sábado, 4 de junho de 2011

ANOMIA


“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição;
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;”

A revolta dos bombeiros-militares

Num Estado Democrático de Direito (que não é um “governo democrático de direito”, porque este é personalista), sua permanência no espaço e no tempo depende do amor às leis vigentes ou, no mínimo, do respeito a elas. E, no âmbito desse respeito, há a hierarquia das leis a ser observada por todos os cidadãos, incluindo-se os políticos eleitos pelo povo. Não há exceção a esta regra, a não ser nos “estados de exceção” (estado de defesa e de sítio), situações, todavia, dependentes de aprovação pelos poderes constituídos. Caso contrário, é ditadura. É tão grave esta visão da lei que outro dia ouvi um Ministro do STF dizer que não pode um parágrafo pretender valer mais que seu artigo, e assim por diante, como também não se pode conceber um regramento municipal abalroando idêntico regramento estadual ou federal. Portanto, é de se supor que num Estado Democrático de Direito os cidadãos respeitem as leis a partir da Lei Maior: a Constituição da República Federativa do Brasil. Qualquer tentativa contrária cheira a golpe, por mais singelo que seja o motivo alegado. Mas é o que vem ocorrendo no RJ governado por Sérgio Cabral; e a principal vítima dessa acintosa anomia é a instituição militar estadual denominada Corpo de Bombeiros, eis que aviltada a sua destinação de organismo de segurança pública nos termos do Artigo 144 da CRFB, caput e inciso V:

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I - polícia federal; II - polícia rodoviária federal; III - polícia ferroviária federal; IV - polícias civis; V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.”

A explosão de indisciplina dos bombeiros-militares do RJ deve primeiramente passar pela constatação da anomia instituída desde o primeiro governo do Sr. Sérgio Cabral, quando, abruptamente, e em desapego à norma constitucional, ele deslocou o CBMERJ, inquestionável organismo de segurança pública, força militar estadual auxiliar reserva do Exército Brasileiro, para os quadros da Secretaria de Estado de saúde. Ora, a Carta Magna é clara, os Corpos de Bombeiros Militares são organismos de segurança pública ocupando o mesmo status constitucional das Polícias Militares. Portanto, devem integrar-se à estrutura da Secretaria de Estado de Segurança Pública. Na medida em que se consolidou o atropelo à Carta Magna e leis referentes, e nenhuma ação do Poder Judiciário houve no sentido de restaurar a legalidade (não sei se o Ministério Público encetou algum questionamento a respeito), a ilegalidade passou a predominar como regra até haver a reação anárquica que se vê no Quartel Central do CBMERJ: uma corporação desmoralizada em seu status legal tentando reagir contra o ato de força a que foi submetida como se nada representasse a CRFB e leis referentes. Pior é que lá vai a PMERJ (como “polícia do governo”) representar a força bruta contra a coirmã, mesmo ciente de que seu papel deveria ser o de defender as leis vigentes até contra a vontade do governante. Para tanto, seus membros se comprometem perante a Bandeira Nacional, demais de ser esta missão muito claramente exposta nos diplomas legais em vigor. E, dentre os muitos compromissos escritos, ressalta-se o da ética, nos termos do Art. 27 do Estatuto da PMERJ, mormente o seu Inciso IV:

“IV - cumprir e fazer cumprir as leis, os regulamentos, as instruções e as ordens das autoridades competentes;”


