terça-feira, 18 de janeiro de 2011

A TRAGÉDIA DA SERRA

De quem é a culpa?


Há chuvas torrenciais todo ano; há desfiles de Escolas de Samba todo ano; há campeonatos de futebol todo ano. São eventos previsíveis. No segundo caso, há uma superestrutura; todo um planejamento ocorre; o enredo é escolhido; alas são organizadas; fantasias são planejadas e produzidas; compositores se dedicam à disputa pelo Samba Enredo; ensaios são efetuados; desfiles técnicos dão o retoque final e ocorre o desfile em que todo o sistema é testado. Um erro na passarela, tudo escoa ralo abaixo e a Escola de Samba é rebaixada. Resumo da ópera: cai o carnavalesco, a rainha da bateria é lançada ao ostracismo, o presidente da agremiação perde o posto e por aí segue a irada cobrança dos foliões. No terceiro caso, do futebol, é a mesma coisa, mas nem tanto como nas Escolas de Samba, e a razão é simples: há invariáveis desvios de conduta visando a interesses escusos e o time perde, e ingressa na segunda divisão, e a torcida sofre, embora a paixão do torcedor supere todas as derrotas. Mesmo assim, troca-se o técnico, jogadores são vendidos, o presidente do clube vai pro beleléu etc. No samba e no futebol, todavia, raramente há mortes a lamentar.



No primeiro caso, das chuvas torrenciais, a estrutura estatal de prevenção a desastres delas consequentes é obtusa; não há previsão de nada; não há diagnósticos amplos e profundos; não há nenhuma proatividade; as ações são reativas aos acontecimentos; tudo é surpreendente, embora se trate de imprevisibilidade previsível; e a desgraça se abate sobre os ignaros; porque os desidiosos não se lembram dos mortos anteriores e nenhuma providência se robustece para enfrentar a tragédia seguinte. Há, sim, muita solidariedade desordenada no momento agudo, ofuscando a incompetência do Poder Público. A mídia transforma cidadãos adotantes de cães abandonados em heróis, em vez de estimular a adoção de órfãos humanos.


Quando há o desastre todos fogem da desgraça; não há justificativas que lhe correspondam. As cobranças se resumem aos pareceres de especialistas explicando o fato como se estivesse esmiuçando um caixão e seu conteúdo morto. Os eloquentes desespatifam ovos espatifados ou desderramam o leite derramado na maior caradura. Os políticos hábeis na retórica permanecem em seus postos sem grandes incômodos, a publicidade paga com verbas públicas lhes garante a imunidade. Ninguém é cobrado como nos outros dois casos comentados. Enquanto isso, o tempo é empurrado pela solidariedade tola invadindo o noticiário; donativos são desviados; contas bancárias são abertas e passam ao largo de qualquer fiscalização; almas anônimas ocupam o esquecimento da sociedade, que se sente máxima por doar um quilo de feijão ou um capote para saciar momentaneamente algum corpo vivo. Sim, eis a sociedade hipócrita de alma lavada ante as vítimas da tragédia anunciada. E, depois de a natureza secar a lama e os garis varrerem o pó das ruas, a vida continua, os festejos coletivos dão lugar às isoladas dores familiares. Ah, os atingidos que se danem, pois o mundo gira! Afinal, quem os mandou serem miseráveis e se pendurarem nas encostas?...
Na verdade, há no íntimo dos afortunados moradores do asfalto certa aversão ao visual feioso da favela e dos favelados. Muitos sortudos até torcem para que o feio seja levado pela enxurrada e o mato renasça nas encostas resgatando a perdida “vista da montanha”. Mas, como a vida continua, as construções chiques necessitam de mão de obra barata e futuros favelados surgem de todos os pontos do país das desigualdades, ou, na linguagem presidencial feminina, emergem da “regra geral” da miséria nacional. E vêm os trabalhadores “morar” nas construções; e catam tábuas, e zincos, e pregos, e caibros velhos, e paus de eucalipto para construir seu barraco onde houver chão na encosta perigosa. E não sem dono, porque o futuro favelado paga a alguém pelo chão tomado a muque, cultura de opressão do pobre contra o pobre. E surge então o barraco, e a família viaja de longe para ocupar um lugar ao sol sem pensar na enxurrada: ignora-a e morre na ignorância...

