segunda-feira, 5 de julho de 2010

Sobre o “recuo” da PMERJ



Às vezes eu me antecipo em críticas que incomodam alguns mentores e gestores de ideias e projetos na segurança pública, não por minha culpa, mas pelo excesso de ufanismo deles (desculpem-me a redundância). Ufanismo é pura emoção, e emoção é um bom sentimento, sem dúvida; o seu excesso, porém, pode até matar. Aliás, os excessos não são razoáveis. Não me parece prudente defender inflexivelmente o que está indo bem ou criticar em desrazão o que vai indo mal. Não cuido de extremos. Creio que o meio-termo é aconselhável neste universo em que vivemos sobressaltados por novidades.
Bem, agora começo a ficar exultante (sem aquele exagero ufânico) com o choque de realidade por que passa a mídia em relação às UPPs. Entendo que a mídia começa a reconhecer seus próprios exageros ao cobrar explicações oficiais sobre as inevitáveis falhas de percurso nos específicos ambientes por ela (mídia) tornados “paraísos” por conta das UPPs. Esta confortável situação elogiosa, claro, foi imediatamente absorvida pelo sistema oficial como “verdade absoluta” (mote de publicidade governamental com direito a placas comemorativas e outras cascatas eleitoreiras), um perigo neste mundo de incertezas, turbulências, assimetrias, desequilíbrios e desordens que nos fogem ao controle.
Vejo hoje o principal entusiasta das UPPs (Jornal O Globo) a emitir uma opinião com roupagem crítica. Sugere ao não menos entusiasmado sistema oficial que deva “IMPEDIR RECUOS”. Ora, não há nenhum “recuo” no trabalho das UPPs; há, sim, a ampliação temerária de um projeto antigo de policiamento ostensivo comunitário que depende de constante correção de rumo e, principalmente, de complementação com investigação criminal para erradicar o máximo que puder o crime nas localidades ocupadas. Não se trata tão-somente de tráfico, mas de todos os fatos contravencionais e criminosos visíveis (típicos de reação imediata pela PMERJ) e invisíveis (típicos de investigação criminal pela PCERJ).
Como eu já afirmei, a UPP não é “milagre” nem invenção atual. É apenas adaptação de táticas exigidas por uma estratégia que, nos moldes atuais, corresponde a caminhar no arame circence em dia de ventania. Afinal, é inegável a desarmonia na convivência coletiva em localidades caracterizadas pela desordem social, fator sociopolítico por si só gerador de desordens públicas (favelas são resultantes da desordem social brasileira). Ora, num Estado Democrático de Direito a Ordem Pública decorre da Ordem Jurídica, esta que, por sua vez, decorre da Ordem Social. Se há alguma desordem social, há de haver de algum modo a desordem jurídica; e se há a desordem jurídica, há de haver a desordem pública.
O papel da PMERJ é buscar o equilíbrio restrito ao que lhe compete (polícia ostensiva de preservação ou restauração da ordem pública), e o faz através das festejadas UPPs e também por meio de outras ações operacionais arriscadas que executa em favelas sem UPPs, como nos informam diariamente os jornais. Muitas dessas operações repressivas são bem-sucedidas, mas outras culminam malsucedidas, como a ação dos policiais da UPP no Morro do Cantagalo, em Ipanema. Aliás, a alternância entre equilíbrios e desequilíbrios é como na luta universal entre a matéria e a antimatéria, com ínfima vantagem para a primeira. Não houvesse a imprecisão cósmica mínima, nem nós existiríamos. Cá pra nós, não por acaso o morador do Morro do Cantagalo baleado possui três passagens pela polícia, ou seja, não é nenhum “santo”...


O projeto das UPPs é ótimo como ideia e ação, reitero enfaticamente; porém, é complicado ou impraticável como possibilidade de expansão para todo o RJ e seus ambientes favelados nos quais impera a desordem pública como autêntica calamidade social. E onde se implanta um privilégio inacessível a outros cidadãos que têm o mesmo direito a ele, há a discriminação (condenada pela Carta Magna). Onde há UPP (o privilégio), por enquanto a ordem está aparentemente vencendo a desordem, sim, mas num processo dinâmico e variável em que, em alguns momentos e situações, a desordem se imporá à ordem, até que a intervenção estatal novamente a restaure e preserve até a próxima desordem. É um sistema de pesos e contrapesos numa balança social ora equilibrada no fiel, ora desequilibrada no excesso ou no vazio de um dos pratos.
Em vista de tanta complexidade, é impossível “impedir recuos”, como sugere o Jornal O Globo. Melhor é admitir o crime como fator constante, pondo a inteligência policial a agir no sentido de detectar os sintomas da desordem para atalhá-la. Nem sempre, todavia, isto será possível na realidade da convivência social. Portanto, não houve “recuo”. Pelo contrário, houve ação e sempre haverá em tudo que é recanto do RJ infestado de bandidos, inclusive os policiados por UPPs. É a missão da PMERJ e a corporação não recua a não ser como tática de combate para sagrar-se vitoriosa ao fim e ao cabo...

Um comentário:

Anônimo disse...

Todo trabalho com valores humanos só deve ser feito com exemplos positivos, ou seja, evitando fazer referência aos anti-valores. A sociedade e a mídia já se encarregam do ensino do anti-valor todos os dias! Pais, familiares e professores só precisam mostrar o valor positivo e os bons exemplos. Esse é o caminho correto e é assim que obteremos os melhores resultados.


Reynoso Silva