sábado, 28 de maio de 2011

A PMERJ na berlinda II

Destruir para construir, para destruir, para construir...









“Eu vou simplesmente continuar construindo. Vocês façam o que puderem para impedi-lo.” (Robert Moses)












“A queda de Moses para a crueldade extravagante, ao lado de seu brilho visionário, sua energia obsessiva e ambição megalômana, o capacitaram a erigir, através dos anos, uma reputação quase mitológica. Ele aparecia como o último de uma longa linhagem de construtores e demolidores titânicos...” (Marshall Berman)






A História da Humanidade é geralmente contada ou recontada a partir de edificações preservadas ao longo de séculos. Boa parte dessa história, porém, só é conhecida por meio de resgates arqueológicos exaustivos e onerosos. Não é por acaso que esta prática científica tende a vencer os tempos; afinal, as sociedades mundiais contam suas histórias buscando nelas inserir novas provas físicas de veracidade.
Tal iniciativa de preservação ou de restauração não se limita a prédios públicos. As edificações particulares recebem o mesmo tratamento dos governos ou de entidades particulares no sentido da manutenção da história viva de famílias ou instituições públicas e particulares. Daí que “baixar o espírito destruidor do nova-iorquino Robert Moses” não parece boa prática, embora a modernidade exija a adoção de medidas extremas e prejudiciais à prática corrente da preservação dos patrimônios históricos, alguns sublinhados até como patrimônios da humanidade.
Em se tratando de quartéis militares, ressalvadas as exceções, em muitos casos eles representam uma história insubstituível, marco vivo de uma ou várias épocas, e penetram o espírito da tropa como o lar penetra o espírito da família. Por conseguinte, destruir um quartel ou um lar não se resume a descer a marreta sobre a edificação e ponto final. Demanda cautela e avaliação do custo-benefício da destruição em vista não apenas de uma geração, mas do interesse maior da própria sociedade.
A mesma história nos conta o quanto a insanidade destruidora das guerras arrasou edificações seculares, tornando-as irrecuperáveis. Nem é o caso de falar das caríssimas restaurações que se fizeram necessárias depois dos desmoronamentos perpetrados por megalômanos eventualmente detentores do poder.
A lógica dessas gentes doentes é a do delírio, da empolgação consigo mesmo, da “superestima patológica de si mesmo”, o que muitas vezes só se percebe depois da desgraça feita. Talvez (quem sabe?) o demasiado tempo à frente do poder produza mentes ociosas, valhacoutos da mania de destruição sob o pretexto de “modernizar” É, pode ser... Porque a falta de preparo para o exercício continuado do poder é campo propício à proliferação de mentes doentias; eis aí a necessidade de renovação política para evitar o continuísmo, tarefa da democracia, que, no entanto, não é real no Brasil. O predomínio é do continuísmo como cultura eleitoreira, esta que, tão poderosa, vem vencendo todas as ideologias reinantes, de esquerda ou de direita.
É difícil para a sociedade conter esses ímpetos megalomaníacos que consomem fortunas, cuja destinação deveria ser para a erradicação da pobreza, do analfabetismo, das moléstias etc. Não é, todavia, tarefa simples. O poder de destruir e construir, como agora vemos ocorrer no Brasil em vista da Copa do Mundo e das Olimpíadas, ilustra mui bem a dimensão do problema. Porque os bilhões que estão sendo gastos bem que poderiam ser aplicados na melhoria das condições de vida do povo, especialmente descentralizando as vultosas somas que saem do bolso deste mesmo povo sofrido em demasia.
Ocorre, porém, que o jogo de poder paira como aviões em voo de cruzeiro por sobre a cabeça do povoléu, ou seja, é inalcançável à vista da imensa maioria de brasileiros pobres, sem nada para comer, sem colégio para estudar, sem saúde, nada. Mas isto não afeta o sentimento dos poderosos, com destaque para a grande mídia que mais lucra com os gastos públicos descaradamente grafados como “investimentos”.
Que investimento, que nada! A verdade é que as grandes obras enriquecem a mais e mais os detentores do poder, não importando seus discursos “socialistas”. O que se vê é a roubalheira desbragada e a caradura de políticos novos-ricos à custa do erário público; pior é que acontece tudo em nome da “democracia” e “do povo”, assumido rebanho a aplaudir a maravilha dos espetáculos futebolísticos, artísticos e semelhantes, difundidos de tal modo que os miseráveis se sentem lídimos participantes, mesmo que de prato vazio e apenas em frente das telinhas ilusórias de tevê disparando programado marketing.
Portanto, quando vejo anúncios de destruições e construções por dirigentes políticos primeiramente me lembro das calamidades, das enchentes eternizadas por falta de vergonha na cara dos eleitos de sempre, dos desabrigados novamente perdendo seus entes queridos e suas quinquilharias improvisadas. Sim, assolam-me o desânimo e a revolta diante de tanta sem-vergonhice anunciada pelos “arautos do bem” e “salvadores da pátria” eternizados no poder por via de oba-oba e dos conluios de políticos com os donos da mídia. São eles, sim, pupilos de William Randoph Hearst, magnata estadunidense pioneiro do sensacionalismo gerador de escândalos e de dinheiro para abafá-los. É com esse espírito que assisto ao anúncio da venda dos quartéis da PMERJ em justificativa que me soa marota.

Nenhum comentário: