quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Sobre a incidência de assaltos na Zona Sul do Rio de Janeiro

Sem menoscabar a violência assoladora de todas as cidades brasileiras...


A sucessão de assaltos em edifícios na Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro sugere haver no Estado uma polícia “a lutar no escuro com um inimigo desconhecido”. Esta alegoria gravada por Brian Greene em sua obra Tecido do Cosmo define a incerteza desse mundo em que vivemos ou pensamos nele viver; e serve (ou penso que sirva) para retratar o acirramento do crime no asfalto, perpetrado por marginais desconhecidos e impunes. Porque, poucos dias após a morte do assaltante que lá na Tijuca ameaçou explodir uma granada, – não se preocupando com a vida da refém nem com a dele própria, – uma súcia sem maiores preocupações em ser identificada pela a polícia e seus atiradores de escol ameaçou explodir outra granada num assalto a edifício residencial. Demais de a certeza da impunidade estar virando moda, haja artefato bélico a sobrar em mãos erradas, hein?...
Esses assaltantes seriam loucos? Não sei, mas eles não se afetam diante do risco de morte, tal como aquele criminoso isolado que em boa hora abraçou-se ao diabo. Deste modo, é possível supor que os assaltantes ainda livres e vivos sejam capazes de matar com a mesma despreocupação do bandido morto. Na verdade, quase que reeditam em nossas plagas a loucura fundamentalista. Afinal, que inimigo é esse? Que espécie de criminalidade reflete a realidade atual do Rio de Janeiro?... A verdade é que a polícia enfrenta há muito tempo um banditismo audacioso e armado até os dentes, que ataca policiais em vez de se render à lei. Não há, da parte dos meliantes, qualquer temor à prisão, ao confronto ou à morte. Eles prosseguem em suas ações sistemáticas desafiando uma PMERJ retardatária (O telefone 190 é mais uma agonia na vida das vítimas) e uma PCERJ acostumada a esperar o registro dos fatos na tranquilidade da DP (e “investiga” tomando depoimento de vítimas e testemunhas em inquérito policial). É costume antigo e dissociado da atualidade do crime...
Ufanismos ou críticas à parte, não se há de duvidar de que o sucesso da PMERJ na Tijuca se deveu à feliz coincidência de ser o comandante do 6º BPM oriundo do BOPE, bem como parte de sua equipe. Trata-se, pois, de exceção à regra geral do atraso e certo despreparo no atendimento às ocorrências comunicadas pós-fato, não se podendo, por óbvio, aferir nenhuma prevenção, sendo igualmente raros os flagrantes no asfalto, sem falar nas repressões que resultam em tragédia a atingir inocentes.
Ora bem, a realidade acaba se resumindo aos flagrantes gerados em operações aparatosas das duas corporações nas favelas, endereço certo de traficantes, armas e drogas e garantia de alguns defuntos a enfeitarem uma violência armada superior aos estragos causados por conflitos bélicos reconhecidos pela ONU. No segundo caso, porém, a população tem direito à intervenção de tropa neutra para garantir sua integridade física e moral.
Já em terras cariocas e circunvizinhanças abundam os entrechoques violentos defuntando inocentes. E o tempo escorre, e os jornais acumulam notícias de assaltos, mortes e apreensões de drogas e armas, até embrulhar o peixe do dia seguinte. Enquanto isso, os PMs morrem no silêncio das noites e das tocaias pouco difundidas. E, esperando passivamente o ataque-surpresa do assassino cruel, lá estão eles, – nas vias expressas e demais logradouros públicos, – prontos para receber tiros sem o direito de satisfazer suas necessidades fisiológicas, faça sol ou faça chuva. No mínimo, safam-se com alguma garrafinha a recolher urina, sendo difícil conceber para os desinfelizes uma diarréia inesperada. Diarréia não pooode!!! Incontinência urinária também não poode!!! Só pode prestar continência sem chiar e olhe lá!...