Ora, o militar estadual se rege em primeiro lugar pelas leis, cabendo-lhes respeitá-las e defendê-las com o sacrifício da própria vida. Mas quando autoridades superiores ignoram essas leis, como é o aberrante caso da subordinação do CBMERJ à Secretaria de Saúde, não deveria caber aos valorosos soldados do fogo acolher submissamente o absurdo, nem à PMERJ se lançar contra seus coirmãos para aprofundá-lo. Porque é tão descarado e arrogante o descumprimento, por parte do Governo Estadual, dos preceitos constitucionais, que os valorosos bombeiros deveriam reagir antes mesmo de saírem a pleitear melhores condições de trabalho e de vida. Porque, em vista do desrespeito dos dirigentes políticos estaduais ao status constitucional do CBMERJ, nada mais esses dirigentes podem esperar além de reações revoltosas, algo que, se comparado a um grande incêndio, não é mais o seu foco primeiro. É sim, um fogo descontrolado que se alastra e tende a assumir proporções gigantescas, tornando-se tragédia decorrente do desprezo dos dirigentes políticos pelos valorosos militares estaduais, transformados em “agentes de saúde”...
Não sei como a crise será contornada. À primeira vista, parece-me que os revoltosos não recuarão facilmente, nem pela força ou por ameaças desferidas por dirigentes sem legitimidade, dado o desespero e a revolta dos primeiros em confronto com a arrogância dos segundos. Não há como impor hierarquia militar alguma porque o regramento constitucional foi acintosamente quebrado de cima para baixo. O menoscabo com que os bombeiros-militares vêm sendo tratados só pode ser rechaçado por meio de inconformismo veemente. É o que ocorre e tende se a exacerbar, porque, se essa imensa massa de desesperados invadiu o quartel, e se trata de crime militar gravíssimo, o desvio de finalidade da corporação por iniciativa de dirigentes políticos foi pior, sendo a invasão simples reação contra este. Agora o azar está lançado. A tropa do CBMERJ não parece disposta a recuar e a solução não será o uso da força para contê-la. Investir a PMERJ contra o CBMERJ num momento delicado como esse pode significar o caos e a repetição do que houve em Minas Gerais, em 24 de 1997 (Dia nacional da Luta dos Cabos e Soldados), na cidade de Belo Horizonte, ocasião em que o Cabo PM Valério dos Santos Oliveira, da PMMG, foi morto a tiro enquanto clamava, junto com outros companheiros, por melhores condições de vida e de trabalho em favor de sua sofrida categoria. Infelizmente, e por enquanto, é o que se vislumbra: uma tragédia produzida de cima para baixo, resumida na luta fratricida do roto BM contra o esfarrapado PM.
O episódio, agora de proporções inimagináveis devido ao confronto entre as coirmãs, com a PMERJ enfiada em quartel do CBMERJ, tornou-se absurdo. Poderíamos até representá-lo por meio de uma grosseira alegoria: um jogo de futebol em campo molhado e debaixo de chuva em que o árbitro, usando erradamente sua autoridade e sua força, obriga os contendores a jogar com uma bola de futebol de salão, em nítida quebra de regra. Claro que a tendência do jogo é a de se tornar violento, com prejuízos para ambos os times. Fico imaginando se ocorresse o inverso, ou seja, uma invasão do Quartel General da PMERJ por PMs. Será que o Corpo de Bombeiros, tão força auxiliar reserva do EB como a PMERJ, invadiria o quartel da coirmã? Ou seria convocado o próprio EB para coibir o ato indisciplinado? Não sei... Não sei... Só sei que o prejuízo futuro no relacionamento entre os coirmãos bombeiros-militares e policiais-militares pode ser irreversível, tudo por conta do desmando irresponsável de dirigentes amantes da anomia a serviço de si próprios e do caos, como ocorreu na histórica revolta dos marinheiros, ressalvadas as diferenças. Tomara que termine tudo bem e que, principalmente, o regramento constitucional seja restaurado pela União, nem que a ferro e fogo. Afinal, e já que é assim, há de prevalecer o que está escrito na Lei Maior, relevando-se, além do Art. 144, o Art. 22, caput, Inciso XXI:

“Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (...) XXI - normas gerais de organização, efetivos, material bélico, garantias, convocação e mobilização das polícias militares e corpos de bombeiros militares;”

É O QUE BASTA!

5 comentários:

Cel RR Esteves disse...

Parabéns pelo "post",de uma clarividência inconteste. Como você estou apreensivo quanto ao que está por vir. Um abraço

Vilaça disse...

Parabéns pela postagem. Quem conviveu no seu Comando sabe quanto orgulho se tem ter sido seu Comandado. Sempre Amigo Vilaça.

Eduardo Creazola disse...

Meu eterno Comandante, fico muito feliz pela clareza como o Senhor esclarece temas tão complexos. Esperando este humilde Ten PM Ref e Causídico do Direito que alguma autoridade política que tenha vergonha na cara TE CONSULTE antes de legislar sobre PMERJ e CBMERJ, e com a devida vênia, o Senhor terá muito a ensinar-lhes.
Parabéns pela aula de legislação militar que nos foi dada e tenho certeza que muitos Militares Bombeiros neste momento sabem exatamente que seus sacrifícios e suas aflições não serão em vão, como tambem sustentarão os nossos anseios de também sermos bem renumerados. Aproveito este blog tão visitado para pedir em nome da Minha Família Policial Militar, dos Direitos Humanos ditados pela Minha OAB, muitas desculpas à toda Corporação do CBMERJ pela forma como foram tratados pelos meus pares, ou seja: poucos pares. Porque a maioria não obedeceu a tal ordem absurda. Ate porque o seu AUMENTO SALÁRIAL é o nosso também, Eu, minha mulher e meus filhos pedem DESCULPAS a vocês e as suas famílias, vocês merecem todas as nossas SOLIDARIEDADE e AGRADECIMENTOS. E que DEUS esteja com vocês
.
Um forte abraço do amigo

Eduardo Creazola

Carlos disse...

O que está por trás dos bombeiros.



