terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Um tiro pela culatra II


Em toda a História da Humanidade tem sido frequente nos processos de comunicação a criação de expressões e símbolos gerando efeitos especiais com o fim de tornar imediata sua percepção e influenciar as pessoas. Seja criando imagens, ou flexionando palavras, ou dando-lhes novos formatos e significados, o fato é que a transformação e/ou a evolução semântica de termos e expressões estão presentes no nosso cotidiano, assim como a imagem surge e desaparece depois de cumprir alguma finalidade ou se eterniza no tempo. Só como exemplo, durante anos o Brasil inteiro divertiu-se assistindo às exóticas aparições do personagem Chacrinha, cuja imagem, fortíssima, ainda baila na mente de quem vivenciou aquela época e conviveu aos domingos com a magnífica criação do profissional de tevê Abelardo Barbosa.
Os meios de comunicação de massa são tão dinâmicos que uma expressão há pouco considerada calão ou chula, ou mesmo desconhecida, passa a ser corriqueira. O mesmo ocorre com a imagem, cujo efeito pode sumir no dia seguinte ou se tornar perene. E desse oportuno conjunto de circunstâncias que impressionam o inconsciente individual e coletivo, alcançando os diversos segmentos da sociedade, se valem a publicidade e a propaganda trabalhando marketing, merchandising e outras técnicas de oportunidade como poderosos instrumentos de convencimento, sejam quais forem as características do que tenham de defender e/ou vender. Ou atacar...
Símbolos gráficos, fotos, letras estilizadas, números disformes, logotipos e logomarcas proporcionam absorção momentânea, com identificação imediata do que se quer apresentar. Holywood, Coca-Cola, Xerox, Disney e Bombril são marcas ligadas à facilidade e ao prazer. Mas também a hedionda suástica em todo o mundo, o CV no Rio de Janeiro e o PCC em São Paulo associam-se ao terror, à morte, à impunidade, ao narcotráfico, à corrupção policial e política etc. Eis o multifacetado contexto em que ora emerge a imagem do PM cabisbaixo, algemado e separado da tristonha família por uma grade de ferro... Ah, a “família”... Será que os mentores do cartaz sabem qual é o real significado da família? Será que sabem ser a família a maior fonte de socialização desde o início dos tempos? Será que não percebem que o sentido da mensagem em muito ultrapassa seu foco menor do desvio de conduta do PM ao acrescentar a imagem da retaliada família? E, mesmo que fosse tão-somente para relevar o negativismo do desvio de conduta, ao expor a imagem de um PM não singularizado como de comportamento desviante, ela, a imagem, atinge frontalmente todos os PMs, especialmente as praças e suas famílias já tão sofridas. Para se ter uma ideia desse comportamento institucional de negação sistemática do desvio de conduta (anúncio desnecessário, pois a PMERJ é rigorosíssima na punição dos desvios de conduta da tropa), a própria jornalista Vera Araújo, experimentada em todos os sentidos no exercício do seu labor, não resistiu em abrir o texto com a frase contundente: “A imagem é forte.”
Sim, ela pressentiu: “A imagem é forte.” Até demais! Porque sugere uma representação mental, consciente ou não, formada a partir de vivências, lembranças, ideologias, dogmas e outras percepções passíveis de serem alteradas dependendo de quem a observa e dela queira se servir. As imagens afetam e são afetadas por atitudes e opiniões de indivíduos ou grupos. Por isso são criadas e/ou adaptadas com fins de manipulação. Segundo muitos estudiosos, imagem é conceito ou conjunto de opiniões subjetivas de um indivíduo ou de um grupo social sobre uma organização, uma empresa, um produto, uma instituição, uma personalidade, um indivíduo etc. A imagem é, porém, oscilante, porque depende de inferência subjetiva, ou seja, submete-se à percepção do indivíduo que com ela interage, situação geralmente vinculada à sua cultura organizacional e social. Por isso é que os estudiosos são unânimes em assegurar que não se pode exigir do observador da imagem um sentimento unânime de justiça e equilíbrio. Eis onde reside o perigo, pois a imagem, enquanto perdura, constrói e destrói ânimos e reputações com facilidade e volúpia surpreendentes. É tão poderoso o efeito maléfico (ou benéfico, que não é o caso em comento) das técnicas de manipulação da imagem, que o legislador constituinte atentou para o problema e o consignou em texto literal, contundente, indiscutível, como se observa no Inc. X, do Art. 5º da CRB:

