sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Apertem os cintos: o “Piloto PMERJ” sumiu



Esta última providência da PMERJ de não mais permitir ao PM prestador de serviços nas ruas lavrar o BRAT (Boletim de Registro de Acidentes de Trânsito) no próprio local do acidente sem vítima, momento em que o agente público anota detalhes do ocorrido, incluindo desenho reproduzindo detalhes do fato, dentre outras medidas como a qualificação dos indivíduos em conflito, testemunhas etc., sugere não ser decisão isolada. É também mui contraditória, pois não faz tanto tempo a PMERJ foi proibida de lavrar Registro Policial Militar (RPM), e o principal argumento, dentre outras filigranas inaceitáveis, foi o de que o contribuinte não deveria ser levado ou se dirigir a quartel para ser atendido e sim a uma delegacia policial civil. Enfim, o quartel serve a um propósito, mas não serviu ao outro, o que é no mínimo estranho, para não dizer absurdo.
A incongruência da mudança é tão tamanhona que abalroa os fundamentos da instituição PMERJ como prestadora de serviços públicos, função que deveria ser estimulada em vez de inibida. Pior é que o argumento contrário é o de dar mais espaço a uma PMERJ repressiva da criminalidade, esquecendo-se do detalhe de que, em estando nessa missão de atendimento a acidentes de trânsito sem vítimas, que é rápida, mas se no seu transcurso houver algum acionamento para coibir crime, os patrulheiros partem imediatamente e o máximo que o incidente pode causar é um atraso decerto menor que a responsabilidade de lavratura do BRAT transferida em caradura para o particular, este que nenhum poder de polícia possui para registrar detalhes do fato com vistas a servirem de prova judicial. Por mais fidedignos, esses dados podem ser e serão contestados pela parte oposta no mundo jurídico-judicial, isto também no mínimo.
Falando o português claro, a decisão da PMERJ soa como conformismo humilhante, e peço perdão pela redundância, pois o conformismo por si só é humilhante. E não estranharei se houver na sequência outra inovação no sentido de que as partes envolvidas em acidentes de trânsito sem vítimas, – porém geralmente conflitantes e em muitos casos roçando a prática de algum delito de menor potencial ofensivo a exigir lavratura de Termo Circunstanciado (TC), – que as partes sejam instadas a comparecer à sede policial civil para lavrar o BRAT, deste modo esvaziando mais um relevante serviço policial militar inserido no contexto conceitual e prático da manutenção da ordem pública (missão constitucional das Polícias Militares), que a PMERJ vinha prestando com eficiência aos seus principais destinatários: os cidadãos contribuintes. Ora, tudo isso cheira a colaboracionismo tal como vimos na França submetida pelos alemães durante a II Grande Guerra! Nada mais ignominioso...
Se se considerar que o sonho da PCERJ é aquartelar a PMERJ e ocupar seus espaços nas ruas, sem dúvida a “coirmã” deu dois passos fundamentais à frente, enquanto a PMERJ, como sugere Deonísio da Silva em romance (Avante soldados, para trás), deu uma corrida louca para trás na prestação dos seus serviços de segurança à população, sendo certo que o atendimento à criminalidade corresponde a não mais que 5% do labor cotidiano da corporação. Enfim, abandonar o todo em vista da menor parte é como abandonar o grande navio por conta de um furinho microscópico no casco. Mas a PMERJ assim se comporta, e faz o jogo do poder contrário aos interesses da população; pois, ao se dedicar tão-só ao controle da criminalidade, a imagem da corporação tende a mais se desgastar, como, aliás, vem acontecendo desde que terceirizaram o atendimento do telefone 190, instituindo a esdrúxula situação de um atendente de telemarketing acionar a radiopatrulha sem conhecer absolutamente nada do assunto e nem o ambiente onde o fato estaria ocorrendo. Pois o tempo que leva para anotar os obrigatórios dados, – antes de desvelar qual patrulha atenderá a ocorrência criminosa, – o tempo gasto é suficiente para os facínoras alcançarem o Japão. Isto aconteceu comigo: certa vez liguei de Niterói para o telefone 190 a comunicar o furto de um veículo; fui atendido por uma moça que pensei ser PM feminina; mas logo percebi que não era, e que não conhecia a cidade de Niterói. Ela me fez tantas perguntas preliminares para preencher a sua ficha de atendimento que me levou à irritação. Claro que, quando ela terminou seu diligente trabalho burocrático, o veículo furtado deveria já estar em Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense...
Eu poderia aqui afirmar que a prática do recuo não só prejudicará a instituição PMERJ como um todo como acarretará sérios transtornos à população usuária de veículos. Não mais lavrar RPM já consiste numa aberração fundamental que a sociedade precisa saber e reagir a ela; não mais lavrar o BRAT no local do acidente, momento mais importante para consignar a verdade substancial, – a ser levada à apreciação principalmente do Ministério Público e da Justiça, – é um desserviço à manutenção da ordem pública; terceirizar o atendimento do telefone 190 representa, por fim, o desfecho de uma inércia planejada e executada pelos que têm um inegável interesse em fazer desaparecer das ruas a PMERJ, tal como o “Piloto PMERJ” lá do título...

2 comentários:

Wanderby disse...

Creio que a lavratura do BRAT em atendimento à ocorrência de acidente de trânsito sem vítima é algo inerente ao lema "servir e proteger" e ao conceito de polícia administrativa.
Vale ressaltar que o comparecimento do PM ao local se presta não apenas à confecção do documento (tão importante que é uma das exigências das seguradoras para pagamento de valores devidos), mas à oferta de segurança e de apoio aos condutores envolvidos.
Destaco ainda que mesmo a ocorrência de código inicial 721 (acidente de trânsito sem vítima) pode apresentar a necessidade de imposição de medidas legais de natureza administrativa determinadas pelo CTB, bem como desdobramentos na esfera de crime ou contravenção penal.
Diferentemente da desnecessária, anacrônica e danosa (ao erário e à sociedade) submissão de todas as ocorrências de natureza delituosa, mesmo na ausência de flagrante e nas hipóteses de menor potencial ofensivo, aos balcões das delegacias de polícia, o atendimento aos cidadãos envolvidos em acidentes de trânsito não é perda de tempo.

Anônimo disse...

Me coloco em suspeição para emitir uma opinião a cerca do texto e do comentário que se apresenta, mas por um dever de reconhecimento me resta tão somente dar a minha continência.
Cel Ronaldo Menezes