Nos últimos meses venho acompanhando as manifestações que alguns bombeiros vem realizando em frente a assembléia legislativa, ali na rua 1° de março. Confesso que estive presente nas duas primeiras manifestações deste ano, mas não mais retornei. Ficava ali, parado e assistindo cinco ou seis bombeiros e PMS disputarem o microfone, tomando minutos repetitivos que pareciam nunca terminar. Cada um querendo aparecer mais que outro. Eram sempre os mesmos. Normalmente, do lado dos bombeiros, era gente que tinha seus próprios vínculos políticos com deputados e vereadores. Infelizmente gente que verdadeiramente poucas horas de trabalho dedicou ao CBMERJ.

Tempos depois, li no jornal que seis ou sete bombeiros haviam sido presos por incitar greve. Ao ver cada nome, lembrava dos panfletos que recebi em época de eleição e me perguntava, se uma instituição centenária merecia ser usada para alavancar a carreira de meia-dúzia.
Gostaria que todos vocês ao lerem os nomes dos lideres desse movimento, fossem até o Google e checassem quais não foram candidatos nas ultimas eleições.

Os três principais lideres são:

Capitão alexandre Marchesini (Candidato a deputado pelo PR)
Capitão Lauro botto (candidato a deputado pelo PV)
Cabo Benevenuto (candidato a deputado pelo PRTB)

E os dois principais PMs que discursam sempre são:

Coronel Paul (Candidato pelo DEM)
Cabo Gurgel (candidato pelo PTB)

Será que não está óbvio que essa gente quer uma melhoria pra elas próprias?

O CB Benevenuto, por exemplo, passou os últimos 4 anos lotado em um gab de deputado e depois saiu candidato.
O Capitão Marchesini, foi candidato pelo partido do Garotinho. Por que ele não cobrou do Garotinho este aumento na época que ele era governador?

Acordem. Esse pessoal nunca foi bombeiro de verdade. Todos os que ali estão só querem usar a corporação como trampolim político. Já vi vários deputados bombeiros serem eleitos e a coisa só mudou para eles.
Quando fiz minha escolha por um serviço publico, eu sabia que o salário era baixo, mas decidi ingressar pela estabilidade. Foi uma escolha minha, troquei o salário mais alto da iniciativa privada, pela estabilidade de um emprego publico. Não vou agora me vitimizar por minha própria escolha. Isso seria safadeza.

Vejo até crianças sendo levadas aos protestos. Ora, pra que alguém vai levar crianças para uma manifestação? Só se for pra servir de escudo humano, não há outra justificativa. Isso é atitude de oportunista covarde.

Óbvio que bombeiro ganha pouco. Assim como todo funcionalismo e é uma situação que ouço desde que me conheço por gente.

Vamos melhorar sim, mas não com essa turma que aí está.

Anônimo disse...

Estou muito triste com todo este acontecimento, penso que tudo isto denigre e enfraquece cada vez mais a imagem da PMERJ diante de uma polpulacao que ja embora pecise dos servicos da PM, desacredite nela. Visto que todos nos como PM e ou BM somos "comandados" por um Governo ha muito tempo desgovernado (porque isto nao partiu exclusivamente do governo Sergio Cabral)de uma maneira muito velada vem acontecendo pouco a pouco a cada governo com promessas de melhorias salariais, carga horaria entre outros..e isso foi calando nossa voz! Hoje onde este governo vem manipulando as Corporacoes com certos "beneficios", gratificacoes (que uma certa forma `e uma maneira de causar conflitos internos entre os pares)nao bastasse tudo isso usa sua autoridade para promover tambem a discordia entre as corporacoes CBMERJ e PMERJ...que governo `e este?? nos incita a participar de passeata gay fardados, autoriza passeata para liberacao da maconha (cuja a venda ajuda na compra de armas para fortalecer o crime. Sabe fala-se da Ditadura, que sabemos, foi uma epoca repressiva, onde nao haviamos a "tal liberdade de expressao" alias tao desejada por TODOS, mas qual liberdade de expressao? esta que que foi reprimida exatamente da mesma maneira e pela mesma Unidade (BPCHQ) que foi tao utilizada na epoca da ditadura...o nosso povo sofre do "mal da memoria seletiva" Acho que `e passada a hora de Unirmos todos BM, PM e PC e lutarmos sim por um tratamento mais digno, Humano e por alguem que entenda a nobre missao que e
"SERVIR E PROTEGER MESMO COM O SACRIFICIO DA PROPRIA VIDA" ou "RIQUEZAS E VIDAS ALHEIAS SALVAR" nao acredito que um civil possa alcancar tal conhecimento sem ter vivido e sua pele esta experiencia dia apos dia...
Cel Laranjeiras gostaria de parabeniza-lo pela sua materia, muito bem colocada sua palavras o aplaudiria de pe se fosse um discurso em publico. Estas precisam ser ouvidas por nossos companheiros e pela massa...

Agnus Dei