caríssimo Larangeira,
De fato, Niterói, São Gonçalo e Maricá, como você listou, devem se unir para exigir, em bloco,um tratamento à altura dos problemas que vêm enfrentando. Junto a eles parece que merece assento Itaboraí, ainda mais agora com as obras do Comperj, atraindo milhares de trabalhadores para lá. Infelizmente, para você que inicia o texto falando que é hora de deixar para lá essa questão de UPP como sendo culpada disso e daquilo, o nosso secretário de segurança, o Sr. Beltrame, comentando o que tem ocorrido em Niterói, declarou que o problema só será resolvido com a...UPP !!! Quer dizer, é um carma, é uma lástima!
Mas, a questão, na verdade, como vc aponta, é bem outra. É claro que é patente e para todos que está existindo um cansaço sistêmico, o esgotamento do modelo pela execução do mesmismo durante décadas e, então, é certa a tua receita em indicar uma intervenção estrutural no sistema e isso só se consegue fazer zerando tudo e a partir do zero, em todos os campos e setores, redesenhar - comunidade e polícia - o novo modelo que se encaixe para Niterói, São Gonçalo, Maricá e Itaboraí. Dá preocupação quando alguém, conforme noticia o jornal que vc expõe no texto, já apresenta uma solução mágica, como essa do cinturão em volta da cidade, mas sem saber como fazer isso! Por amor de Deus, sejamos mais cautelosos e profissionais.Também aposto que a solução tenha que ser inicializada pela via política e depois atingir toda a coletividade envolvida na questão.

Emir Larangeira disse...

Caro Monnerat

Há diversos artigos neste blog em que reproduzo o "mapa da pacificação" indicando a quantidade de PMs por UPPs já instaladas. Não há uniformidade na relação população/número de policiais empregados, o que me parece correto, embora eu desconheça os critérios determinantes de cada efetivo por localidade. Veja o meu artigo intitulado "Novamente as Upps", no qual o mapa da pacificação publicado pelo Jornal O Globo foi reproduzido. Separe a proporcionalidade mais antipática, ou seja, aquela em que é maior o número de cidadãos para cada policial. Depois use o índice tido assim como "ideal" (o pior) e compare com a realidade do somatório populacional desses quatro Municípios em referência em idêntico cotejo com o atual efetivo da PMERJ. Não fiz a conta, mas é provável que nem todo o efetivo atual da PMERJ atenda ao somatório das populações municipais na mesma proporção da UPP pior atendida em efetivo. Indo por terra o parâmetro básico, quais seriam os demais?... Só um diagnóstico poderia determinar os meios ideais (materias e humanos), o que nos remete ao PLANO no qual pensamos, claro que sem reduzir tudo à mera implantação de UPPs, pois, se somarmos apenas as favelas dominadas pelo tráfico nesses quatro Municípios e projetarmos nelas UPPs nos moldes do Rio de Janeiro, danou-se!... Não haverá efetivo que dê conta...

Paulo Fontes disse...

Caro amigo Larangeira,


Tenho a mais absoluta crteza que todos os males do BRASIL tem início na CLPETOCRACIA POLITICA imbricada n poder desde D,João Charuto!
E como cordel está na moda aí vai a minha forma de protesto.
Abcs


QUERO VOLTAR PARA PINDORAMA


DE NATAL DA PORTELA AO BANDO DO CACHOEIRA
MUITA AGUA POR BAIXO DA PONTE JÁ ROLOU
DE TROCO DE BALEIRO A "TERA" ROUBALHEIRA
NESTA BANDALHEIRA O BRASIL SE AFOGOU

SÃO GÂNGSTERES FACÍNORAS
TODOS ELES COM ANEL DE DOUTOR
SÃO MILHARES DE PICARETAS
NISSO O LUIS INÁCIO ACERTOU

ELE SÓ ERROU NO NÚMERO
QUE CERTAMENTE SUBESTIMOU
NÃO ERAM SOMENTE TREZENTOS
OS PICARETAS DE QUEM ELE FALOU

ALÉM DISSO NÃO SE INCLUIU
NO ROL DOS FIGURÕES NOTÁVEIS
O MENSALÃO ENTÃO SURGIU
COMO PROVA FORMIDÁVEL

DE “DOTÔ” A SENADOR
DE PREFEITO A GOVERNADOR
DE DEPUTADO A SENADOR
DE EMPRESÁRIO A SERVIDOR

ESTE PAÍS ATÉ QUE TINHA FUTURO
MAS CHEIRA MAL O COMPADRIO
OS ESCROQUES ESTÃO NO CONGRESSO
VERDADEIRO LOCAL DE HOMIZIO

A VERGONHA NA CARA FOI EMBORA
MAS EM PINDORAMA ELA CERTO DIA MOROU
UM TEMPO BOM DA NOSSA HISTÓRIA
ÍNDIOS NUS SEM POLÍTICO E SEM “DOTÔ”