São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

A sabedoria do legislador fez-se presente, pois, no fim de contas, o texto sintetiza o direito de preservação de alguns dos imprescindíveis valores que conformam a dignidade da pessoa humana, dentre eles a imagem (Inc. III do Art. 1º da CRFB). Indiscutível, portanto, é o valor jurídico da imagem do cidadão, decerto conjugada ao sentimento, tornando-se, portanto, muito perigosa sua manipulação. Seu efeito é arrasador. Por isso, a propaganda e a contrapropaganda são consagradas desde os primórdios até mesmo por seu uso instintivo. Nenhum exército dispensou ou dispensa a propaganda como arma de guerra; nenhuma empresa ignora a força dos símbolos para alcançar seu público-alvo. Qual será hoje o público-alvo do cartaz, já que foi veiculado pela grande mídia?...
Uma organização social somente existe se integrada e dinamizada por pessoas; e o PM, antes de tudo, é ser humano merecedor de respeito, inclusive quando restrito à farda rotulando-o como indivíduo aparentemente sem identidade em meio à tropa (o corpo dócil denunciado por Michel Foucault em seu clássico Vigiar e Punir).
“A imagem é forte”, eis como reagiu em espanto a jornalista Vera Araújo, com desculpas pela insistência. Bah!... Não importa que sejam atores, a mensagem generaliza a exceção e não me parece que irá meter em brios a tropa da PMERJ a não ser no sentido inverso da intenção do cartaz. Só para comparar, Abelardo Barbosa jamais existiu no ideário popular; o que subsiste ainda hoje é a imagem do apresentador Chacrinha, de forte apelo emocional positivo. E enquanto esse cartaz (de apelo negativo) estiver exposto, a imagem projetada dentro e fora dos quartéis será a do PM deselegante, alquebrado, com mãos a ferros perante uma cabisbaixa família física e moralmente eviscerada: a família do PM. É assim que a PMERJ pensa a melhorar a conduta dos homens, – e de muitas mulheres, – que compõem a sua tropa?... Será que os desvios de conduta numa organização, – de profunda complexidade à luz da multidisciplinar ciência do comportamento humano, – se resumem a esta solução tão absurdamente reducionista
?...

7 comentários:

Anônimo disse...

Tabém, misoca, já que voce tem tanto ódio do passado, vou deixar de te chamar de misoquinha e vou chamar só de mimi, tá bem?
SEGUINTE:brilhante seu posicionamento com respeito a esta última demonstração de falta absoluta de amor corporativo(o cartaz feito pelo mafioso miguel cordeiro e caterva).

Mas também o que que voce queria de uma Corporação que está sendo comandada por dois Cabos?miguel cordeiro e erizinho)será dai para pior.....

Mas não caia em depressão,ela, mercê de tantos inimigos internos e externos, conseguiu sobreviver galhardamente 203 anos e sobreviverá outros tantos, simplesmente porque ela é obra de Deus.

Emir Larangeira disse...

Sr. Anônimo

Claro que posso identificá-lo de mil maneiras, pois você é imprudente e parece não conhecer as firulas da internet. Mas, já que me trata com tanta intimidade, devo-lhe dizer que meu apelido é da infância (Misoca), restrito aos meus irmãos e parentes próximos, e dos bons tempos do futebol, e muito me orgulha. Já "mimi" eu não gostaria porque é apodo de um dos maiores jogadores de várzea que conheci. É só ler a crônica referente no meu site para ver que não invento. Quando ao Sr. Cel PM Cmt Geral, discordo de você em todos os sentidos. Ele é homem comprovadamente íntegro e profissional formado e aperfeiçoado nos mesmos cursos de todos os coronéis. Portanto está apto a comandar e não cabe compará-lo ao outro, sargento, e verdadeiro idealizador do cartaz, segundo o noticiado. Uma coisa é discordar conceitualmente de algo. Tento fazer isto com isenção e respeito ao próximo e sempre assinando. Para mim o Cel Erir acolheu o cartaz por vivenciar na pele a angústia dos desvios de conduta no andar de cima, que pesam sobremodo no clima ético e organizacional da PMERJ. Só para seu governo, o Miguel Cordeiro é sargento. Quam sabe seja o motivo de o PM do cartaz retratar um cabo para insinuar que o problema de desvios de conduta é de cabo para baixo?
Devo também lhe dizer que postei seu comentário em virtude do final, que fala em Deus. É sinal que você não está de todo perdido: apenas tem um pé no Inferno e outro no Purgatório. Mas deve tomar cuidado para não escorregar e descer ao fogaréu... E, por fim, pense bem: que adianta à PMERJ e à sociedade, que ela tem de servir prestimosamente, apenas sobreviver? A função social da briosa deveria ser bem mais que isso, não acha?

Aí está, devidamente postado, o seu confuso comentário. Deu-me a chance de acrescentar algo mais ao que eu disse, reafirmo e assinei como agora assino.

Saúde e paz!
Feliz Ano Novo!

Paulo Xavier disse...

Acompanho o blog do Cel Larangeira a alguns anos, assim como o do Cel Jorge da Silva e confesso que hoje as lágrimas rolaram do meu rosto quando li: "Será que que os mentores do cartaz sabem qual é o real significado da família? Será que sabem ser a família a maior fonte de socialização desde o início dos séculos? Eu respondo. Não sabem, claro que não sabem. Se soubessem não fariam tal coisa, essa humilhação, esse esculacho.
Sou ex-PM licenciado ex-oficio em 1982 na semana do Natal, aposentado pelo INSS por tempo de serviço e funcionário de uma Multinacional Italiana e só consegui dar a volta por cima porque tive apoio da minha família, inclusive um irmão Oficial do Exercito Brasileiro e outro funcionário da Petrobras.
Cel Larangeira estou sendo repetitivo, mas não posso deixar de enviar meus parabéns mais uma vez; não é "babaovismo"; esse "parabéns" sai do fundo da minha alma.
Quanto ao anônimo, que para o sr, a muito já deixou de sê-lo, não liga não, não deixe que ele consiga irritá-lo; pelo jeito esse cidadão passou anônimo por toda a sua trajetória de vida; anônimo que Aurélio chama também de obscuro. Isso mesmo, obscuro, ou sombrio, tenebroso, confuso, ignorado. Um abraço. Paulo Xavier

Emir Larangeira disse...

Prezado Paulo
Obrigado mais uma vez por sua intervenção. Quanto ao anônimo, sempre tento salvar alguma coisa em meio às baboseiras dele. No caso, aproveitei para deixar claro que minha crítica, por mais contundente que seja, primeiramente se baseia em conhecimento de causa. Depois, ele me permitiu esclarecer que tenho respeito pelo comandante-geral e pelos mentores do cartaz, embora a intenção de produzi-lo e a decisão de difundi-lo tenha sido de total infelicidade, segundo minha visão pessoal. Mas a vida é feita de erros e acertos, o que não significa que o errado seja marca registrada de ninguém; muito menos o acerto pode ser característica imutável do ser humano, que foi posto no mundo para errar e acertar, e muitas vezes o acerto para alguns é erro para outros. Vivemos o mundo da dicotomia, do bem e do mal, do certo e do errado, pois somos forjados socialmente para aceitar ou abominar coisas, pessoas, ideias etc. Pena que seja assim, pois também sabemos que o equilíbrio está no meio, entre o aplauso e a vaia. E o mundo segue gerando mais ódio que amor. Infelizmente, há sempre aqueles que pensam vencer o mal com o mal. Fazer o quê?...
Mas vamos em frente, insistindo no bem como valor maior!
Abraços do amigo.

Adilson da Costa Azevedo disse...

