quinta-feira, 15 de março de 2012

Minha batalha contra os pernilongos


Confesso que em toda a minha vida jamais pensei ser derrotado por pernilongos. Nem tanto pelo zumbido impertinente de suas asinhas antes do ataque derradeiro, que, para eles, geralmente termina numa pequena gota do meu sangue esparramado depois que eu os amasso em ira. Perda de tempo porque, fabricados em série, vai um pro beleléu e vem outro imediatamente substituí-lo num exército de retaguarda exponencial.
É bem verdade que de todos os produtos destinados a eliminar pernilongo, aposto ainda no meu ortodoxo tapa aplicado no seu momento mais glorioso, que é quando ele me crava o alfinete chupador e se esquece do resto ao deliciar-se do meu sangue. É olho por olho, dente por dente: para cada chupada uma palmada fatal e fim do sem-vergonha, que, porém, morre gozando das delícias do meu envelhecido sangue. Nem mesmo me respeita a idade, até parece que meu sangue é valioso vinho de safra antiga. Claro que, como afirmei no parágrafo anterior, o meu método é perdedor...
Por causa dessa paranóia em que me meti para vencer minha guerra particular contra os mosquitos, muitas vergonhas passei. Uma delas aconteceu quando comprei duas “raquetes elétrico-eletrônicas” (ou algo que o valha) no centro de Maricá, onde a camelotagem rola solta por manter ótimas relações empresariais com a fiscalização... E como todo bom brasileiro, que sabe não adiantar comprar nada com nota fiscal, como manda a lei, pois o dinheiro vai parar em algibeiras corruptas, toda vez que preciso de alguma quinquilharia vou ao camelô da esquina e pouco se me dá se não gostam. Foi o caso: em desespero, comprei as raquetes que supostamente torrariam os mosquitos no contato com elas. Depois de pagar, perguntei singelamente ao camelô qual era a garantia das miraculosas raquetes e recebi uma apropriada resposta: “Moço, já viu camelô dar garantia?”
Vermelho de vergonha, lá fui eu com as raquetes sonhando utilizá-las de imediato. O lugar preferencial foi meu banheiro, nuns cantinhos escuros onde alguns pernilongos se ocultam para dormir de dia e de noite me atacar a mim sem piedade. Liguei o botão da primeira raquete e enfiei-a na escuridão sentindo-me logo culpado pelo “holocausto” que ela me providenciou: era estalo que não mais acabava, mais rápido que a produção em série dos mosquitos. Tive absoluta certeza de vitória e vibrei a cada estalo pensando no sofrimento da mosquitada inimiga, até que percebi haver mosquito de mais... Puxei a raquete para a claridade e vi que ela não precisava de mosquito para estalar seus curtos-circuitos ininterruptamente. Raivosa, talvez, não parou nem quando desliguei o botão. Primeiramente desconfiado, não tardei a ter certeza de que não matei mosquito algum; apenas utilizei uma raquete defeituosa...
Passado o misto de frustração que quase me levou a Maricá para empombar com o camelô (denunciá-lo aos fiscais não me parecia boa ideia...), sentei na cama e fiquei rindo de mim com cara de paisagem: “Moço, já viu camelô dar garantia?” A frase me aborrecia mais que o prejuízo financeiro, e bem mais pelo fato de eu perder minha primeira batalha para aquele exército movido a sangue. Joguei as raquetes fora e excogitei outro modo de ferrar a mosquitada pulverizando-a com os mais variados produtos “mata-mosquitos” que nos são oferecidos em mágicos anúncios. Outra batalha perdida: fui parar no alergista e tive de abandonar a aparentemente infalível tática que me saiu mais onerosa que minhas raquetes chinesas...
Outras tentativas eu fiz com a utilização de quinquilharias ligadas em tomadas a queimarem um papel azul ou a aquecerem um estranho líquido respectivamente liberando fumacê ou vapor – ambos mortais... Mortais?... Que nada! O que vi foi mosquito cafungando prazerosamente a fumaça e o vapor, deitando e rolando na orgia agora regada a tóxico e sangue – um autêntico banquete socialite. Tal como fizeram com a fumaça e o vapor, os pernilongos fungavam também tudo que era spray paradoxalmente destinado a mandá-los ao além, se é que existe “fantasma de mosquito”.
Cansado de tecnologias, apelei para algumas “namoradas” que no meu quarto se iniciavam tapeando a mosquitada. Que nada! Não lograram eliminar meus inimigos como também mais nada aconteceu entre mim e elas, falha geral de minha parte e ausência dos comprimidinhos mágicos... Enfim, depois de todas as frustradas tentativas tornei ao método que me tem sido mais eficaz: engolir um Lorax 2 mg. Ah, que os pernilongos se fartem de mim! Afinal, dopado eu não ligo pra zumbido ou mordida de mosquito. E muito menos pra “namoradas”, que, no caso em questão, não passam de fantasias a me lembrar a mim os tempos idos e vividos...

2 comentários:

Paulo Xavier disse...

Cel Larangeira
Esse meu comentário seria para os seus versos em literatura de cordel, onde se revela mais um dos seus dons artísticos, mas cabe também para este dos pernilongos(não aprendi distinguir crônica, de conto, de novela, et.) por ser mais atual.
Por não ter a sua facilidade de expressão, ou inspiração; gosto de usar frases prontas, e uma delas diz o seguinte. Aquele que trabalha com as mãos é artesão/ Aquele que trabalha com a mente é um sábio/ Aquele que trabalha com a inspiração é um artista/ Aquele que trabalha com a técnica é um profissional/ Aquele que trabalha com a intuição é um místico/ Aquele que trabalha com o coração é um espiritualista/ Aquele que escolhe o caminho do conhecimento e não da dor é o engenheiro da sua própria vida...
Eis aí Cel, a razão por que aprendi a admirá-lo e a respeitá-lo ainda mais; todos esses adjetivos ou virtudes brotam através dos seus belos textos.
Se me permite, minha continência e meus parabéns. Paulo Xavier.

Emir Larangeira disse...

Muito obrigado, amigo!

É muito bom receber incentivo como o seu. Na verdade, quando a gente se arrisca a escrever sobre qualquer coisa, inclusive e principalmente "abobrinhas", dá a face ao tapa e é ótimo quando recebe carinho em vez de um tabefe. Isto é irresistível e talvez por isso os artistas, em especial os poetas épicos e os que cantaram elegias, garantiram o colorido do qual dependem nossos espíritos para alcançar o bem-estar sem implicações materiais. Só o bem-estar mental, que nos faz muito bem. Bom fim de semana!
Abs.