QUEM MANDAVA ERA CUNHAMBEBE
CACIQUE JUSTO COMO ELE SÓ
NÃO HAVIA RECURSOS NEM RAME RAME
E DO CRIMINOSO NINGUÉM TINHA DÓ

FURTOU PERDIA AS MÃOS
ROUBOU ERA CONDENADO
FALAVA DEMAIS PERDIA A LÍNGUA
PREVARICOU ERA EMASCULADO

BOB DYLAN CANTA E MANDA VER
SUAS CANÇÕES ME DEIXAM ATÔNITO
ALL ALONG THE WATCHTOWER
EXORCIZAM MEUS DEMÔNIOS

NENHUMA RAZÃO PARA FALAR A SÓS
DISSE O POLÍTICO PARA O LADRÃO
QUASE TODOS AQUI SÃO IGUAIS A NÓS
E POUQUÍSSIMOS AQUELES QUE NÃO SÃO


NÃO FIQUE ASSIM TÃO ALARMADO
A HORA É JÁ NÃO DEIXEMOS PRA DEPOIS
VAMOS ROUBAR TUDO QUE PUDERMOS AGORA
E DEIXAR UM TROCO PRO FEIJÃO COM ARROZ

NÃO SE AVEXE POR EU SER “DOTÔ” E SENADOR
NA BANDIDAGEM NÃO EXISTE HIERARQUIA
VOCÊ É UM ESCROQUE EU TE CHAMO PROFESSOR
ESTE PAÍS É MESMO UMA GRANDE ANARQUIA

TAMBÉM NÃO FICA PREOCUPADO
SOBRE O QUE TUA FAMÍLIA E AMIGOS VÃO DIZER
SE UM DE NÓS PORVENTURA FOR APANHADO
E NA JUSTIÇA TIVER QUE RESPONDER


A SOCIEDADE PERDEU TODO O SEU PUDOR
O QUE VALE É A GRANA PRA GASTAR
A HONESTIDADE POR AQUI NÃO TEM VALOR
AINDA TEM HABEAS CORPUS PRA NOS LIBERTAR

TEM POLÍTICO COM OITENTA ANOS
QUE DESDE OS VINTE ESTÁ NO PODER
HÁ SESSENTA ANOS SE LOCUPLETA
SÃO VAMPIROS QUE SÓ FAZEM MORDER

ROUBARAM NO PASSADO
E NO PRESENTE SÓ TEM LADRÃO
JÁ COMPROMETERAM O FUTURO
DE TUA E DA MINHA GERAÇÃO

VOU PARAR POR AQUI AGORA
CASO CONTRÁRIO QUEM ENTRA BEM SOU EU
JÁ IMAGINOU QUE COISA FORA DE HORA
O BANDIDO LIBERTO DIZER QUE O BANDIDO SOU EU!

PAULO FONTES

Emir Larangeira disse...

Caro poeta e amigo Paulo Fontes

Muito legal! Já viu o meu cordel sobre as eleições da AME/RJ, em resposta a outro cordel cujo livreto postei? O seu coerdel é dez! valeu!
Abs.

Paulo Xavier disse...

Cel Larangeira.
No jornal "O globo" do dia 24 de março há uma matéria em que moradores do Ponto Cem Réis pedem mais segurança para o bairro do Fonseca, mais precisamente para a Alameda S. Boaventura onde os assaltos são constantes. Segundo o jornal, o Maj André Caetano do 12º BPM declarou que não via motivos para reforçar o policiamento pois foram apenas 4 assaltos em 13 dias.
Por ironia do destino, o Sgt Celso de Jesus do 12º BPM é assassinado em um assalto neste mesmo bairro alguns dias depois.
Fica aqui uma pergunta: Se o policiamento naquela árera fosse reforçado, conforme reivindicação dos moradores, não poderia ter sido evitada a morte do policial?

Emir Larangeira disse...

Caro Paulo

Você tem razão. Hoje o Secretário Beltrame admitiu a migração de bandidos do Rio de Janeiro para Niterói, embora os delitos mais graves (crimes de sangue e assalto a residência) paradoxalmente tenham sido praticados por marginais locais já identificados. E são poucos praticando muitos crimes sucessivamente, o que nos remete à origem de tudo: o esvaziamento do aparato policial em Niterói, São Gonçalo, Maricá, Itaboraí e demais cidades do interior a partir da FUSÃO. Isto implica a necessidade de replanejar o policiamento em todo RJ, já que a concentração de efetivos acontece no Rio, o que não significa dizer que lá as coisas andam bem. Na verdade, nem nas UPPs as coisas andam bem, o que nos remete à ideia de que um "feijão-com-arroz" bem feito poderia gerar melhores resultados no geral e no específico. Contudo, não posso negar que as UPPs, malgrado os problemas que enfrentam, é um bom modelo para minimizar a aflição dos moradores de comunidades dominadas pelo tráfico. O problema é que são mais de mil no RJ. Como fazer? UPPs em todas não é humanamente possível. Prefiro então lembrar Henry Ford: "O que deve ser feito deve ser bem feito." Não seria melhor partir do geral pensando assim antes de particularizar o policiamento?... Fica no ar a indagação.

Paulo Xavier disse...

Cel Larangeira.
Li a notícia sobre o reconhecimento do Secretário Beltrame em relação às migrações de bandidos do Rio para Niterói. Tem um comentário inteligente de um leitor que começa dizendo o seguinte: "O primeiro passo para se resolver um problema é reconhecer que ele existe" e isso é uma verdade. Não há como negar o óbvio diante de tantas evidências, porém insisto que o problema se espalha por várias cidades, inclusive Macaé, Campos e Rio das Ostras, que não foram citadas.
Minha continência com meu respeito.