Caro Larangeira

Os que te conhecem sabem do seu orgulho de ser oficial da PM e do seu trabalho seja na atividade profissional na Corporação seja como deputado onde você revelou-se um ferrenho defensor da PM como Instituição e dos seus componentes. Ao se deparar com um cartaz como esse, imagino o seu sentimento repugnando essa infeliz idéia. Não tenho dúvida do valor do atual Comandante da PM e de sua integridade. No entanto, mesmo os bem intencionados cometem equívocos. Creio também que o presidente da Assinap Miguel Cordeiro apresentou esse cartaz acreditando em sua eficácia positiva. O efeito produzido até agora foi de indignação dos PMs.Os exemplos de cima demonstram que se fossemos algemar os engravatados que cometem crimes os estoques de algemas seriam esgotados.Não sobraria para essa minoria de PMs que cometem esse desvios de conduta.Assim, o melhor a ser feito imediatamente seria a retirada de todos os cartazes com um solene pedido de desculpas a todos os PMs.O respeito ao Comandante Geral iria aumentar muito.
Um forte abraço. Adilson

Emir Larangeira disse...

Meu irmão Adilson

Agradeço o comentário e a clarividência dele, em especial por sublinhar que pode não ter havido má intenção por parte do comandante-geral, pessoa íntegra e a cima de qualquer suspeita, que merece o meu mais profundo respeito, e quiçá por parte também do Presidente da ASSINAP, Miguel Cordeiro, bom amigo de muitos anos que eu igualmente prezo. Entretanto, entendo que ambos falharam ao expor o cartaz sem o apoio de especialistas. Desvio de conduta nas organizações é matéria de vasto e profundo estudo acadêmico e de difícil solução. Concordo que o cartaz deva ser retirado e que ambos peçam desculpas à tropa pela má ideia. Nada demais, apenas sinal de honradez e isenção. Não se trata de defender aqueles que desonram a corporação, mas de escudar os bons PMs (maioria absoluta) e suas famílias, e até mesmo as famílias dos que incorrem em desvios de conduta, que, aliás, vão do simples surrupio de uma folha de papel à extorsão e crimes mais graves. Com a sua experiência de vida e profissional, ninguém melhor para compreender que existem desvios e "desvios" e o melhor caminho é apostar no ser humano como basicamente bom e não como essencialmente mau, como nos alertam muitos estudiosos. O Cel PM Carlos Magno Nazareth Cerqueira, apoiado por nosso mestre Cel Jorge da Silva, determinou como Grande Objetivo da PMERJ no seu Plano Diretor o HOMEM PM, a partir do qual e mediante incentivo ao desempenho, mudaria a cultura da corporação. O sonho dele de uma NOVA POLÍCIA e UM NOVO PM não se concretizou, mas nada impede que o atual comandante-geral busque um exemplar, e, até em homenagem ao saudoso Cel Cerqueira, dissemine novamente a ideia nele contida e que se fundamenta na ciência administrativa, que, por sua vez, se escuda em todas as ciências como subsistemas de um só sistema. Creio que relendo o Plano Diretor a que me refiro o atual mandatário da PMERJ encontrará a melhor receita já elaborada pela PMERJ e obterá o melhor resultado em termos de clima ético e clima organizacional. Tomara que alguém lhe dê a ideia. Aliás, há uma Coronel PM (Kátia)que deve lembrar desses tempos, pois trabalhava na PM.5 quando segundo-tenente e hoje é Chefe de Gabinete. Fica a sugestão gravada e missão cumprida. Beijos no seu coração e nos corações da família!
Emir

Emir Larangeira disse...

Ao anônimo recalcado

Há um anônimo que volta e meia me manda mensagem ofensiva. Não gostou de eu ter elogiado o Plano Diretor da PMERJ, cujo mentor foi o Cel Cerqueira com o apoio intelectual do Cel Jorge da Silva, de quem sou compadre (sou padrinho da filha dele). Curioso é que o anônimo ficou irado por eu homenagear um morto, como se fosse possível o Cel Cerqueira retornar do além para me fazer algum favor. A você, anônimo, que não tem coragem de mostrar a cara, mando o recado: não perca tempo destilando seu recalque. Aqui no meu blog mando eu, e não posto baboseiras. Assine o que você escreve, que eu lhe respondo à altura. Mas na escuridão do seu anonimato você sempre ficará, se depender de mim.
Viu como é fácil te responder? Tal como eu li seu recado tolo, você decerto lerá a minha resposta e ficará mais zangadão ainda. Quem sabe assim você saia da caverna, onde você mora e só vê a sua sombra projetada na parede úmida, para receber luz no peito?...