Alguns leitores, pelo andar da carruagem, devem supor que invento ou exagero... Talvez tenham razão. Mas conto com a possibilidade quântica da irrealidade, da incerteza, do espectro que vejo através do vidro de alguma garrafa ao mirar o ambiente social. Impossível! Como mirar o ambiente, se estou nele? Como perceber a realidade, se estou enfiado nela?... Então, quando passo pela Perimetral talvez eu não esteja vendo as radiopatrulhas e seus PMs debaixo de guarda-sol ou guarda-chuva, dependendo das condições climáticas, pouco importa, “soldado é superior ao tempo”. Aliás, aquele serviço insinua punição disciplinar, embora sua denominação impressione: “MOVE: Monitoramento Ostensivo de Vias Expressas”. Há quem diga, à surda dos corredores do BPVE (Batalhão de Vias Especiais), que os PMs estão realmente cumprindo “punição geográfica”... Sim ou não, lá estão as radiopatrulhas enfileiradas como estacas, lembrando-me o adágio alemão: “A árvore impede de ver a floresta.”
É como vejo, sim, as radiopatrulhas: em fantasmagórico policiamento preventivo, este que supostamente se refere à maior (ou menor) frequência do patrulhamento, ou seja, a radiopatrulha percorrendo as vias públicas e os patrulheiros observando dinamicamente o ambiente, assim inibindo a oportunidade de delinquentes contumazes praticarem crimes. Contrariamente, a radiopatrulha parada em vias de grande movimento institui uma falsa impressão de presença, modo prático de engrupir os olhares atemorizados de motoristas indefectivelmente assaltados onde não há radiopatrulha. Os bandidos sabem, adrede, onde elas estão “plantadas” (ponto-base) e em que horário passam (roteiros). Que moleza! Eles agem sempre no vazio insuperável...
Estacionar as viaturas em locais movimentados significa economia de combustível, de PMs, de pneus e do carro em geral. É uma espécie de “generalização brilhante”; é o um se transformando em muitos; é a inutilidade se tornando utilidade. Cá pra nós, como diria Boris Casoy: “Isto é uma vergonha!” Seria, mal comparando, premiar um sorridente telespectador num programa de grande audiência, criando no espírito desprevenido de quem está de olho na telinha a certeza (falsa) de que também ganhará o prêmio em meio a milhões de concorrentes. Como diria outro grande comunicador, Ancelmo Gois: “Faz sentido.” Sim, faz sentido, sim! Afinal, ao mirarmos o Cosmo cremos piamente ver o que não vemos: a imagem refletida é remotíssima. Portanto, nada demais permanecermos com a cabeça enfiada na areia do autismo... Ah, tudo bem! Que assim seja! Mas que, pelo menos, possamos registrar esta realidade, ou irrealidade, com a certeza, ou a incerteza, de que não estamos boiando nesta “história pra boi dormir”. Ou estamos?...
Não encerrarei em pessimismo. A PMERJ fincou no Elevado Paulo de Frontin a primeira torre de observação, de cinco metros de altura, blindada, com banheiro e conforto para alojar dois PMs. E outras virão... Sem dúvida, a torre é melhor que as radiopatrulhas; as torres parecem-me mais seguras e saudáveis, embora reeditem o século XVIII e o panopticum de Jeremy Bentham. Depois de instaladas, o PM poderá observar as ocorrências e chamar a polícia, melhor que morrer como pato no lago ou urinar na latinha, melhor que sofrer os efeitos da chuva e da canícula. Mais que isto, a mudança significa a constatação de que o modelo atual é deprimente, o que nos alenta, embora, talvez, fosse mais seguro instalar câmeras para observação indireta, com a garantia de que elas não urinam ou defecam nem dormem durante o serviço e ainda podem arquivar imagens a servirem de prova futura contra criminosos. Será que o custo-benefício da torre+PMs justifica a escolha? O tempo dirá...


2 comentários:

Anônimo disse...

Enquanto o tempo não diz,mais vidas de policiais cobaias serão ceifadas, nessa guerra em que o bandido pode se deslocar para onde quiser, com o carro que escolher e com o armamento mais moderno que já se ouviu falar. E o povo? Ah! esse fica à mercê da própria sorte. Paulo Xavier - Macaé

Rose Mary M. Prado disse...

Ainda bem que EU não estou com a cabeça enfiada na areia do autismo!
Acho muito bonito e elucidativo o texto abaixo e o dedico
a todos aqueles que não dão valor ao bom policial e também para aqueles que sabem o seu valor, como eu:

A falta de um policial

"Muito bem, senhor cidadão, eu creio que o senhor já me rotulou. Acredito que me enquadro na categoria em que o senhor me colocou.
Eu sou esteriotipado, padronizado, marcado, corporativista, e sempre bitolado. Infelizmente é reciproca e verdadeira.
Eu não vou porém rotulá-lo. Mas, desde que nascem, seus filhos ouvem que sou o bicho papão, e depois o senhor fica chocado quando eles se indentificam com meu inimigo tradicional... O BANDIDO!
O senhor me acusa de contemplar com os criminosos, até que eu apanhe um de seus filhos em alguma falta.
O senhor é capaz de gastar uma hora para almoçar e interrompe o serviço para tomar muitos cafés por dia, mas me considera um vagabundo se eu paro para tomar uma xicara.
O senhor se orgulha de seu refinamento mas nem pisca quando interrompe minhas refeições com seus problemas.
O senhor fica fulo quando alguém o fecha no trânsito, mas se eu o pegar fazendo a mesma coisa, estarei lhe perseguindo.
O senhor conhece todo o código de trânsito, mas nunca porta todos os documentos obrigatórios.
O senhor acha que é um abuso se me vê dirigindo em alta velocidade para atender uma ocorrência, mas sobe pelas as paredes se eu 10 minutos para atender um chamado seu.
O senhor acha que é parte do meu trabalho se alguéem me fere, mas não diz que truculência da polícia se eu devolvo uma agressão.
O senhor nem cogita ao seu dentista como arrancar um dente, ou ao seu médico como extirpar seu apêndice, mas está sempre me ensinando como aplicar a LEI.
O senhor quer que eu o livre dos que metem o nariz na sua vida, mas não quer que ninguém saiba disso.
È preciso fazer algo para combater o crime, mas fica furioso se é envolvido em um processo apenas como testemunha.
O senhor não vê ultilidade para minha profissão, mas certamente ela se torna valiosa se eu trocar um pneu furado da sua esposa ou conduzir o seu menino no banco detrás da patrulha, ou talvez, salve a vida do seu filho com uma respiração boca-a- boca, ou trabalhe muitas horas extras proucurando sua filha que sumiu.

Assim, senhor cidadão, eu sou um policial!!!"