Ah, a “família”... Geralmente vinda em pedaços do Nordeste da água de menos para enfrentar as chuvas torrenciais das grandes cidades do Sudeste, sinônimo de morte. E as favelas crescem exponencialmente como “regra geral”. E essas famílias, se antes morriam de sede e fome, logo morrerão afogadas em água e/ou asfixiadas na lama da vergonha – nosso genocídio impune. E os políticos, donos da mídia indiretamente remunerada pelas verbas estatais publicitárias, põem-na de quatro. E a mídia se finge isenta produzindo falsos heróis em vez de críticas. Quase, na verdade, nos faz culpar o favelado por existir favela. E esses políticos e compadres midiáticos seguem sem remorso lhes ocupando o quengo apodrecido. Cá pra nós, muitos deles, de tanta culpa no cartório, deveriam se jogar dum penhasco...



Avante bombeiros, autênticos heróis em meio a tantos vilões!


5 comentários:

Paulo Xavier disse...

...mas como são mestres da retórica, fazem um discurso mais que emocionante, para o mundo todo ver e ouvir, que chega a tirar lágrimas dos olhos de quem assiste. Como são caras de pau!
No início da enxurrada de notícias, disse pra mim mesmo que não ia assistir tanta desgraça, tanto sofrimento; não faz bem ao coração, depois mudei de idéia, afinal, é preciso encarar a realidade, ajudar de alguma forma e seguir em frente, porque para alguns, a vida continua.

Anônimo disse...

Concordo em Parte!
Bomba 00.

NEIDE disse...

DE UM LADO SE NÃO NOS JUNTAMOS E COOPERAMOS, SOMOS INSENSÍVEIS E POR OUTRO LADO SE PARTICIPAMOS DE MUTIRÕES, DE ARRECADAÇÃO DE ÁGUA, MANTIMENTOS ETC..., O GOVERNO NÃO SE MOBILIZA TANTO E O PROBLEMA CONTINUA. SABEMOS QUE VERBAS SERÃO LIBERADAS COM JÁ FALARAM MAS O QUE NÃO SE SABE É PARA ONDE VAI ESSA VERBA E NÃO HÁ UMA SATISFAÇÃO OU PRESTAÇÃO DE CONTAS JUNTO AO POVO. COM CERTEZA, COMO SEMPRE ALGUÉM FICARÁ COM UMA ENORME PORCENTAGEM E NO FIM OUTROS FATOS SURGIRÃO PARA QUE A MENTE BRASILEIRA SE OCUPE E ESQUEÇA.

Anônimo disse...

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011Dilma manda Cabral parar de pedir verbas e bate no aliado: “Você devia ter vergonha e renunciar”
Edição do Alerta Total – http://www.alertatotal.net/

Por Jorge Serrão

Sexta-feira passada, a Presidenta Dilma Rousseff comprovou que seu estilo de governar não poupa sequer os aliados ou amiguinhos. Por telefone, Dilma quase reduziu a pó o governador Sérgio Cabral. No momento mais tenso da conversa entre ambos, Dilma chegou a gritar que Cabral devia ter vergonha e renunciar. A bronca de Dilma em Cabralzinho foi presenciada por amigos dela.

Dilma recomendou que Cabral pare de reclamar por verbas. Lembrou que, desde 2008, o governador fluminense já fora alertado pelo governo federal de que as chuvas poderiam causar uma tragédia no Estado. Dilma concluiu que a administração de seu aliado pouco fez para evitar os efeitos das chuvas que produziram centenas de mortes.

Dilma também criticou Cabral por se ausentar do Rio de Janeiro, em períodos críticos, como os de começo de ano. A Presidenta ponderou que pega muito mal, em toda catástrofe, o vice-governador Luiz Fernando Pezão sempre aparecer, primeiro, como a voz oficial, enquanto o governador tira férias.

Quem ouviu a conversa no viva voz jura que Cabralzinho chegou a chorar com as duras críticas da Mãe Dilma. A mídia amestrada dará uma linha sequer sobre a bronca privada de Dilma em Cabralzinho. O assunto "não interessa" no momento de exploração jornalística da desgraça de milhares de pessoas.

Anônimo disse...

DINHEIRO DAS ENCHENTES FOI PARA A FUNDAÇÃO ROBERTO MARINHO

Então não venham de hipocrisia. Os mesmos veículos das Organizações Globo que estão cobrando investimentos públicos – o que é emergencial, é claro – escondem que a fundação dos seus patrões, a família Marinho pegou R$ 24 milhões, dados por Cabral, que era para terem sido usados na prevenção de enchentes e contenção de encostas. É tudo lastimável.