quarta-feira, 27 de março de 2013

Notícia ruim...


Notícia ruim, incômodo contraste da euforia do dia da “conquista” do Complexo do Alemão, os bandidos em disparada, batendo os calcanhares na bunda, cena tragicômica seguida de ufanas poses fotográficas dos “conquistadores” em oba-oba histórico. Lembra também a morte da PM Fem Fabiana Aparecida de Souza, alerta máximo que nem beliscou os brios do sistema, que se mantém amparado no desconceito da conquista, eis que não houve nenhuma. Lembra, principalmente, o poderio real e permanente do Comando Vermelho, que nos remete ao fiasco norte-americano no Vietnã numa época de guerra de guerrilha que impressionava pelo fato de que quanto mais morriam norte-vietnamitas, mais deles surgiam na selva, nos centros urbanizados e nas aldeias descampadas e em tudo mais que era lugar, até escorraçarem de lá a poderosa nação estadunidense, completando serviço anterior da expulsão dos franceses. Lembra também a profecia de William da Silva Lima (O Professor), prócer do CV e um de seus principais fundadores, aos que queriam envolver o CV na luta política: “Alguns deles, pequeno-burgueses, pretendiam usar nossas comunidades e nossa organização com finalidades políticas. À medida que não deixamos usar, comprovamos, sem soberba, que conseguimos aquilo que a guerrilha não conseguiu, o apoio da população carente. Vou aos morros e vejo crianças com disposição, fumando e vendendo baseado. Futuramente elas serão três milhões de adolescentes que matarão vocês (a polícia) nas esquinas. Já pensou o que serão três milhões de adolescentes e dez milhões de desempregados em armas? Quantos BANGU I, II, III, IV, V... terão que ser construídos para encarcerar essa massa?...”

Volta-se aqui ao complicado trinômio “trabalhador-bandido-policial”, cabo de guerra que, necessariamente, põe dois lados contra um, sendo o trabalhador o contrapeso, o braço a mais tendente ao bandido que nasceu do ventre favelado, tal como ele, o trabalhador, situação comprovada em pesquisa na Cidade de Deus por importante antropóloga (Alba Zaluar). Não que os trabalhadores não almejem a paz. Eles a almejam, sim, mas a questão está no cerne, na indagação que o atormenta: de quem ele deve sentir mais temor?... Do simpático policial estranho no ninho ou do bandido que viu nascer? Do policial que lhe aponta o fuzil ou do bandido que aponta o fuzil contra o policial? Ou de ambos que lhe apontam o fuzil?...

Ora, o nome disso é beco sem saída, se correr o bicho pega, se parar o bicho come, é melhor silenciar que denunciar a localização dos bandidos armados que estão a desestabilizar a pacificação, de antemão sabendo que quem pacifica deve morrer antes de matar para não ser questionado pelos assistentes societários, que estão sempre em locais seguros apostando contra a polícia tais como apostam no touro contra o toureiro. Daí a bala perdida sair sempre do fuzil policial, bandido não mata crianças, só policial, e a comunidade sempre acusa o policial, mesmo sabendo que o tiro foi disparado pelo bandido. É assim, mesmo! É assim que o galo canta no Cantagalo, o povo jura no Juramento e a manga amadurece na Mangueira até cair em mãos famintas e garantir o alimento único de muitos.

Pior é que a Providência não providencia a paz, não joga um raio certeiro no quengo dos animosos bandidos que de policiais não têm medo, e os enfrentam em tocaia, e os matam em covardia, embora sobre coragem ao policial para atacar de verdade o bandido. Mas vêm logo as pesadas cobranças dos que conceituam de longe a desgraça, mas desconhecem o drama humano favelado e a tragédia humana do policial que corre atrás do único emprego, perigosíssimo e mal remunerado, mas único possível neste país da imobilidade social dissimulada em benesses governamentais socialistas. Que se dê a vitória então ao bandido! Que se desmoralize o policial! Que haja a tremedeira favelada ante os tiros que novamente infernizarão a vida deles, que não pode ser pacata, a sociedade formal não permite porque não gosta da imagem das favelas entrando por suas janelas seguras e abastadas! Sim, porque por mais que digam ou jurem o contrário, a favela é feia e ser favelado não é vida, é pobreza! Porque luxo favelado é só no Carnaval, com direito ao silêncio do bumbo sobre o qual arrisco o poema de rima pobre, mas é o que Deus me permite...



Na quarta-feira de cinzas

do carnaval que passou

o som entalado na goela

João da Encarnação

solta o grito vencedor.



Na quinta-feira, euforia

a ressaca do tambor

na sexta, a afinação

mais um desfile exaltando

a glória do ganhador.



No sábado dos campeões

de manhã, lá na favela

o sangue seco no chão

um corpo inanimado

jaz ao lado do tambor...



vazio na bateria,

falta o bumbo campeão

que a bala perdida alcançou

é João da Encarnação

é sangue do batedor.



Um comentário:

Paulo Xavier disse...

Essa notícia da resistência e ousadia dos criminosos do Complexo do Alemão já era de se esperar, afinal bandido é assim. Ela é ruim para o povo fluminense que em sua maioria acredita na vitória do bem; é ruim para o morador ordeiro da comunidade que apenas deseja que seu direito de ir e vir seja respeitado; é ruim para os pais que temem pela vida dos seus filhos em um território onde o conflito é iminente; é ruim para toda uma comunidade que poderá voltar a conviver face a face com o crime, com o tráfico de drogas e com a desordem.
Na minha humilde opinião, o mais difícil e complicado já foi feito, que foi expulsar aquele bando de vagabundos, uns bandidos de verdade, outros jovens "levados", que até então viviam na onda da realidade reinante do lugar.
Para manter a tão sonhada paz, mais vidas se perderão e que não seja as dos moradores inocentes nem dos policiais, mas as do "alemães" (inimigos).